30.10.05

As 10 pessoas mais pobres do mundo


Em exclusividade mundial e em estreita colaboração com a revista Fortune, CNN e a Rockfeller Fondation, o website Pimenta Negra sente-se no dever moral de partilhar com os seus leitores o Ranking mundial das 10 pessoas mais pobres do planeta:


!º lugar – A. Boudadi ( da Etiópia) – possui uma fortuna calculada em 0.,00091 dólares

2º - K.Tiba ( do Burundi) – com um fortuna calculada em 0,00095 dólares

3º - G. Condami ( Rep. Dem. Do Congo) – com 0,000103dólares

4º - M. Banané ( da Serra Leoa) – com 0,00146 dólares

5º - O. Isal ( da Eritreia) – com 0,00150 dólares

6º - F. Abdullah ( do Tadjiquistão) – com 0,00169 dólares

7º - R. Paédé – da Guiné-Bissau) – com 0,00183 dólares

8º - H. Honoré ( do Malawi) – com 0,00184 dólares

9º - T. Abdoula ( de Moçambique) – com 0,00202 dólares

10º - I. Sagha ( do Níger) – com 0,00210 dólares


Nota de esclarecimento:
Como é óbvio na base desta lista encontra-se o PIB per capita. Para melhor análise comparativa poderemos adiantar que, segundo valores do ano de 2003, o PIB por habitante no Luxemburgo é de 45.778 dólares, o da Noruega é de 42.222 dólares , o da Suíça é de 36.828 dólares e o dos Estados Unidos é de 36.731 dólares por habitante. Ou seja: cerca de 260 a 500 vezes superiores aos habitantes mais pobres do planeta.
Os habitantes dos países do Norte capitalista ganham em média por dia 200 vezes mais que os 100 milhões de residentes dos países pobres.

Nota final:
Cada um pode achar tudo isso normal. E acomodar-se.
Mas para quem estas realidades perturbam e são inaceitáveis urge fazer algo no sentido de tornar o mundo mais humano, solidário e justo.
E - porque não ? - começar por…

Viver na simplicidade, para que outros possam... simplesmente viver.

Competitividade (para um glossário anti-neoliberal) (1)


Competitividade – novo/velho jogo económico que consiste em utilizar os trabalhadores como peões com vista ao desmantelamento social, e a esmagar os operários às mãos dos accionistas em proveito dos dividendos destes.
Neste jogo o jackpot é alcançado quando se convence o operário que o accionista é ele próprio.


Cliente – termo de origem latina que significava «aquele que obedece». Exemplos: um cliente de uma grande superfície, da TAP, de uma farmácia, …,etc. Todos parecem-se com o protótipo do cliente em geral para quem a publicidade faz passar a ideia que é para ele que uma empresa trabalha!!!


Insegurança – sentimento difuso e confuso , que surge da crença dos homens que nasceram para ficar toda a vida debaixo das saias da mãe.

(continua)

Nota: as definições foram retiradas da net

2 minutos de silêncio


(dois minutos de silêncio no próximo dia 11 de Novembro)

Nós conhecemos a guerra, a tirania, e a balbúrdia verbal. Assistimos à luta do vizinho contra o outro vizinho, à tribo contra a outra tribo, à nação contra outra nação, e um credo contra outro credo. Nós temos vindo também a assistir à crescente tensão mundial. Vemos que, ainda por cima, deitam petróleo para cima de todo esse ódio. E vemos como a paz custa vencer.
Estamos perante um conflito nebuloso cujo fim não está à vista. Dizem-nos que há uma parte e uma outra em cada lado da barricada. Dizem-nos que o nosso modo de vida está em perigo e que é forçoso que vençamos a todo o custo. Mas, como os caixões se multiplicam, não podemos deixar de lamentar as nossas próprias perdas.
Mas o horror de guerra infinita traz consigo uma oportunidade para uma resistência verdadeiramente global.
E assim criaremos um lado novo - o lado que quer entender, o lado que procura as raízes da nossa luta, o lado que triunfará por cima de todo esse conflito.
Nós inventaremos um ritual para transcender esse jogo duplo em que querem transformar as mortes deles nas nossas mortes, e as nossas nas mortes deles. Desafiaremos todos para fazerem o mesmo.
Dois minutos é tudo aquilo que nós precisamos para este ritual global de reconciliação. No próximo dia 11 de Novembro ficaremos em silêncio durante dois minutos em honra de todas as vítimas inocentes - em Londres, no Afeganistão, em Nova Iorque, no Iraque, na Tchechenia, em Madrid. Dois minutos de silêncio, de recordação, de reflexão, a fim de considerar as escolhas que nós fizemos e o caminho que nós devemos trilhar no futuro.

Nota: iniciativa lançada pelo colectivo que edita a conhecida revista canadiana Adbuster

29.10.05

A Amazónia está a sofrer uma das suas maiores secas


A selva amazónica está a secar. As chuvas deste ano foram as mais baixas dos últimos 35 anos. Como consequência da falta de precipitações já existem rios e lagos secos e os prejuízos na agricultura elevam-se a muitos milhões de euros. Muitas povoações encontram-se isoladas porque a sua única via de comunicação são os barcos que circulam através do emaranhado fluvial que se estende por todo o território da selva amazónica.
Em Julho passado caíram 30,8 litros por metro quadrado em média, quando o normal para esse período são 87,5 litros. Em Agosto passado a chuva foi de 66% dos valores normais.
Greenpeace denuncia a situação grave que se vive e que acresce ao problema da desflorestação que tem ameaçado a selva amazónica.
O rio Amazonas perdeu dois metros de altura no último ano, apesar de ter ainda 17 metros de altura. Mas o problema é que muitos dos afluentes e lagos secaram literalmente. Do lago Curulai, no Estado brasileiro do Pará, por exemplo, só sobra um fina camada de água sobre a qual uma vaca pode caminhar.
A falta de água traduz, sem dúvida, uma catástrofe ambiental. O governo brasileiros já mobilizou o Exército para distribuir água, alimentos e medicinas às populações isoladas do interior da selva, que se calcula serem em número de 40.000. Os habitantes da cidade de Manaquiri estão praticamente isolados sendo necessário o seu abastecimento via helicóptero.
Alem disso, a seca tem contribuído para o aumento vertiginoso os incêndios.
Em suma: os ecossistemas valiosíssimos estão em vias de se perder, com incalculáveis perdas, com as populações a viver momentos dramáticos.

A revolução do quotidiano


Transformar o mundo e reivindicar a vida é a palavra de ordem efectiva dos movimentos insurreccionais... a revolução faz-se todos os dias, apesar dos especialistas em revolução e em oposição a eles: uma revolução sem nome, como aquilo que pertence à experiência vivida. Ela prepara, na clandestinidade do quotidiano dos gestos e dos sonhos, a sua coerência explosiva"

(excerto do livro "A arte de viver para as novas gerações", de Raoul Vaneigem)

Poema do amor


Este é o poema do amor.
O poema que o poeta propositadamente
escreveu só para falar de amor,
de amor,
de amor,
de amor,
para repetir muitas vezes amor,
amor,
amor,
amor.
Para que um dia, quando o Cérebro Electrónico
contar as palavras que o poeta escreveu,
tantos que,
tantos se,
tantos lhe,
tantos tu,
tantos ela,
tantos eu,
conclua que a palavra que o poeta mais vezes escreveu
foi amor,
amor,
amor.
Este é o poema do amor.

António Gedeão

27.10.05

Contrato tácito das pessoas que dormem…


O mundo em que vivemos assenta num contrato tácito entre os conformistas amorfos e cujo conteúdo é o seguinte:

1) Aceito a competição como base do nosso sistema social e económico, mesmo se tenho consciência que o seu funcionamento gera frustração e cólera por entre a esmagadora maioria dos perdedores.

2) Aceito ser humilhado ou explorado na condição de também eu humilhar e explorar quem quer que se encontre abaixo de mim na hierarquia social

3) Aceito a exclusão social dos marginais, desadaptados e dos fracos em geral, uma vez que a integração social tem que ter limites

4) Aceito remunerar os bancos a fim destes investirem o meu salário conforme as suas conveniências, mesmo sem receber qualquer dividendo pelos seus gigantescos lucros. Aceito igualmente que os bancos me exijam uma comissão elevada para me emprestarem dinheiro que não é outro senão o dos seus clientes.

5) Aceito que permanentemente sejam congeladas e sejam lançadas fora toneladas de alimentos a fim que os preços não baixem, o que é preferível a dá-los às pessoas necessitadas e que permitiriam salvar algumas centenas de milhar de pessoas da fome, cada ano que passa.

6) Aceito que seja expressamente proibido pôr fim aos seus dias, mas que seja perfeitamente tolerável que se vá morrendo aos poucos ao inalar-se ou ingerir-se substâncias tóxicas autorizadas pelos Estados.

7) Aceito que se faça a guerra para fazer reinar a paz. Aceito que em nome da paz a primeira despesa pública dos Estados seja para o orçamento do exército. Aceito igualmente que os conflitos sejam criados artificialmente a fim de garantir o escoamento dos stocks de armas e de fazer girar a economia mundial.

8) Aceito a hegemonia do petróleo sobre a nossa economia, muito embora se trate de uma economia de elevado custo e geradora de poluição, pelo que estou de acordo em travar ( e mesmo impedir) qualquer substituição, mesmo se se vier a descobrir um qualquer meio gratuito e ilimitado de produzir energia, o que seria uma grande perda e prejuízo elevado para o nosso sistema económico.

9) Aceito que se condene a morte do próximo, salvo se o Estado decretar que se trata de um inimigo, caso esse em que devemos então encorajar a que seja morto.

10) Aceito que se divida a opinião pública criando partidos de direita e partidos de esquerda, que passarão o seu tempo a combater-se entre si, dando a impressão de fazer avançar o sistema. Aceito, além disso, todas as divisões possíveis e imagináveis, visto que elas me permitirão canalizar a minha cólera para os tais inimigos referenciados, e cujo retrato será agitado perante os meus olhos.

11) Aceito que o poder de moldar e formatar a opinião pública, outrora entregue às religiões, esteja hoje nas mãos dos negociantes, não eleitos democraticamente e que são totalmente livres de controlar os Estados, já que estou plenamente convencido do bom uso que não deixarão de fazer daquele poder sobre a opinião pública.

12) Aceito a ideia que a felicidade se resume ao conforto, amor ao sexo, e à liberdade de satisfazer todos os desejos, pois é isso que a publicidade não se cansa de me transmitir. Quanto mais infeliz, mais eu hei-de consumir, e ao desempenhar com competência este meu papel, estou a contribuir para o bom funcionamento da nossa economia.

13) Aceito que o valor de uma pessoa seja medido em função da sua conta bancária, assim como a sua utilidade social esteja dependente da sua produtividade, e não tanto da suas qualidade, pelo que será excluído o sistema quem não se mostre suficientemente produtivo.

