13.12.06

Eva Luna


"Me llamo Eva, que quiere decir vida, según un libro que mi madre consultó para escoger mi nombre.

Nací en el último cuarto de una casa sombría y crecí entre muebles antiguos, libros en latín y momias humanas, pero eso no logró hacerme melancólica, porque vine al mundo con un soplo de selva en la memoria. Mi padre, un indio de ojos amarillos, provenía del lugar donde se juntan cien ríos, olía a bosque y nunca miraba al cielo de frente, porque se había criado bajo la cúpula de los árboles y la luz le parecía indecente..."
(Eva Luna, livro da escritora chilena Isabel Allende)


Há livros que nos marcam. Este é certamente um deles. Apesar de o ter lido, sofregamente, há anos atrás, em apenas dois dias...

Em 1988, Isabel Allende apresenta-nos Eva Luna, num livro com o mesmo nome que conta a vida aventureira de uma rapariga pobre latino-americana, que encontra amizade, amor e algum sucesso através do seu poder de contar histórias.
Neste livro, a acção desenrola-se com Rolf Carlé, refugiado europeu, jornalista e amante de Eva Luna. Deitado com Eva Luna, ele pede-lhe para lhe contar uma história. "Sobre quê?, ela pergunta".
"Conta-me uma história que nunca tenhas contado a ninguém. Inventa-a para mim". E assim ela faz, dando a Rolf Carlé e ao leitor vinte e três vibrantes e encantadoras demonstrações da sua arte.
Nestas histórias, podemos encontrar camponeses e pessoas abastadas, guerrilhas e videntes, grandes belezas e tiranos. Aqui, encontramos Clarisa, "nascida antes da electricidade chegar à aldeia, que viveu para ver a cobertura televisiva do primeiro astronauta a levitar na lua, e morreu de espanto quando o Papa faz uma visita e conhece na rua homossexuais vestidos de freiras; El Cápitan, que levou quarenta anos a pedir em casamento a sua companheira de dança; Horácio Fortunato, dono de um circo, cujo encontro com uma mulher estrangeira o força a mudar as suas rudes maneiras quando a tenta cortejar; Maurizia Rugieri, que abando o seu marido e o seu filho para ir viver com um estudante de medicina, transformando a vida de ambos numa ópera que ela própria encena; Nicholas Vidal que "soube sempre que uma mulher lhe iria custar a vida" mas que nunca suspeitou que seria a mulher do Juiz Hidalgo; Raid Halbi, que mais uma vez põe à disposição da população de Água Santa, a sua preocupação e a sua sabedoria…


Isabel Allende cita Sherazade e "As mil e uma noites" antes de começar a contar a história de "Eva Luna". Ela é escrita em primeira pessoa, como uma autobiografia, pela própria Eva, que luta contra a pobreza, as dificuldades e o cepticismo numa América Latina dominada por ditadores.
E a autora explica sua preferência por mulheres que anotam suas memórias para que não sejam apagadas pelo tempo. "Minha mãe foi o guia de minha infância. Talvez por isso seja mais fácil escrever sobre as mulheres. Ela deu-me um caderno para anotar a vida na idade em que outras meninas brincavam de bonecas", diz Isabel.


Há livros que nos marcam. Outros que nos divertem, que nos entretêm. Outros ainda que nos mudam e com os quais aprendemos. “Contos de Eva Luna” é um desses livros, uma obra inolvidável que tem o dom de cativar quem se aventura pela riqueza das suas páginas, recheadas até à última linha de uma criatividade incomensurável.

Somos convidados a viajar pelo mundo, visitando desde recônditas aldeias índias na floresta Amazónica, até buliçosas cidades europeias, passando pelas gélidas paisagens de brancura do sul da Argentina. Assistimos a um desfile de personagens surpreendentes, todas elas partilhando de um sentimento comum: o amor. Vamos de encontro a camponeses e pessoas abastadas, guerrilheiros e videntes, conquistadores e tiranos.


Como definir os “Contos de Eva Luna”? Um agrupado de histórias seria justo, mas ainda assim insuficiente. Talvez uma colectânea de sublimes aventuras, ou ainda um emaranhado de narrativas que extravasam a vulgaridade, fantásticas e verosímeis, simultaneamente. Cada um deles vive de uma simbiose entre fantasia e a realidade: fantásticas porque as personagens são desenhadas pela autora, reais porque têm por matéria-prima um sentimento que existe, indubitavelmente.

Esta obra converte o leitor num devorador de peripécias. Preso desde a primeira página, tenta descortinar um fim para uma história que desde logo se apresenta como irresistível. Deixa-se enredar, vivendo as derrotas e conquistas dos protagonistas. Somos cúmplices de Allende, na medida em que sonhamos com o nos narra, escrevendo mentalmente o fim de que muitas vezes carece. Um livro que não nos “corta as asas”, que nos atribuiu a responsabilidade de rematarmos, a bel-prazer, o destino das personagens que nele intervêm.

Nota biográfica:
Isabel Allende (Lima, 2 de Agosto de 1942) é uma jornalista e escritora chilena nascida no Peru e actualmente radicada nos Estados Unidos da América. Uma das principais revelações da literatura latino-americana da década de 80. Sua obra é marcada pela ditadura no Chile, implantada com o golpe militar que em 1973 derrubou o governo de seu tio, o presidente Salvador Allende (1908-1973).
Escreveu A casa dos espíritos (1982) e ganhou reconhecimento de público e crítica. A obra é filmada em 1993 por Bille August, tendo como Portugal a servir de cenário, com Jeremy Irons e Meryl Streep.