14.7.05

Bruno Latour: é preciso repensar a ecologia política

Entrevista a Bruno Latour

Para você tem sentido distinguir a ecologia científica e ecologia política?

Bruno Latour – Se por ecologia política se entender as associações de defesa da natureza e os partidos chamados «verdes», a resposta é evidentemente sim. Há uma enorme diferença entre os especialistas das terras amazónicas, os modelizadores californianos do clima e os amadores da pesca como as militantes da associação francesa Eaux et rivières. Agora se considerarmos que os temas estudados – terras, climas, poluição, recursos de peixes – são comuns, a diferença já não é tão necessária, uma vez que é evidente que todos debates e problemáticas carecem de todas as formas de ecologia que acabam por se ligar. No meu entender, o que é necessário é redefinir os termos «ecologia», «política» e «científico».

No seu livro «Políticas da Natureza» propõe reconsiderar a questão da ecologia política porque julga que ela tem sido mal colocada. De forma algo provocadora, você parece que defende que ela não tem propriamente como objectivo a defesa da natureza. Porquê? O que é que então ela pretende?

Bruno Latour – Não, não é uma provocação, mas uma evidência : a natureza não é um ser que se encontraria no mundo – ou antes, na qual nós, os humanos, teríamos de nos inserir. A natureza ( toda a história das ciências, das mentalidades e todas a antropologia nos mostra isso) é um modo histórico de pensarmos as nossas relações com os objectos e relações políticas entre nós. Como Philippe Descola mostra num livro que será ditado no próximo Outono, «La Nature des cultures», a maior parte das civilizações não conhecem ou não têm necessidade da noção de natureza. Esta noção só emerge no século XVII como um meio de definir a matéria, as leis do universo e um certo vazamento das actividades políticas. Tal corresponde esquematicamente ao empirismo dos filósofos como John Locke. Esta definição da natureza supõe que existiria, para além da vida política, uma espécie de tribunal de apelo para o qual se poderia apelar para arbitrar os conflitos intermináveis entre os humanos. Isso é muito perigoso pois confere-se aos factos estabelecidos pelas ciências exactas o poder de curto-circuitar a vedação necessária à vida pública. A natureza Seia um meio de curto-circuitar a política. Quando a ecologia política se começa a formar durante o século passado da natureza , ela reutiliza esta definição ( que é preciso «salvar», em vez de a «dominar») sem repensar ou sem se aperceber que ela foi feita, desde o início, para tornar mais difícil a abordagem das controvérsias que os humanos mantêm entre si a propósito das coisas que lhes dizem respeito. É este reemprego, este erro de casting se se pode dizer, que eu chamo, citando Karl Marx, a «doença infantil da ecologia». Nenhuma provocação, portanto. O que é surpreendente, pelo contrário, é ver como os partidos verdes se definem relativamente a certo tipo de objectos – os antigos seres que pertencem à natureza modernizadora: os campos, as vacas, os pássaros, etc – quando eles têm o meio mais poderoso para modificar todas as relações entre humanos e não-humanos, mas com uma outra definição das ciências ( sociais, em especial a economia, mas também as ciências «naturais») e da política. Ecologizar as práticas, como diz Isabelle Stengers, nada tem a ver com o «ocupar-se das coisas da natureza» ou o de «salvar a terra mãe». É toda uma renovação tão profunda da vida pública, tal como foi o marxismo no seu tempo.

Porque é que a ecologia política nos conduz a repensar a elação da democracia com as ciências?

Bruno Latour – É preciso distinguir a prática das ciências – instrumentos, laboratórios, experiências, colecções – e o uso político de uma certa teoria de conhecimento produzida pelos empiristas e seus seguidores. Enquanto prática, as ciências têm uma «ecologia» muito complexa que se começa a conhecer melhor. Nada disso tem a ver com o uso que lhe foi dado quando se começou a dizer: «A democracia é para os humanos, mas os factos, os objectos, as coisas são para as ciências».Esta distribuição de poderes –porque se trata de poderes de repartição de tarefas – torna muito difícil o exercício da democracia. Torna-se pois difícil cortar o cordão entre a prática das ciências e a filosofia do conhecimento que, de algum modo, as raptou para suspender o trabalho do que designo por «composição» política.

