18.7.05

Cronologia (incompleta) da revolução portuguesa em 1975



10/1/1975 – Acordos do Alvor entre Portugal, MPLA, FNLA e UNITA para a independência de Angola

14/1/75 – Manifestação a favor da Unicidade Sindical ( estima-se em meio milhão de manifestantes)

16/1/75 – Manifestação promovida pelo PS e que reúne todas as forças direitistas contra a unicidade sindical

21/1/75 – Governo aprova a Unicidade sindical, com apoio do PCP e oposição do PS e PPD

26/1/75 – Realização do Congresso do CDS no Palácio de Cristal, no Porto, que foi sitiado por manifestantes anti-fascistas

28/1/75 – Manobras da NATO em Lisboa. O desembarque previsto para dia 31 não chega a realizar-se.

2/2/75 – Trabalhadores rurais ocupam as terras abandonadas da Herdade do Picote, em Montemor-o-Novo

15/2/75 – Protocolo adicional à Concordata reconhece o direito dos católicos ao divórcio

21/2/75 – Apresentação do Programa Económico de Transição, elaborado por uma equipa chefiada pelo Major Melo Antunes

11/3/75 – Tentativa abortada de golpe de Estado por parte de militares afectos ao general Spínola. Este e mais 18 oficiais fogem para Espanha. O RALIS sofre um ataque aéreo onde morre o soldado Luís

Na sequência do golpe, as sedes dos partidos direitistas são assaltadas.

14/3/75 – Nacionalização da banca e seguros, seguindo-se as principais empresas dos grupos económicos nacionais.
(Intervencão do Estado nas empresas (Dec.-Lei 222-B/75 de 12 de Março; e Confirmação do encerramento da bolsa (Despacho de 16 de Agosto de 1975)

15/3/75 – A Junta de Salvação Nacional que assumira o poder em 25 de Abril de !974 é substituída por um novo órgão, Conselho da Revolução, que se torna o órgão mais importante do poder político.

23/3/75 – São publicamente reveladas informações sobre os preparativos para acções de terrorismo de direita, tendo por protagonista uma organização contra-revolucionária clandestina que dá pelo nome de ELP.
O Conselho da Revolução institucionaliza as ADUs ( Assembleias de Delegados de Unidade) que gera um verdadeiro processo de democratização da vida nos quartéis.

26/3/75 – Tomada de posse do 4º Governo Provisório, chefiado por Vasco Gonçalves

27/3/75 Costa Gomes, presidente da República, recebe ao longo da semana os embaixadores dos países da NATO

31/3/75 - Realizam-se as primeiras ocupações de terras no Alentejo. Criação do Subsídio de desemprego

7/4/75 – O MFA ( O Movimento das Forças Armadas, que protagonizou o golpe militar em 25 de Abril de 1974 que levou ao derrube do regime fascista) confirma a «via socialista»

11/4/75 – Assinatura do Pacto constitucional MFA- Partidos

15/4/75 – Aprovadas as Bases da Reforma Agrária

25/4/75 – Realização das primeiras eleições livres para a Assembleia Constituinte: PS é o mais votado (37,9%), PPD (26,4%), PCP (12,5%), CDS (7,6%), MDP (4,1%), UDP (0,8%).

1/5/75 – Incidente nas comemorações do 1º de Maio, alegadamente por Soares não conseguir entrar na tribuna.

5/5/75 – Formação do MDLP, organização contra-revolucionária clandestina chefiada por Spínola

19/5/75 – Início do conflito no jornal «República» entre os trabalhadores e a direcção ( ligada ao PS) . Os elementos do PS retiram-se do Governo como forma de protesto, acusando o PCP. Mas no dia 30 de Maio o PS regressa ao governo.

27/5/75 – A Rádio Renascença, propriedade do Episcopado, é ocupada pelos trabalhadores e começa a emitir programação a favor do avanço da revolução.
Aprovação da Lei do Divórcio

28/5/75 – O COPCON ( organismo militar com força operacional) ocupa as sedes do MRPP e prende 400 militantes.

