28.9.05

Aviso


Por motivos de força maior, de carácter pessoal, decidimos suspender temporariamente a actualização regular de textos e informações no http://Pimentanegra.blogspot.com
Agradecemos o apoio e incentivo que recebemos.
Prometemos regressar com a brevidade possível.
Mais determinados e com mais pimenta.
Obrigado por tudo.
.
Nota 1: é possível que façamos algumas actualizações durante este interregno, cuja duração é indeterminada, mas só para manter o blog operacional.
.
Nota 2: nunca esquecer que este é o mundo virtual, e que o mundo real é aquele onde vivemos e onde se desenvolvem as solidariedades, as resistências, as transformações sociais e individuais, as tristezas e alegrias da vida.
.
Nota 3: quando estiverem reunidas as condições para o nosso regresso que, esperamos, seja tão breve quanto possível, comprometemo-nos a avisar pessoalmente por e-mail os nossos amigos que tiveram o gesto amigo e solidário de nos escrever até agora.Um abraço solidário.
.
Contacto:
PimentaNegra@hotmail.com

Os activistas «anti-consumismo» querem mudar o mundo, independentemente dos partidos

(tradução de um texto do Le Monde de 25 de Set de 2005)

Joana, de 23 anos, faz parte dos que começaram o seu empenhamento político a partir de investidas contra os anúncios publicitários no metro parisiense durante o Inverno de 2003. Num restaurante associativo, um pouco maior que uma sede de uma associação de estudantes, em pleno bairro de Belleville, em Paris, e apoiada numa comprida mesa de madeira Joana recorda-nos a sua primeira «acção directa»: Estava impressionada e excitada. Acabara de encontrar uma maneira de agir politicamente sem que ninguém o fizesse em meu nome».
Nesta cantina, que serve ao mesmo tempo de cozinha, cerca de 30 jovens dos 20 aos 30 anos discutem ao longo da tarde assuntos como os ceifeiros dos OGM ( transgénicos), a subida do preço do petróleo, ou como o óleo vegetal pode substituir a gasolina nos automóveis. São elementos do RAP (Résistance à l’agression publicitaire, Resistência à agressão publicitária) ou de movimentos libertários.
É aqui que se reúnem os activistas anti-consumismo, aqueles que organizam operações de tapagem dos painéis publicitários, acções de boicote, esvaziamento de pneus dos jeeps e que participam nas paródias das missas, em plena rua, ao ar livre, em nome de uma imaginária «Igreja do Santo Consumo».
Desde o ano de 1999 estes grupos, tais como os «anti- 4×4» que militam contra os veículos de todo-o-terreno dentro das cidades, o colectivo «Vélorution» que preconiza a substituição dos automóveis pelas bicicletas, ou «Chiche», um grupo de jovens ecologistas que se multiplicam num mosaico de tendências, à imagem dos altermundialistas. Entre os «anti-consumismo» coexistem os ecologistas puros e duros, que vivem sem carro, sem frigorífico, ao lado de anarquistas nómadas ou squaters, a que não faltam os habituais frequentadores dos tribunais de pequena instância.
O seu ponto comum é a vontade de militar à esquerda «fora dos aparelhos partidários», assim como transformar as manifestações em momentos «lúdicos». Munidos de marcas indeléveis, de panfletos realizados nos seus computadores, e trazendo muitas vezes narizes de clowns (palhaços), eles pretendem pôr em causa a sociedade de consumo, na linha dos movimentos do Maio de 68, mas num contexto económico infinitamente mais difícil que a dos que os seus pais conheceram.
Contra o produtivismo, eles denunciam uma sociedade baseada num consumismo exponencial legitimado na ideia do crescimento. Os seus livros de cabeceira são, desde os anos 1970, «A Sociedade do Espectáculo» de Guy Debord, «1984» de George Orwell. Mas, hoje, longe das barricadas do Maio de 68, eles transformaram-se nos movimentos anti-OMC (Organização Mundial do Comércio), surgidos a partir de Seattle (1999), nos anti-G8 de Génova (2001), que se tornaram os referentes fundacionais deste novo activismo. Outro elemento referencial foi, sem dúvida, o livro «No Logo» da jornalista canadiana Naomi Klein que contesta a «tirania das marcas»
«Todos os opositores ao neoliberalismo convergem na luta contra a publicidade, vista como o carburante do actual sistema capitalista», explica Sébastien Darsy, autor do livro «Temps de l’anti-pub» ( Actes Sud, 2005). Entre os activistas « anti- 4×4», «anti-tv», «pró-bicicleta» e «anti-publicidade» as fronteiras não estão definidas e são frequentes e mais que muitas as relações entre si.
«Os colectivos criam-se e desaparecem», explica Ludovic Prieur, coordenador do site Internet Hactivist News Service (HNS), uma das fontes de informação destes colectivos. «Alguns envolvem-se na luta contra a publicidade; amanhã será a vez dos «anti-4 × 4». Passa-se de um território de luta para outro» Da mesma maneira, as relações com outros grupos europeus relevam mais das relações interpessoais do que de redes estruturadas e coordenadas. «Nós temos apenas relações pontuais, aquando da organização de certas manifestações como do Euro May day, o 1º de Maio contra a precariedade, o Dia sem marcas, etc», explica Ludovic Prieur. »depois cada um volta para sua casa, numa atitude de precariedade positiva»
Este zapping de iniciativas reflecte o funcionamento destes movimentos, como se a Internet tivesse transformado as formas tradicionais do militantismo. « A informação circula muito rápido graças aos blogs, às newletters, aos e-mails», esclarece Philippe Colomb, activista que está à frente da associação «Vélorution». Avisamos todos e passamos à acção. Mas esta liberdade de acção tem um preço: «Há muito turn-over. É difícil manter no tempo toda esta nossa militância», lamenta-se Philippe Colomb.
Estes activistas têm, ainda assim, os seus referentes. O tom libertário é dado claramente por Yvan Gradis, principal redactor da revista «Le Publiphobe» e co-fundador do RAP. E basta passar pelo local da associação, em Vincennes ( Val-de-Marne), para descobrir outros referentes. Entre material diverso, encontramos os textos dos pensadores do «decrescimento» como Serge Latouche, professor de economia na Universidade Paris-IX, François Brune, professor de letras, Paul Ariès, professor de ciências políticas em Lyon-II. Todos são subscritores da revista «La Décroissance», publicada pela associação «Casseurs de Pub», cujo conceito epónimo define a vontade de acabar com o crescimento económico, encarada como a fonte das actástrofes ecológicas e sociais. Esses autores são os mais «antigos» do movimento, segundo Sébastien Darsy: «Eles apontaram os referentes intelectuais, e que atraíram os mais jovens activistas».
Resta referir que os novos activistas acabaram por inovar, introduzindo novas formas de activismo «lúdico», inspirados nas acções da Adbuster americana, precursora da subversão artística dos painéis publicitários, e nas acções da Reclaim the Streets, que defende a «re-apropriação das ruas»
À sua maneira, os novos activistas «anti-consumismo» lembram a sua necessidade de fantasia imaginativa. É o que dizem e testemunham Jean-Christophe, 28 anos, que trabalha para a RAP, e Roger, 30 anos, engenheiro electrónico, no desemprego. Ambos estão profundamente empenhados no movimento e assumem-se como membros da «Geração-Precariedade».

Alguns livros sobre o movimento anti-consumismo:

La France rebelle, sous la direction de Xavier Crettiez et Isabelle Sommier, 2002, Ed. Michalon, 570 pages.

­ Le Temps de l'anti-pub, Sébastien Darsy, 2005, Ed. Actes Sud, 236 p.

Références idéologiques :­ No logo, la tyrannie des marques, Naomi Klein, 2000, Ed. Actes Sud, 574 p.

­ Démarque-toi ! Petit manuel anti-pub, Paul Ariès, 2004, Ed. Golias, 192 pages.

­ Putain de ta marque !, Paul Ariès, 2003, Ed. Golias, 526 pages.

­ Casseurs de pub, Raoul Anvélant, Paul Ariès, François Brune, Denis Cheynet, 2004, Ed. L'Aventurine, 300 pages.

Revistas :
Casseurs de pub et la décroissance ;
Le Publiphobe.

Acção de libertação do ar comprimido ( acerca de Os Esvaziadores)


Os esvaziadores dos 4 × 4


( tradução de um texto do Le Monde de 25 de Setembro de 2005)