Rejeitando a clivagem entre a esfera política e a esfera científica, voc~e opõe-se ao cientismo e à polícia dos experts. Qual deve ser então o papel dos cientistas nas decisões políticas?

Bruno Latour - Os experts ( especialistas) não são investigadores. O expert é um ser híbrido, monstruoso, encarregado de fazer simultaneamente a pesquisa, mas sem a dura escola da controvérsia sábia, assim de explorar consensos, sem no entanto passar ela dura escola da composição política. Tornamo-los muito infelizes ao mergulhá-los numa espécie de injunção paradoxal. Creio que seria preferível retirar-lhes a função de expert e modificar completamente a repartição de poderes ( é preciso não esquecer que se trata de poderes). A minha solução consiste em fazer colaborar para 4 tarefas diferentes quer os sábios e os políticos, quer os militantes e eleitos ( a que acrescentaria os artistas e os juristas): essas 4 tarefas são as da perplexidade, consulta, hierarquia e instituição. Não há aí nada de extravagante. Se repararmos nós somos no nosso apartamento simultaneamente bombeiros, electricistas e pintores trabalhando tudo dentro da mesma casa. Ora é exactamente isso que se passa com a ecologia. Seria errado dizer aos bombeiros para tratare, de uma casa, e aos pintores de outra. Não teria sentido. Não há investigadores sobre factos, e políticos sobre valores. Se repararmos nas terras, nos peixes, nos climas, nos rios, todos eles são objectos comuns que se nos atravessam, e devemos aplicar as diversas competências destes colectivos ( os militantes não têm as mesmas competências que os especialistas de ecotoxicologia, nem as dos eleitos têm as dos pescadores) às mesmas tarefas.

Para você será necessário repensar os colectivos de forma a incluir os não-humanos nas discussões ecológicas e nas tomadas de decisões?

Bruno Latour – Mas Há mil maneiras para se fazer isso. Acabo de abrir na Alemanha uma grande exposição sobre «A coisa pública» («Making Things Public», ver
http://makingthingspublic.zkm.de/ ). Christelle Gramaglia e Jean-Pierre Le Bourhuis fizeram lá uma instalação muito significativa: de um lado temos as discussões nas comissões locais de água acerca da poluição nos rios; aí só encontramos os humanos «clássicos» se assim posse dizer, mas o que fazer para saber se o que é dito do rio é exagerado, urgente, superficial ou alarmista? Ora é preciso que para além dos humano, se faça «falar» o rio. Existem pequenos crustáceos que servem aos cientistas de sentinelas para avaliarem sobre o estado do rio na condição de os mantermos e torná-los capazes de se exprimirem. Ora se estes crustáceos se encontram em condições de entrar nas comissões em que se discute o futuro do rio, então porque havemos de separar os humanos políticos de um lado, e os não-humanos apolíticos do outro. Uma tal separação é absurda.
Outro exemplo da mesma exposição é realizada por Mauz e Didier Demorcy sobre a política de reintrodução do lobo nos Alpes: se olharmos para a paisagem bucólica, ela corresponde à antiga natureza, se assim se pode dizer, isto é, à que parece estar «fora» da política. Mas se olharmos mais de perto apercebemo-nos que cada elementos da paisagem ( o parque para os carneiros, a distribuição dos chalets, etc) encontra-se inteiramente dependente das controvérsias sobre a coabitação entre espécies.
Ora se há um problema de coabitação generalizado no planeta, talvez seja tempo dos politólogos, os sociólogos… se aperceberem que as ligações entre humanos e não-humanos significam estarmos na mesma sociedade, ou no mesmo colectivo, como eu costumo chamar. A política gira à volta das «coisas», e isso é a ecologia, pouco importa que seja científica ou política, uma vez que as competências de uns e ouros se devem aplicar sobre os mesmos objectos, ou antes, sobre as mesmas temáticas. Lembremo-nos que conservamos na palavra «república» esta sabedoria que não é nova: na «república» existe a partícula «res» que quer dizer coisa. Ora a ecologia não faz mais que nos recordar esta simples realidade, que os politólogos se tinham esquecido: que as coisas são estudadas pelos sábios, modificadas pelos tecnólogos, assumidas pelos militantes e apreciadas pelos amadores, e todo esse bazar deve tornar-se público. Mas para compor o público à volta destas coisas, é preciso mudar a nossa filosofia e as nossas ciências sociais


