20.6.06

A sexualidade e as classes sociais (in «A Revolução Sexual», de Daniel Guérin)


Transcrição do quarto capítulo do livro de Daniel Guérin, «Revolução Sexual, segundo Reich e Kinsey»(Essai sur la révolution sexuelle après Reich et Kinsey», no original),
editado pela Inova (1975)


Breve nota biográfica (retirada da contracapa do livro editado pela Inova):
Daniel Guérin nasce em 1904 de uma família burguesa. Aos 26 anos rompe com o seu meio de origem para se tornar militante revolucionário, e assim manter-se-á durante toda a sua vida. Daniel Guérin foi um autor multiforme: os seus escritos estendem-se desde a sociologia, história, teoria política, sexologia e até ficção.
Muitos das suas obras são hoje verdadeiros clássicos nas respectivas matérias.
Ideologicamente Daniel Guérin reivindica-se do chamado marxismo libertário, entre o anarquismo e o marxismo, e por isso mesmo, é um dos nomes mais citados pelos estudantes revoltosos em Maio de 68.
Muito antes de Maio de 68, Daniel Guérin já desmascarava o puritanismo e defendia a revolução sexual ao lado da revolução social, apoiando-se em Wilhelm Reich e Alfred Kinsey.
Para Daniel Guérin, a liberdade de cada um praticar o amor à sua maneira faz parte dos direitos do homem: confunde-se com a liberdade, simplesmente.

Nota prévia de advertência deste weblog:
os inquéritos sobre as práticas sexuais foram realizados por Kinsey nos Estados Unidos na década de 50, e os comentários de Guérin foram escritos no final da década de sessenta. Apesar de serem algo datados, a verdade é que estes dados ( e comentários subsequentes) são imprescindíveis caso se queira fazer uma análise histórica e sociológica acerca da sexualidade nas sociedades contemporâneas.




Kinsey, se bem que menos orientado para a sociologia do que para a biologia, consente no entanto em fazer uma incursão na primeira destas duas ciências quando enumera as diferenças de comportamento que lhe foi possível verificar em toda a escala social. Mas tais observâncias são limitadas pela sua repugnância ( bem americana) em admitir que existem classes sociais: apenas pretende conhecer «níveis de instrução» ou «categorias profissionais». Comete o deslize de se limitar a alinhar cifras e a traçar curvas sem demasiada preocupação em interpretar as variações registadas.

Para Kinsey, as diversas camadas sociais são todas elas inibidas sexualmente, obedecendo a «tabus» cuja origem remonta à moral judaico-cristã. Mas, segundo a sua opinião, tais tabus não são por elas observadas do mesmo modo. O que é «tabu» para as camadas ditas «superiores» é-o em menor grau para as classificadas de «inferiores».

Comecemos pelas interdições de que são vítimas as chamadas classes «superiores» e com as quais as «inferiores» se preocupam muito menos.

De um modo geral, a actividade sexual global das camadas «superiores» é bastante menor que a das camadas «inferiores». Kinsey dividiu a sociedade em 3 camadas e em função do seu nível de instrução, que ele cifra respectivamente: 0 a 8 ( instrução primária), 9 a 12 ( instrução secundária), 13 e mais ( instrução superior) e traça a curva da actividade global das 3 categorias, dos 10 aos 45 anos. Enquanto que as curvas das duas primeiras categorias coincidem até cerca dos dezassete anos ( ou seja, a idade em que cessa a instrução da 1ª categoria), elas afastam-se a seguir ligeiramente até cerca dos 40 anos. Os louros cabem aos que têm apenas a instrução primária. Quanto à curva da terceira categoria, ela diverge muito acentuadamente em comparação com as duas primeiras desde os 12 anos de idade com clara desvantagem da actividade sexual para as camadas «superiores», ainda que a distância diminua sensivelmente depois dos 30 anos de idade.

As camadas sociais ditas «superiores» são menos precoces que as classificadas de «inferiores». Três quartos dos rapazes que não ultrapassam a escola primária exercitam-se no coito pré-adolescente ( e muitas vezes vão mesmo até ao acto sexual consumado) contra apenas um quarto dos rapazes que vão frequentar o ensino secundário.