30/5/75 –Instituído o serviço cívico estudantil

2/6/75 – Abertura solene da Assembleia Constituinte

25/6/75 – Independência de Moçambique

29/6/75 – Fuga de 89 pides da prisão de Alcoentre

30/6/75 – Início de combates na cidade de Luanda entre MPLA, FNLA e UNITA

2/7/75 – Como protesto contra a decisão do governo de entregar a Rádio Renascença ao Episcopado, trabalhadores e organizações partidárias e cívicas manifestam o seu apoio à luta dos trabalhadores da RR, formando piquetes para evitar a entrada nas instalações de gerência.

3/7/75 –Manifestação operária em Lisboa, convocada pelos trabalhadores da Siderurgia, exigindo o julgamento dos pides, e responsabilizando o governo pela fuga dos pides além de manifestarem solidariedade aos trabalhadores da Rádio Renascença

5/7/75 – Independência de Cabo Verde

8/7/75 – MFA aprova o chamado «Documento-Guia da Aliança Povo-MFA», consagrando o Poder Popular, e que merece críticas do PS, PPD e CDS

Em S.Pedro da Cova a população ocupou as instalações da Companhia de Minas, encerradas desde 1970, transformando-as em Centro Revolucionário Mineiro, deliberando também deixar pagar as rendas de casa e entregá-las ao referido Centro.

10/7/75 – Manifestação popular de apoio ao Documento aprovado na assembleia do MFA, promovida pelo PCP, MÊS, PRP, UDP, FSP, MPD,LCI e Intersindical.
Entretanto, o PS abandona o Governo, seguido uma semana depois pelo PPD

12/7/75 – Independência de S.Tomé e Príncipe

13/7/75 –São destruídas sedes do PCP ( em Rio Maior) e da FSP (Frente Socialista Popular, um partido formado a partir da ala esquerda do PS).
Têm aqui início uma série de acções violentas contra as sedes de partidos e organizações políticas de esquerda, registadas por todo o país mas com maior intensidade no Norte e Centro. Esta onda de violência conotada com as forças contra-revolucionárias ficou conhecida por Verão Quente.

18/7/75 – Grande manifestação das comissões de moradores e de trabalhadores na cidade do Porto de apoio às decisões da Assembleia do MFA que aprovou o Poder Popular.


19/7/75 – Comício do PS na Fonte Luminosa, na Alameda ( em Lisboa), com a presença de milhares de manifestantes contra-revolucionários, onde o dirigente do PS, Mário Soares, exige a demissão do primeiro-ministro Vasco Gonçalves
No Porto elementos desconhecidos destroem as sedes de partidos progressistas (ex.: MDP), enquanto militantes do PS cercam as instalações do Rádio Clube Português

25/7/5 – Assembleia do MFA

27/7/75 – Congresso da Intersindical

31/7/75 – MPLA controla Luanda. Intensifica-se a ponte aérea que traz de regresso muitos retornados portugueses que viviam em Angola, e noutras colónias.

7/8/75 – Um grupo de destacados oficiais entrega ao Presidente da República, general Costa Gomes, o chamado «Documento dos Nove», que é apoiado pelo PS e por todas as forças políticas da Direita.

8/8/75 – Tomada de posse do 5º Governo Provisório, com militares, independentes e militantes do PCP e MDP, chefiado pelo General Vasco Gonçalves.

11/8/75 – Destruição das sedes do PCP, do MDP e da União dos Sindicatos em Braga

13/8/75 – Apresentação do «Documento do COPCON» defendendo o «poder popular de base».

14/8/75 – São afastados 24 jornalistas do Diário de Notícias

18/8/75 – Vasco Gonçalves discursa em Almada

20/8/75 – Grande manifestação de apoio ao documento do COPCON

25/8/75 – Criação da Frente Unida Revolucionária ( que reúne várias organizações revolucionárias: FSP, LCI, LUAR, MÊS, PRP)

27/8/75 – Encerramento das instalações da 5ª Divisão, ordenada pelo COPCON e executada por unidades dos Comandos dirigidas pelo oficial contra-revolucionário Jaime Neves.
Manifestação de rua organizada pela FUR contra o capitalismo e a social-democracia.