14) Aceito voluntariamente que sejam prodigamente pagos os jogadores de futebol e os actores e actrizes, e a um nível muito inferior os professores e médicos, profissionais encarregados da educação e da saúde das futuras gerações.

15) Aceito que sejam lançados para os lares, especialmente destinados para esse fim, as pessoas de idade, cuja experiência poderia ser útil, uma vez que sendo nós a civilização mais evoluída do planeta ( e, sem dúvida, do universo) sabemos bem que a experiência não se partilha nem se transmite.

16) Aceito que todos os dias sejam apresentadas as notícias mais terríficas e mais negativas do mundo a fim que possa apreciar até que ponto é normal e possa dar-me por satisfeito a sorte que tenho em viver numa sociedade ocidental, tanto mais que incutir o medo nos nossos espíritos só pode ser benéfico para todos nós.

17) Aceito que os industriais, os militares e os políticos se reúnam regularmente para tomar decisões, sem nos consultar, sobre o futuro da vida e do planeta.

18) Aceito consumir carne bovina tratada com hormonas sem que eu esteja informado sobre o assunto. Aceito que a cultura dos transgénicos se expanda por todos os sítios do mundo, permitindo às transnacionais do sector agro-alimentar patentear as sementes, recolher dividendos e colocar sob o seu jugo toda a agricultura mundial.

19) Aceito que os grandes bancos internacionais emprestem dinheiro aos países desejosos de adquirir armamento, escolher aqueles que farão a guerra e os que a não farão. Estou plenamente consciente que mais vale financiar as duas partes beligerantes a fim de estar seguro que o conflito possa durar o mais tempo possível, de modo a ser possível pilhar os seus recursos caso não possam reembolsar os empréstimos recebidos.

20) Aceito que as empresas multinacionais se abstenham de aplicar os progressos .sociais do ocidente nos países desfavorecidos. Considerando que é uma verdadeira beleza vê-los a trabalhar, prefiro que seja permitido o trabalho de crianças em condições infra-humanas e precárias e que, em nome dos direitos do homem e do cidadão, não haja o direito de ingerência nesses assuntos.

21) Aceito que os políticos possam ter uma duvidosa honestidade e, por vezes, sejam corruptos, perante as fortes pressões de que eles são alvos, desde que para a maioria dos cidadãos a regra seja a tolerância zero.

22) Aceito que os laboratórios farmacêuticos e os industriais do sector agro-alimentar vendam aos países subdesenvolvidos produtos fora do prazo ou com componentes cancerígenas, e que estejam interditas no ocidente.

23) Aceito que o resto do mundo não-ocidental possam pensar diferentemente de nós, sob a condição de não virem para cá exprimir as suas crenças, e ainda menos tentar explicar a nossa História com as suas noções filosóficas primitivas.

24) Aceito a ideia que não existe senão duas possibilidades na natureza, a saber: caçar ou ser caçado. E se somos dotados de uma consciência e de linguagem, não é com certeza para saber escapar a esta dualidade, mas sim para justificar porque é que agimos assim.

25) Aceito considerar o nosso passado como uma sucessão ininterrupta de conflitos, conspirações políticas e de vontade para obter hegemonias, mas eu sei que hoje tudo isso já não existe porque estamos no apogeu na evolução humana, e que as únicas regras que regem o nosso mundo são a busca da felicidade e da liberdade de todos os povos, tal como ouvimos dizer constantemente nos discursos políticos.

26) Aceito sem discutir e considero como verdades todas as teorias propostas para explicar o mistério das nossas origens. Além disso, aceito que a natureza tenha demorado milhões de anos para criar um ser humano, para o qual o único passatempo é a destruição da sua própria espécie daqui a alguns instantes.

27) Aceito que a procura do lucro seja o fim último da Humanidade, e que a acumulação das riquezas seja realização efectiva da vida humana.

28) Aceito a destruição das florestas, a quase destruição da fauna marítima dos rios e eoceanos. Aceito o aumento da poluição industrial e a dispersão de venenos químicos e de elementos radioactivos na natureza. Aceito a utilização de todas as espécies de aditivos químicos na minha alimentação, porque estou convencido que, se aí são introduzidos, é porque são úteis e desprovidos de risco.

29) Aceito a guerra económica que alastra pelo planeta, mesmo se sinto que ela nos conduz para uma catástrofe sem precedentes.

30) Aceito esta situação e admito que não posso fazer absolutamente nada para a mudar ou melhorar.

31) Aceito ser tratado como besta, pois feitas as contas, penso que não valo mais que isso.

32) Aceito não levantar qualquer questão, de fechar os olhos a tudo isso e em não me opor a nada, uma vez que estou demasiado ocupado com a minha vida e já tenho preocupações que me cheguem. Aceito mesmo defender até à morte este contrato se mo pedirem.

33) Aceito pois, consciente e voluntariamente, este meu triste destino contratual que me colocaram à frente dos olhos e que vou assinar, apesar de tal me impedir de ver a realidade das coisas.


Nota final:
Caso estejas contra e recusas subscrever este contrato, podes em alternativa começar por utilizar os recursos que a amizade e o amor, a fraternidade e a responsabilidade partilhada, te oferecem e passar a reflectir, a conceber, a ousar e a tecer uma teia não-venenosa, mas saudável, para manter vivo o nosso planeta e garantir à Humanidade o direito a viver com justiça e liberdade.
Todo o atraso é demais.

(Texto retirado da net e de autoria dos Amigos da Terra.)

26.10.05

A mundialização do amor maternal (ou a transferência dos cuidados maternais do Sul para os países do Norte)


As mulheres do Sul são as novas amas dos países do Norte. Quando emigram, deixando para trás maridos e filhos, é geralmente para cuidarem da progenitura das famílias abastadas dos países do Norte.
Através delas regista-se uma deslocalização de tipo novo entre o Sul e o Norte: uma transferência de cuidados e de atenção, enfim, de amor maternal do Sul para os países do Norte.
No fundo, é a velha extracção (importação) de recursos do países pobres para os países ricos, mas desta vez a transferência recai sobre um recurso especial: o amor maternal



Carlos e Princela Bautista não sabem, mas estas duas crianças de uma pequena aldeia das Filipinas, e que vivem longe dos seus pais emigrantes, são as beneficiárias de uma declaração internacional: o artigo 6º da Declaração das Nações Unidas dos Direitos da Criança consagra que qualquer criança «tem necessidade de amor e compreensão», que «deve tanto quanto possível crescer sob a salvaguarda e a responsabilidade dos seus pais», assim como «as crianças com pouca idade não devem , salvo circunstancias excepcionais, ser separadas da sua mãe». Estes desejos, por agora, não passam de votos piedosos que estão longe de proteger as crianças expostas ao fenómeno da globalização.
A família Bautista não ficou, na realidade, preservada dos custos humanos da globalização. No seu quarto de dormir, nas traseiras da casa do seu empregador, em Washington DC, Rowena Bautista, a mãe, conserva 4 fotografias em cima da mesinha de cabeceira: duas fotografias dos seus filhos naturais, nas Filipinas, e outras duas fotos com as crianças que esteve a cuidar até há bem pouco tempo nos Estados Unidos. As fotografias dos seus filhos tem 5 anos. As outras duas mostram, conforme ela confidenciou a um jornalista do Wall Street Journal, tudo o que lhe faltou. Já dois Natais que ela não vai a casa. Na última vez, o seu filho, hoje com 8 anos, mal se aproximou dela, quando a interpelou: «porque é que vieste?»
Filha de professora e de um engenheiro, Rowena fez estudos de engenharia durante 3 anos, abandonou-os para ir para o estrangeiro à procura de trabalho e de aventura. Alguns anos mais tarde, por altura de uma viagem, apaixonou-se por um operário africano de construção civil do qual teve 2 filhos. Não encontrando trabalho nas Filipinas, o pai dos seus filhos teve de ir trabalhar para a Coreia do Sul e, desde então, nunca mais apareceu.