Nos adolescentes das camadas «inferiores» o coito pré-conjugal é absolutamente corrente e considerado como normal e mesmo saudável, enquanto que as camadas «superiores» estão mais impregnadas do conceito cristão que atribui a mais alta importância à virgindade antes do casamento, ainda que em maior grau no referente à mulher. 98% dos rapazes que não continuam os estudos após a escola primária praticam o coito antes do casamento, contra 84% dos rapazes de formação secundária e 67% dos que prosseguem os seus estudos na universidade.

A frequência das relações sexuais entre os 16 e os 20 anos eleva-se a uma média entre 2 e 4 vezes por semana nos rapazes que só têm a instrução básica, contra 1,5 para os que frequentam o secundário e 0,3 para os universitários.

Contrariamente aos das camadas «superiores», os homens pertencentes às camadas sociais inferiores não se preocupam com a escolha das suas companheiras, dado que possuem menos exigências estéticas a satisfazer e menos convencionalismos a respeitar. Pelo contrário, preferem prazeres positivos e que não os façam incorrer em obrigações sociais ou emocionais. Ainda entre os 16 e 20 anos, os rapazes das camadas «inferiores» ( ou com apenas escolaridade básica) têm relações sexuais com prostitutas 9 vezes mais frequentes que os que frequentam a universidade, enquanto os rapazes do nível «secundário» frequentam-nas mais de 4 vezes que os «universitários».

É sobretudo entre os «primários» e, em menor grau, entre os «secundários» que se encontra um gosto muito vivo pela variedade das companheiras sexuais.

Finalmente, os «universitários» são obrigados a contentar-se com prazeres imaginários em muito maior medida que os rapazes menos instruídos. O conceito de sexo evoca nele a masturbação, as poluções nocturnas, as carícias e uma avidez incessante de raparigas que só muito raramente aceitam copular com ele.

Nas mulheres, algumas destas diferenças são diametralmente opostas. Assim, por exemplo, apenas 30% das raparigas que têm «ensino primário» têm coitos pré-conjugais, contra 47% das que só frequentam até ao fim do «ensino secundário» e 60% das «universitárias». Claro está que estas estatísticas estão falseadas pela simples razão de que o casamento não tem lugar, nas 3 camadas ou categorias, na mesma idade de vida: as das camadas «inferiores» casam-se muito mais cedo, pelo que têm menos oportunidade de praticarem o coito pré-conjugal. Se restringir-mos a análise às mulheres que casam com a mesma idade, apercebemo-nos que a percentagem do coito pré-conjugal não varia demasiado em função do nível de escolaridade. Kinsey concluiu desse facto que os factores sociais influenciam mais o comportamento sexual dos homens que o das mulheres. E também neste aspecto ele abstém-se de levar as suas deduções até ao fim. Se os factores educacionais exercem menos influência sobre o comportamento das mulheres que sobre o dos homens, é, sem dúvida, porque todas as mulheres, sem distinção do nível de instrução, estão ainda, em larga medida, subjugadas pelo patriarcado e, portanto, inibidas por essa mesma razão.

No que se refere à homossexualidade, Kinsey faz uma constatação que confirma as suas afirmações precedentes quanto ao carácter natural desta conduta: ela é mais praticada pelos elementos que só têm a instrução básica do que pelos que possuem formação superiora, além de que aqueles, comparativamente a estes últimos, são muito raramente exclusivos.

Resumindo: sob muitos aspectos, as chamadas camadas «inferiores» são menos inibidas pelos tabus anti-sexuais que as camadas «superiores», e encontram-se muito mais próximas da natureza que as ditas «superiores»

Acontece que as camadas «inferiores» sofreriam, por seu lado, de certas inibições que atormentam em menor medida os membros das camadas «superiores».
Assim, por exemplo, aquelas não gostam de fazer durar o acto sexual durante tanto tempo como os das pretensas elites sociais, e isso talvez porque as suas capacidades imaginativas e emocionais são menos apuradas. Praticam, também, menos livremente os contactos bucais. Possuem ainda mais preconceitos perante a nudez ( tida como obscena) no momento das relações sexuais. Têm menos necessidade de estimulantes psicológicas (imagens eróticas, literatura «perversa»). Dedicam-se menos à masturbação e são mais reticentes quanto a ela.