O sub-ajudante Marrant concentrou as suas tropas num bar no centro de Paris. De dia, este pseudo-militar de 28 anos é estudante. À noite, dirige um pequeno «comando» armado de bombas de ar e sacos de lama sob o estranho nome de «Les Dégonflés» (Os Esvaziadores).
Esta estranha tropa atacou as ruas de Paris nas últimas duas semanas. O seu alvo são as viaturas todo-o-terreno 4 × 4 que se encontram nas ruas da cidade. Os pneus de 24 viaturas todo-o-terreno foram esvaziadas durante estas acções organizadas desde o dia 30 de Agosto. No passado dia 13 de Setembro outra dezena de 4 × 4 foram cobertas de lama. Nesta noite a área escolhida foi o bairro de Montpanasse. Pelo caminho descobriram um alvo ideal, um enorme Land Rover azul metalizado. Alguns «Esvaziadores» ocuparam-se a lançar lama sobre a viatura com as suas próprias mãos. « Estes veículos nunca foram para o campo, nós encarregamo-nos simplesmente de os levar até lá», desabafa um jovem de 25 anos, conhecido pelo nome de «sub-ajudante Gachet».
Um panfleto com alguns erros ortográficos é colado nos vidros. «Esta campanha utiliza métodos de acção directa que podem ser discutíveis. Mas é claro que numa sociedade de direito é preferível não se fazer a justiça pelas suas próprias mãos.. Por isso é que nós considerámos as nossas acções como actos de legitima defesa».
Os alvos são seleccionados com precaução, de preferência longe das residências. «Não queremos confrontos. Por alguma razão chamamo-nos «Os Esvaziadores», diz Urbain, um rapaz que se reuniu com o grupo, ao lado de Eric, Lili, Julien, Guillaume, Mathilde por ocasião de uma manifestação de protesto contra o dirigente da extrema-direita Le Pen em Abril de 2002. Têm-se encontrado, entretanto, nas manifestações anti-guerra e nos protestos estudantis. Este companheirismo activista veio a desembocar nas acções anti-publicidade no metro parisiense, o que lhes valeu, de resto, terem sido objecto de acusações judiciais.
Alguns deles são agora membros de «Os Esvaziadores». Têm entre 20 e 33 anos. Rapazes, sobretudo. A maior parte, estudantes parisienses de arquitectura, história, fotografia e marketing.
«A maior parte de nós vêm de um meio pequeno-burguês, excepto alguns de vêm de famílias desfavorecidas», declara o «sub-ajudante» Gachet. A principal motivação para a sua acção é a ecologia e o anti-produtivismo.
Uns militaram nos partidos políticos. Outros agem no seio de associações. Mas quase todos, hoje, situam-se à margem da política tradicional, que vêem como ineficaz e à qual opõem a acção directa. «Pretendemos suscitar na sociedade os debates que os políticos se mostram impotentes em promover e que possam sensibilizar as pessoas», diz-nos Eric, 33 anos, desempregado, que remata: «Simbolicamente até acho interessante estigmatizar os 4 × 4 com métodos de acção próprios de rapazinhos»

Vivienne Westwood lança na Grã-Bretanha uma T-shirt «eu não sou terrorista»


A conhecida criadora de moda e do design «punk» (imaginou o look dos Sex Pistols), hoje mundialmente já consagrada nos círculos de moda, acabou de lançar uma linha de t-shirts para denunciar o projecto de legislação antiterrorista que o governo Blair publicou.

«Eu não sou um terrorista. Por favor, não disparem.», proclama o slogan inscrito nas T-shirts, criadas por Vivienne Westwood, e cujas receitas de venda reverterão para a Liberty, uma das maiores associações de defesa dos direitos humanos da Grã-Bretanha.

«Esta t-shirt serve para pôr os britânicos a reflectir», explicou a conhecida designer de moda no decorrer da conferência de imprensa, acabando por se interrogar: «como alguém se sentiria se algum familiar fosse preso ou morto pela polícia, apesar de ser inocente.»

Fonte: AP

25.9.05

O exército mais incompetente do mundo

Segundo as estimativas do US General Accounting Office, citadas pela revista Manufacturing Technology News do passado dia 1 de Setembro de 2005, o exército norte-americano terá já utilizado desde o início da invasão mais de 18.000.000 balas de 5,56 mm para os seus M-16 e derivados.

Ora, sabendo que os porta-vozes da Coligação dos exércitos de ocupação estimam em cerca de 20.000 o número de insurgentes temos que concluir que terão sido usadas 90.000 balas por cada insurgente, sem que, apesar disso, tenham sido neutralizados.

Tudo isso mostra bem a ineficácia das forças armadas norte-americanas e como estão condenadas ao insucesso, tal é a sua incompetrência…

Fonte: RedVoltaire

Como seria o mundo, se a humanidade fosse constituída por 100 pessoas



Como seria uma amostra ( de 100 pessoas) representativa de toda a Humanidade


Se transformarmos a população da terra numa comunidade pequena de 100 pessoas, e se mantivéssemos as mesmas proporções que temos hoje no mundo actual, a humanidade seria assim constituída:

61 asiáticos
12 europeus
14 americanos (da América doNorte e do Sul)
13 africanos
01 australiano (Oceania)

50 mulheres
50 homens

67 não são Cristãos
33 são Cristãos ( católicos, protestantes e ortodoxos)

Desses 100 habitantes, só 6 pessoas possuíam 59% de toda a riqueza mundial, 13 teriam fome ou sofriam de má nutrição, 14 não sabem ler, e tão-só 7 teriam instrução a nível secundário

Das despesas anuais totais daquela comunidade no total de 3,000,000 dólares por ano:

- 181,000 dólares seriam gastos em armas e guerra...
- 159,000 dólares seriam gastos em educação...
- 132,000 dólares seriam gastos em saúde.

Finalmente, se você é daquelas pessoas que mantém os seus alimentos num frigorífico e as suas roupas num armário, então fará parte do grupo mais rico da Humanidade (isto é, 25% daquelas 100 pessoas)

E se tiver uma conta bancária, então isso significa que você será uma das 30 pessoas mais ricas no mundo ( naquela amostra de 100 pessoas que compõem aquela amostra da Humanidade)

Dessas 100 pessoas que fazem parte da amostra, 25 lutam para viver com 1 dólar ou menos por dia , e 47 pessoas lutam para viver com 2 dólares ou menos por dia.

12.9.05

Diário Íntimo de George W. Bush

26 de agosto

Voltei a perder com Dick no golfe. Devo mudar os tacos ou ir passear com Dick. Bárbara ainda não acabou de limpar a casa, apesar da ajuda dos empregados marroquinos. Telefonam-me de Miami... a propósito de não sei o quê de...Karina. Terei que lhes mandar dinheiro, é o mais certo. Hoje quis ler algo antes de me deitar, mas o livro estava de pernas para o ar. Continuo a repousar no meu rancho do Texas e estou mais que convencido que é mais fácil triunfar com um êxito do que com um insucesso.

27 de Agosto

Voltei a perder com Donald ao golfe. Devo mudar, sem falta, de tacos ou, então, destituir Donald. Bárbara ainda não acabou de limpar. Mantenho-me a descansar no meu Rancho do Texas, mas estou preparado para qualquer imprevisto que possa ou não acontecer, até porque o futuro sempre será melhor amanhã.

28 de Agosto

Voltei a perder no golfe com Patterson, e estou quase decidido a não aumentar-lhe o subsídio para a sua Igreja, a não ser que continue a ameaçar Chávez. Não esquecer que devo mudar de tacos.
Telefonaram-me de novo. Disse-lhes que não é a contaminação o que ameaça o meio ambiente mas as impurezas da água e do ar. Continuo no meu Rancho do Texas. Hoje ao ver um pôr do sol pensei que já é hora da raça humana entrar no sistema solar. Bárbara ainda não terminou de limpar. Devo mudar o cabo do telefone porque instalaram-no de pernas para o ar. Os tipos não sabem fazer nada Nem sequer servem de prismáticos.

29 de Agosto

Voltei a perder no golfe com a Bárbara. Devo mudar os tacos ou acabo por ser eu a limpar a casa. Continuo no meu Rancho do Texas a descansar. Ao ver um jogo de beisebol na televisão engasguei-me com...uma bolacha Prezzler, e isso foi porque, como disse Bárbara, não lhe puseram gelo. O pior foi que com...o sufoco, perdi o equilíbrio e fui contra a porta. Tenho que procurar New Orleans no mapa...a última vez que procurei acho que era a sul de Nova Iorque. Disseram-me que há lá, como no Brasil, muitos negros.

30 de Agosto

Voltei a perder ao golfe e nem sequer me lembro com quem, e tudo isso por causa do maldito telefone, a quem ainda não arranjaram o cabo, e que não parava de tocar. Falaram-me de não sei o quê de Katrina e New Orleans. Continuo a pensar que a melhor maneira de acabar com as inundações é secarem os rios e os mares. Algum tempo atrás já tinha proposto cortar as árvores para acabar com os incêndios, e espero que não demorem muito a darem-me razão. Que sorte a minha estar de férias no meu Rancho no Texas.

31 de Agosto

Hoje tive que suspender a minha partida de golfe. Devia ter ido com a Condolezza comprar sapatos de 500 dólares em Nova Iorque. Por não a ter acompanhado, vou ter que ir agora para New Orleans por causa de alguns negros que morreram. Bárbara disse-me que, no fundo, eles já estão habituados a morrer. Por isso não sei qual é o problema. Bárbara não percebe de política. Continuo no Texas.

1 de Setembro

Reparo agora que New Orleans fica no Louisiana. Só que não sei aonde fica o Louisiana. Dick informou-me que as pessoas de lá estão encantadas com o governo e que até lhe fizeram alguma ofertas sexuais. Acho que vou ter que ir lá, logo que deixe de chover. Vou telefonar a Condolezza para que deixe de comprar sapatos e perder tempo no teatro, e vá dar uma volta por New Orleans. Ninguém melhor que ela para falar com os negros e explicar-lhes que não é nada de pessoal.

2 de Setembro

Estou em New Orleans e não sei o que fazer. Aqui não se pode jogar golfe. Além disso, faz uma calor tremendo e não me agradam nada essas sessões de fotografia com refugiados. Tive que exigir que não me pusessem a abraçar com um...qualquer refugiado. Tiveram que ir buscar ao Misouri um casal de brancos.
Disse-lhes que rezassem.

3 de Setembro

Voltei para o Texas...Bárbara ainda não acabou de limpar. Hoje não vem ninguém jogar golfe. Hoje é o dia em que não vou perder

Tradução do castelhano. O original está em:
http://www.rebelion.org/noticia.php?id=19923

11.9.05

11 de Setembro de 1973: o dia em que a CIA derrubou uma democracia


Em Setembro de 1970 Salvador Allende ganha as eleições presidenciais no Chile e, desde então, é desencadeada uma violenta campanha de intoxicação e de agitação contra o governo de Unidade Popular até ao seu derrube por meio do golpe militar de 11 de Setembro de 1973, apoiado pelos Estados Unidos, no qual encontraram a morte milhares de pessoas, entre elas Allende, cujo Palácio presidencial foi bombardeado pelos aviões golpistas, e a partir do qual o Chile viveu o período mais negro da sua história, esmagado sob a ditadura fascista de Pinochet em que milhares de pessoas foram perseguidas, presas, torturadas e mortas, tendo muitas delas desaparecido.