Uma Transplantação de afectos

Rowena teve de voltar a partir para os países ricos, juntando-se á massa crescente das mães dos países pobres que trabalham durante períodos longos no estrangeiro por não poderem garantir a subsistência mensal nos seus próprios países. Ela deixou os seus filhos entregues à avó, contratou alguém para ajudar à lide da casa e meteu-se num avião em direcção a Washington DC. Arranjou um trabalho de ama com o mesmo salário que um médico nas Filipinas. Tal como Rowena, 40% das 792.000 pessoas que trabalham na economia doméstica nos Estados Unidos são estrangeiras. E tal como Rowena, 70% dos emigrantes das Filipinas são mulheres.
«O meu bebé» - é assim que Rowena chama à pequena Noa, a criança norte-americana de que ela cuida. Uma das primeira palavras pronunciadas por Noa foi «Ena«, diminutivo de Rowena. Noa, inclusivamente, começou a tagarelar a língua que Rowena falava nas Filipinas. Rowena acorda Noa às 7 horas da manhã, leva-a ao centro de recreio, está com ela no baloiço, e adormece-a na sua sesta. Rowena confessa: «Dou a Noa o que não posso dar aos meus filhos». Em troca, a criança norte-americana dá a Rowena o que ela não recebe em casa. Rowena não hesita: «ela dá-me a impressão de ser uma mãe».
Os filhos de Rowena vivem numa casa com 4 quartos junto de outros familiares, dos quais 8 são crianças que têm também algumas das suas mães no estrangeiro. A figura central na vida destas crianças – a quem eles chamam «mamã» - é na realidade é avó. Esta última trabalha como professora com um horário inacreditavelmente longo – das 7 horas da manhã às 9 horas da noite. Rowena não fala do seu pai, o avô das crianças. Nas Filipinas os homens não se envolvem na educação das crianças.
A vida de Rowena reflecte uma tendência mundial de uma enorme amplitude: a importação de cuidados e de amor dos países pobres para os países ricos. Desde há algum tempo, profissionais altamente qualificados deixam os seus países de origem, países pobres do Sul, com os seus hospitais mal equipados, escolas semi-abandonadas, e a crónica falta de perspectivas profissionais, em direcção aos países ricos, que lhes oferecem possibilidades de trabalho mais interessantes e melhor remuneradas. Enquanto as nações ricas se tornam cada vez mais ricas e as nações pobres cada vez mais pobres, este fluxo de capacidades e de competências de sentido único não cessa de aumentar o fosso entre uns e outros. A esta fuga de cérebros ( brain drain) acresce actualmente uma tendência paralela, menos visível pás carregada de consequências. As mulheres, que cuidam das crianças, idosos e doentes nos seus países pobres, deslocam-se para tomar conta das crianças, idosos e doentes dos países ricos, quer como empregadas domésticas, quer como amas ou ajudantes. Trata-se do que se chama a fuga dos cuidados maternais ( em inglês, care drain).
Quaisquer que sejam as medidas adoptadas por estas mães em relação aos seus filhos, a maior parte delas ressente-se dolorosamente da separação, acusando uma culpabilidade e remorsos contra si próprias. Numa entrevista, Vicky Diaz, uma professora diplomada, que deixou os seus 5 filhos nas Filipinas confessa: «A única coisa que posso fazer é dar todo o meu amor à criança de que tomo conta, na falta dos meus filhos». Esta realidade que está a tomar proporções desmedidas bem pode ser encarada como uma verdadeira operação mundial de transplantação de afectos.
Os filhos, numerosos, sofrem tanto como as suas mães. Estima-se, por exemplo, que 30% das crianças filipinas – qualquer coisa como 8 milhões – vivem em famílias em que, pelo menos, um dos pais partiu para o estrangeiro. Encontramos crianças na mesma situação em África, na Índia, no Sri Lanka, na América Latina e na ex-União Soviética. Como é que reagem? Não muito bem, segundo uma investigação do Centro de migrações de Manila, conduzida junto a mais de 700 crianças. Comparadas aos seus colegas de escola, os filhos dos trabalhadores emigrantes sofrem mais doenças, mostram-se mais coléricos, confusos e apáticos, além de que os seus resultados escolares se mostram particularmente fracos.
Outros estudos sobre esta população revelam um aumento de delinquência e de suicídios infantis. Quando se pergunta as estas crianças se gostavam de deixar, uma vez adultos, os seus filhos para emigrarem, a resposta é quase sempre negativa.
Se compararmos as carências afectivas de que sofrem estas crianças com a profusão de amor de que beneficiam as crianças dos países ricos, não é difícil de experimentar algum sentimento de injustiça. Na sua pesquisa sobre mulheres de cor, empregadas como domésticas, Sau-Ling Wong declara que o tempo e a energia que estas trabalhadoras despendem para os seus empregadores é à custa dos seus próprios filhos. Mas não é só o tempo e a energia que aqui estão em causa: é também o amor. Neste sentido, podemos falar de amor como um recurso desigualmente distribuído – um recurso que se retira de um lugar em proveito de outro.
Pode-se bem entender como os pais dos países ricos ficam felizes quando as amas re-direccionam o seu amor da maneira como desejam. Aliás, o amor das amas dos países do Sul para com os seus filhos é percepcionado por alguns empregadores como um produto natural da «cultura do terceiro-mundo», que seria muito mais rica no plano afectivo, e caracterizada por laços familiares mais calorosos, uma vida comunitária intensa e toda uma tradição de entrega maternal. Ao contratarem uma ama dos países do Sul, muitos empregadores esperam implicitamente estar a importar a «cultura indígena» de um país pobre, a fim de cobrir as falhas em matéria de cuidados e de afectos que sofre o seu próprio país rico.
Quando indagada pelas razões por que a relação das mães anglo-saxónicas com os seus filhos é tão diferente do das mulheres nas Filipinas, a directora de uma creche coloca a seguinte hipótese: «As mulheres das Filipinas crescem num meio mais descontraído e mais afectuoso. Elas não são tão ricas como nós, mas não são tão apressadas por falta de tempo, não são tão materialistas e ansiosas. Têm uma cultura mais de amor, e orientada sobre a família.» Uma mãe, advogada norte-americana, tem uma opinião similar: « Cármen adora muito simplesmente o meu filho. Ela não se inquieta se ele sabe ou não o alfabeto, ou se está numa boa escola. Ela tem prazer, muito simplesmente, em estar com ele. E, de facto, com os pais tão ansiosos e sobre-ocupados como nós, é isso que o Tomás precisa. Eu amo muito o meu filho. Mas as coisas são aquilo que são. Cármen faz-lhe mais bem do que eu.»

Uma alquimia cultural especial

As amas filipinas entrevistadas na Califórnia falam de uma outra maneira acerca do amor que elas dão às crianças que estão sob o seu encargo. Para elas, esse amor não é um produto de importação proveniente de oásis rurais; ele desenvolve-se em parte sobre os ombros da ideologia norte-americana do laço afectivo mãe-criança. E é reforçado pela profunda solidão destas mulheres assim como pela nostalgia que elas sentem dos seus próprios filhos. Se o amor é um recurso precioso, ele não provém simplesmente dos países pobres e é reimplantado nos países ricos; ele deve antes a sua existência a uma alquimia cultura especial que se produz no país de onde ele é importado.
Para Maria Gutierrez, que se ocupa de uma bebé de 8 meses de dois país intensamente envolvidos na sua vida profissional ( ela como advogada e ele como médico), é a solidão e as longas horas de trabalho que alimentam o seu amor pelo filho dos seus empregadores. «Gosto muito da Anne, mais que aos meus próprios filhos. Sim, é estranho – eu sei. Mas passo muito tempo com ela. Pagam-me. Fico só. Trabalho dez horas por dia, com um dia apenas de descanso. Não conheço ninguém aqui por perto. Esta criança dá-me então aquilo que me falta.»
Ela mesma predispõe-se a dar maior atenção à filha dos seus empregadores que aos seus rebentos. «Sou mais paciente, mais tranquila. Dou a prioridade à criança. Quanto aos meus filhos, trato-os como a minha mãe me tratou(…) A minha mãe cresceu numa família de camponeses. Tinha uma vida difícil. Não era calorosa comigo. Não me tocava nem me dizia que me amava. Ela não tinha consciência do que devia fazer. Perdeu dois bebes antes de eu nascer. Pensei que ela tinha medo de me amar quando era pequena, porque podia vir a morrer também. Mais tarde, fez-me trabalhar, ainda era eu pequena, para cuidar das minhas quatro irmãs e irmãos. Não tive tempo para brincar.»
O destino fez com que uma vizinha de idade mais avançada tomasse conta dela, a alimentasse e a tratasse quando estava doente. No fundo, é como se tivesse sido adoptada informalmente – uma prática corrente nas Filipinas, quer nos campos quer nas cidades nas décadas de 60 e 70.
De certo modo, Maria viveu uma infância pré-moderna, marcada por uma mortalidade infantil elevada, trabalho infantil e ausência de sentimentalismo, que estava inscrita numa cultura que enfatizava o envolvimento familiar e o apoio comunitário. O que recorda a situação da França do século XV, tal como nos é descrita na obra de Philippe Ariès (L’Enfant et la Vie familial sous l’Ancien Regime), em que não havia lugar à romantização da criança nem à ideologia burguesa da maternidade intensiva. O envolvimento contava muito mais que os sentimentos.

Os «cuidados maternais», a nova ordem do mundo

O envolvimento da Maria para com os seus próprios filhos, com 12 e 13 nos, quando partiu para o estrangeiro, traz a marca desse envolvimento. Qualquer que seja a sua cólera e a sua tristeza, Maria manda-lhes dinheiro e fala-lhes. O envolvimento está bem presente, mas ela ainda deve fazer um trabalho emocional para exprimir os seus sentimentos. Quando telefona para casa – conta, Maria - «eu digo à minha filha “gosto muito de ti”. Inicialmente isso soava a falso. Mas depois tornou-se natural. E agora ela responde da mesma maneira. É um pouco estranho mas eu aprendi dizer isso, desde que vim viver para os Estados Unidos.»
A história de Maria releva de um paradoxo. Por um lado, o mundo rico extrai amor do mundo pobre. Mas o que é extraído é em parte produto ou produzido aqui: os tempos livres, o dinheiro, a ideologia da relação pais-filhos, a solidão das mães emigrantes e a intensa nostalgia que sentem pelos seus filhos. No caso de Maria, a sua infância pré-moderna nas Filipinas, a ideologia pós-moderna do amor maternal e da infância que reina nos Estados Unidos, assim como a solidão do emigrante acabam por se aliar a fim de moldar o amor que ela prodigaliza à filha dos seus empregadores. Uma tal amor é também um produto da disponibilidade das amas, que estão livres dos constrangimentos temporais e da ansiedade relativa à escolarização das crianças e jovens, coisa que os pais, nos países ricos, sentem. É aí, onde não chega qualquer vestígio da protecção social, onde não se espera nenhum apoio de uma estrutura estatal, nem comunitária nem conjugal, é aí que as crianças e os pais não podem viver sem a presença da figura de uma mãe do Sul. O amor de Maria, enquanto ama dos filhos dos outros, não é atingido pelos efeitos destabilizadores do novo capitalismo norte-americano.
Se isso é verdade – que o amor maternal das mulheres do Sul é, pelo menos, um produto criado pelas condições em ele é dado – poder-se-á porventura dizer que o amor de Maria por uma criança de um país rico é extraído das crianças de um país pobre? Sim, porque a sua presença quotidiana foi roubada e com ela a expressão quotidiana do seu amor. É certo que é a própria ama que opera essa transferência. Mas se os seus próprios filhos sofrem com a sua falta, ela sofre com eles. E este sofrimento constitui o peso que ela carrega, lançado pela globalização.
Estranhamente, nos países ricos o sofrimento dos emigrantes e dos seus filhos é raramente visível pelos beneficiários. A mãe de Noa atende à relação que se estabelece entre a sua filha e Rowena. A mãe de Anne concentra-se na relação desta com Maria. Mas elas não conseguem ver mais longe.
A noção de extracção de recurso do Sul para enriquecer os países do Norte não é coisa nova. Remonta à época dos imperialismo e isso na sai forma mais literal: a extracção de ouro, de marfim e outras matérias-primas dos países pobres. Ora é esta forma de imperialismo abertamente coercitivo e androcentrado que persiste hoje, e onde as mulheres continuam a desempenhar uma função central. Hoje, quando o amor e o «care» se tornam o «novo ouro», as mulheres continuam a desempenhar um importante papel na história. Nestes dois casos referidos, quer pela morte quer pela deslocalização, são as crianças dos países pobres que arcam com o prejuízo.
Por isso, bem se pode dizer que a migração não representa uma fardo para o homem branco, mas antes pelo contrário, graças a uma série de laços invisíveis, ela é um fardo para a criança de cor.

(tradução para português do texto de Arlie Russel Hochschild, originalmente sob título de «Love and gold», editado no volume «Global Woman:Nannies, maids and sex workers in the new economy», sob a direcção de Arlie R. Hochschild e Barbara Ehrenreich)

(existe tradução francesa, com o título «Le nouvel or du monde:la mondialisation de l’amour maternel» na revista «Nouvelles Questions Féministes, vol. XXIII, nj 3, 2004 - ver o site
http://www2.unil.ch/liege/nqf/ - e que foi retomado na revista Sciences Humaines nº 161, juin 2005)


Nota: Nos Estados Unidos o «care» ( cuidados maternais) representa um sector em plena expansão, traduzindo-se em 20% de todos os empregos segundo a economista Nancy Folbre.

Numerosas mulheres emigrantes têm filhos. A idade média das mulheres emigrantes nos Estados Unidos é de 29 anos, a maior parte delas vem das Filipinas e do Sri Lanka

Os estudos de género (gender studies)



Os gender studies apareceram nos anos 70 nos Estados Unidos e transformaram profundamente o estudo das relações homens/mulheres. Hoje em dia os estudos sobre o género multiplicaram-se e revisitam o conjunto das ciências sociais e humanas.