Bruno Latour é filósofo e sociólogo. É dos mais importantes nomes da sociologia das ciências.
Bibliografia:
La Science en action.Introduction à la sociologia des sciences, 1989
Politiques de la nature. Comment faire entrer les sciences en démocratie, 1999
Un monde pluriel mais commun, 2003


( entrevista retirada do hors-série nº 49, Luillet-Août 2005 da revista Sciences Humaines)

Cronologia da tomada de consciência ecológica (algumas datas)

1972 – pela primeira vez é posto em causa o princípio do crescimento ilimitado enquanto modelo de crescimento. O relatório «The limits of growth» (os limites do crescimento) é o resultado da reflexão de um grupo conhecido sob o nome de «Clube de Roma»
Neste mesmo ano é criado o partido verde na Nova Zelândia, o Values Party

1973 – Primeira crise do petróleo, na sequência do embargo da OPEP. É criado nesse ano o PNUE ( Programa das Nações Unidas para o Ambiente), fixando a sua sede em Nairobi (Quénia)

1974 – O francês René Dumond é o primeiro candidato ecologista a apresentar-se a umas eleições presidenciais, tendo recebido 337.800 votos.
Dois investigadores descobrem que os CFC são responsáveis pela diminuição do ozono na estratosfera.

1976 – Explosão numa fábrica química em Seveso.A libertação de cloro e dioxinas envenenam cerca de 700 pessoas mas sem fazer vítimas mortais.
A Unesco cria uma rede de reservas da biosfera

1977 – Grande manifestação antinuclear em França contra a central nuclear Superphénix. Dos enfrentamentos com a polícia resulta a morte de Vital Michalon.
Aprova-se uma moratória antinuclear no Quebeque.

1978 – É criado no Canadá o primeiro Ministério do Ambiente
A Áustria decide abandonar a energia nuclear.
O barco Amoco Cadiz larga 200.000 toneladas de petróleo nas costas da Bretanha

1979 – Convenção de Bona sobre a preservação das espécies migratórias.
Realização da conferência mundial sobre o clima em Genebra
Acidente nuclear em Three Mile Island ( nos Estados Unidos) leva à suspensão da construção das centrais nucleares naquele país.
S. Francisco de Assis é indicado pela Igreja Católica como patrono dos ecologistas

1980 – Criação do Partido verde alemão.
A ONU proclama a década da água potável
A UINC e a WWF referem-se pela primeira vez à noção de «desenvolvimento sustentável»
Resolução da Comissão baleeira internacional no sentido de reduzir as cotas na pesca à baleia

1981 – A plataforma petrolífera Itoc One despeja durante longos 5 meses mais de 700.000 toneladas de petróleo no Golfo do México.
Realização pela ONU de uma Conferência sobre as fontes de energias renováveis

1982 – A Assembleia Geral das Nações Unidas adopta a Carta Mundial da Natureza

1984 – Uma fábrica de produtos químicos em Bhopal ( Índia) provocam a morte de milhares de pessoas
Resolução da Comissão económica da ONU: reduzir 30% das emissões de dióxido de enxofre

1985 – Realização pela ONU de uma Conferência sobre a protecção da camada de ozono.
Conferências da OCDE sobre resíduos perigosos em Basileia, e sobre chuvas ácidas em Paris.

1986 – Incêndio e explosão na central nuclear de Tchernobyl
Em Basileia 30 toneladas de produtos químicos são lançados no Reno
Interrupção total da caça comercial às baleia

1987 – A Comissão mundial sobre o ambiente e o desenvolvimento publica o Relatório Brundtland « O nosso futuro pertence-nos»
Assinatura por 24 países do Protocolo de Montreal sobre a protecção da camada de ozono. O seu objectivo é reduzir 50% das emissões de CFC até 1999

1988 – Conferência da ONU sobre o ambiente em Oslo.
Inundações no Bangladesh com 25 milhões de deslocados. A desarborização dos Himalaias é apontada como causa responsável.
Realiza-se em Hamburgo um Congresso Internacional sobre o clima e sobre as consequências das catástrofes climáticas nos países desenvolvidos.