Grande parte da responsabilidade das acções de desestabilização social e política deve ser assacada aos Estados Unidos, e muito particularmente às suas agências de informação, como a CIA, que estiveram muito activas durante todo o período por que durou o governo de Unidade Popular e que não se cansaram até Allende ter sido morto às mãos dos militares golpistas.

Com efeito, desde a eleição de Allende e a entrada em funções do governo de Unidade Popular o Chile tornou-se aos olhos dos norte-americanos um perigo para a «democracia», e a então Administração Nixon empenharam-se diligentemente em desestabilizar a democracia chilena, financiando as forças, as milícias e os partidos da extrema-direita e fomentando o golpe de estado militar

Recorde-se que Allende, logo que assumiu a direcção do governo chileno, tinha nacionalizado as grandes empresas e os bancos, em especial as empresas estrangeiras que exploravam os recursos mineiros do Chile, verdadeiros vampiros do povo chileno.

Allende tentou ainda levar a cabo uma política social a favor das camadas sociais mais pobres e exploradas, ensaiando formas democráticas de gestão.

O 11 de Setembro deve ficar na memória dos povos como uma página negra da luta pela liberdade e pela justiça, a fim de ninguém mais esquecer o que são capazes de fazer as multinacionais e os homens de mão dos Estados ricos aos países do sul que lutam pela salvaguarda das suas riquezas.
O 11 de Setembro é mais uma data em que os Estados Unidos derrubaram uma democracia e um presidente democraticamente eleito

Concerto de Joan Baez, símbolo da protest song, contra a guerra do Iraque


Joan Baez, figura simbólica do movimento anti-guerra do Vietname nos anos 60 e conhecida folk-singer e uma das mais conhecidas cantoras do que se chamou a Protest Song, deu um concerto gratuito contra a guerra do Iraque, vindo expressamente a Crawford (Texas) apoiar Cindy Sheehan, a mãe californiana de 48 anos cujo filho de 24 anos morreu no passado mês de Agosto em Bagdade.
Na ocasião Joan Baez declarou: «Aquando da primeira manifestação (contra a guerra do Vietname) nós eramos 10. Mas agora somos muitos».


http://www.joanbaez.com/latestnews.html

Por um recomeço de aulas sem marcas publicitárias, e contra o chorudo negócio dos manuais escolares


Apela-se aos pais, aos professores e aos jovens para rejeitar o assédio e o autêntico raid de consumismo comercial que os estudantes, as suas famílias e os professores são normalmente vítimas por ocasião do recomeço de aulas em cada ano lectivo.

Não faltam exemplos do assédio por parte dos publicitários e das mais variadas empresas junto da população e das comunidades escolares para a compra e posse de múltiplos objectos e materiais que são apresentados como imprescindíveis para o sucesso escolar, desde o material de informática até a empréstimos bancários, passando pelos mais diversos e imaginativos elementos e acessórios, sem esquecer o autêntico roubo em que se transformou o negócio chorudo dos manuais escolares, verdadeira fraude escolar que as famílias dos alunos são as principais vítimas. A penetração da publicidade e de produtos empresariais dentro das escolas torna-se cada vez mais uma realidade que importa denunciar, e sensibilizar todas as comunidades educativas para a sua completa rejeição.

Recusamos firmemente que os alunos e os jovens em geral sejam presas fáceis de operações de marketing e publicidade encapotada dentro do espaço escolar. Apela-se pois quer às famílias dos alunos, quer aos encarregados educativos de cada escola para boicotarem e não permitirem a entrada de marcas publicitárias dentro do recinto escolar como primeiro passo para uma educação não consumista dos jovens e para a sua descolonização mental, habituando-os e mantendo a sua educação fora da ditadura das marcas e da pressão e assédio da publicidade e do marketing.

A escola é, e deve manter-se, um espaço privilegiado de aprendizagem e autonomia o que pressupõe e exige a salvaguarda das crianças e dos jovens face aos apetites e pressões das firmas e das marcas comerciais, de forma a não serem vítimas de pulsões consumistas nem se tornarem consumidores compulsivos. A monocultura do consumismo dominante veicula padrões e valores que são forçosamente muito distintos da educação pública e da pedagogia escolar.

É preciso não esquecer que os publicitários funcionam como verdadeiros dealers à porta da escola: esperam pelas crianças e jovens, sabendo sobejamente que, quantos mais cedo os conseguirem convencer para o consumismo compulsivo e irreflectido, mais difícil se tornará a desintoxicação no futuro. É esse o objectivo do marketing e dos publicitários: tornarem as crianças e os adolescentes em jovens adictos de marcas e produtos a fim de que outras grandes empresas possam explorar em seu proveito outros jovens no outro extremo do planeta.

É, por exemplo, justamente por efeito da publicidade e de outros factores que lhe estão adjacentes que existe um número cada vez maior de crianças e jovens a sofrer de obesidade e de outras doenças.
Face à crescente agressão e penetração da publicidade junto dos alunos e respectivas famílias é preciso resistir de forma a preservar os valores e os princípios da educação e da autonomia e não permitir que a pedagogia escolar seja pervertida pelo mercado.

É preciso resistir às agressões e ao assédio da publicidade dentro da escola e junto dos alunos e estudantes

Mais info:
http://www.casseursdepub.org/

A Yahoo é informadora da polícia chinesa


A multinacional norte-americana Yahoo forneceu informações à polícia chinesa que levaram à detenção de um jornalista chinês e à sua consequente condenação a 10 anos de prisão, acusado por ter revelado segredos do Estado, informa o The Christian Science Monitor.
O jornalista condenado chama-se Shi Tao e trabalhava na redacção do jornal económico Contemporary Trade News e foi detido no passado mês de Dezembro depois de ter enviado um e-mail a um grupo de defesa dos direitos civis, sediado em Nova Iorque a propósito da comemoração do 15º aniversário da repressão na Praça de Tiananmen

A altura das mulheres-polícias espanholas vai baixar


Segundo foi anunciado pelo jornal El País do passado 9 de Setembro o regulamento do próximo concurso público para o ingresso nos corpos da Polícia do Estado espanhol vai diminuir a altura mínima exigida para os(as) candidatos(as) a serem polícias. Com efeito, a altura mínima para as mulheres-polícias passa a ser 1,60 e para os homens-polícias será de 1,70.
Não foi divulgado se tais requisitos se aplicam também aos agentes informadores do Cesid ( o nosso SIS), mas tudo indica que o tamanho e a altura dos informadores só será relevante para os oficiais-informadores do serviço de informações militares, que continuarão a ter que se submeter às exigências de recrutamento militar, não se aplicando, portanto, para os serviços civis de informações, os quais são indiferentes à estatura e altura dos respectivos elementos, valorizando antes a capacidade pessoal de dissimulação dos aspirantes a oficial de informação.

7.9.05

Os bibliotecários norte-americanos impugnam o Act Patriot


Os bibliotecários norte-americanos entregaram uma impugnação judicial contra uma cláusula do Act Patriot aprovado pela administração Bush que exige às bibliotecas fornecer ao governo os registos de empréstimos dos utentes das bibliotecas. A impugnação apresentada contra o Procurador Geral dos Estados Unidos, Alberto Gonzales, e o director do FBI, Robert Mueller, deu entrada num tribunal do Connecticut no passado dia 9 de Agosto e foi subscrita por uma biblioteca não identificada e pela União americana das liberdades civis (ACLU).
Os subscritores sustentam que a ordem do FBI de mostrar os registos das bibliotecas é claramente inconstitucional e que a proibição judicial vigente de falar publicamente sobre a impugnação é claramente inconstitucional por constituir uma restrição à liberdade de expressão. Por força dessa proibição as informações transmitidas pela Democracy Now baseiam-se no site da ACLU

http://www.democracynow.org/article.pl?sid=05/08/26/2134241&mode=thread&tid=25

Puta de fábrica

Puta de fábrica (Putain d'usine), livro de Jean Pierre Levaray

«Todos os dias iguais. Chego ao emprego e algo se precipita sobre mim, uma espécie de vaga de desespero, como um suicídio, como uma pequena morta, a sensação de ardência de uma bala na testa. Um trabalho já bem conhecido, uma sala de controle inundada de luzes – e colegas que, em certos dias, não têm vontade de se encontrarem. Trabalhamos juntos, mas nunca nos habituamos. Acaba-se até por desejar que a fábrica feche. Que seja deslocalizada, ou reestruturada, que aumente a sua produtividade e que baixe os seus custos fixos.
Parar, para quê ? Para não termos mais trabalho, e para que sejamos livres. Livres mas, claro está, com outro tipo de actividades.
Ninguém fala deste mal estar que atinge os operários com mais de 40 anos e que já há muito tempo não estão motivados para um trabalho que os faz sofrer. Mas que é preciso defender porque há a crise, o desemprego. E sempre é uma garantia para continuar a consumir, na falta de condições para viver dignamente.A equipa da tarde está em vias de ser substituída, feliz, por deixar o local. Será, depois, a nossa vez de aí estar durante 8 horas. Sentamo-nos no refeitório à volta das chávenas de café. As colheres giram moles, o estado de espírito de todos é o mesmo, tal como já a fadiga que nos invade frente a esta noite que vai ser longa.»Extracto do livro Puta de fábrica («putain d’usine») de Jean Pierre Levaray, operário numa fábrica de produtos químicos em Rouen e que não esconde o seu esforço para se evadir do mundo que descreve e no qual vive através da escrita.

O livro é uma reedição dos seus escritos de 2002 , revista e aumentada com a crónica «Après la catastrophe», ambos editados pela L’Insomniaque, e ainda o epílogo industrial «Plan Social». A actual edição é das edições Agone.