O conceito de «Género» apareceu nos Estados Unidos durante os anos 70 em torno de uma reflexão à volta do sexo e da utilização desta variável na pesquisa nas ciências sociais. O movimento feminista, que tinha tido obtido algum impacte após a revolução sexual, procurava fazer ouvir a sua voz nas instituições de pesquisa. Tratava-se de reconhecer um empenhamento que se assumia cada vez mais como uma reflexão renovada sobre o mundo.
Foi o psicólogo Robert Stoller que popularizou em 1968 uma noção já utilizada pelos seus colegas americanos desde os anos de 1950 para compreender a separação em certos pacientes entre corpo e identidade. Daí a ideia que não existe uma real correspondência entre género ( masculino/feminino) e o sexo ( homem/mulher). Foi em 1972 que, apoiando-se na articulação entre a natureza e a cultura desenvolvida pelo antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, a socióloga Anne Oakley reenviou o sexo para o domínio biológico e o género para a dimensão cultural. Os universitários americanos recusam a aproximação frequentemente realizada entre mulheres e natureza (principalmente feita por causa das suas faculdades reprodutivas) enquanto os homens estariam do lado da cultura. Um artigo publicado em 1974 pela antropóloga Sherry Ortner teve um forte impacte ao tornar os termos particularmente explícitos: « A mulher é para o homem o que a natureza é para a cultura». Em antropologia foi Margaret Mead que se dedicou a uma primeira reflexão sobre os papéis sexuais nos anos 1930. O estudo dos papéis desempenhados pelos indivíduos segundo os sexos e os caracteres propriamente femininos e masculinos permite distinguir a aprendizagem daquilo que é dado pela natureza.

Sexo feminino = um «macho menor» !!!

Uma vez operada a distinção entre género e sexo, os investigadores voltaram-se a concentrar nas relações homem/mulher. A historiadora Joan W. Scott incitou a ver mais longe a simples oposição entre os sexos. Esta deverá ser considerada «problemática» e constituir, enquanto tal, um objecto de pesquisa. Se o masculino e feminino se opõem de modo problemático é porque existe entre eles relações de poder em que um domina sobre o outro. Mas se o género é pensado como uma construção social, tal não se verifica com o sexo, encarado como um dado natural e, mais provavelmente, como algo «impensado». Foi o historiador Thomas Laqueur que demonstrou o carácter historicamente construído do sexo e a sua articulação com o género. Na obra « A Fábrica do Sexo» (1992) ele mostra a coexistência ( e a predominância do primeiro sobre o segundo) dois sistemas biológicos. Assim, durante muito tempo, o corpo era visto como unisexo e o sexo feminino era como um «macho menor» , quando no século XIX passamos para um sistema fundado na diferença biológica dos sexos.
Logo que o sexo se tornou cultural tal como o género, a sexualidade torna-se aos olhos dos investigadores o objecto de uma nova reflexão. A influência do filósofo francês Michel Foucault ( especialmente na década de 1980 durante a qual as suas obras foram traduzidas nos Estados Unidos) foi primordial. O género foi articulado com o poder e a sua transformação em discurso foi relacionada com a análise da sexualidade e das suas normas.
O final dos anos de 1980 dá-se um início de institucionalização. Emprestado ao vocabulário psicológico e médico pela sociologia, o termo é utilizado noutras disciplinas como a história. Antes que o género se tenha transformado numa ferramenta de análise, a história das mulheres limitava-se a fazer aflorar as narrativas até então invisíveis. Só depois é que deixa a mostrar as mulheres de uma maneira essencialista, isto é, com características próprias e imutáveis tais como as qualidades emotivas, por exemplo. A análise do género reconduz as especificidades pretensamente femininas à luz de um dado momento e uma determinada sociedade. Foi assim que os estudos de género perimitram reconhecer o carácter socialmente construído dos dados históricos sobre as mulheres como dos homens. Se o género torna visível o sexo feminino, tal implica que o homem deixe de ser neutral e geral para passar a ser visto como um indivíduo sexuado.A partir daqui foi possível desenvolver-se uma história dos homens e das masculinidades, sobretudo graças à revista americana Men and Masculinities dirigida por Michael Kimmel.
As questões à volta do género, da mesma maneira que a sua variação para a sexualidade desde os meados dos anos 80, contribui para dividir as feministas em dois grupos. As mais radicais empenham-se a mostrar o carácter opressivo da hierarquia dos sexos em termos de sexualidade a favor do homem, visto na sua globalidade como um macho dominante.

Gays, lésbicas, queers

Outro grupo, como as americanas Rubin Gayle e Judith Butler, mostram que a relação entre os sexos não implica somente uma hierarquia entre os géneros mais também uma injunção normativa. Em 1984 R. Gayle alarga a reflexão teórica às sexualidades que escapam à norma como o sadomasoquismo e a pornografia. Judith Butler, em 1990, tenta lançar um olhar transversal que inclua tanto as mulheres, os gays, as lésbicas como outras minorias que não se reduzam a nenhuma das duas primeiras categorias. Para J.Butler, se o sexo é tão cultural quanto o género, este último pode ser entendido como um discurso performativo sobre o qual se podia agir a assim introduzir modificações aos habitus impostos pela sociedade. Este esquema analítico alarga-se à pesquisa sobre as minorias tais como os homossexuais, as lésbicas ou os transsexuais. Os estudos de género constituem parte inteira pois que a opressão não diz respeito somente às mulheres, nem a dominação emana unicamente dos homens mas do sistema heterossexual. Os estudos gay e lésbicos, e mais tarde a teoria queer, insistirão na análise da norma imposta ao género ou não. Assim, o caso das lésbicas pode ser analisado sob o ângulo do género, enquanto mulheres, como do da norma, enquanto desviantes. O movimento queer baseia-se na multiplicidade das identidades sexuais estabelecidas segundo as necessidades e as contingências. Da mesma maneira, o trabalho do historiador americano George Chauncey sobre a cultura gay nova-iorquina durante o período entre as guerras mundiais cruza os parâmetros do género e da sexualidade de uma forma frutuosa. Mostra como se passou de um sistema de género em que a relação homossexual assentava nas identidades homem/mulher (só o dos homens que apresentava um comportamento feminino era estigmatizado) para um sistema em que a homossexualidade é avaliada à sombra da heterossexual idade. No segundo caso ( a que corresponde ao actual período) todo o homossexual é estigmatizado sob o olhar da sua sexualidade. O historiador mostrou assim a coexistência dos dois sistemas na actual Nova Iorque em que certas comunidades de latinos continuam a funcionar segundo um binarismo de género.

O contributo francês

O conceito de género encontrou algumas dificuldades para se implantar em França, devido principalmente à desconfiança para com o feminismo americano visto como demasiado comunitarista e radical. Nos anos 1980 a universidade francesa procurou precaver-se contra o político. Pela sua passagem pelo militantismo, os estudos feministas afastaram-se do domínio da pesquisa.
As expressões «relações de sexo» ou « relações sociais de sexo» foram durante muito tempo preferidas à noção de género, encarada por fluida demais. Esse vocabulário explica-se pela abordagem feminista materialista, influenciada pela escola marxista que caracteriza a primeira geração das investigadoras nos anos 1970, por via das sociólogas Christine Delphy, Nicole-Claude Mathieu e Colette Guillaumin.
Elas acabaram por retomar o trabalho de desnaturalização iniciado pelos universitários americanos, principalmente através do questionamento do trabalho enquanto actividade natural da mulher.
C. Delphy centra a sua reflexão na opressão como construção social. Ela opõe-se a uma visão diferencialista e identitária que vê as mulheres como um grupo homogéneo com características especificamente femininas. Inverte mesmo a problemática inicial: a masculinidade e a feminilidade não explicam a hierarquia e a dominação tal como o sexo muito menos explica o género. Os grupos de homens e mulheres não se constituíram senão porque a instituição social da hierarquia ( que se estende à organização social) é o princípio primeiro, do mesmo modo que é o género o que dá sentido à característica física do sexo (que em si não contém algum sentido).
O conceito de género começou realmente a difundir-se em França nos meados dos anos 1990, quando a Comunidade Europeia se virou para as questões de género e da paridade na busca de u ma igualdade efectiva. A partir de 1993 os debates sobre a paridade alargaram os trabalhos sobre o género ao campo político. Desde 1970 que os trabalhos de Janine Mossuz-Lavau sobre a visibilidade das mulheres relativamente ao voto, às eleições e à elegibilidade representaram uma primeira abordagem das relações entre os estudos de género e o campo político. A sociologia do trabalho acabou por concluir da necessidade de se tomar em conta o sexo de modo sistemático. Neste quadro assiste-se ao longo dos anos 90 à criação de módulos específicos de pesquisa como o «Mage» (Marche du travail et genre) à volta da socióloga Margaret Maruani que, depois de se ter interessado pela divisão sexual do trabalho, analisa hoje a divisão sexual do mercado de trabalho.
Quer seja na história, na antropologia ou em qualquer das ciências sociais, o género é objecto de um crescente interesse nos meios universitários, a passo que nos Estados Unidos parece que o conceito parece ter perdido grande parte da sua força provocativa e do seu valor heurístico, não abrindo novas pistas de investigação ou não promovendo novas perspectivas sobre os temas clássicos. Os jovens investigadores franceses estão, por seu turno, mais entusiasmados, tanto mais que se encontram distantes do militantismo que entravava o reconhecimento dos seus predecessores. Nesse sentido, o seu principal desafio é dar ao género um estatuto teórico nas ciências sociais despido de ideologia.

(Tradução para português do artigo de Sandrine Teixido, publicado no hors-série nº 4 ( Septembre-Octobre 2005)da revista francesa Sciences Humaines)

Breve glossário:

Género = de origem anglo-saxónica (gender) o termo começou por ser usado nas ciências médicas, a psicologia e a sociologia, e só depois pela história das mulheres a partir dos anos 1980. Em França preferiu-se durante muito tempo empregar expressões como «sexo social» ou «diferença social dos sexos» para se referir à mesma realidade. O termo hoje já se generalizou e inscreve-se numa perspectiva construtivista e pela qual se analisam as diferenças entre homens e mulheres (desigualdades, hierarquias, dominação masculina, etc) como construções sociais e culturais, e não como resultado de diferenças naturais.


Feminismo diferencialista = ramo do movimento feminista que postula uma diferença da natureza entre o masculino e o feminino, pelo qual existiria uma «essência feminina» que decorreria dos caracteres femininos específicos e inatos ( condutas femininas, escrita feminina,…) e que justificaria as diferenças no tratamento entre os dois sexos. Apelidadas por vezes de «essencialistas» ) sobretudo pelos seus detractores) as feministas diferencialistas reivindicam a igualdade na diferença.