1989 – O petroleiro Exxon Valdez verte 40.000 toneladas de petróleo nas costas do Alaska.
Os Verdes recolhem 10.000.000 votos nas eleições europeias e são eleitos 30 deputados ecologistas para o Parlamento de Strasbourg.
Realização de uma conferência sobre poluição atmosférica em Noordwijk (Holanda) com o objectivo de estabilizar as emissões de CO2 até ao ano 2000.
Declaração de Vancouver acerca da sobrevivência no século XXI

1991 – Protocolo de Madrid. 26 países decidem que durante 50 anos não haverá desenvolvimento no Antárctico.

1992 – Cimeira da Terra no Rio de Janeiro. Assinatura da Convenção sobre a Diversidade biológica.

1994 – A Convenção sobre as mudanças climáticas do Rio é ratificada por 50 países.
Convenção em Paris sobre a desertificação.

1997 – Conferência do Conselho da Terra para analisar as decisões tomadas na Cimeira do Rio.
Realização do Rio+5, uma sessão especial da ONU sobre o ambiente.
Cimeira de Quioto sobre as mudanças climáticas

1998- Conferência de Paris sobre água e o desenvolvimento durável
Conferência de Buenos Aires sobre as mudanças climáticas.

2000 – Directiva comunitária da EU tendente a uma harmonização da gestão da água na Europa

2002 – Terceira Cimeira da Terra e Joanesburgo, na África do Sul

2004 – A Rússia ratifica o protocolo de Quioto, permitindo assim a sua entrada em vigor.
Adopção de um plano de acção europeu em matéria de agricultura biológica: 21 pontos são adoptados a favor de uma política mais favorável à agricultura biológica

2005 – A UNESCO organiza em Paris uma Conferência Internacional sobre a biodiversidade.
Em 16 de Fevereiro entre em vigor e tem força de lei o Protocolo de Quioto para os 128 países que o ratificaram.

(esta cronologia está longe de ser completa, mas serve para acompanharmos o processo de sensibilização e tomada de consciência das questões ligadas ao ambiente)

Indicadores do desenvolvimento sustentável


Como construir os indicadores do desenvolvimento sustentável

(Nota: um indicador é uma variável que serve para dar conta de uma realidade.
Já um índice faz a síntese de vários indicadores
)

Uma política de desenvolvimento sustentável não pode fazer-se sem indicadores.
Ora para os autores da Agenda 21 – o programa que resultou da Conferência do Rio de 1992 – os indicadores existentes ( Produto Nacional Bruto, Produto Interno Bruto, etc) são incapazes de avaliar a sustentabilidade de uma política de desenvolvimento. Na continuação dos indicadores sociais que irromperam no domínio das políticas públicas em meados dos anos 60, a procura de indicadores de desenvolvimento regressou em força nos últimos tempos.
Entre as tentativas visando superar ou, pelo menos, completar o PIB, existe uma com certo sucesso. É o índice de desenvolvimento humano (IDH) proposto pelo Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento (PNUD). As outras ficaram entre os iniciados e ainda não encontraram legitimidade para um eventual uso.

Quais são esses indicadores?

IDH (índice do Desenvolvimento Humano) combina 3 indicadores de base: a esperança de vida à nascença, o rendimento e o nível de educação

Índice de bem-estar económico sustentável (índex of sustainable economic welfare, Isew) é um índice monetário que corrige o PIB tendo em conta as contribuições negativas ( custos sociais e ambientais ligados às desigualdades de rendimentos, à poluição, aos ruídos sonoros, às perdas nos ecossistemas naturais; à diminuição dos recursos não-renováveis; à erosão da camada de ozono, etc) e positivas ( trabalho doméstico e despesas públicas de educação e de saúde)

Indicador do progresso real (genuine progress indicator, GPI) derivado do Isew, mas ao qual junta as contribuições positivas dos beneméritos, dos bens de consumo sustentáveis e das infraestruturas de transportes, e que subtrai os custos suplementares como os das fracturas familiares, do desemprego, e perda dos tempos livres, etc