Perante tais diferenças, Kinsey comete o erro de as atribuir pura e simplesmente a um maior respeito popular por certos tabus, quando também se podem explicar por uma maior conivência com a natureza, uma menor intervenção da actividade cerebral e das aquisições culturais na sexualidade das amplas massas.

É verdade, sem dúvida, que também o povo é prisioneiro de tabus, mas menos que as pretensas «elites» e somente na medida em que a religião ainda o subjuga. Mas os tabus não são tão rígidos, pelo que a sua sexualidade se mantém fundamentalmente «pagã». O povo, entregue a si próprio, pratica o amor também de uma maneira simples e espontânea.

Ou seja, a revolução sexual, tal como a revolução social, é, antes de tudo, obra do povo.

As estratégias da indústria farmacêutica para multiplicar lucros - Os vendedores de doenças

retirado de
http://ecodebate.com.br/



As estratégias da indústria farmacêutica para multiplicar lucros espalhando o medo e transformando qualquer problema banal de saúde numa “síndrome” que exige tratamento


Autores:
Ray Moynihan,
Alain Wasmes

Há cerca de trinta anos, o dirigente de uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo fez declarações muito claras. Na época, perto da aposentadoria, o dinâmico diretor da Merck, Henry Gadsden, revelou à revista Fortune seu desespero por ver o mercado potencial de sua empresa confinado somente às doenças. Explicando preferiria ver a Merck transformada numa espécie de Wringley’s – fabricante e distribuidor de gomas de mascar –, Gadsden declarou que sonhava, havia muito tempo, produzir medicamentos destinados às... pessoas saudáveis. Porque, assim, a Merck teria a possibilidade de “vender para todo mundo”. Três décadas depois, o sonho entusiasta de Gadsden tornou-se realidade.

As estratégias de marketing das maiores empresas farmacêuticas almejam agora, e de maneira agressiva, as pessoas saudáveis. Os altos e baixos da vida diária tornaram-se problemas mentais. Queixas totalmente comuns são transformadas em síndromes de pânico. Pessoas normais são, cada vez mais pessoas, transformadas em doentes. Em meio a campanhas de promoção, a indústria farmacêutica, que movimenta cerca de 500 bilhões dólares por ano, explora os nossos mais profundos medos da morte, da decadência física e da doença – mudando assim literalmente o que significa ser humano. Recompensados com toda razão quando salvam vidas humanas e reduzem os sofrimentos, os gigantes farmacêuticos não se contentam mais em vender para aqueles que precisam. Pela pura e simples razão que, como bem sabe Wall Street, dá muito lucro dizer às pessoas saudáveis que estão doentes.

A fabricação das “síndromes”A maioria de habitantes dos países desenvolvidos desfruta de vidas mais longas, mais saudáveis e mais dinâmicas que as de seus ancestrais. Mas o rolo compressor das campanhas publicitárias, e das campanhas de sensibilização diretamente conduzidas, transforma as pessoas saudáveis preocupadas com a saúde em doentes preocupados. Problemas menores são descritos como muitas síndomes graves, de tal modo que a timidez torna-se um “problema de ansiedade social”, e a tensão pré-menstrual, uma doença mental denominada “problema disfórico pré-menstrual”. O simples fato de ser um sujeito “predisposto” a desenvolver uma patologia torna-se uma doença em si.

O epicentro desse tipo de vendas situa-se nos Estados Unidos, abrigo de inúmeras multinacionais famacêuticas. Com menos de 5% da população mundial, esse país já representa cerca de 50% do mercado de medicamentos. As despesas com a saúde continuam a subir mais do que em qualquer outro lugar do mundo. Cresceram quase 100% em seis anos – e isso não só porque os preços dos medicamentos registram altas drásticas, mas também porque os médicos começaram a prescrever cada vez mais.