29/8/75 – Costa Gomes, Presidente da República, demite Vasco Gonçalves, e nomeia-o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas que, no entanto, não assumirá por efeito da pressão exercida pelo chamado grupo dos nove»

5/9/75 – Curiosa Assembleia do MFA em Tancos onde os Chefes de Estado-Maior concentravam já em si próprios todos os votos que decide modificar a composição do Conselho da Revolução de forma a permitir a sua hegemonia por parte dos militares ligados ao «grupo dos nove»

10/9/75 – São desviadas 1000 espingardas automáticas G3 do quartel de Beirolas

10/9/75 – Criação de estruturas militares revolucionárias e manifestação dos SUV (soldados unidos vencerão) no Porto de apoio ao poder popular

12/9/75 Comício da FUR no Campo Pequeno a favor do Poder Popular
No Porto, a polícia a mando do Governador civil Socialista impede e dissolve a reunião do Conselho Municipal do Porto (que reúne as Comissões de Moradores, o SAAL, várias Comissões Sindicais, Cooperativas e Organizações Populares da cidade) .
O brigadeiro Eurico Corvacho é substituído à frente da Região Militar do Norte pelo coronel Pires Veloso, uma figura grada aos meios reaccionários.

17/9/75 – Grande Manifestação em Beja de apoio à Reforma Agrária, convocada pelo Sindicato dos trabalhadores Agrícolas e pela Liga dos Pequenos Agricultores, e apoiada pelo PCP

19/9/75 – Tomada de posse do 6º Governo Provisório, sob a chefia do Almirante Pinheiro de Azevedo, e composto por militares, independentes, elementos do PS, PPD e PCP, cujo programa político recebe o apoio da Confederação patronal.

20, 21 e 22/9/75 – Agudização da luta política nas ruas. Manifestação dos Deficientes das Forças Armadas. Prosseguem as nacionalizações.

25/9/75 – Nova manifestação dos SUV em Lisboa. Com o objectivo de retirar poderes ao COPCON, o 6º Governo Provisório cria o AMI (Agrupamento Militar de Intervenção)

27/9/75 Embaixada e Consulados espanhóis no Porto e Lisboa invadidos e destruídos por manifestantes que protestavam pela execução de 5 oposicionistas espanhóis pelo Estado fascista de Franco.


29/10/75 – Realização de uma manifestação no Porto convocada pela Comissão de luta dos quartéis CICAP/RASP com apoio dos SUV. Outra manifestação promovida pelo SU foi realizada no Entroncamento

2/10/75 Grande Manifestação em Beja convocada pelos Secretariados das Intercomissões de Trabalhadores e Moradores e pelos soldados da Base Aérea de Beja, a que aderiram os soldados do Regimento de Artilharia de Beja

1/10/75 – Pires Veloso, comandante da Região Militar do Norte ordena a desarticulação do CICAP, quartel situado no centro do Porto, e afecto às forças revolucionárias. Face à recusa por parte dos militares, Pires Veloso recorre ao Regimento de Comandos da Amadora para expulsar os militares revolucionários.

7/10/75 – Militares do CICAP, e de outras unidades,ocupam o RASP (Regimento de Artilharia da Serra do Pilar, em V.N.de Gaia)

8/10/75 - Ataque de elementos contra-revolucionários aos trabalhadores que apoiavam os soldados do RASP (Regimento de Artilharia da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia) contra as medida do coronel Pires Veloso.

9/10/75 _ Manifestação dos SUV ( calcula-se em 4.000 soldados) em Coimbra, com a presença de muitos apoiantes, e de muitas comissões de trabalhadores e de moradores

14/10/75 Fim da sublevação dos militares do RASP por intervenção persuasiva do Chefe de Estado-Maior do Exército, General Carlos Fabião.

15/10/75 – O 6º Governo manda selar as instalações da Rádio Renascença, ocupadas desde Maio pelos Trabalhadores, mas a ocupação mantém-se.


7/11/75 – Emissor da Rádio Renascença, na Buraca, é destruído à bomba por ordem do Governo - que para o efeito utiliza o AMI - como forma de eliminar as emissões e os programas de carácter revolucionário.

7,8 e 9/11/75 – Manobras militares a nível nacional com a participação dos 3 ramos das Forças Armadas cujo plano é a concentração de tropas no Norte, enquanto o «inimigo» é localizado no sul do país.