O Lago Tchad ameaça desaparecer


O lago Tchad evapora-se gradualmente. O crescimento demográfico, as actividades agro-pastoris a e desertificação estão a provocar uma preocupante degradação na fauna e flora. Recorde-se que o lago Tchad se situa no coração de um território árido e quente, na fronteira sul do deserto do Sahara. A sua superfície de água passou de 25.000 Km2 em 1963 para 5.000 Km2 nos anos 2000, ou seja, um recuo de500 km2 por ano, tendo tido uma importantíssima função económica já que fornece agua a mais de 20 milhões de pessoas distribuídas por 4 países: o Tchad, os Camarões, o Níger e a Nigéria. Para ele confluem os rios Logone, Chari e o Komadougou Yobé. Segundo os especialistas a continuar a este ritmo o lago desaparecerá daqui a 20 anos. A agravar a situação está a redução drástica da pluviosidade
Mais info:

http://www.monde-solidaire.org/spip/article.php3?id_article=2315

6.9.05

Para uma sociologia do hiperpoder ( o caso dos Estados Unidos)



A editora catalã Anthropos Editorial, que publica uma revista de sociologia com o mesmo nome, acaba de editar o livro «Repensar los Estados Unidos, para una sociologia del hiperpoder» com a direcção de Loic Wacquant, que reúne os textos distribuídos por dois números da revista francesa Actes de la Recherce en Scences Sociales (nº 138 e 139, de Junho e Setembro de 2001, respectivamente) sob o lema « A excepção americana». Nele se inclui as contribuições de vários investigadores como Pierre Bourdieu( dos imperialismos do universal), Roger Brubaker (para além a identidade), Dan Clawson, Peter Cookson, Frederick Cooper, Rick Fantasia ( uma ditadura sobre o proletariado), Paul Farmer (Quando amedicina se converte em indústria), Neil Fligstein ( o mito do mercado), Nicolas Guilhot ( os profissionais da democracia), Carole Persell ( o sofrimento do priviligiado:internados de élite e transmissão do poder), Barbara Rylko-Bauer, Teresa Sullivan, Elizabeth Warren, Jay Lawrence Westbrook.

Segue-se a tradução do prólogo de autoria de Loic Wacquant, sob o título «A América como profecia de autocumprimento»


A América como profecia de autocumprimento


Poucas sociedades opõem ao esforço de objectivação científica tantos obstáculos como os Estados Unidos. Tal não se deve à imensidade do seu território nem à sua diversidade social e cultural, mas antes ao facto de tratar-se de um país que, desde a sua origem, se pensou e sempre viveu como uma «nação à parte», que escapava às leis e as determinações que habitualmente governam a estrutura e trajectória das sociedades. A noção de «excepção», introduzida na era jacksoniana pelo fascinado visitante da nova república que foi Alexis de Tocqueville, e mais tarde retrabalhada por toda uma tradição de pensamento de carácter liberal, é um efeito cosubstancial da ideologia nacional, tal como declara o historiador Richard Hofstadter: «O nosso destino não é o de ser uma nação que gera ideologias, mas sim o de incarnar uma ideologia» (1). Como pode a Sociologia, ciência do normal e do comum, do regular e do secular, consagrada à implantação de «modelos e leis», segundo a formulação de Durkheim, e que provém de instituições sociais europeias com vestígios de um passado multissecular repleto de desigualdades herdadas, conseguir com esta visão apropriar-se desta «Nova Jerusalém»? Isto é, de uma sociedade de imigração fluida e móvel, uma sociedade impregnada de religião e formada no livre jogo do «fim» eternamente inalcançável e virada, não obstante, para o futuro, que encontra precisamente a sua unidade na crença da sua unicidade e na fervente busca de um destino manifesto a que está pretensamente destinada e que crê realizar em nome do género humano.
Outra razão é que o citado postulado da «excepção» não só proporciona uma referência impensada das artes, letras e do pensamento autóctone como também, e sobretudo, nas ciências sociais norte-americanas que se fundamentam, como demonstra Dorothay Roos em The origins of American Social Science (3) , em dois dogmas complementares e que constituem um mito fundador da nação, que só periodicamente é posto em questão para uma melhor renovação com recurso a novos conceitos. O primeiro é aquele que fala do «individualismo metafísico» e que, de Ralph Waldo Emerson a Richard Rorty como de George Herbert Mead a James Coleman, faz do indivíduo o fundamento infundado da acção, o valor e o seu saber. (4) O segundo considera que a América do Norte de deve definir em oposição às velhas sociedades europeias, rígidas e conflitivas, organizadas segundo esquemas colectivos historicamente retrógados e, portanto, condenadas à partida à estagnação e à decadência, a menos que se transformem segundo o padrão norte-americano que se inspira no antiestatismo, tal como o propõem as diferentes variantes do discurso actual sobre a globalização. Assim aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial com a teoria da «modernização», bem recebida por David McLellend, Daniel Lerner e Talcott Parsons.
Um terceiro factor, este mais conjuntural, aumenta ainda mais a força da ilusão da excepcionalidade da América do Norte: é que depois da queda do império soviético, e por efeito da instalação do seu capital económico, militar, jurídico e cultural através do planeta, esta tornou-se a nação-referência de toda a humanidade. O domínio sem precedentes que exercem os Estados Unidos por um duplo movimento articulado de atracção ( através da fuga de cérebros – brain drain – e a exportação, mediante os seus gabinetes estratégicos – think tanks - , fundações, agências comerciais e variados organismos classificados de não-governamentais) no movimento internacional de bens
Imateriais, meios de comunicação, arte, direito, ciência, filantropia, colocam-nos em posição de inculcar em todo o planeta a sua visão particular do mundo.(5) Os Estados Unidos têm, desde logo, a característica excepcional de, nos alvores do século vinte e um, ser a primeira sociedade da história dotada de meios materiais e imateriais para impôr o seu padrão político e social como estrutura de pensamento universal, e excepcional, é também o facto de o fazer, transmutando as suas particularidades em normas ( veja-se o ideal transhistórico) . Procedendo assim transforma toda a realidade à sua imagem e semelhança.
Um último obstáculo à sociologia da sociedade norte-americana reside nos discursos cruzados e cúmplices de celebração e denegação que sempre a acompanham e a envolvem num denso entrelaçar de pré-noções que derivam do senso comum e que, para lá do seu antagonismo, se põem de acordo para travar um conhecimento rigoroso do funcionamento das suas instituições. Por essa razão é que foi necessário reunir aqui os trabalhos de investigadores norte-americanos provenientes de todas as áreas disciplinares e acabar com o encantamento do mito fundador que converte os Estados Unidos na figura emblemática da prosperidade em aliança com a liberdade ( de trabalhar, de iniciativa, de aprender, de votar,etc), mas também para romper com a lógica do processo que pensa em termos de «ser a favor ou contra» a fim de inculpar ou inocentar. Tudo isso para que seja possível encontrar o modo para compreender e explicar as relações e os mecanismos sociais que não pelo facto de pertencerem a um contexto específico, são menos genéricos.
Um mercado de trabalho do proletariado que estala por estar sujeito ao despotismo legal do empresariato graças à repressão sem limites nem descanso dos sindicatos; crescimento da precariedade da classe média no próprio seio da prosperidade reencontrada devido à divisão da protecção social em camadas sociais; escolas de elite que outorgam aos herdeiros um quase monopólio da facto das posições superiores de poder e que se juntam à classe dominante, permitindo as famílias patrícias da costa Este com os novos ricos das outras burguesias regionais(6); um Estado que desregula o emprego e «mercantiliza» ilimitadamente a saúde, desenvolvendo uma política fiscal e industrial em benefício dos accionistas e dos sectores de ponta da «nova economia»; as redes e os estratagemas na base dos quais as grandes empresas dominam a máquina eleitoral, sem esquecer os atributos bizantinos da arquitectura política ( que se revelou na confusão jurídico-política da recontagem dos votos na Florida aquando da primeira eleição de George W. Bush); a relação entra a clivagem racial e o encarceramento massivo como «política social» que se propõe lutar não contra a pobreza mas sim contra os pobres, entendidos como a negação viva da ideologia nacional da oportunidades para todos; por último, a irrupção no campus universitário de um discurso fluído e confuso que releva mais da moral e da política que da teoria social, e que tem como efeito a fusão das estruturas de desigualdade no dissolvente retórico da (pluri)cultura; são outros tantos aspectos desconhecidos da realidade norte-americana e que se opõem a uma visão idealizada da América do Norte, hoje em dia hegemónica tanto dentro como fora das suas fronteiras.
Colocando de manifesto os efeitos da intrusão violenta e do império crescente do capital económico em todos os sectores da vida social, as análises deste livro contribuem para o progresso do conhecimento empírico dos Estados Unidos enquanto sociedade singular, mas também servem como analista histórico em tamanho real das transformações que se operam nos nossos dias em todas as instituições sociais submetidas ao seu tropismo. O facto de radiografarmos as instituições norte-americanas permite proporcionar materiais indispensáveis para uma antropologia comparativa de uma invenção do neoliberalismo na prática, já que os Estados Unidos, após a evolução sociopolítica dos anos setenta, se tornaram no motor teórico e prático da codificação e disseminação transnacional de um projecto ideológico que pretende submeter o conjunto das actividades humanas à tutela do mercado. Daí que o compêndio de trabalhos aqui reunidos apresenta não apenas um interesse científico mas também um interesse cívico, o que faz com que não fique apenas limita a um público universitário.