Feminismo Igualitarista = para as feministas igualitaristas, também conhecidas por «universalistas», todos os seres humanos são indivíduos iguais, independentemente das diferenças dos traços físicos como a cor da pele ou o sexo. As diferenças entre homens e mulheres são o resultado de relações de poder e de dominação. A subordinação da mulher é uma produção social e toda a afirmação da especificidade feminina arrisca-se a dar lugar a uma hierarquização. O sexo deve pois estar dissociado dos papéis sociais, políticos e simbólicos na sociedade.

Queer = o termo aparece nos Estados Unidos no período entre as duas grandes guerras para designar pejorativamente os homossexuais com um comportamento ostensivamente efeminado. Hoje, o termo designa uma teoria que coloca em causa toda a norma, quer ela seja de género ou de sexo. Para desmontar as identidades, os queers empenham-se a misturar todas as classificações: sexualidade hetero ou homossexual, gays, lésbicas, transsexuais, masculino-feminino,…a fim de insistir na plasticidade das relações sexo-género. A identidade não é mais uma essência mas antes uma perfomance, algo fluído, bizarro e inclassificável…

Gender studies = conjunto de estudos e pesquisas que analisa as diferenças de tratamento entre homens e mulheres em todos os domínios sociais e que gerou inúmeros estudos nas ciências sociais de carácter transdisciplinar. Posteriormente, tais trabalhos desmultiplicaram-se em outras tantas áreas de estudo como os «men’s sutides ( sobre a construção do masculino e da virilidade), os «gay and lesbian studies» ( sobre a sexualidade), e os «queer studies»


Women’s studies
= desenvolveram-se na década de 1960 nas universidades norte-americanas estreitamente ligados ao movimento feminista da época, e marcado por um acentuado feminismo «radical» que assumia um diferencialismo e que levava à separação entre os sexos.

Alguns nomes:


· Margaret Mead (1901-1978) – figura de proa do culturalismo antropológico norte-americano. Combate a noção do «eterno feminino». A partir dos seus estudos no terreno nas ilhas do Pacífico Margaret Mead defende o carácter cultural e construído das identidades de sexo, mostrando que em certas etnias a passividade e a sensibilidade são características masculinas.
· Simone de Beauvoir – publica em 1949 o livro «O Segundo Sexo» que se vai tornar na obra de referência na reflexão sobre o género. Analisa aí as modalidades sociológicas, psicológicas e económicas da hierarquia entre os sexos e mostra a universalidade da dominação dos homens sobre as mulheres, convidando as mulheres a usar da sua liberdade para escaparem ao papel de serva e mãe.
· Luce Irigaray – é a principal figura da contestação à psicanálise enquanto disciplina patriarcal, denunciando o imperialismo masculino da filosofia ocidental. Procura lançar uma nova ética nas relações sexuais.
· Michel Foucault – o filósofo francês constitui uma referência maior para os defensores da teoria queer ao mostrar o carácter construído da normatividade heterossexual e ao questionar as noções de género e sexo.
· Carol Gilligan – psicóloga diferencialista para a qual homens e mulheres tem funcionamentos psicológicos diferenciados. Interessa-se em especial pelas concepções da moral dos dois sexos: a mulher com uma «ética da solidão» (empatia, protecção e altruísmo) e o homem com uma «ética de justiça» (igualdade das pessoas, respeito do direito).
· Elisabeth Badinter – defende uma concepção igualitarista dos dois sexos. O amor maternal não teria nada de natural e instintivo. Cada sexo tem a sua dose de masculinidade e de feminilidade. As sociedades são cada vez mais andróginas. Ao mesmo tempo que se opôs a qualquer medida discriminatória para as mulheres, erigiu-se igualmente contra as tendências de vitimização de algumas feministas, reafirmando a sua completa rejeição de todo o diferencialismo.
· Joan Scott – Historiadora americana que, no encalço de Foucault e dos desconstrucionistas (conhecida pelo seu French feminism), propôs uma definição rigorosa da noção de género. Apresenta o post-estruturalismo como um instrumento para re-analisar os fenómenos históricos, sociais e culturais à luz dos discursos e das representações sobre a diferenças dos sexos.
· Judith Butler – Professora de literatura comparada em Berkeley, esta autora, juntamente com Eve Kosofsky Sedgwick, é a teorizadora do movimento queer. Opõe-se às feministas que definem as mulheres como um grupo com características comuns, o que reforçaria o modelo heterossexual e binário. Vê o género como uma variável fluida e susceptível de variar segundo o contexto e o momento. J. Butler convida a uma acção subversiva ( o chamado «gender trouble») que leve a uma confusão e à profusão de identidades. Para ela, a identidade de género pode ser reinventada sem cessar pelos próprios actores.
· Françoise Héritier – parte da constatação do carácter universal da dominação masculina, da hierarquia homem(mulher e daquilo que ela chama uma «valência diferencial dos sexos». Preconiza uma mudança para as mulheres a partir do controle destas sobre a sua fecundidade graças à contracepção.
· Pierre Bourdieu – dedicou-se a descrever em todas as obras as relações de dominação nas sociedades e a violência simbólica que daí resulta, mostrando como as mulheres integraram o «habitus» (comportamentos mais ou menos conscientes e modos de pensar) do sexo, ou seja, da sua própria dominação. A dominação masculina torna-se assim uma «construção social naturalizada» que, não obstante o movimento feminista, não se mostra pronto a desaparecer.

25.10.05

As pessoas sem sentimentos triunfam mais nos negócios


Os psicopatas funcionais, ou seja, aquelas pessoas que reprimem os seus sentimentos, são as que tomam as melhores decisões de investimento porque não experimentam emoções como o medo, segundo revela um estudo realizado por investigadores da Stanford Graduate School of Business.
O medo evita que as pessoas assumam certos riscos, mesmo os considerados lógicos. Além disso, a capacidade de controlar as emoções contribui – segundo o mesmo estudo – para um melhor desempenho dos negócios.
Muitos executivos e eminentes advogados partilham essas características, garante Antoine Bechara, professor de Neurologia da Universidade de Iowa, num comunicado publicado no site da Stanford Graduate School of Business. O estudo foi realizado pela Carnegie Mellon University e pela Universidade do Iowa.
Cada um dos participantes no estudo recebeu 20 dólares para apostar num jogo. No começo de cada partida deviam decidir se arriscavam um dólar ao lançar uma moeda ao ar e com uma vantagem de 2,50 dólares se acertassem. Ainda que pudessem negar a participar, a aposta financeira era grande uma vez que o rendimento potencial superava o risco de perda.
Os jogadores com danos cerebrais aderiam mais facilmente à aposta. Terminavam com três dólares a mais que os outros, e investiam 84% nas partidas face aos 58% dos outros, os quais deixavam que o receio e temor influenciasse as suas decisões.
Muitos dos investidores de sucesso podiam bem ser psicopatas funcionais porque não conhecem o medo ou conseguem eliminá-lo.

O estudo foi publicado na revista Psychological Science de Junho.

Veredicto do Tribunal Internacional de Opinião para Julgar a Dívida Externa

Consultar:
www.quiendebeaquien.org/castellano/eventos/tribunal/veredicto.htm

Em castelhano:

SENTENCIA

Tras la realización de las tres Vistas Preliminares de Córdoba, Salamanca y Barcelona, ayer, día 22 de octubre, se celebró en Madrid el “Tribunal Internacional de Opinión para juzgar las políticas de Deuda Externa” con la finalidad de enjuiciar la responsabilidad del gobierno español, las empresas transnacionales españolas y las instituciones financieras internacionales en relación con los daños causados por la llamada Deuda Externa en los pueblos del sur.
Esta deuda produce perjuicios desde una perspectiva estrictamente económica, empobreciendo a los pueblos; desde una perspectiva de deterioro del medio ambiente y entorno natural, cuyo daño se trasmite a las futuras generaciones; y desde una perspectiva que fractura la convivencia y la organización política, impidiendo un desarrollo democrático de los pueblos y dañando la sociedad con grave perjuicio y sufrimiento de los sectores menos favorecidos.


Sobre estos puntos versaron los debates, las exposiciones de los testigos, peritos, y los argumentos defensivos o justificativos y sobre los mismos, el Jurado ha emitido un veredicto, tras lo cual, este

TRIBUNAL INTERNACIONAL DE OPINIÓN PARA JUZGAR LA DEUDA EXTERNA

Formula, EN NOMBRE DE LOS PUEBLOS QUE SOPORTAN LA DEUDA EXTERNA y de todos los ciudadanos y ciudadanas solidarios con los mismos, esta SENTENCIA que declara probados los siguientes HECHOS:

1. Constatamos que el monto de la denominada “Deuda Externa” se ha ido acrecentando de forma vertiginosa en las últimas décadas y que supone un claro obstáculo para el desarrollo de una vida digna de los pueblos.

2. Constatamos que el pago de la Deuda Externa cobra diariamente la muerte de personas y es una de las mayores causas de la violencia estructural y de la violación sistemática de los Derechos Humanos de la mayor parte de la población mundial.

3. Constatamos que dicha deuda es ILEGITIMA ya que:
Está pagada con creces. Los interés son usureros Se concedió a gobiernos dictatoriales y corruptos sin consultar ni repercutir a sus poblaciones, ya que éstos se destinaron a proyectos improductivos, compra de armamento o se desviaron a cuentas personales en países del Norte y paraísos fiscales. Es utilizada como instrumento de saqueo permanente del Sur y como medio de presión para imponer políticas neoliberales que lo mantiene entrampado en un ciclo de dependencia y de más deuda.


4. Constatamos la existencia de una DEUDA del Norte CONTRAÍDA CON LOS PUEBLOS DEL SUR que es mucho más profunda y que abarca los valores, el desarrollo de las personas y las comunidades y que legitima los sistemas de dominación y sometimiento de los pueblos. El problema de la deuda es un problema de PODER y de injusta distribución de ese poder a escala mundial, nacional, comunitaria y muchas veces, familiar.

5. Constatamos que la deuda del Norte abarca la inmensa DEUDA HISTÓRICA, contraída tras más de quinientos años de saqueo y destrucción, avasallamiento político y cultural, esclavitud y sometimiento perpetuado hasta el presente por un sistema y ordenamiento mundial que ha institucionalizado la inequidad, el robo, la mentira y la impunidad.

6. Constatamos que los países del Norte han generado una DEUDA ECOLÓGICA la cual tiene importantes impactos sociales y medioambientales, impide la soberanía alimentaría, contamina el aire, el agua y el suelo, provoca enfermedades poniendo en peligro de forma grave la salud pública, y supone una transferencia de carga para las generaciones futuras, además de comprometer seriamente la supervivencia del planeta.

7. Constatamos asimismo una DEUDA SOCIAL por la violación sistemática de los DERECHOS HUMANOS incluyendo los derechos a la vida, al trabajo y un salario digno, la seguridad social, la educación, la salud, el acceso a los medios de subsistencia, la alimentación, agua potable, la vivienda, el derecho a no sufrir destierro, derechos al desarrollo y a la paz.