8/11/75 – Reunião plenária das Comissões de Trabalhadores da Cintura Industrial de
Lisboa

9/11/ Manifestação de apoio das forças contra-revolucionárias ao 6º Governo


12/11/75 – Grande manifestação de operários à frente da Assembleia da República
Continuam a onda de atentados bombistas contra militantes revolucionários e de ataques e destruição às sedes de sindicatos e partidos revolucionários ( no dia 12 em Aveiro, poucos dias depois no Porto com a destruição da sede da União dos Sindicatos do Porto e da sede do MDP)

15/11/75 – Juramento de bandeira no RALIS (um quartel às portas de Lisboa) de soldados com o punho fechado na presença do chefe de estado-maior do exército e de representantes das comissões de trabalhadores e moradores das zonas de Marvila, Beato e Olivais

16/11/75 – Manifestação de trabalhadores da cintura industrial de Lisboa

19/11/ 75 –Governo auto-suspende-se

20/11/75 – O Conselho da Revolução decide substituir Otelo por Vasco Lourenço à frente da Região Militar de Lisboa

23/11/75 – Comício do PS e de toda a reacção direitista

25/11/75 – Golpe contra-revolucionário dirigido por Ramalho Eanes que neutraliza as unidades militares de esquerda, e prendem e matam militares revolucionários. Na acção contra-revolucionária destaca-se o Regimento de Comandos da Amadora que ataca o Regimento da Polícia Militar.
O pretexto foi a acção levada a efeito nesse dia pelos pára-quedistas que tinham ocupado o Comando da Região Aérea de Monsanto e 6 bases aéreas para protestar e pedir a demissão do Chefe do Estado Maior da Força Aérea que acabara de mandar passar à disponibilidade cerca de 1000 soldados de Tancos.
Declaração do Estado de sítio (Dec. 670-A/75 de 25 de Novembro)

27/11/75 – Otelo Saraiva de Carvalho demite-se, e o COPCON é integrado no Estado Maior General das Forças Armadas.

17/12/75 – Criação de tribunais especiais.
Criação do CLARP ( Comité para a libertação dos antifascistas e revolucionários presos)

O que é o poder popular?

(texto de Miguel Serras Pereira, publicado na revista Vida Mundial de 24 de Julho de 1975)


«…a tomada de poder aparece-nos como sendo a transformação das suas formas de exercício e distribuição de sentidos, muito mais do que a simples transferência de uns para outros detentores…»
( Miguel Serras Pereira, ver texto a seguir )