(1) Richard Hofstader, citado por S.M. Lipset, American Exceptionalism: A Double-Edged Sword, Nova Iorque, Norton, 1996,p.18, obra de grande utilidade pois oferece um catálogo dos tópicos mais importantes sobre esta temática; veja-se igualmente J.P. Greene, The Intellectual Construction of América: Exceptionalim and Identify from 1492 to 1800, Chapel Hill, University of North Carolina Press, 1993; e Byron E. Shafer (dir.), Is América Different? A New Look at American Exceptionalim, Oxford, Oxford University Press, 1991
(2) M.F. Jacobson, Barbarian Virtues: The United States Encounters Foreign Peoples at Home and Abroad 1876-1891, Nova Iorque, Hill and Wang, 2000
(3) D.Ross, The Social Origins of American Social Science, Nova Iorque, Cambridge University Press, 1991, e idem, «An Historian’s View of American Social Science», Journal of the History of the Behavorial Sciences, 29-2 (abril 1993), pp 99-112
(4) O excepcionalismo também serve de refúgio ao espiritualismo e sustenta uma visão heróica da história, tal como indica esta citação cheia de candor.de Seymor Martin Lipset «…a Providência encarregou-se de dotar uma nação de um Washigton, de um Lincoln, de um Roosevelt quando eram necessários…
(5) Y. Dezalay e I. Garth, The Intertionalization of Palace Wars: Lawyers, economists and the contest to transdform Latin American States, Chicago, University of Chicago Press, 2002
(6) Cujo representante caricatural bem pode ser o presidente George W. Bush, multimilionário, filho de Presidente e neto de Senador, nasido numa aldeia no Connecticut, antigo aluno ( medíocre) de uma das «academias» privadas descritas por Caoline Persell e Peter Cookson ( «Pensionnats d’élite: ethnographie d’une transmission de pouvoir», Actes de Recherces…, 138) e também neste livro o texto sobre o «Sofrimento dos privilegiados: internatos de elite », tendo passado mais tarde pelas Universidades de Yale e de Harvard, mas cuja imagem pública é de um jovem de uma cidade do Texas.

A poesia como resistência

O filósofo francês Jean-Luc Nancy lançou há já alguns meses atrás um pequeno livro intitulado «Resistência da poesia», no qual se pode ler a dado passo:

«É preciso contar com a poesia. É preciso contar com ela em tudo o que fazemos e pensamos fazer, nos discursos, no pensamento, na prosa e na arte em geral. O que quer que haja atrás desta palavra, e mesmo supondo que não haja nada que não seja datado, terminado, deslocado, eliminado, mesmo assim resta a palavra. Uma palavra com a qual há que contar porque assim ela exige. Podemos suprimir o «poético», o «poema» e o «poeta» sem grandes prejuízos ( talvez). Mas com a poesia com toda a indeterminação do seu sentido, e não obstante toda essa indeterminação, não há nada a fazer. Ela lá está, e sempre estará mesmo que a rejeitemos, que desconfiemos dela e que a detestemos (p23/3)

No original:


"il faut compter avec la poésie. Il faut compter avec elle en tout ce que nous faisons et pensons devoir faire, en discours, en pensée, en prose et en 'art' en général. Quoi qu'il y ait sous ce mot, et à supposer même qu'il n'y ait là plus rien qui ne soit daté, fini, délogé, arasé, il reste ce mot. Il reste un mot avec lequel il faut compter parce qu'il demande son dû. Nous pouvons supprimer le 'poétique', le 'poème' et le 'poète' sans beaucoup de dommages (peut-être). Mais avec 'la poésie', dans tout l'indéterminé de son sens et malgré toute cette indétermination, il n'y a rien à faire. Elle est là, et elle est là alors même que nous la récusons, la suspectons, la détestons. " (p.23/23)

Revista Crítica das Ciência Sociais dedica número temático aos estudos para a paz.


A revista de sociologia crítica, editada pelo Centro dos Estudos Sociais da cidade de Coimbra acabou de lançar o seu último número (nº71) dedicado à temática dos estudos para a paz. Inclui textos de José Manuel Pureza e Teresa Cravo (Margem crítica e legitimação nos estudos para a paz), Håkan Wiberg (Investigação para a Paz: Passado, presente e futuro), Vicent Martínez Guzmán (Filosofia e investigação para a Paz), John Galtung (Três formas de violência, três formas de paz. A paz, a guerra e a formação social indo-europeia), Tatiana Moura (Novíssimas guerras, novíssimas pazes. Desafios conceptuais e políticos), Rodrigo Tavares (Por que é a Europa uma região pacífica? Um novo quadro de análise), Elísio Estanque (Trabalho, desigualdades sociais e sindicalismo), Hermes Augusto Costa (A política internacional da CGTP e da CUT: Etapas, temas e desafios).
Recorde-se que os Estudos para a Paz aparecem como conhecimento crítico e, portanto, alternativo ao conhecimento paradigmático dominante no domínio das Relações Internacionais determinado pelos interesses egoístas, da violência e força dos Estados. Hoje, mais do que nunca, é preciso revitalizar estes estudos. Boa hora, pois, para o aparecimento de um conjunto de ensaios sobre esta problemática.

A população índia no Brasil


A população índia no actual Brasil não é homogénea: comporta cerca de 220 povos que falam 120 línguas diferentes. Está estimada em 500.000 a 700.000 indivíduos, representando 0,3& a 0,4% da população total do país, e vivendo na sua esmagadora maioria ainda em aldeias.
Recorde-se que em 1500 quando Pedro Alvares Cabral descobriu a costa brasileiras o número de índios residentes no território do actual Brasil era estimado em 5 milhões. Desde então, muitos dos povos indígenas desapareceram por acção de massacres, escravatura, mortes e maus tratamentos, epidemias e a penetração da civilização predatória do capitalismo europeu.
Fonte: Le Monde

4.9.05

Os edukadores


Os edukadores (título original: Die Fetten Jahre sind vorbei) é o título de um filme do realizador Hans Weingartner que já está em exibição em Lisboa e que merece ser visto.
O argumento refere-se à actual luta contra a dominação capitalista e os seus personagens são três jovens berlinenses: Jan ( que defende que os mais ricos devem ser "edukados"), o seu companheiro de casa, Peter, que partilha os mesmo ideais, mas é mais descontraído, e Jule, a namorada de Peter, que se muda lá para casa porque já não consegue sobreviver com o seu salário de empregada.
Peter e Jan decidem invadir as mansões dos ricos, mexer nas suas coisas e deixar mensagens como «Os vossos dias de abundância estão contados» a fim de criar neles um sentimento de insegurança sobre o seu estatuto social privilegiado.
O enredo permite também o confronto entre duas gerações contestatárias: a de 1968 que, entretanto, se integrou socialmente, e a actual geração de contestação ao neo-liberalismo capitalista.
Com uma realização heterodoxa ( tipo câmara na mão), repleto de humor sarcástico e frequentes denúncias sociais, o filme serve sobretudo para reflectir nas melhores formas de criticar e contestar o sistema de domínio e exploração como é a economia de acumulação do capital.

Jedes Hertz ist Eine Revolutionäre Zelle!” (Todo coração é uma célula revolucionária!) é um exemplo de frases que marcam o filme.
Site oficial:
http://www.theedukators.com/

Alguns diálogos:

Quando Jule descobre que Peter e Jan são os Edukadores, ela pergunta a Jan porque invadem as mansões deixando mensagens como “Você tem dinheiro a mais” ou “os seus dias de fartura estão contados”:

Jan: - Para eles se sentirem inseguros mesmo com toda a segurança. É sinistro ter a casa invadida. Ter alguém que te vigia e vai continuar a vigiar

Jule: - Por que não pegam tudo e doam para os pobres?

Jan: - Eles contam com ladrões. Mas nós queremos que fiquem apavorados. Na fila do banco, vão ouvir sussurros: “Você tem dinheiro a mais”. Vão sentir-se completamente sozinhos. Nada poderá ajudá-los. Nem a fortuna, nem a mulher, nem a polícia.

Noutro passo Jan, Jule e Peter conversam com Hardenberg, milionário sequestrado pelos 3, num verdadeiro debate filosófico:

Jule: - Quantas horas por dia trabalha?

Hardenberg: - 13, 14 horas tranquilamente.

Jule: - O que faz com tanto dinheiro? Você acumula coisas. Coisas grandes, carros, mansões, um iate. Um monte de coisas para dizer: “Sou um macho poderoso”. Não vejo outra razão. Não tem tempo para curtir o seu iate. Então, por que é que quer sempre mais?

Hardenerg: – Vivemos numa democracia. Não devo explicações sobre os meus bens. Paguei por eles.

Jan: - Errado. Vivemos sim numa ditadura do capital. Você roubou tudo o que possui.

Hardenberg: - Posso possuir mais coisas porque trabalho mais. Tive as ideias certas na hora certa. E, além disso, não sou o único. Todos tem chances iguais.

Jule: – No sudeste da Ásia, muitos trabalham até 14 horas por dia e não têm mansões. Ganham 30 euros por mês. Também podem ter boas ideias mas não conseguem pagar uma viagem de autocarro à cidade vizinha.

Hardenberg: - Desculpe por eu não ter nascido na Ásia.

Jule: - Mas ainda assim pode tornar suportável a vida lá. O Primeiro Mundo devia perdoar a dívida do Terceiro Mundo. É só 0,01% do nosso PIB! Por que não fazem isso?

Hardenberg: - Seria o colapso do sistema financeiro mundial

Jule: - Vocês querem-nos pobres, para poder controlá-los... forçá-los a vender os seus produtos a preços ridículos.
(...)
Jan: - É a regra básica do sistema: exaurir todos até o limite para que não possam reagir.

Hardenberg: - Não é verdade. Claro, precisamos melhorar as coisas. Protecção ambiental, aumentar os preços do produtor... mas o sistema não vai mudar.

Jan: - Por que não?

Hardenberg: - É da natureza humana querer ser melhor que os demais. Todo grupo logo elege um líder. E a maioria só fica feliz quando compra algo novo.