8. Constatamos la existencia de una DEUDA POLÍTICA de vasta dimensión ya que muchos países tienen usurpada sus derechos a la vida, a la soberanía y a la autodeterminación.

9. Constatamos una DEUDA CULTURAL por el trasvase de valores y perversión del lenguaje que convierte a los acreedores en supuestos deudores; el robo y el saqueo en interdependencia y globalización; la humillación y la auto-complacencia en ayuda y cooperación.

10. Constatamos que el gobierno español así como el Fondo Monetario Internacional y el Banco Mundial han participado en la comisión de actos internacionalmente ilícitos, dando apoyo a regímenes criminales, dictatoriales y autoritarios cuando están obligados por el derecho internacional a respetar y hacer respetar los derechos humanos.

11. Constatamos que el Gobierno español, así como la Unión Europea en su conjunto, pone serias trabas a la libre circulación de los trabajadores inmigrantes y viola el Convenio de Ginebra para refugiados, mientras imponen al Sur la libre circulación de capitales y mercancías, a través del FMI, la OMC, el BM y la OECD. La inmigración se produce por la causa de las desigualdades económicas entre los p aíses empobrecidos que tienen, sin embargo, que destinar gran parte de sus recursos al pago de la deuda externa. Así, se condena a buena parte de la población mundial a una situación sin salida. Ni en los países emisores de inmigrantes ni en los receptores encuentran una posibilidad para salir de las condiciones de extrema pobreza que afrontan.

12. Constatamos que el gobierno español ha aumentado la partida de los presupuestos generales del Estado destinada a los créditos FAD (Fondos de Ayuda al Desarrollo) en un 63,5% respecto al último año. Con ello, sigue utilizando mecanismos de supuesta “ayuda” que perpetúan la generación de Deuda Externa y sirven a la internacionalización de la economía española.

13. Constatamos que el gobierno español utiliza el gasto público y mecanismos públicos de apoyo a la exportación como la CESCE (Compañía Estatal de Seguros de Crédito a la Exportación) para impulsar actividades de empresas transnacionales españolas que comportan impactos ambientales, económicos y sociales muy negativos en los países destinatarios de la Inversión Extranjera Directa española. Así mismo constatamos la total pasividad e indiferencia del gobierno español ante casos de denuncias por la violación de los derechos humanos y procesos judiciales contra empresas transnacionales españolas tales como Repsol-YPF, Endesa, Union Fenosa, Iberdrola, Gas Natural, BBVA, Grupo Santander, La Caixa, Aguas de Barcelona, Abengoa, FCC, ACS-Dragados, etc.

14. Constatamos que de llevarse a cabo la cancelación de la Deuda Externa del gobierno español al ritmo establecido actualmente, el 4%, necesitaríamos 25 años para alcanzar la cancelación total.

Estos hechos expuestos en el Tribunal Internacional de Opinión para juzgar la Deuda Externa, constituyen una violación grave del Derecho Internacional y sus normas y cuerpos legales, tales como la Declaración Universal de los Derechos Humanos, el Convenio 169 de la Organización Internacional de Trabajo (OIT) sobre los pueblos indígenas y originarios, el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales, el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos, el Derecho a la Autodeterminación de los Pueblos, así como de leyes y normas de carácter nacional e internacional, tales como el Convenio sobre Biodiversidad o el Protocolo de Kioto.

Por ello se condena al Gobierno español, a las instituciones financieras y comerciales internacionales así como a las empresas transnacionales españolas a:

1. Reconocer política y jurídicamente que las mujeres y hombres de los países del Sur son sujetos de derecho. Se debe garantizar satisfactoriamente los derechos de todas las víctimas de la globalización capitalista a la verdad, la justicia y la reparación integral.

2. Ejecutar las políticas necesarias para abolir la deuda externa. Prohibir cualquier política económica que tenga repercusiones negativas sobre otros países, y que ponga en peligro la vida de los ciudadanos o impida la satisfacción de sus necesidades básicas (soberanía alimentaría, educación, salud, vivienda digna, agua potable, soberanía cultural, etc.).

3. Instalar una moratoria, sin acumulación de intereses, en el cobro de la deuda de los 82 países del estado español con el fin de realizar Auditorias Públicas Integrales y participativas para determinar la ilegitimidad de la deuda exigida.

4. Abolir de forma inmediata e incondicional todas las deudas impagables e ilegítimas. Establecer un calendario de compromisos para adoptar un proceso que muestre la verdad y las responsabilidades políticas y judiciales de aquellas personas y/o instituciones que permitieron, fomentaron e hicieron uso de los créditos ilegítimos. Restituir los daños causados e indemnizar a las víctimas.

5. Reconocer la deuda ecológica adquirida con los países empobrecidos - lo que implica pedir públicamente perdón por los daños y perjuicios causados -, establecer mecanismos para su restitución y aplicar políticas que eviten su generación.
La prohibición de inversiones públicas y privadas en proyectos que no cumplan los estándares ambientales, laborales y sociales. La derogación de todas aquellas políticas que fomentan un modelo de producción, transporte y consumo, dependientes de la importación de energías no renovables o la utilización de espacios ambientales fuera de nuestro territorio.
La cancelación de todos los mecanismos de flexibilidad que permitan incumplir los compromisos adquiridos de reducción de emisiones de gases de efecto invernadero.


6. Establecer, en los ámbitos que proceda, reparaciones y responsabilidades judiciales, civiles o penales, por la generación de deudas ecológicas, sociales y políticas.
La creación de un fondo de compensación por los daños producidos a causa de la deuda ecológica adquirida por el gobierno español, sus instituciones públicas y las empresas privadas.


7. La eliminación de los créditos FAD (Fondo de Ayuda al Desarrollo) como instrumento de Ayuda Oficial al Desarrollo (AOD), el cierre de la CESCE (Compañía Española de Seguros de Crédito a la Exportación) y el cese inmediato de sus actividades, así como la no contabilización de la cancelación de la deuda como AOD.

8. La no utilización de los mecanismos públicos para generar nueva Deuda Externa o de apoyo a la exportación para impulsar actividades de empresas transnacionales españolas.

9. Ejecutar políticas efectivas para la prohibición del comercio armamentístico, así como la reducción radical del gasto público militar. Además del no apoyo a leyes que fomentan la impunidad y las violaciones de los derechos humanos.

10. La incorporación de los puntos expuestos anteriormente en la Ley reguladora del tratamiento de la deuda externa, actualmente en tramite en el Parlamento español, así como en los Presupuestos Generales del Estado.

11. Promover en el ámbito internacional el no reconocimiento tanto de la deuda externa multilateral como de la privada, y proceder al desmantelamiento de las instituciones internacionales, tales como el Banco Mundial, el Fondo Monetario Internacional y la Organización Mundial de Comercio.

12. Replantear completamente el concepto de deuda externa para que los países mal llamados deudores sean considerados acreedores y los países generadores de Deuda Ecológica, Social y Política, como el Estado español, sean considerados deudores.

13. Garantizar el derecho a la información y el derecho a informar de los ciudadanos mediante legislaciones que pongan fin a la concentración de medios y favorezcan a la prensa sin animo de lucro.

14. Encaminar todas las políticas públicas y privadas hacia una profunda transformación del sistema económico capitalista.

Ordenamos a todas las autoridades y funcionarios que cumplan y hagan cumplir la presente sentencia contra la que no cabe recurso alguno.

Y así lo declaramos y firmamos en Madrid, a 22 de octubre de 2005.

Firmado, los jueces:

Juana Calfunao (Lonko de la Comunidad Mapuche Juan Paillalef, Comisión Ética contra la Impunidad, Red de Defensores Comunitarios, Chile),
Itziar Ruiz Jiménez (Profesora de Relaciones Internacionales de la Universidad Autónoma de Madrid),
Carlos Berzosa (Rector de la Universidad Complutense de Madrid).
Félix Pantoja (Vocal del Consejo General del Poder Judicial).



El Jurado Popular ha fallo de forma unánime que los acusados son culpables de todos los delitos imputados y acusaciones realizadas por la campaña ¿Quién debe a quién?. Este jurado estuve compuesto por Rosa Regás (Directora de la Biblioteca Nacional), Carlos Taibo (Profesor de Ciencia Política en la UAM), Javier Ortiz (Periodista), César Carrillo (Expresidente del sindcato USO de Colombia, exiliado), Eunice Khanyssa Mabyeka (Jurista, Miembro de la Asociación de Estudios Africanos y Panafricanismo), Chini Rueda (Teóloga, Miembro de Católicas por el Derecho a Decidir y del colectivo Somos Iglesia), Gemma Tarafa (Activista contra la Deuda Externa, Observatorio de l a Deuda en la Globalización), Jorge Fonseca (Profesor de economía de la UCM) y Begoña Lalana Alonso (Abogada, miembro de la junta de la Asociación Libre de Abogados).

Guia do ceifeiro voluntário de OGMs ( ou transgénicos)


O guia indispensável para qualquer ceifeiro voluntário de OGMs já circula na net. Ele reúne uma série de truques e cuidados a ter para as acções de descontaminação dos campos semeados de OGMs.

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http://www.geneticsaction.org.uk)

17.10.05

Conferência de Imprensa ( texto de Harold Pinter)


Excertos da peça/sketch de Harold Pinter, Prémio Nobel da literatura de 2005 com o título original «Press Conference» e que, com a tradução de Pedro Marques, faz parte do volume «Conferências de Imprensa e Outras Aldrabices, editado em conjunto pelos Artistas Unidos e Livros Cotovia, na colecção «Livrinhos de Teatro», por altura da representação do espectáculo homónimo, estreado em Junho de 2005, e encenado por Jorge Silva Melo


CONFERÊNCIA DE IMPRENSA (excertos)

Imprensa – Senhor ministro, antes de ser Ministro da Cultura creio que o senhor foi chefe da Polícia Secreta.

Ministro – Correcto.

Imprensa – Vê alguma contradição entre estes dois papéis?

Ministro – Absolutamente nenhuma. Como chefe da Polícia Secreta tinha a responsabilidade, especificamente, de proteger e garantir a nossa herança cultural de forças cuja intenção é subvertê-la. Defendíamo-nos do verme. E ainda nos defendemos.

Imprensa – O verme?

Ministro – O verme

….

Imprensa - Qual era a natureza da cultura por si proposta?

Ministro – Uma cultura baseada no respeito e nas regras da lei.

Imprensa – Como é que vê o seu actual papel de Ministro da Cultura?

Ministro – o Ministro da Cultura apoia-se nos mesmos princípios que os guardiães da Segurança Nacional. Acreditamos numa compreensão saudável, musculada e terna da nossa herança cultural e das nossas obrigações culturais. Estas obrigações incluem naturalmente a lealdade ao mercado livre.

…..

Imprensa – E a divergência crítica?