Indicador do bem-estar económico e social de Lars Osberg e Andrew Sharpe que consiste numa média ponderada de 4 indicadores sintéticos sobre os fluxos de consumo, as riquezas (económico, humano e ambiental), as desigualdades e a insegurança económica

Índice de bem-estar humano (human weel-being índex, HWI), proposto pelo economista Robert Prescott_Allen, composto de indicadores relativos à saúde e à vida familiar (estabilidade da família), ao rendimento e grau de satisfação das necessidades de base, à economia, ao nível de educação e meios de comunicação, direitos políticos e cívicos, paz ou conflito armado, criminalidade e equidade

Cada um destes indicadores combina 4 tipos de abordagem: o primeiro consiste em dar uma parte variável aos 3 pilares do desenvolvimento sustentável ( o económico, o social e o ambiental), o segundo diz respeito aos recurso e a sua duração; o terceiro é centrado sobre o humano, e reflecte o bem estar; o quarto define as normas e os procedimentos que permitem avaliar toda acção social a respeito do desenvolvimento sustentável.

Histórias de uma trabalhadora na Era de Informação


Quando da implantação em massa de robots e de computadores nas actividades produtivas em geral, os optimistas consideraram que os efeitos seriam positivos para os trabalhadores. A realidade, no entanto é muito diferente.

O surgimento das máquinas ferramenta de controle numérico computorizadas, robots e redes de computadores nas industrias, gerou muitas expectativas. As pessoas mais optimistas, desvalorizando a função objectiva de uma empresa capitalista, logo viram apenas sinais positivos.
Seguiu-se uma onda de especulações sobre como o futuro dos trabalhadores seria radioso doravante. As máquinas iriam substituir o trabalho humano penoso e enfadonho. Os trabalhadores passariam a exercer funções muito mais criativas, em ambientes mais agradáveis, com horários de trabalho menores e mais flexíveis e, sobretudo, melhor remunerados.
Isso tudo seria possível pelo vertiginoso aumento da produtividade que, como todos “sabem” sempre reverte em benefício de… toda a sociedade! O elementar facto de que os ganhos em função desses aumentos de produtividade são apropriados pelas empresas, e não pelos empregados parecia ser um mero detalhe de pouca importância.
Para os economistas, administradores de empresas e profissionais de informática, a realidade logo ficou clara. Os objectivos da automação eram respectivamente: cortar o maior número possível de empregados e extrair o máximo de trabalho da mão-de-obra restante nas unidades industriais.
Mas, para se alcançar esses objectivos era necessário um novo sistema de gestão, capaz de compatibilizar os novos equipamentos com os recursos humanos. A isso se prestavam perfeitamente os conceitos desenvolvidos no Japão, mais especificamente, o sistema concebido pelo engenheiro Eiji Toyoda e o seu especialista em produção Taichi Ohno nas instalações da Toyota.
Dessas técnicas, hoje bastante conhecidas, nasceram os processos de reestruturação e reengenharia da produção, largamente utilizados em todo o mundo. Dele também deriva o conceito de produção “enxuta”, das vantagens da terciarização e da flexibilização das relações de trabalho. A este novo paradigma, seguindo Manuel Castells, chamamos de capitalismo informacional.
As consequências da utilização combinada das novas tecnologias de informação e telecomunicações e dessas técnicas de gestão de pessoal podem ser brevemente sintetizadas:
1) A automação elimina empregos, em quantidade assustadora, nos níveis intermediários da hierarquia. Os empregados “sobreviventes” aos processos de reengenharia, tanto os operários quanto os executivos, passam a serem pressionados a aceitar aumentos progressivos de sua carga de trabalho.
2) Embora o desemprego possa não se manifestar nos níveis mais baixos, as condições de trabalho em geral deterioram-se. Os trabalhadores são obrigados a um ajustamento às velocidades de produção dos robots, muito mais exigentes do que a linha de produção “taylorista/fordista” tradicional.
3) O nível de instrução dos trabalhadores decresce continuamente com o aumento da “inteligência” das máquinas e das interfaces “amigáveis”.
Para mostrar como isso ocorre na prática, citaremos o depoimento de uma trabalhadora que passou dois anos a trabalhar no Japão, o berço dessas novas ideias e de longe o país que mais as utiliza.