De seu escritório situado no centro de Manhattan, Vince Parry representa o que há de melhor no marketing mundial. Especialista em publicidade, ele se dedica agora à mais sofisticada forma de venda de medicamentos: dedica-se, junto com as empresas farmacêuticas, a criar novas doenças. Em um artigo impressionante intitulado “A arte de catalogar um estado de saúde”, Parry revelou recentemente os artifícios utilizados por essas empresas para “favorecer a criação” dos problemas médicos [1]. Às vezes, trata-se de um estado de saúde pouco conhecido que ganha uma atenção renovada; às vezes, redefine-se uma doença conhecida há muito tempo, dando-lhe um novo nome; e outras vezes cria-se, do nada, uma nova “disfunção”. Entre as preferidas de Parry encontram-se a disfunção erétil, o problema da falta de atenção entre os adultos e a síndrome disfórica pré-menstrual – uma síndrome tão controvertida, que os pesquisadores avaliam que nem existe.

Médicos orientados por marqueteiros (propagandista das farmacêuticas)

Com uma rara franqueza, Perry explica a maneira como as empresas farmacêuticas não só catalogam e definem seus produtos com sucesso, tais como o Prozac ou o Viagra, mas definem e catalogam também as condições que criam o mercado para esses medicamentos.

Sob a liderança de marqueteiros da indústria farmacêutica, médicos especialistas e gurus como Perry sentam-se em volta de uma mesa para “criar novas idéias sobre doenças e estados de saúde”. O objetivo, diz ele, é fazer com que os clientes das empresas disponham, no mundo inteiro, “de uma nova maneira de pensar nessas coisas”. O objetivo é, sempre, estabelecer uma ligação entre o estado de saúde e o medicamento, de maneira a otimizar as vendas.

Para muitos, a idéia segundo a qual as multinacionais do setor ajudam a criar novas doenças parecerá estranha, mas ela é moeda corrente no meio da indústria. Destinado a seus diretores, um relatório recente de Business Insight mostrou que a capacidade de “criar mercados de novas doenças” traduz-se em vendas que chegam a bilhões de dólares. Uma das estratégias de melhor resultado, segundo esse relatório, consiste em mudar a maneira como as pessoas vêem suas disfunções sem gravidade. Elas devem ser “convencidas” de que “problemas até hoje aceitos no máximo como uma indisposição” são “dignos de uma intervenção médica”. Comemorando o sucesso do desenvolvimento de mercados lucrativos ligados a novos problemas da saúde, o relatório revelou grande otimismo em relação ao futuro financeiro da indústria farmacêutica: “Os próximos anos evidenciarão, de maneira privilegiada, a criação de doenças patrocinadas pela empresa”.

Dado o grande leque de disfunções possíveis, certamente é difícil traçar uma linha claramente definida entre as pessoas saudáveis e as doentes. As fronteiras que separam o “normal” do “anormal” são freqüentemente muito elásticas; elas podem variar drasticamente de um país para outro e evoluir ao longo do tempo. Mas o que se vê nitidamente é que, quanto mais se amplia o campo da definição de uma patologia, mais essa última atinge doentes em potencial, e mais vasto é o mercado para os fabricantes de pílulas e de cápsulas.

Em certas circunstâncias, os especialistas que dão as receitas são retribuídos pela indústria farmacêutica, cujo enriquecimento está ligado à forma como as prescrições de tratamentos forem feitas. Segundo esses especialistas, 90% dos norte-americanos idosos sofrem de um problema denominado “hipertensão arterial”; praticamente quase metade das norte-americanas são afetadas por uma disfunção sexual batizada FSD (disfunção sexual feminina); e mais de 40 milhões de norte-americanos deveriam ser acompanhados devido à sua taxa de colesterol alta. Com a ajuda dos meios de comunicação em busca de grandes manchetes, a última disfunção é constantemente anunciada como presente em grande parte da população: grave, mas sobretudo tratável, graças aos medicamentos. As vias alternativas para compreender e tratar dos problemas de saúde, ou para reduzir o número estimado de doentes, são sempre relegadas ao último plano, para satisfazer uma promoção frenética de medicamentos.