Na medida em que este poder se opõe a outras formas de organização política de uma formação política, ele não pode ser definido pelo conteúdo ( intenções, etc) ou ideologia dos órgãos de poder político. Já se vê que não há, de um modo geral, poder que se diga antipopular – poder que se não diga ao serviço do povo, e que pelo bem do povo, pela posse de uma interpretação privilegiada dos verdadeiros interesses populares, se não pretenda justificar. Não se podendo, pois, de uma decisiva, distinguir o poder popular, na sua diferença, pela orientação do poder – esse é o erro ou sofisma de uma crítica oportunista como a de Bettelheim ao capitalismo de Estado russo na sua feição pós-Estaline -, teremos de o definir pela forma de exercício, pelo seu funcionamento. Assim, para retomar a questão russa como exemplo, é absurdo ( absurdo de todos os reformismos que, como é norma, não dizem o seu nome, o que permite qualificá-los como oportunismo) dizer que o poder político, sob a direcção de Estaline, seguia uma linha proletária, sendo por isso socialista, ao passo que o mesmo poder foi preenchido com uma linha política – a do Partido Comunista da União Soviética – classista após a morte do velho ditador, mediante a transformação da composição da sua direcção. Correcto será dizer que, tanto antes como depois de Estaline, mau grado todas as importantes diferenças e alterações, o poder não era proletário nem popular, pois não era exercido nem pelo proletariado propriamente dito nem pelo conjunto das massas trabalhadoras, mas antes em seu nome por um bloco social, ele próprio diferenciado e co as suas contradições internas, sintetizado pelo Partido e pela cúpula do Estado, que entre si dividia as diversas funções sociais de direcção, monopolizando o poder de coacção e os meios de violência organizada e institucional.
Para o que aqui nos interessa, portanto, o poder popular definir-se-á pelo exercício e pelo funcionamento. Este tipo de definição é o único que não só permite conceber uma alternativa revolucionária para o Estado classista e para a superação da superação entre os produtores e os meios de produção como permite estabelecer a sua existência e julgar das suas condições materiais de possibilidade. O poder popular será assim o exercício directamente pelo povo trabalhador e pelos seus aliados, constituindo um bloco revolucionário: democracia directa, formas cooperativas e autogestionárias, visando a superação do político e do económico pela sua desparticularização radical.
Antes de retomarmos e concluirmos este breve artigo de definição do poder popular, tarefa que bom seria ver objecto de uma batalha de produção ideológica, temos, por força das circunstâncias que de certo modo o provocam, de deter-nos um instante ainda, como já na anterior semana fizemos (cf. Poder Popular: consagração e equívocos), sobre o documento-guia. Da sua rápida confrontação com o tecto de Vasco Gonçalves, da não menos rapidamente obtível constatação da ausência de referências ao exercício do poder popular sobre a direcção da economia e, indirectamente, da leitura das razões que João Martins Pereira apresentou para se demitir do seu cargo governamental, de outras coisas ainda, talvez as principais, que não se vão repetir aqui e que ainda não estão clarificadas no ambiente amalgamado das horas convulsas que vivemos a nível político, podemos concluir que, tomando à letra o documento, com ele o MFA ou se engana ou nos engana. Em qualquer caso, o que queremos dizer é que a adopção de resoluções sobre o poder popular, por razões de Estado e na subordinação à força pelo menos arracional dessas razões, priva de ser o poder de que se fala ao privá-lo da sua soberania. Um poder segundo é um poder subjugado (fisicamente apenas ou física e ideologicamente também) e/ou um poder na oposição, um contrapoder contra o poder primeiro.
Se o poder popular implica a transformação da forma estatal do poder político e a sua colectivização material (dos meios de violência, das instâncias executivas e deliberativas), então vemos que a permanência do velho aparelho de Estado e por maioria de razão o reforço que dele se pretende, a sua estabilização, como é a ideia-chave do texto de Vasco Gonçalves, não só significa e permite aferir o atraso do poder popular como contra o desenvolvimento das suas condições de conquista da soberania trabalha e age. Com efeito, para além de ser um poder constituído ou herdado (como é o caso) em virtude de uma expropriação generalizada ( é o poder que as massas não têm), o Estado é um poderoso agente de segregação de camadas privilegiadas que às antigas se substituem, um poderoso agente de cristalização de novos blocos dominantes, um poderoso agente da reconversão da crise agudizada da sociedade de classes. Deste poder de Estado tem o poder popular, enquanto não lograr a sua transformação total. que se ir emancipando desde o começo e radicalmente.
É certo que outras ideias-chave, que não a de Vasco Gonçalves, permitirão uma leitura (que é sempre de natureza produtiva) com consequências diversas do documento-guia. A discussão de que ele tem sido objecto demonstra bem até que ponto a sua interpretação é uma dimensão de afrontamento e luta política. Mas o texto, com a letra que é a casa do seu espírito, existe, e a menos que ela seja falsificada, levanta, para além de todas as interpretações, problemas que estas têm servido para silenciar e para obscurecer o apuramento do seu conteúdo político.