Jan: - “Feliz”? Acha que as pessoas são felizes, Hardenber? Ei, abra os olhos. Saia do seu carro e ande pelas rua! Elas parecem felizes ou animais assustados? Veja suas salas de estar. Todas com a TV ouvindo zumbis chiques falarem sobre uma felicidade perdida. Passeie pela cidade. Verá a imundice, a superpopulação, as massas feito robôs nas escadas rolantes das lojas de departamento. Ninguém conhece ninguém. Acham que a felicidade está ao alcance mas ela é inalcançável porque você a roubou. É a vida. Você sabe muito bem. Mas tenho uma notícia para você: a máquina superaqueceu. Somos só os precursores. A sua época está a acabar. Enquanto você surfa na tecnologia, outros sentem ódio. Como as crianças das favelas vendo filmes de acção americanos. É só o começo. Haverá mais. Mais casos de insanidade, serial killers, almas destruídas, violência g
ratuita. Não pode neutralizar todo mundo com game shows e shoppings e os antidepressivos não vão funcionar para sempre. O povo está cansado da merda do seu sistema.

Hardenberg: - Admito que há alguma verdade no que falou, mas sou o bode expiatório errado. Eu jogo o jogo, mas não fiz as regras.

Peter: - Não importa quem inventou a arma, e sim quem puxa o gatilho.

Noutro momento estão Jan e Hardenberg a conversar , enquanto este lava suas roupas. Jan questiona-o como um ex-revolucionário que participou do Maio de 68 e agora se transformou num magnata insensível.

Jan: - Aposto que há muito tempo que não lava as sua s próprias roupas. Como é que alguém com o seu passado vive como você? Você teve ideais.

Hardenberg: -O meu pai dizia: “com menos de 30, se não és de esquerda és um desalmado. Acima dos 30 se continuares de esquerda és burro”.

Jan: - Eu sei, mas não acredito nesses baboseiras. É sempre a mesma desculpa.

Hardenberg: - Acontece devagar, aos poucos. A gente nem nota. Um dia, vendemos o carro velho. Queremos um mais seguro, com ar condicionado. Você casa-se, constitui família, compra uma casa. Educar os filhos custa caro. Segurança. Contrais dívidas, e começas a trabalhar para pagá-las e age como os demais. Até que numas eleições , para sua surpresa, o teu voto vira conservador.

Objectores do crescimento


A rede dos objectores ao crescimento e para o pós-desenvolvimento vai organizar nos dias 17 e 18 de Setembro em Brens, na região francesa de Tarn, encontros entre todos os interessados no decrescimento e no pós-desenvolvimento.
O movimento dos objectores do crescimento e do pós-desenvolvimento constituiu-se no seguimento da Conferência Internacional «Desfazer o desenvolvimento, refazer o mundo» realizada em Fevereiro de 2002 em Paris.

O buraco da camada de ozono atingiu a sua maior extensão


A Agência Espacial Europeia anunciou que o buraco da camada de ozono no pólo sul atingiu a sua máxima extensão desde o ano de 2000, ao ocupar uns 10 milhões de Km2, qualquer coisa como a superfície do continente europeu. Prevêem ainda que continue a aumentar até meados do mês de Setembro.
Os principais responsáveis são os compostos à base de clorofluorocarbonos, proibidos desde 1987, mas cujos efeitos – segundo os entendidos – soa se deixarão de sentir daqui a 10 anos.

Fonte: El País

Espanha já pensa em enterrar CO2 no subsolo

O governo espanhol lançou um projecto para armazenar o dióxido de carbono (CO2) debaixo da terra. As emissões de gases com efeito-estufa não param de aumentar e uma das soluções projectadas pelo governo espanhol é armazenar CO2 debaixo da terra a fim de cumprir o Protocolo de Kioto. Este projecto envolve 90 milhões de euros e foi entregue ao Centro de Investigações Energéticas, do Meio Ambiente e Tecnológicas (Ciemat)

Fonte: El País

ONU alerta para o perigo da extinção dos grandes símios


O panorama dos grandes símios ( gorilas, orangotangos, bonobos, chimpanzés) é desolador. Segundo o Atlas dos Grandes Símios e da sua conservação publicado por estes dias pela ONU estas espécies correm o risco de desaparecer nos próximos 30 anos se o meio ambiente em que vivem continuar a degradar-se como aconteceu até agora. Entre as causas figura a pobreza dos países que albergam estas espécies e que facilita a sua caça e a desflorestação dos habitats.

Fonte: El País

«O novo militarismo americano», um livro de Andrew Bacevich


«The New American Militarism: how americans are seduced by war», cujo autor é Andrew Bacevich, professor, veterano da guerra do Vietname, lança um libelo contra o complexo militar-industrial norte-americano, fornecendo não argumentos mas muitos dados sobre o crescendo militarismo norte-americano. Uma leitura útil, pois.

Reproduz-se aqui um comentário retirado de uma conhecida livraria virtual sobre este livro:

According to many of the custodians of public opinion, Andrew Bacevich has earned his right to a fair hearing. Not only is he a graduate of West Point, a Vietnam veteran, and a conservative Catholic, he is a professor of international relations and a contributor to "The Weekly Standard" and "The National Review." Obviously, if he were a left-leaning anti-war Democrat and a contributor to, say, "The Nation," he wouldn't be taken seriously as a critic of American militarism - he would be merely another "blame-America-first" defeatist.
Bacevich sees militarism manifesting itself in some disquieting ways. Traditionally America has always gauged the size of its military with the magnitude of impending threats. After the Civil War, World War I and II, the military was downsized as threats receded. Not so after the fall of the Soviet Union. The military budget has continued to grow and the expenditures are greater - by some measures - than all other countries combined. American military forces are now scaling the globe and the American public seems quiet comfortable with it. And everyone else is growing uneasy.
The mindset of the current officer corps is dominant control in all areas "whether sea, undersea, land, air, space or cyberspace." In other words, supremacy in all theaters. Self-restraint has given way to the normalization of using military force as a foreign policy tool. From 1989 (Operation Just Cause) to 2002 (Operation Iraqi Freedom) there have been nine major military operations and a number of smaller ones. The end of the Cold War has given the US a preponderance of military strength (the proverbial unipolar moment) that has enamoured successive administrations with the idea of using military force to solve international problems. In earlier times, war was always an option of the last resort, now it is a preventative measure.
War, according to Bacevich, has taken on a new aesthetic. During World War I and II, and also Vietnam and Korea the battlefield was a slaughterhouse of barbarism and brutality. Now, with the advent of the new Wilsonianism in Washington, wars are seen as moments of national unity to carry out a positive agenda, almost as if it were international social work.
The modern soldier is no longer looked upon as a deadbeat or a grunt, but rather as a skilled professional who is undertaking socially beneficial work. In fact, in a poll taken in 2003, military personnel consider themselves as being of higher moral standards than the nation they serve.
In the political classes, the Republicans have traditionallly been staunchly pro-military, but now even Democrats have thrown off their ant-military inclinations. When Kerry was running for president he did not question Bush's security policies, he was actually arguing that Bush had not gone far enough. Kerry wanted to invest more in military hardware and training. Even leftist Michael Ignatieff argues that US military intervention should be used to lessen the plight of the oppressed and that we should be assisting them in establishing more representative government. But superpowers are not altruistic; they are only altruistic to the extent that it serves their self-interest. That's probably why Ignatieff will not get much of a hearing and Bacevich will. This book should give us pause as to why the range of opinion in the America on the use of military force is so narrow. If there is one voice that stands a chance of being heeded, it is from this conservative ex-soldier.

Tariq Ramadan, intelectual árabe, vai ser conselheiro do governo de Blair


Segundo as notícias veiculadas pela imprensa oficial o conhecido e polémico intelectual árabe Tariq Ramadan, a quem o governo norte-americano recusou o visto de entrada nos Estados Unidos no ano passado sob a acusação de defender os terroristas, vai ser conselheiro do governo britânico....