Quanto mais alienados, mais consumistas

A remuneração dos especialistas pela indústria não significa necessariamente tráfico de influências. Mas, aos olhos de um grande número de observadores, médicos e indústria farmacêutica mantêm laços extremamente estreitos.

As definições das doenças são ampliadas, mas as causas dessas pretensas disfunções são, ao contrário, descritas da forma mais sumária possível. No universo desse tipo de marketing, um problema maior de saúde, tal como as doenças cardiovasculares, pode ser considerado pelo foco estreito da taxa de colesterol ou da tensão arterial de uma pessoa. A prevenção das fraturas da bacia em idosos confunde-se com a obsessão pela densidade óssea das mulheres de meia-idade com boa saúde. A tristeza pessoal resulta de um desequilíbrio químico da serotonina no célebro.

O fato de se concentrar em uma parte faz perder de vista as questões mais importantes, às vezes em prejuízo dos indivíduos e da comunidade. Por exemplo: se o objetivo é a melhora da saúde, alguns dos milhões investidos em caros medicamentos para baixar o colesterol em pessoas saudáveis, podem ser utilizados, de modo mais eficaz, em campanhas contra o tabagismo, ou para promover a atividade física e melhorar o equilíbrio alimentar.


A venda de doenças é feita de acordo com várias técnicas de marketing, mas a mais difundida é a do medo. Para vender às mulheres o hormônio de reposição no período da menopausa, brande-se o medo da crise cardíaca. Para vender aos pais a idéia segundo a qual a menor depressão requer um tratamento pesado, alardeia-se o suicídio de jovens. Para vender os medicamentos para baixar o colesterol, fala-se da morte prematura. E, no entanto, ironicamente, os próprios medicamentos que são objeto de publicidade exacerbada às vezes causam os problemas que deveriam evitar.


O tratamento de reposição hormonal (THS) aumenta o risco de crise cardíaca entre as mulheres; os antidepressivos aparentemente aumentam o risco de pensamento suicida entre os jovens. Pelo menos, um dos famosos medicamentos para baixar o colesterol foi retirado do mercado porque havia causado a morte de “pacientes”. Em um dos casos mais graves, o medicamento considerado bom para tratar problemas intestinais banais causou tamanha constipação que os pacientes morreram. No entanto, neste e em outros casos, as autoridades nacionais de regulação parecem mais interessadas em proteger os lucros das empresas farmacêuticas do que a saúde pública.


A “medicalização” interesseira da vida

A flexibilização da regulação da publicidade no final dos anos 1990, nos Estados Unidos, traduziu-se em um avanço sem precedentes do marketing farmacêutico dirigido a “toda e qualquer pessoa do mundo”. O público foi submetido, a partir de então, a uma média de dez ou mais mensagens publicitárias por dia. O lobby farmacêutico gostaria de impor o mesmo tipo de desregulamentação em outros lugares.


Há mais de trinta anos, um livre pensador de nome Ivan Illich deu o sinal de alerta, afirmando que a expansão do establishment médico estava prestes a “medicalizar” a própria vida, minando a capacidade das pessoas enfrentarem a realidade do sofrimento e da morte, e transformando um enorme número de cidadãos comuns em doentes. Ele criticava o sistema médico, “que pretende ter autoridade sobre as pessoas que ainda não estão doentes, sobre as pessoas de quem não se pode racionalmente esperar a cura, sobre as pessoas para quem os remédios receitados pelos médicos se revelam no mínimo tão eficazes quanto os oferecidos pelos tios e tias [2] ”.

Mais recentemente, Lynn Payer, uma redatora médica, descreveu um processo que denominou “a venda de doenças”: ou seja, o modo como os médicos e as empresas farmacêuticas ampliam sem necessidade as definições das doenças, de modo a receber mais pacientes e comercializar mais medicamentos [3]. Esses textos tornaram-se cada vez mais pertinentes, à medida que aumenta o rugido do marketing e que se consolidas as garras das multinacionais sobre o sistema de saúde.