Escolhemos a narrativa dessa pessoa por duas razões:
Em primeiro lugar porque sua experiência de trabalho foi junto a linhas de produção automatizadas e executando as mesmas tarefas que seus colegas japoneses, e não como acontece com muitos imigrantes que se aventuram nos EUA e Europa, que acabam executando tarefas específicas, justamente onde a nova automação está quase ausente (restaurantes, hotéis, serviços de manutenção, limpeza, etc).
A segunda razão é que se trata de pessoa com um alto nível intelectual, tanto mais que as suas narrativas são extraídas de um trabalho académico da sua autoria, cujo objectivo é exactamente uma análise do “toyotismo”.(1)
Segundo reconhece a autora: “A automatização é considerada o primeiro elemento desse modelo. Trata-se da utilização de máquinas capazes de parar automaticamente quando surgem problemas. Assim o trabalhador que até então era treinado para desenvolver o seu trabalho numa única máquina pode ser responsabilizado por várias, o que diminuiria a quantidade de trabalhadores necessários numa linha de montagem, onde a autora teve experiência de trabalho, como relata a seguir”.
A narração da autora inicia-se, como era de se esperar, pelas dificuldades do próprio processo de deixar o seu país e enfrentar uma realidade totalmente desconhecida, o Japão. Note-se que o novo capitalismo informacional não reduz significativamente a procura de empregos de baixa qualificação.
A autora relata que a certa altura, “a ala feminina do grupo é submetida a um teste com trinta cálculos matemáticos, com a informação de que quem resolvesse todos os trinta cálculos em cinco minutos seria indicada para a vaga daquele dia. A autora conseguiu resolver vinte e oito dos cálculos no tempo que foi estipulado e por isso foi levada a uma fábrica da Suzuki na cidade de Kosai para uma entrevista”.
Isso levar-nos-ia a concluir que se valoriza bastante o nível de ensino, principalmente a preparação básica em ciências exactas, já que o trabalho é junto a equipamentos altamente sofisticados. Mas, após repetir o teste na fábrica da Suzuki, a autora acaba por ser recusada, e o motivo foi que:
“a fábrica não aceitava secretárias, enfermeiras e professoras, pois, a função (trabalhar no sector de reposição de peças) exigia que se desse 15 mil passos por dia, e para a empresa se certificar que o funcionário estava dentro das normas era colocado um marcador na perna – na altura do tornozelo – e segundo eles, pelo porte físico, ela não conseguiria desenvolver a função”.
Perguntar-se-á então: e o teste de matemática não serviu para nada? É simples. Uma pessoa capaz de realizar cálculos sob pressão (trinta cálculos em cinco minutos), está apta a tomar decisões simples, como escolher e contar peças codificadas, por exemplo, na velocidade exigida pelas linhas de montagem dirigidas pelos robots.
Prossegue a autora: “No dia seguinte, candidatei-me a outra vaga, desta vez uma fábrica que produzia fechaduras para carros da Mitsubishi. Ao chegar recebo o uniforme e fui levada à linha de montagem. Não houve nenhum treino, apenas orientações de como realizar a tarefa”.
Devemos notar que isso seria impensável numa fábrica tradicional. Além disso, a autora “durante os primeiros dias trabalhou muito preocupada em dar conta da produção exigida (950 peças por dia), as dificuldades eram grandes, pois, jamais havia visto ou executado tal função”. Como é possível que uma indústria espere que um funcionário atinja metas ambiciosas de produção sem nenhum treino e sem “jamais ter visto ou executado tal função?”
A resposta está em que, como dissemos, as novas tecnologias estão longe de necessitar de empregados com melhor nível cultural e mesmo qualquer experiência anterior. As “interfaces amigáveis” permitem que tarefas complexas sejam executadas por pessoas sem nenhuma qualificação.
Prossegue a autora: “Ao terceiro dia de trabalho, a tentativa para tentar conseguir acompanhar o ritmo das máquinas, criou-me problemas de saúde o que obrigou a ecarregada a levá-la para a enfermaria, sob o olhar reprovador do chefe e dos colegas de linha. Neste dia ficou a saber que uma colega havia tentado suicidar-se, tão grande era o sofrimento pelo qual passava, pois além da adaptação ser difícil, havia a agravante de estar no emprego já por vários dias sem confirmação de trabalho”.
Isso comprova o que também afirmamos: O segredo da espectacular “produtividade” do capitalismo informacional não está somente na tecnologia mas sim na sua combinação com técnicas, às vezes brutais, de exploração da mão-de-obra.
Depois disso, a autora conseguiu transferir-se para outra fábrica e ao cabo de um mês estava a trabalhar num departamento de controle de qualidade. Devemos lembrar que nas fábricas tradicionais, esse era um cargo altamente qualificado, mas a autora relata uma realidade bem diferente:
“As peças eram dispostas num aparelho que através de um computador verificava a sua perfeição ou seu o defeito. A actividade era tão mecânica que apesar do entendimento da língua japonesa ser pouco e de informática ainda menos, a autora foi capaz de realizá-la sem maiores problemas”.
Ou seja, o “controle de qualidade” na realidade era feito pelo computador e a trabalhadora limitava-se a observar os resultados num monitor de vídeo. Resumindo, ela não passava de um auxiliar humano da máquina. Nas suas conclusões a autora nota que:
“A experiência como operária subcontratada tornou possível ver bem de perto que a única diferença entre os trabalhadores, ainda que isso seja despercebido para muitos deles, são as mercadorias que produzem. Não fosse assim, não haveria diferença de uma fábrica para outra. Em todas que a autora teve oportunidade de trabalhar ou apenas conhecer, como era de se esperar, as actividades sempre seguiam a mesma linha, extremamente repetitivas e exaustivas, onde o trabalho se encontra totalmente alienado”.
Isso ocorre porque as novas tecnologias são flexíveis. Ao contrário das máquinas mais antigas, os robots e computadores podem ser programados para executar tarefas diferentes sem alterar praticamente nada as suas características. O mesmo acaba por acontecer para as pessoas que trabalham com eles.
Com esse relato, podemos passar a ter uma visão prática do que até então abordávamos apenas em teoria. Longe do paraíso das jornadas de trabalho flexíveis e do trabalho criativo e de alto nível intelectual, a nova realidade da classe trabalhadora pode ser sintetizada na visão da fabrica do futuro como descrita por Fabio Kazuo Ocada, citado pela autora: “[...] por todos os lados sirenes piscam e os ruídos ensurdecedores da estrutura de metal em funcionamento misturam-se com a música sintética [...] A primeira impressão chega a lembrar um sofisticado parque de diversões, a segunda impressão sugere a imagem do inferno”. (2)
Notas:
(1) FUTATA, Marli Delmônico de Araújo. Breve análise sobre o toyotismo: modelo japonês de produção – Revista Espaço Acadêmico – Nº 47 – Abril de 2005.
Disponível em:
http://www.espacoacademico.com.br/047/47cfutata.htm