Democracia Directa e Autogestão

NO debate político entre partido, entre reformistas e revolucionários, gradualistas e golpistas, com ou sem princípios, tudo isto dependendo do ponto de onde são observados - nesse debate temos um recalcado comum, um impensado cuja existência se denega: o problema da autogestão ou da gestão colectiva e igualitária da actividade directamente produtiva ou geralmente laboral.
Deixando de parte os partidos que, de um ponto de vista direitista, como o PS, se opuseram ao documento-guia, temos que quase todos os outros se reclamam, por virtude de interpretações diversas do documento, considerado como um forte avanço para a democracia directa ,para o tal poder popular. E, todavia, não se compreende bem, não se compreende mesmo nem bem nem mal o que possa ser tal democracia directa, tal poder popular, sem a transformação das relações de poder nos locais de trabalho, trabalho forçado, locais que são núcleos hierarquizantes, dominantes e sistematizadores das relações sociais de produção. Com efeito, se o âmbito da produção, no sentido um pouco restrito de actividade económica em sentido amplo, for excluído, furtado pelo poder a esta democracia directa, a este poder conselhista de que fala e contra os discursos do parlamentarismo se justifica como eminentemente democrático – não teremos democracia directa nem democracia nenhuma. Se, porém, democracia directa tivermos, então não se vê que objectivos de contestação e governo autónomo mais prioritários aos trabalhadores se podem pôr do que aquelas condições de existência que como tais os definem, pela exploração do salariato, e que não podem deixar de ser transformados na primeira linha de uma batalha anticlassista da produção.
A luta contra a hierarquia salarial e disciplinar nas empresas, a rotatividade dos cargos directivos particulares que transitoriamente subsistirem, o ataque rápido contra a divisão do trabalho e a unicidade das funções individuais, pela redução dos técnicos enquanto tais a um papel consultivo, a extinção da diferenciação entre dirigentes, concebedores e executantes, tudo isto parece uma luta a travar, desde já, com palavras de ordem como:
Por um salário único nacional (ou regional); Pela igualdade absoluta das condições de assistência; Por uma produção de riqueza e não de lucro; pela dissolução do exército e pelas milícias populares; pela soberania dos conselhos populares locais e de trabalhadores de empresa, etc.

Contra Representação

Um propósito de democracia directa é o do fim da representação e do princípio da delegação permanente, fundamentos do poder político classista moderno, com alienação definitiva da autoridade das massas populares. Mas nem por um momento a representação parlamentar da democracia ou vanguardista do socialismo (desta os exemplos clássicos são as concepções dos PCs, da esquerda maoísta, e um exemplo recente, português, de via original, é o aludido texto de Vasco Gonçalves), se esses modos de significar a apreender a realidade social fossem exclusivos de uma classe dominante e dois ou três grupos minoritários obtidos por recrutamento policial ou clerical menor, mantendo-se a classe operária e o conjunto dos assalariados puros e alheios a tais representações. Daí o podermos falar, sacrificando ao sempre pouco ocultador jargão oficial, de revolução cultural.
Se a crise da «humanidade», como se dizia, não é, ao contrário do que pensava Trotsky e os estalinistas que o perseguiam, a crise da sua direcção revolucionária, mas se, pelo contrário, a questão da revolução reside na passagem de uma qualquer direcção particular à colectivização da direcção e à sua dessubjectivação, também, por conseguinte, então a tomada de poder aparece-nos como sendo a transformação das suas formas de exercício e distribuição de sentidos, muito mais do que a simples transferência de uns para outros detentores, ideologicamente representada esta transferência como alteração dos conteúdos ou do reino dos fins visado.

O Bloco Histórico e o Poder Popular

Parece ser útil abordar aqui a questão, sempre magna, da aliança de classes para a constituição daquilo a que Gramsci chamava «bloco histórico» e que podemos chamar, por mor de clareza, bloco revolucionário. A necessidade de constituição deste bloco surge como justificação para todos os oportunismos, reformismos, tendo-se revelado escolho insuperável dos partidos ditos revolucionários de tipo vanguardista. Estes partidos pensam, com efeito, que este bloco se construirá, deve ser construído, em torno de um enunciação de objectivos políticos conciliados, capazes de mobilizar em torno dos assalariados da indústria as demais camadas exploradas e oprimidas de uma população nacional.
Na perspectiva do poder popular, pelo contrário, a tónica será posta de outra maneira. O bloco revolucionário constitui-se no próprio exercício das assembleias e outros órgãos locais em que a solidariedade de interesses, a comunidade de poder (deliberação e execução) é um facto e em que a concertação é directamente possível e não objecto de uma interpretação expropriadora do poder central. O modo, citado recentemente na TV, pelo qual as comissões de moradores do Porto resolveram o caso da expropriação dos terrenos e casas de habitação com perfeita salvaguarda dos rendimentos dos senhorios pobres é exemplar e dispensa grandes desenvolvimentos especulativos e conceptuais. A própria integração, desde a base, dos elementos não operários ou mesmo não assalariados nas comissões de moradores, nas cooperativas locais, nos órgãos, em suma, do poder popular, é a sua integração no bloco revolucionário, determinando, melhor do que o fará qualquer programa, a correcta dinâmica que u processo revolucionário deve seguir para encontrar a sua via e se desenvolver. A prevalência, directa e de facto, que não delegada ou presumida pela existência de um partido (único, já se sabe) da classe operária e por cima dela depositário da sua verdade, dos assalariados na direcção e dinamização do processo será garantida pela existência paralela das comissões de trabalhadores de empresa e pela gestão colectiva da economia.