(Tradução: Wanda Caldeira Brant)
wbrant@globo.com

Bibliografia complementar:


* A revista médica PLoS Medecine traz, em seu número de abril de 2006, um importante dossiê sobre “A produção de doenças” – http://medicine.plosjournals.org/
* Na França, as revistas Pratiques (dirigida ao grande público) e Prescrire (destinada aos médicos) avaliam os medicamentos e trazem um olhar crítico sobre a definição das doenças.
*Jörg Blech, Les inventeurs de maladies. Manœuvres et manipulations de l’industrie pharmaceutique, Arles, Actes Sud, 2005.
* Philippe Pignarre, Comment la dépression est devenue une épidémie, Paris, Hachette-Littérature, col. Pluriel, 2003.
[1] Ler, de Vince Parry, “The art of branding a condition ”, Medical Marketing & Media, Londres, maio de 2003.
[2] Ler, de Ivan Illich, Némésis médicale, Paris, Seuil, 1975.
[3] Ler, de Lynn Payer, Disease-Mongers: How Doctors, Drug Companies, and Insurers are Making You Feel Sick, Nova York, John Wiley & Sons, 2002.



Texto traduzido de Le Monde Diplomatique-Brasil,

in EcoDebate.com.br - 16/06/2006


A mais bonita camisola da selecção brasileira...

Por via de http://www.sindromedeestocolmo.com/ soubemos de uma manifestação realizada em Londres neste últimos dias que foi liderada por Abul Koyair, 20 anos, e que visava protestar contra as operações antiterror da polícia britânica.
Abul Koyar apareceu vestindo uma camisola da selecção brasileira, em homenagem a Jean Charles de Menezes (alguns parentes deste estavam também presentes).

Koyair, nascido em Londres, é mais uma vítima da atual violenta polícia britância. Tomado totalmente de surpresa o seu irmão foi baleado e dois outros ficaram detidos vários dias, antes de serem soltos, sem nenhuma acusação formal.
É a guerra de Bush e Blair contra os "terroristas": Primeiro atiram, depois averiguam.
Viver em Londres ficou muito perigoso



Colher para Semear - Rede Portuguesa de Variedades Tradicionais


COLHER PARA SEMEAR

Rede Portuguesade Variedades Tradicionais

PORQUÊ PRESERVAR VARIEDADES TRADICIONAIS?


A perda da biodiversidade agrícola, em todo o mundo, é da ordem dos 75%, segundo estudo da FAO em 1984. A situação portuguesa contribui certamente para este panorama, tendo em conta o número de variedades desaparecidas nas últimas décadas das nossas hortas e pomares. Poderemos apontar várias razões para esta situação.

A generalização do uso de sementes híbridas na agricultura contribui para aumentar a pobreza varietal e também para a dependência dos agricultores: devido à degeneração e perda natural de vitalidade destas sementes logo à segunda geração, a sua compra anual torna-se necessária. O comportamento actual dos agricultores que deixam de colher sementes das suas culturas, preferindo comprar os lindos pacotes que os cativam com as fotografias e as promessas de boas colheitas, é outra destas razões.

Por outro lado, a aglutinação das pequenas casas de sementes, geralmente por parte das multinacionais do ramo, reduziu drasticamente a oferta de variedades regionais e tradicionais, pois estas não têm qualquer interesse económico num sistema globalizado. Por essa razão, hoje cultivam-se as mesmas variedades por todo o mundo, não se adaptando estas, como é óbvio, a todos os climas, microclimas e tipos de solos existentes. Consequentemente, necessitam de uma gama enorme de biocidas para completar o seu ciclo, contribuindo assim para os efeitos sobejamente conhecidos de poluição a vários níveis, e para a redução da qualidade alimentar

As variedades que empreenderam uma viagem ao longo de inúmeras gerações para chegarem até nós, foram cuidadosamente criadas e acompanhadas, muitas vezes com grandes sacrifícios, pelos nossos antepassados. São a nossa herança mais preciosa, elas são a vida em forma de semente, são o nosso passado sem o qual não existiria vida em nós. Cabe-nos portanto dar continuidade a essa herança que nos foi tão generosamente cedida, semeando estas variedades, dando-lhes vida e utilidade, podendo assim ser vistos com orgulho por aqueles que nos antecederam, e também pelas gerações vindouras.