Ministro – A divergência crítica é aceitável – se for deixada em casa. O meu conselho é o seguinte – deixem-na em casa. Guardem-na debaixo da cama. Ao lado do penico do mijo.
(Ele ri-se)
É lá que é o lugar dela.

….

Imprensa – Então vê o seu papel como Ministro da Cultura como vital e frutuoso?

Ministro – Imensamente frutuoso. Acreditamos na bondade inata do vosso Manel vulgar e da vossa Maria. É isto que procuramos proteger. Procuramos proteger a bondade essencial do vosso Manel vulgar e da vossa Maria vulgar. Vemos isso como uma obrigação moral. Estamos determinados a protegê-los da corrupção e da subversão com todos os meios que temos à nossa disposição.

(…)

16.10.05

Hoje é o Dia Mundial Anti Mc Donalds



Para informações sobre os problemas que a McDonald's pode causar, ver:

Harold Pinter, nobel anti-imperialista


«Os crimes dos Estados Unidos por todo o mundo têm sido sistemáticos, constantes, clínicos, desumanos e muito bem documentados, mas ninguém fala deles.»

«O facto é que o Sr. Bush e o seu gang sabem o que estão a fazer e Blair, a não ser que seja o idiota iludido que frequentemente parece ser, também sabe o que eles estão a fazer. Bush e companhia estão determinados, muito simplesmente, a controlar o mundo e os recursos do mundo. E estão-se nas tintas para o número de pessoas que matam pelo caminho.»

Declarações de Harold Pinter, prémio Nobel da Literatura de 2005

Mais de 2000 menores estão condenados a prisão perpétua nos Estados Unidos


Um relatório da Human Rights Watch (HRW) e da Amnistia Internacional revela que, pelo menos, 2.225 pessoas estão actualmente a cumprir prisão perpétua nas prisões dos Estados Unidos por delitos que cometera, quando ainda eram menores.
16 % dessas 2.225 pessoas tinham entre 13 e 15 anos quando cometeram o delito.
O título do estudo é: «O resto das suas vidas: prisão perpétua para crianças delinquentes nos Estados Unidos».

Preparação para um Dia Internacional contra as OGMs na Primavera de 2006

Consultar:
http://altercampagne.free.fr/


Realizar-se-á na Primavera do próximo ano (isto é, em 2006) uma iniciativa à escala internacional com o objectivo de informar a população e fazer frente comum aos OGMs, vulgo, transgénicos, produzidos a céu aberto e cujo destino é a alimentação. O dia ainda por marcar deverá recair num fim de semana entre os meses de Abril e Junho de 2006.

As pessoas e organizações que já mostraram interesse e aderiram à inciativa são as abaixo-indicadas. Estão também abertas as adesões para outras parcerias por todos os países, quer a nível individual quer de organizações.

Adesões:
Vandana Shiva (India),
Liliane Spendeler (Spain),
Tamara Dabie (Croatia),
Annick Ferauge (Belgium),
Astrid Konrad (Austria),
Badrul Alam (Bangladesh),
Gerald Miles (Wales),
Juan-Roy de Menditte (France),
Frederick Ablam Kouwo (Togo),
Bare Chamsdine (Afrique),
Arca Atay (Turkey),
Antonio Onorati (Italia),
Vincent Perrot (France),
Victor Nzuzi (Congo),
Marco Presutto (Italia),
Setsuko Yasuda (Japon),
Kenneth Richter (UK),
Arnaud Apoteker (France),
Ignacio Chapela (USA-California),
Brian Tokar (USA-Vermont),
Michel Dupont (France),
Wytze de Lange (Netherlands),
Jadwiga Lopata (Poland),
Arpad Pusztai (Hungary),
Guy Kastler (France).

Que são representantes das seguintes organizações ou colectivos:

Navdanya,
Friends of the Earth,
Makronova Institute,
Bangladesh Krishok Federation,
Collectif d’Action GénEthique,
GM Free Cymru,
Attac,
Consumers International,
Crocevia,
"No to GMOsPlatform",
Vision21,
Greenpeace,
Confédération Paysanne,
Fédération Nationale d’Agriculture Biologique,
Institute for Social Ecology,
XminY Solidarityfunds,
International Coalition to Protect the Polish Countryside,
Nature & Progrès.

Estudo prova-o: aquecimento global favorece furacões


Cientistas de uma universidade norte-americana encontraram novas provas da relação entre o aquecimento global, o aumento dos gases com efeito de estufa e os fenómenos metereológicos extremos registados nos últimos tempos.
Num artigo publicado pela revista Science, investigadores do Centro de Ciências Marinhas da Universidade da Califórnia afirmam que novas provas sugerem que existe uma ligação entre o aumento do dióxido de carbono (CO2) na atmsofera e o aquecimento global que causou fenómenos como os furacões Katrina e Rita – que em finais de Agosto e Setembro se abateram sobre a América Central e do México, causando centenas de mortes e enormes prejuízos.
«A relação entre o clima tropical e os gases com efeito de estufa é particularmente crucial porque as regiões tropicais recebem a maior proporção de luz solar, que actua como aquecedor do resto da Terra», explicou David Lea, um dos autores da investigação.
Segundo o estudo, a energia e a intensidade dos furacões têm relação esteita com a maior temperatura dos oceanos, que tem aumentado, em média, um grau centígrado por ano.

Fonte: JN

15.10.05

Estamos no bom caminho quando o Pimenta Negra incomoda os agentes do poder


A desmontagem dos esquemas com que o poder se serve para se reproduzir é, e deve ser, um dos objectivos de quem luta pela emancipação social e cultural do ser humano das teias com quem o oprimem.
Esse caminho de desocultamento não é fácil nem tarefa de dias. Exige lucidez, perseverança e clarividência para a sua realização, uma vez que a força da inércia , da ignorância e ingenuidade não são infelizmente coisa rara por estas paragens, como ainda é frequente a intoxicação psicológica produzida pelas estruturas e agentes dos interesses instalados toldar a vista e a inteligência de quem se esforça para a dignificação dos explorados e oprimidos.
Claro está que tudo isto não é novidade. Os estratagemas com que o poder se socorre são já antigos ( fala-se até da «segunda mais velha profissão do mundo»…), mas já o que é surpreendente é a inexperiência e ingenuidade de que dão mostram alguns espíritos, e que preferem continuar a assobiar para o lado.
Tudo isto vem a propósito da autêntica barragem de atoardas que o responsável deste website tem sido objecto desde que colocou o post sobre o novo director do SIS ( ver infra), dando mesmo a ideia que terá tocado numa «vaca sagrada» para certos círculos, mais que minados por uma rede de influências bem direccionada. O vespeiro que veio ao de cima só reforça a ideia que estamos no bom caminho na luta pela transparência e tratamento analítico dos mecanismos do poder sacralizado, qualquer que ele seja. De resto, não são mais que dois, os elementos a quem deve ser assacada mais que previsivelmente a autoria desta campanha de ataques pessoais, devidamente acolitados pelo coro de ingénuos de sempre.
Os famigerados pára-quedistas apareceram pouco tempo depois das manifestações no Porto realizadas a propósito da cimeira da OCSE há uns três atrás. O seu repentino aparecimento, ainda para mais num contexto cibernético, a oferecerem os seus préstimos técnicos despertaram desde logo a maior curiosidade, que veio a aumentar à medida que se interessavam por aspectos que só uma consciencialização teórica ou então uma prática radical poderiam suscitar interesse. O que não era obviamente o caso. De seguida, adoptaram o procedimento típico em situações similares que é o da colagem ao líder informal e a respectiva veneração. A falta crónica de jeito, a inconsistência e a leviandade que deram mostras revelaram à saciedade que não passavam de seres alienígenas num planeta que lhes era completamente estrangeiro. A sucessão de erros e incoerências fez o resto.
Assombrações como estes não são anormais, dadas as lógicas subjacentes ao mundo capitalista contemporâneo. Infelizmente temos que conviver com tais epifenómenos. O que não impede que estejamos atentos em relação a eles, e saibamos fazer a sua descodificação.
Este weblog, e o seu autor, nunca deixarão de lutar pela transparência e pela justiça social. Até podemos entender que os aparelhos estatais (ainda que questionemos a sua génese) tenham na sua lógica interna um princípio de defesa e prevenção contra riscos externos (o mesmo se passando com qualquer organização formal ou informal), mas já somos frontalmente contra o Estado de Excepção que nos querem impor.
Assim como nos mostramos claramente contra o cerceamento de direitos e liberdades e a domesticação do combate pela justiça e pela liberdade dos injustiçados.
Desgraçadamente, como se não fossem já suficientes os obstáculos com que se vão defrontando, os vários movimento sociais (sindicalista, ecologista, libertário, etc) ainda têm que se desembaraçar dos entraves colocados artificialmente no seu caminho.
Sem esquecer a ligeireza de uns quantos que, interpelando retoricamente o poder estatal, ainda acreditam na imaculada Virgem Maria.


Contacto:
PimentaNegra@hotmal.com

13.10.05

Harold Pinter ganha Nobel de Literatura de 2005


O dramaturgo britânico Harold Pinter é o Nobel de Literatura deste ano.
Pinter, que completou 75 anos recentemente, é autor de mais de 30 peças, e é considerado como o maior dramaturgo britânico vivo. Além das peças, Pinter também escreve poemas e prosa.
Morador de Londres e filho de uma costureira judia, Pinter também é conhecido pela sua participação em campanhas pela defesa dos direitos humanos.
Foi um crítico ferrenho das políticas públicas da ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher e do ex-presidente dos EUA Ronald Reagan.

Famoso por seu estilo livre, cheio de silêncios, o seu nome deu origem ao termo "Pinteresque" (Pinteresco).

Em entrevista à BBC em Fevereiro deste ano, Pinter disse que havia desistido de escrever peças de teatro e que se concentraria noutras formas de literatura, principalmente a poesia.
"As minhas energias estão indo em direcções diferentes, certamente para a poesia", disse. "Mas, também nos últimos anos eu fiz vários discursos políticos em vários lugares e cerimónias."
"Estou a usar muita energia, mais especificamente em situações políticas que, eu acho, são muito preocupantes do jeito que as coisas estão."

Em 2003, Pinter publicou um livro de poesia antiguerra, intitulado War (Guerra, em tradução livre). O livro, que critica a guerra no Iraque, recebeu o prémio Wilfred Owen, que leva esse nome em homenagem ao poeta que morreu na Primeira Guerra Mundial.
A peça mais recente de Pinter foi Remembrance of Things Past (Memória de Coisas Passadas, em tradução livre), publicada em 2000.

O Ecologismo dos pobres


Por Joan Martínez Alier ( autor do livro «El ecologismo de los pobres. Conflictos ambientales y lenguajes de valoracion», professsor catedrático do Dpto de Economia e História Económica da Universitat Autónoma de Barcelona e presidente da International Society of Ecological Economics)

A brutal e crescente exploração dos recursos naturais provocado pelo nosso modelo económico não só dá origem a um longa lista de problemas ambientais, como gera cada vez mais numerosos e gravíssimos sociais.