(2) OCADA, Fabio Kazuo. Trabalho, sofrimento e migração internacional: o caso dos brasileiros no Japão. In: ANTUNES, Ricardo e SILVA, Maria Aparecida Moraes. O avesso do trabalho. 1ª. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2004.
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(texto retirado da net)

A maior empresa do mundo é a Wal-Mart


A revista Fortune publicou a sua lista anual das maiores empresas mundiais.A tabela ordenada com base nas rceitas do ano anterior conta com 176 empresas norte-americanas. Nas 10 maiores há 4 petrolíferas, 4 fabricantes de automóveis, um retalhista e um conglomerado, a General Motor.
A Wal-Mart fechou o ano de 2004 com receitas de 287,9 mil milhões de dólares, e um lucro de 10,26 mil milhões de dólares.

71% dos alunos do 9ºano chumbaram a Matemática


Saíram os resultados do novos exames do 9º anos e os dados não podiam ser mais reveladores: 71% dos alunos do 9ºanos (num total de 84.980 alunos) reprovaram à disciplina no exame de Matemática, mas como a nota de exame tem um peso de 25% a maior parte os alunos passou para o ano seguinte( ou seja, 74% recebeu a aprovação)
Na disciplina de Português 77% dos que fizeram exame obtiveram classificação positiva.