3.9.05

O verdadeiro nome do Katrina é o aquecimento global


O furacão que arrasou a costa sul dos Estados Unidos recebeu o nome de Katrina pelo Serviço Meteorológico Nacional. Mas o seu verdadeiro nome é o aquecimento global. Quando o ano começou, a causa da nevada de 60 cm que caiu em Los Angeles foi aquecimento global. Quando os ventos de 200 Km fecharam as centrais nucleares na Escandinávia e cortaram o fornecimento de corrente eléctrica a centenas de milhares de pessoas na Irlanda e no Reino Unido, o factor impulsionador foi o aquecimento global. Quando uma grave seca atingiu o Oeste americano, reduzindo os níveis de água do rio Misuri a mínimos históricos, durante este Verão, o responsável é mais uma vez o aquecimento global.
Quando a pior seca registada há muitos anos atinge Espanha e Portugal, provocando incêndios, e os níveis de água em França são os mais baixos desde há 30 anos, a explicação está ainda no aquecimento global. Quando uma vaga de calor letal no Arizona manteve temperaturas acima aos 43 graus centígrados e acabou com a vida de mais de 30 pessoas numa semana, o culpado chama-se aquecimento global. E quando a cidade indiana de Bombaim acumulou um metro de água num só dia, matando 1000 pessoas e arruinando a vida mais de 20 milhões, o vilão tem o nome de aquecimento global.
À medida que a atmosfera aquece, gera secas mais prolongadas, chuvas mais intensas, vagas de calor mais frequentes e tormentas mais rigorosas. Apesar do Katrina ter começado como um furacão relativamente pequeno que assediava as costas do sul da Florida, a verdade é que veio a receber uma enorme carga de intensidade resultante das temperaturas abrasivas da superfície oceânica do Golfo do México. As consequências foram terríveis e aterradoras. Infelizmente muito poucos norte-americanos conhecem o verdadeiro nome do Katrina, já que as indústrias do carvão e do petróleo encarregam-se de gastar milhões de dólares a fim de manter a opinião pública na ignorância sobre a matéria.
O motivo é simples: permitir que o clima se estabilize exigiria que a humanidade reduzisse o seu consumo de carvão e petróleo em cerca de 70%. Ora isso ameaça logicamente a sobrevivência das maiores empresas. Em 1995 os serviços públicos do Minnesota descobriram que a indústria do carvão tinha pago mais de 800 milhões de euros a 4 cientistas a fim de que estes se mostrassem cépticos quanto ao aquecimento global. O ExxonMobil gastou mais de 10 milhões de euros desde 1998 numa campanha de relações públicas e de intoxicação pública contra a demonstração da existência do aquecimento global. Em 2000 os magnatas do petróleo e do carvão tiveram a sua maior vitória com a vitória do presidente George W. Bush que não tardou em seguir as suas opiniões sobre a política climática e energética.
À medida que a mudança climática vai evoluindo, muitos investigadores temem que já nos encontremos num ponto de mutação irreversível e descontrolada. Sob este pano de fundo a ignorância dos cidadãos norte-americanos acerca do aquecimento global reforça ainda mais as críticas dirigidas contra os meios de comunicação norte-americanos. Quando a imprensa dos Estados Unidos trata do tem do aquecimento global é para se dedicar aos seus aspectos políticos e diplomáticos, e não para o que o dito aquecimento está a provocar na agricultura, no abastecimento de água, na vida vegetal e animal, na saúde pública e no clima.
Durante anos a indústria dos combustíveis fósseis pressionou os meios de comunicação para que valorizassem mais a opinião de um grupo de cépticos do aquecimento global do que as conclusões a que chegou a Comissão Intergovernamental sobre a Mudança Climática ( constituída por mais de 2.000 cientistas procedentes de 100 países). Agora que a ciência viu confirmada as suas conclusões – e os impactos são evidentes, como mostram o que ocorreu no Golfo do México – a imprensa partilha também, com os sectores do carvão e do petróleo, as culpas pelo rasto de destruição que nos atingiu. Como habitante de Bóston tenho receio que o próximo Inverno – tal como no ano passado – seja rápido e extremamente rigoroso. Nos inícios de 2005 uma mortífera tormenta de neve deixava sem electricidade milhares de pessoas na Nova Inglaterra e uma camada record de 1,6 metros de neve cobriu a cidade de Bóston. O nome tradicional daquele mês era Janeiro. O verdadeiro é aquecimento global.

Texto publicado no The New York Times, de Ross Gelbspan, também autor do livro «The heat is on y Boiling Point»

Tradução para português a partir da versão publicada na edição do El País de 3 de Setembro de 2005

New Orleans a cidade da música e dos negros


New Orleans é conhecida como a The Big Easy pelos costumes permissivos, pela sua tolerância e inclinação para os prazeres mundanos. Os seus habitantes amam a boa mesa, a música e o divertimento, e os turistas não param de chegar em massa à cidade atraídos pela sua vibrante vida nocturna, os seus casinos e restaurantes.
Milhares de médicos, advogados e agentes de seguros assistem anualmente a multitudinários congressos no mesmos hotéis e centros de convenções convertidos agora em refúgio de desesperados.
A parte antiga da cidade, conhecida pelo nome de Bairro Francês, foi construído pelos espanhóis – a cidade esteve sob domínio da coroa espanhola entre 1772 e 1800 – e o seu ambiente subtropical recorda muito mais Habana, San José, Cartagena das índias do que Bóston. NY ou Washington. Ali os bares estão abertos 24 horas e não faltam tentações ao virar da esquina.
Habitada maioritariamente por pessoas de origem indígena, francesa, espanhola e africana, Nova Orleans é um mundo completamente distinto daquele outro que existe do outro lado da autoestrada número 10, dessa outra América puritana e furibundamente conservadora. Nove Orleans é também a Meca do jazz e uma das cidades com mais músicos por metro quadrado. Nela nasceram e viveram Duke Ellingtom, Louis Armstrong, Fats Domino, Louis Prima, Mahalia Jackson, Professor Longhair, Dr. John, or irmãos Neville, a família Marsalis, Harry Connick jr e tantos outros.
Mas a cidade sofre também uma merecida fama de corrupta e violenta, onde reina a prostituição, droga e marginalidade delinquente. Nova Orleans é a cidade norte-americana com o rendimento per capita mais baixo – a quarta parte dos seus habitantes vivem abaixo do limiar da pobreza – e o seu índice de criminalidade é dos mais altos dos Estados Unidos.
Em muito dos seus bairros populares, longe do bulício da parte antiga e do esplendor das mansões coloniais do Garden District, os gangs de jovens narcotraficantes armados entregam-se às suas rivalidades e impõem as suas leis.
Nova Orleans é uma cidade antiga em que sobrevive uma estrutura social herdada da época colonial. Brancos e negros misturam-se nos locais de trabalho, nos Carnavais e nos estádios, mas raramente nas zonas residenciais onde persistem barreiras difíceis de franquear. Dois em cada três habitantes da cidade são de raça negra, a maioria descendente dos escravos trazidos de África.
Quem trata hoje de sobreviver no superlotado Estádio da cidade e no Centro de Congressos são aqueles que durante o resto do ano dependem dos subsídios estatais para viver, são aqueles que careciam de meios próprios para seguir as instruções dadas para evacuar a cidade. São os mais pobres, na sua imensa maioria negros. São eles as vítimas desta catástrofe.

Texto de J.P. Velázquez-Gaztelu, publicado na edição do El País de 3 de Setembro de 2005

Feynman contra a burocracia administrativa

(Nota: Convém recordar que o conhecido cientista Richard Feynman, prémio nobel da Física, foi considerado deficiente mental pelo Exército norte-americano, que o dispensou do serviço militar e que, quando trabalhou no Projecto Manhattan nunca se adaptou à disciplina militar)



Em certa ocasião um funcionário do departamento de relações públicas de uma prestigiada Universidade contactou Feynmam para o convidar a dar uma conferência nessa Universidade. Feynman recebeu o funcionário em sua casa. Céptico e um pouco para se divertir explicou ao funcionário que evitava dar conferências por via da Administração por causa da papelada que habitualmente há que tratar. O funcionário, atencioso, riu-se e garantiu-lhe que no seu caso tudo será rápido e fácil.

- Será numa Faculdade, não é verdade?
- Sim
- Então gostaria de dar a conferência sob uma única condição: que não tenha de assinar a minha assinatura mais que 13 vezes, incluindo a o endosso do cheque.
- Não há problema. Trata-se já disso


A primeira assinatura foi logo para a aceitação do acordo. Pouco mais tarde Feynman teve que apôr a sua assinatura num documento ( em duplicado) em que assegurava que era leal ao governo, sob pena de não poder dar a conferência, outra assinatura para a Câmara local, e ainda outra para assegurar que era professor universitário em funções.O funcionário que o havia visitado estava a enervar-se uma vez que o número de assinaturas não párava de subir.
Feynman deu a conferência no dia aprazado. Brilhante, como sempre. Todo o mundo ficou maravilhado. Teve que assinar mais um documento a assegurar que tinha estado nessa Universidade a dar a conferência... e assim se somaram uma a uma até se atingir o número de 12 assinaturas. Pouco tempo depois, o funcionário apresenta-se na casa do físico trazendo o cheque.Para o receber Feynman tinha de assinar o cheque e um documento no qual declarava que havia realizado a tal conferência. Ou seja, teria que assinar mais duas vezes a sua assinatura, perfazendo 14 vezes.



- Se assino o documento não posso assinar o cheque. Como você esteve lá e escutou a minha conferência, então assine você pela minha vez.
- Ouça, não acha isto tudo um capricho – replicou o funcionário - Não, Foi um acordo que fiz consigo logo à partida. Você até pareceu que nunca chagaríamos às 13 assinaturas; mas foi o que foi acordado entre ambos, e espero bem que tal seja cumprido.
- Repare. Eu trabalhei muito e empenhei-me nisto. E o que me dizem é que não pode receber o seu dinheiro a menos que assine a declaração.
- Pois bem, se assim é, e como assinei já por 12 vezes, e como a conferência já foi realizado, prescindo do dinheiro.
- Detesto ter que fazer isto – balbuciou o funcionário
-Não se importe – rematou Feynman.



No dia seguinte o funcionário telefona desesperado: era impossível não lhe dar o dinheiro pois tinha havido autorização superior e havia que justificar a despesa já contabilizada.

- Bom, então dêem-me o dinheiro
- Mas você tem de assinar o documento
- Isso é não farei – retorquiu o físico

Depois de muito tempo, Feynman endossou a sua décima quarta assinatura, desfeito de riso, perante o alívio e a incompreensão do diligente funcionário.


Fonte:http://www.historiasdelaciencia.com/

Como Feynman foi considerado deficiente mental pelo exército norte-americano




Richard Feynman, Prémio Nobel de Física em 1965, para efeito da sua incorporação nas forças armadas dos Estados Unidos, foi obrigado a fazer um exame médico para o exército no ano de 1942, durante o qual foi considerado inapto, por razões de deficiência mental

Segue-se parte do diálogo dele com o psiquiatra que o avaliava:
Psiquiatra: Quanto você valoriza a vida?
Feynman: Sessenta e quatro
P: Por que você disse sessenta e quatro?
F: Como você espera que se meça o valor da vida?
P: Não! Eu quero dizer, por que você falou "sessenta e quatro" e não "setenta e três", por exemplo?
F: Se eu tivesse dito "setenta e três", você faria a mesma pergunta!