O livro « El Ecologismo de los pobres» adopta o ponto de vista da economia ecológica, ou seja, a perspectiva do metabolismo social. Quer isto dizer que devemos ver a economia como um sistema aberto à entrada cada vez maior de energia e materiais, e à saída de resíduos como o dióxido de carbono e outras formas de contaminação.
Regista-se a um aumento da dimensão física da economia. Não nos estamos a desmaterializar. Pelo contrário, a economia humana vai aumentando relativamente quer a espaços quer a recursos físicos. Por isso aumentam também os conflitos ecológico-ambientais. Ou seja, não só estamos a prejudicar as gerações futuras e a eliminar outras espécies que, às vezes, nem as conhecíamos, como se registam crescentes conflitos ambientais aqui e agira.
Constatamos, desde logo, que tem havido um deslocamento dos custos ambientais do Norte para o Sul. Os Estados Unidos importam mais que a metade do petróleo que gastam. Europa e Japão dependem fisicamente cada vez mais das importações. Ao fazermos os cálculos dos fluxos dos materiais observamos que a América Latina está a exportar seis vezes mais toneladas do que importa ( minerais, petróleo, carvão, soja…), enquanto a União Europeia funciona ao contrário: importamos quatro vezes mais toneladas do que exportamos. Isto leva à conclusão de que existe um comércio ecológico desigual.
A mesma desigualdade se verifica nas emissões de dióxido de carbono, causa principal da mudança climática. Um cidadão dos Estados Unidos emite 15 vezes mais que a média de um cidadão da Índia. No livro atrás referido pergunta-se: quem é que tem títulos sobre os aterros de carbono que os oceanos passaram a ser, sobre a nova vegetação e os solos? Quem é que é dono da atmosfera para nela depositar o dióxido de carbono? Sabe-se que o protocolo de Kioto é melhor que a política de Bush mas que não resolve esse enorme conflito ecológico-distributivo. Daí a reivindicação da dívida ecológica que o Norte tem para com o Sul pelo comércio ecologicamente desigual, pela mudança climática, pela biopirataria e pela exportação de resíduos tóxicos. A Dívida Ecológica pode ser expressa em dinheiro mas há aspectos morais que não são abrangidos por uma avaliação monetária.

Ecologismo Popular

Ainda que o peso da economia cresça e apesar de haver crescentes conflitos não há que ser pessimista. Há muitas experiências de resistência popular e indígena contra o avanço das actividades extractivas das empresas multinacionais. Estas resistências parecem ir contra o curso da história contemporânea, que é o constante triunfo do capitalismo e a expulsão de gente pobre. No entanto, as comunidades defendem-se. Muitas vezes, as mulheres estão á frente das lutas. No livro referem-se muitos casos de defesa dos manglares, como na costa equatoriana, onde os manglares desapareceram para dar lugar a camaroneiras e as populações que ali viviam, na apanha de conchas, foram pouco a pouco deslocadas. Os consumidores de camarões não sabem nem querem saber de onde vêm aquilo que comem. Mas os protestos locais contra as indústrias camaroneiras têm provocado centenas de mortes nos últimos anos por todo o mundo.
O mesmo se passa na indústria mineira. As comunidades defendem-se apelando para os direitos territoriais indígenas ao abrigo do convénio 169 da OIT, como hoje é feito na Guatemala, ou através de referendos organizados com pleno êxito em Tambogrande (Peru), em Esquel ( Argentina) contra as minas de ouro. Em países como a Indonésia e a índia as comunidades indígenas recorrem a acções e processos legais. Assistimos em muitos lugares do mundo ao surgimento de reclamações contra empresas ao abrigo da ATCA dos estados Unidos ( Alien Tort Claims Act, uma lei de 1789 que permite reclamar pelos procedimentos fraudulentos a agravos contra estrangeiros por parte das empresas norte-americanas), em geral, sem sucesso. Na Amazónia há comunidades que resistem contra as empresas petrolíferas como Texaco, Repsol e tantas outras.
O norte consome tanto, os ricos do mundo consomem tanto que os limites para a extracção de mercadorias e matérias-primas estão a esgotar-se. Por exemplo, a fronteira do petróleo já chegou ao Alaska e à Amazónia. Mas há resistência em todos os lugares. São conhecidas por ser o ecologismo popular ou Movimento de Justiça Ambiental.
Conhecem-se ainda casos históricos de resistência ainda antes do aparecimento do ecologismo. Assim na mina de cobre em Ashio no Japão há cem anos, ou em Huelva contra a contaminação causada pela empresa Rio Tinto, que culminou com uma enorme carnificina pelo Regiment de Pavia no dia 4 de Fevereiro de 1888. Um dia que bem poderia ser declarado do Ecologismo Popular.

Os passivos ambientais

A economia ecológica é uma crítica da economia convencional porque esta crê que o crescimento económico se pode dar indefinidamente, esquecendo-se, nas contas das empresas e dos governos, da natureza. Na contabilidade de ambos não se incluem os passivos ambientais.
A economia ecológica critica a maneira como se constrói a ciência económica e a sua contabilidade. O que propõe é que se devem considerar os aspectos biológicos, físicos, da química, e sociais. Ou seja, se a economia cresceu 3%, tudo bem, desde que se explique o que foi contaminado, o que aconteceu aos rios, aos bosques, à saúde das crianças, e todos os aspectos sociais e ecológicos. Isto não é apenas uma ideia académica. Despoletam protestos sociais quando a economia massacra a natureza. Por vezes, os afectados são as futuras gerações que não podem protestar porque ainda não nasceram, ou então, uma baleia que muito menos pode protestar. Mas outras vezes os desastres ecológicos afectam as pessoas no presente, que não deixam de protestar. Essas são as lutas pela justiça ambiental.
Há sítios onde se plantaram milhares de hectares de pinheiros a fim de capturar o dióxido de carbono europeu, como no projecto FACE no Equador, onde algumas comunidades começam a protestar, pois não comem pinheiros, nem nesses terrenos podem semear ou criar gado. O pinheiro absorve a água e caso haja incêndios o contrato obriga à sua replantação. Há também conflitos pesqueiros porque a pesca industrial acaba com a pesca artesanal. E não faltam conflitos nos transportes como é caso, por exemplo, do gasoduto de Unocal da Birmânia à Tailândia, ou das hidrovias, com o caso conhecido do Prestige. Casos actuais são os protestos na Catalunha contra a quarta cintura urbana ou por causa do túnel de Bracons.
Há quem não perceba o carácter estrutural destes protestos, quando no Sul nascem as commodity frontiers, os novos locais de extracção e de contaminação. Alguns crêem que se trata de protesto tipo «não no meu pátio» quando, na realidade, são manifestações do movimento internacional pela justiça ambiental. Há mesmo quem pensa que o ecologismo é um luxo dos ricos, e que só nos preocupamos com a natureza quando temos tudo em casa. A ideia do ecologismo popular recorda-nos que há pessoas a protestar porque o que está em causa é a própria sobrevivência.
Surgem também redes deste tipo de protestos. Por exemplo, a rede Oilwatch, nascida em 1995, nas experiências na Nigéria e no Equador. Redes onde se pede ajuda aos países do Norte, uma vez que as empresas são do Norte. Outra rede similar é a Sul-Sul, chamada «Mines, Minerals & People». È nos protestos e nas resistências que nascem as resistências. Estas não advém da cabeça de qualquer intelectual, nem muito menos de qualquer partido política que diga qual é a linha correcta.

Valores incomensuráveis

Na ecologia há diversas correntes. Há quem se diga radical, por exemplo, nos Estados Unidos, mas que não o é no plano social. Trata-se de uma corrente que se preocupa só com a natureza e não tanto com as pessoas. Lutavam, por exemplo, contra barragens em paisagens naturais a preservar que iriam ser assim destruídas. Lutam pela natureza, não pelas pessoas.
Em contraste, no Brasil há um movimento popular que se chama «atingidos pelas barragens». Na índia há uma intensa luta contra uma famosa barragem no rio Narmada, onde as pessoas protestam em defesa do rio mas também em defesa das pessoas. Porque se se vier a ser construída cerca de 40 ou 50.000 pessoas terão que ser deslocadas. Figura destacada é Medha Patkar que não pensa só na natureza, mas nas pessoas pobres que serão atingidas. São grupos indígenas que carecem daquele território para viver, porque sem ele morrerão de fome. Há ecologistas que só pensam na natureza, mas também há ecologistas que entendem que não se pode separar a natureza da sociedade.
Em todos estes conflitos, seja por causa da extracção ou do transporte de matérias primas, seja por causa de contaminações locais e regionais, desenvolvem-se várias linguagens. Assim podem ser que os poderes públicos e as empresas queiram impor uma linguagem económica, dizendo que se fará uma análise ampliada dos custos-benefícios, com todas as externalidades expressas em dinheiro, sem deixar de se realizar uma avaliação do respectivo impacte ambiental a fim de ver se se vai construir ou não uma barragem ou uma mina. Mas pode acontecer que os afectados, ainda que entendam essa linguagem económica, e ainda que possam receber alguma compensação financeira, desenvolvam uma linguagem existente nas suas culturas. Podem declarar, como o fizeram os U’Wa na Colômbia perante a Occidental Petroleum e depois à Repsol, que a terra e o subsolo eram sagrados e que «a cultura própria não tem preço»
Num conflito ambiental estão envolvidos valores muito distintos, ecológicos, culturais, de subsistência das populações, e também valores económicos. São valores que se expressam em diferentes escalas e não são comensuráveis. Como disse Machado: «todo o néscio/ confunde valor e preço».
Quem tem o poder de impor o método de resolução dos conflitos ambientais? As consultas populares, que apelam à democracia local, serão um método válido? Quanto vale a linguagem do sagrado? Valem os valores ecológicos se forem traduzidos em dinheiros, ou valem por si mesmos, nas suas próprias unidades de biomassa e biodiversidade? São questões que resultam da participação reflexiva nos conflitos ambientais em diversos locais do mundo. Daí a pergunta final: quem tem poder de simplificar a complexidade impondo uma determinada linguagem de valor?
O livro « El Ecologismo de los pobres» é um livro de Economia Ecológica., a qual explica o conflito entre economia e meio ambiente e questiona a solução que normalmente é dada para esse conflito através da «modernização ecológica» ou do «desenvolvimento sustentável». Por sua vez, a Ecologia Política estuda os conflitos ambientais e mostra que nesses conflitos, diferentes actores usam ou podem usar diferentes linguagens de valoração. Vemos assim como existem valores incomensuráveis e como o reducionismo económico é um mero exercício de poder.


Texto de Joan Martínez Alier publicado no nº45 de Outono de 2005 da revista em castelhano «Ecologista», editada pelos Ecologistas en Acción