Um Pluralismo radical

O radical pluralismo do poder popular ressalta com evidência necessária e cremos que suficiente das definições anteriores. Também aqui este pluralismo se distingue pelo seu carácter real e resultante das próprias formas do poder popular, que superam largamente aquele pluralismo representado elos partidos de ordem distante e que mais não fazem, do que impor ao conjunto dos cidadãos uma escolha que é sempre a da mesma relação relativamente a um poder que não detêm. Os órgãos de poder popular são, num sentido, apartidários. Noutro, serão mesmo antipartidários na medida em que são órgãos supremos do poder e na medida em que os partidos a que estamos habituados é como órgãos supremos de um poder diferente e antagónica natureza que se definem. Não quer, porém, isto dizer que, noutro sentido outros partidos, outra qualidade de partidos não possa ressurgir no interior do poder popular: correntes de opinião organizadas, grupos de animação e proposta, alternativas para as questões que se deparam para deliberação e resposta das comissões e conselhos. Alguns destes grupos serão mesmo mais avançados do que outros e poderão ser ditos de vanguarda. A diferença essencial está em que o poder lhes não pertence e em que eles não representam de modo privilegiado qualquer classe ou bloco revolucionário, menos ainda são o seu estado-maior ou órgãos de um poder exercido em seu nome mediante a liquidação do poder real daqueles cujo nome é evocado e representado. O poder colectivo e os colectivos são o poder. Outro não há que seja popular.

Miguel Serras Pereira, texto publicado na revista Vida Mundial nº 1871, de 24/7/1975

Relator da ONU denuncia novas formas de tortura


O relato especial da ONU sobre tortura, Manfred Nowak, afirmou que a incomunicabilidade prolongada, a existência de lugares secretos de detenção, e os desaparecimentos forçados podem ser considerados em si mesmos como actos de tortura.

Alojamento em Madrid


O Cats’ hostel é um albergue de Madrid com preços a 16 euros em habitação múltipla e 19 euros em quarto para duas pessoas.

Mais info:
www.catshostel.com
www.hostelworld.com
www.europefamoushostels.com
www.pensionesconencanto.com

Greve da Função Publica


Diversos sectores da Função Pública ( como na saúde, recolha de lixo, transportes e serviços, finanças e tribunais, segurança social9 realizaram no dia 15 uma greve para protestar contra asmedidas lesivas para os seus direitos tomadas pelo governo.

Documentário sobre Luiz Pacheco


«Chamo-me Luiz Pacheco. Fui escritor, escrevi em jornais. Agora sou um fantasma». É assim que Luiz Pacheco se apresenta num documentário acabado de ser produzido sobre a sua vida e obra, realizado por António José de Almeida, e que vais passar no canal 2 da RTP no próximo 22 de Julho.
Recorde-se que Luiz Pacheco, actualmente acamado num lar, foi autor de vários livros de carácter surrealizante ( exemplo: «O libertino passeia por Braga, a idolátrica, o seu esplendor» de 1970, além de ter fundado uma editora ( Contraponto) e ter sido o responsável pela edição de figuras importantes da literatura portuguesa e estrangeira
.

Despedimentos na Coksribas


A coksribas, empresa granuladora de cortiça,situada em S.Paio de Oleiros despediu 13 dos seus 82 trabalhadores, comunicou a Comissão de Trabalhadores que acusa administração de uma gestão danosa