Fonte: «Você deve estar a brincar, Mr Feynman», livro do próprio. A edição portuguesa é da Gradiva

Bansky subverte o muro do apartheid de Sharon


O famoso, irreverente e anónimo artista britânico conhecido pelo nome de Bansky escolheu desta vez o Muro da Vergonha construído pelos israelitas e que serve para se apropriarem dos territórios palestinianos com mais valor, conquistado e ocupado pelo exército do Estado de Israel desde 1967.
Bansky desenhou algumas obras mordazes e imaginativas nas paredes do muro, já insistentemente considerado ilegal por várias instâncias internacionais. Bansky interroga-se mesmo se será ilegal fazer grafittis e desenhos num muro declarado ilegal pelo Tribunal Internacional de Justiça.
O artista esclarece que as suas acções servem para denunciar a todo o mundo que o Estado Judeu converteu a Palestina na «maior prisão ao ar livre de todo o mundo»

Para saber mais e ver os seus desenhos:
.

1.9.05

Já saiu o nº7 do Coice de Mula



Acabou de sair o último número ( nº7) do Coice de Mula, uma das publicações alternativas e contraculturais mais interessantes da imprensa escrita, desta vez sob o lema « Para a desindustrialização da arte».
Com um óptimo aspecto visual, este nº 7 do Coice de Mula contém um dossier sobre Agricultura Biológica, e outro sobre Anarquismo Naturista ( uma das correntes libertárias ainda mal conhecidas e muito pouco divulgadas). Inclui ainda um texto de David Watson ( « Contra a Mega máquina»), um artigo corrosivo sobre «Neo-aves e frangossauros» ( acerca das aves drogadas nos aviários portugueses), a reprodução de uma entrevista a Zeca Afonso e outros textos de análise social (como o que preenche toda a primeira página, «Técnica, Política e Canibalismo») e de humor sarcástico ( como, por exemplo, sobre os «uârquechopes»), sem esquecer uma página inteira dedicada à Banda Desenhada.
Contas feitas, trata-se de mais um extraordinário Coice de Mula, com uma qualidade notável, tanto a nível gráfico como dos seus conteúdos.

e-mail :
jornal_coicedemula@oninet.pt

contactos e subscrições:
Apartado 21477, 1134 Lisboa Codex Portugal

Pontos de Venda:
Almada: Centro de Cultura Libertária

Braga: Livraria Centésima Página

Coimbra: Café República Sé Velha

Évora: Quiosque Praça do Giraldo; Quiosque do Largo de Luís de Camões

Leiria: Livraria Arquivo; Café Pé do Rio

Lisboa: Livraria Ler Devagar; Quiosque do Rossio; Loja Suchi

Porto: Livraria Utopia; Quiosque do café Piolho

Portalegre: Livraria Tavares; Livraria 8.6

Setúbal: Zaragata
.
Nota: os interessados em adquirir a revista podem também contactar:

A liberdade e/ou libertação sexual



Facilitada pela contracepção, prescindindo do casamento, exibida às claras no espaço pública e tolerada em várias das suas variantes, a sexualidade não deixa de suscitar questões e interrogações acerca da real libertação sexual.


«À medida que enfraqueceu o peso da moral tradicional, com forte conotação religiosa, a liberdade sexual foi-se progressivamente afirmando como uma dimensão fundamental da autonomia individual e uma componente essencial do direito ao respeito da vida privada. A crise jurídica dos «bons costumes» fez sair do campo do direito penal um certo número de comportamentos doravante socialmente tolerados (adultério, homossexualidade, …), fazendo com que o direito penal só sancione os actos sem consentimento ( violação, assédio, …)», escrevem Daniel Borillo e Danièle Lochak na introdução de um livro sobre liberdade sexual.
Todavia a noção de consentimento não é simples senão na aparência. Há, bem entendido, os casos em que ela não se aplica, como o das crianças e das pessoas privadas de capacidade de avaliação Por altura dos escândalos judiciais, comportamentos outrora marginais, foram erigidas em modelos do que uma liberdade sexual tornada excessiva seria capaz de gerar - violações, incestos, sado-masoquismo – reclamando uma protecção acrescida das vítimas. Noutros casos, o consentimento dependerá da análise que se faça da situação. É, assim, que a liberdade dos indivíduos passou a ser alvo, desde os anos 80, pela crítica feminista relativamente à situação de autonomia desigual dos sexos: em que medida uma mulher, face à solicitação masculina, dá o seu consentimento? O delito de assédio, introduzido em 1992, visava compensar esta situação. A erotização dos media, a banalização da pornografia foram responsabilizadas por uma evolução inquietante da sexualidade dos jovens para com as violências sexuais, enquanto a prostituição levantava mais uma vez a questão da sua aceitação. Na falta de argumentos derivados da ideia dos «bons costumes», os seus adversários passaram a apelar para uma outra ideia que serve de base para os seus argumentos: a dignidade humana.
«A liberdade sexual não é uma liberdade como as outras», escreve D. Lochak: ela não é um direito do indivíduo, mas um aspecto da sua vida privada. Certos juristas não hesitam hoje a apontar o dedo às múltiplas intrusões da justiça, justificadas paradoxalmente pela modernização das normas sexuais. Os «bons costumes», uma vez postos de lado, levou ao direito contemporâneo a concentrar todos os seus esforços sobre o respeito do consentimento livre e outros princípios, como a dignidade da pessoa e a protecção das vítimas. A consequência é que a investigação dos abusos passa a intrometer-se na esfera da intimidade: os casos de processos por incesto, assédio, violação, abuso de menores entre parentes e amigos multiplicam-se e causam escândalo, originando a tese da decadência dos costumes. Mas qual é verdadeiramente a sua causa? O recuo da ética sexual ou será mais a intrusão do direito em domínios até ali não alcançados? É difícil responder.
Poder-se-á aceitar o que diz um jurista como D. Lochak para quem, paradoxalmente, a libertação dos costumes foi «a par com uma penalização cada vez mais espectacular dos comportamentos sexuais», dando lugar a um «enquadramento repressivo cujas malhas têm a tendência a apertar-se». Esta avaliação significará que a liberdade sexual atingiu os seus limites máximos sob a pressão de uma opinião pública inquieta e de um direito preocupado com as vítimas?

AMOR LIVRE OU DOMINAÇÃO MASCULINA ?

A paisagem das ideias é mais complexa que isso. Aonde podemos falar hoje de uma ideia como a da libertação sexual? O amor livre dos anos 70 parece não mobilizar as pessoas, em parte por causa da crítica feminista que eficazmente invocou a dominação masculina generalizada. Tendo como alvo a pornografia e a prostituição, que nunca gozaram de uma plena aceitação moral na população, a crítica feminista lançou a suspeita sobre a sexualidade como lugar em que se exercem as relações desiguais de poder, questionando portanto a autenticidade do consentimento. Mas nem todas as defensoras das mulheres seguem este diapasão: existe nos Estados Unidos, como na Europa, uma versão pró-sexo do feminismo que defende que é aceitável tanto o prazer como o dinheiro, e que é precisamente ao assumir este facto que permitirá às mulheres afirmar a sua autonomia. Este feminismo, representado em França por autores como Marcela Iacub ou Elizabeth Badinter, milita, por exemplo, por um reconhecimento e uma regulamentação da prostituição e, de uma maneira geral, para que a vitimização a priori das mulheres em matéria sexual não continue. Para além disso, o activismo dos movimentos gay e lésbico a favor de um reconhecimento da homossexualidade encarna hoje uma das formas mais visíveis de militantismo sexual. Se, como escreve Eric Fassin, « a heterossexualidade fica reduzida à dominação, então a libertação está do lado da homossexualidade».

Casamento: uma igualdade difícil

Em contrapartida, a igualdade coloca problemas, como bem mostra as resistências quanto à institucionalização dos casais monosexuais. Do casamento à família homossexual, passando pela adopção, já não é a sexualidade que está aqui em questão mas a identidade sexuada, isto é, a sua construção teórica. Podemos observar isso. quando em França se discutiu o casamento gay, e em que os antropólogos e os psicanalistas foram levados a defender a diferença dos sexos enquanto valor fundante da filiação ou da parentalidade. Em tais matérias nem o princípio do consentimento, nem o da dignidade humana, nem ainda a protecção dos mais fracos têm alguma pertinência. As normas sociais fazem do casamento uma instituição, por essência, heterossexual, sem que se saiba exactamente porquê. Um caso recente, relatado por E. Fassin, mostra-o claramente: um transsexual ( um homem que, mediante uma operação cirúrgica, adoptou traços femininos) e um transgénero ( um homem vestindo-se de mulher) apresentaram-se no Registo Civil e o seu pedido de casamento foi recusado, não obstante, a diferença dos sexos de ambos estar inscrita no estado civil, mas a sua aparência era a de duas mulheres, o que constituiu, aos olhos do responsável, uma provocação. Exemplos como este ilustram as perspectivas exploradas pelo teoria queer que se propõe mostrar até que ponto as identidades sexuais dos indivíduos são frágeis, uma vez que estão construídas sobre uma quantidade de factores independentes: biologia, aparência, práticas sexuais, papéis sexuais. Por exemplo: o que é um casal composto por um travesti e uma mulher: um heterossexual que se recalca associado a uma homossexual que se engana? Os jogos deliberados dos defensores da queer revelam uma liberdade que perturba não somente os usos sociais do sexo, como também toda a identidade sexual que daí resultaria. Daí que a sexualidade se torne, como explica E.Fassin, um «material» independente do género, eventualmente do casal, com todas as consequências que daí podem derivar. Assim, separada do resto, a sexualidade pode declarar-se livre, entregue à subversão das normas, elidindo a construção de novas.

Autor: Nicolas Journet
(texto publicado no nº 163 da revista Sciences Humaines, sob o título «La sexualité sous l’oeil de la critique»)

Bibliografia:
D. Borilio, D. Lochak (dir), La liberte sexuelle, PUF, 2005-08-09
M. Iacub, Qu’avez-vou fait de la libération sexuelle ? , Flammarion, 2002
C. Fabre, É Fassin, Liberté, égalité, sexualité, ed.Belfond, 2003
É.Fassin, «Trouble dans le mariage»,Liberation 15/6/2005