OBJECTIVOS DA ASSOCIAÇÃO:

- Inverter a situação actual de contínua perda de biodiversidade genética agrícola, por meio da recolha, cultivo e catalogação das variedades tradicionais ainda existentes;

- Formar e incentivar os agricultores para a recolha anual das suas próprias sementes, assim como estimular a sua troca, assegurando-lhes uma independência e autonomia em termos de sementeiras;

- Contribuir para o conhecimento do nosso património vegetal, promovendo e participando em colóquios e feiras com exposição de sementes, levando o tema onde for necessário;

- Promover o uso de variedades tradicionais em agricultura biológica por estas estarem melhor adaptadas ao local de cultivo e terem menos problemas fitossanitários;

- Estimular o uso de legumes esquecidos, para uma maior diversidade alimentar e uma culinária mais rica, atractiva e completa;- Dar a conhecer aos jovens a herança que nos foi transmitida pelos nossos antepassados, pois cada semente tem um percurso e uma história própria;

- Defender a segurança alimentar continuando a semear as nossas variedades tradicionais de polinização aberta, perfeitamente adaptadas ao seu meio de origem, em detrimento das práticas actuais que usam as sementes híbridas e, no pior dos cenários, as sementes transgénicas ou geneticamente modificadas.

COMO CONTRIBUIR?

Para concretizar estes objectivos, que são do interesse de todos nós, é necessária a contribuição do maior número de pessoas.De que modo?

- Através da inscrição como sócio;
- Pela oferta de donativos ou géneros;
- Voluntariado em diversas áreas: parte administrativa, pesquisa e trabalho de campo, recolha e propagação de sementes, inventariação, outras áreas relacionadas com as actividades da associação;
- Ser sócio guardião de sementes: comprometendo-se a multiplicar a(s) variedade(s) que apadrinhar, devolvendo à associação parte da sua colheita anual, devidamente seleccionada.

Este sócio deve ter assistido previamente a uma oficina de formação sobre recolha, caracterização e propagação de sementes. O sócio guardião é mencionado no catálogo de variedades como reprodutor da semente que apadrinhar.

INFORMAÇÕES E CONTACTOS:

Colher Para Semear
Rede Portuguesade Variedades Tradicionais
Quinta do Olival, Aguda3260 Figueiró dos Vinhos

José Miguel Fonseca - 236 622 218

Graça Ribeiro - 91 490 9334

fcteixeira@esb.ucp.pt
gcaldeiraribeiro@gmail.com"



Boletim de Inscrição de Sócio (Por favor, preencher com letras bem legíveis, de preferência com maiúsculas)Nome: ___________Morada: ____Localidade: ___ Código Postal: ___E-mail: _ Telefone/ Telemóvel: ___Data de Nascimento: __Profissão: ____ Nacionalidade: ____Nº contribuinte: ______
Quota anual: o Sócio individual 35 ¤ o Sócio colectivo 70 ¤ o Sócio estudante/reformado/menor de 16 anos 17,5 ¤ o Donativo de _____________
Pretende receber sementes*?
o Sim
o Não
Pagamento por cheque nº __ do Banco _____No valor de
à ordem de Colher para Semear
Data ___________________
Assinatura ______

Preencha e envie para: Colher para Semear, Tv. Convento de Jesus, 47 - 2º dto, 1200-125 LISBOA*Os sócios da associação Colher Para Semear têm o direito a: participar em todas as actividades promovidas ou apoiadas pela associação (p. e. encontros, oficinas de formação) com direito a redução de entrada quando praticável; receber o boletim interno e circulares; usufruir anualmente de um número de variedades, que serão definidas e disponibilizadas pela Direcção a partir de uma lista anual.