19.10.10

Mineiros chilenos dizem que não são heróis, mas vítimas de empresas que ganham milhões!


HINO DOS MINEIROS DE ALJUSTREL


Nas minas de Aljustrel...
Morreram muitos mineiros, vê lá!
Vê lá companheiro, vê lá!
Vê lá como venho eu...

Trago a cabeça aberta...
Que me abriu uma barreira, vê lá!
Vê lá companheiro, vê lá!
Vê lá como venho eu...

Trago a camisa rota...
E sangue de um camarada, vê lá!
Vê lá companheiro, vê lá!
Vê lá como venho eu...

Santa Barbara bendita...
Padroeira dos mineiros, vê lá!
Vê lá companheiro, vê lá!
Vê lá como venho eu...

Fonte:
http://farpakultural.blogspot.com/





Mineiros chilenos dizem que não são heróis, mas sim vítimas de empresas e empresários que ganham milhões, sem cuidar da segurança dos seus assalariados.
Para ler a notícia:
AQUI



Santa Bárbara - Hino dos Mineiros


Conversa com Jorge Valadas, e exposição de Ursula Zanger na Casa da Achada ( dia 23 de Outubro, às 16h.)


Sábado, 23 de Outubro, 17:00h
Itinerários - uma conversa com Jorge Valadas
Um percurso: de Lisboa a Paris, nos anos 60; hoje entre Paris e Tavira; do trabalho manual ao trabalho intelectual; mudar a vida, mudar o mundo – o emigrante, o imigrado, o militante, o autor de livros em francês, com ou sem pseudónimo, também sobre Portugal.


Sábado, 23 de Outubro, 16:00h
Inauguração da Exposição de Fotografia «Maria Helena Vieira da Silva e Arpad Szenes vistos por Ursula Zangger»
Com a presença da autora.

Até 8 de Novembro de 2010.

O Centro Mário Dionísio encontra-se na Casa da Achada, sedeada na Rua da Achada, nºs 11 r/c e 11B, em Lisboa, na Mouraria, na freguesia de S. Cristóvão e S. Lourenço, perto da Praça da Figueira.

Meia dúzia de banalidades sobre esta e outras sociedades de classe ( texto do Colectivo Hipátia)


Texto integral e os principais pontos apresentados à discussão pelo Colectivo Hipátia nas JORNADAS ANARQUISTAS E ANARCOSINDICALISTAS


A organização social do capitalismo tradicional, de mercado, alterou-se em grande parte. Agora, ao passo que a produção industrial absorve cada vez menos massas de operários, crescem as concentrações de trabalhadores nos serviços. A agro-indústria foi-se, a pouco e pouco, impondo à agricultura de subsistência. (ponto 18)

Com base numa superior capacidade produtiva, a necessidade de assegurar a fluidez das mercadorias fez crescer cada vez mais a concentração de serviços de comércio, banca e seguros. Essa mesma necessidade de protecção fez também crescer a tropa de choque policial, privada ou do Estado, até se tornar numerosa e influente quanto o próprio exército. (ponto 19)

A extensão da escola a uma cada vez maior massa de crianças e de jovens não tem que ver com uma apregoada cada vez maior qualificação do trabalho, pelo contrário cada vez menos exigente em competências e saberes e antes reduzido a formas estereotipadas e repetitivas de execução, mas a essa necessidade de libertação de mão-de-obra e controlo. (ponto 29)

A importância do trabalho para o capital significa a importância do próprio sistema do salariato. Assalariar é já subjugar. E lutar por assegurar uma sobrevivência fora do sistema de salariato é já atingi-lo no que ele tem de mais essencial. A divisa de Auschwitz «o trabalho liberta» ilustra esta importância. (ponto 36)

Lutar contra o trabalho é assegurar o triunfo sobre a colonização da vida de cada pessoa, que a reduz a peça avulsa de um mundo que lhe é alheio. Fulano ou fulana tornaram-se não a pessoa que são, em si próprias, com a sua riqueza e multiplicidade de saberes, competências, reflexões e afectos, mas meras designações de profissão. (ponto 37)

Quer a reinvenção de formas de sobrevivência que reciclam a dissipação e alienação do modo de vida dominante, quer a criação de formas horizontais e colaborantes do exercício de uma actividade de partilha e troca que assegure sobrevivência e empreste mais-valia à comunidade exemplificam que é possível viver a vida doutra maneira. (ponto 38)

Uma das formas mais importantes desta dissipação é o próprio desenvolvimento produtivista, que faz do chamado progresso um objectivo em si mesmo, sem atender de forma racional a que necessidades ele corresponde e a que preço se faz impor, muitas vezes arrasando as próprias comunidades, e trazendo o desespero e a miséria. (ponto 40)

De facto, à medida que, cada vez mais, o tão afamado progresso foi lançando para fora do processo produtivo cada vez mais massas de gente em progressivo empobrecimento, o lugar central da resistência anti-capitalista foi-se deslocando cada vez mais também para fora da grande fábrica ou empresa de serviços, cuja luta se resume sobretudo a manter o emprego. (ponto 45)

Por isso defendemos a luta social em todas as formas por que ela se manifesta, na relação laboral e fora dela, na divulgação do pensamento libertário, na luta por um modo de vida não predatório da própria natureza, contra as formas de coacção violenta e os aparelhos militares nacionais e planetários, nas lutas de emancipação sexual, contra o progresso tecnológico a todo o preço. Não somos anarco-sindicalistas, mas partilhamos um lugar na barricada dos que combatem a opressão hierárquica, económica, e de todos os tipos. (ponto 50)

Porto, 13 de Outubro de 2010
Colectivo Hipátia

* Texto (em 50 pontos) discutido e aprovado no Colectivo Hipátia a propósito das Jornadas Anarquistas e Anarcosindicalistas do Porto. O texto, pela sua extensão, dificulta a discussão na forma proposta na organização das jornadas, pelo que só propomos os pontos acima em destaque.
Durante a discussão no Colectivo Hipátia foi considerado deixar este texto em aberto para posterior nova discussão e enriquecimento em alguns pontos (o papel do pensamento utópico precursor da crítica à sociedade opressiva; o capitalismo de Estado e suas variedades – exemplos dos modelos da União Soviética e da China actual; o lugar na escola no mundo do capitalismo actual).

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Meia dúzia de banalidades sobre esta e outras sociedades de classe


Nascimento do proletariado moderno

1. O surgimento da máquina a vapor e o desenvolvimento de forças motrizes capazes de substituir a tracção animal vieram possibilitar a partir dos fins do séculos XVII e sobretudo a partir do século XVIII a concentração de meios capazes de uma produção industrial em larga escala que até aí nunca fora possível.

2. Esta concentração beneficiava agora das grandes rotas comerciais abertas a partir do século XVI, da atitude religiosa mais tolerante para com o mundo dos negócios trazida pelo Reformismo e, sobretudo, da existência de um campesinato desapossado e empobrecido, sem meios certos de sobrevivência.

3. Todas estas condições foram propícias à criação de um proletariado industrial numeroso, concentrado, a quem os frutos do trabalho eram extorquidos em longas e penosas jornadas, em ambientes insalubres e sob a disciplina de uma organização laboral de carácter hierárquico e para-militar.

4. A própria condição operária ficava ainda refém, para além de recursos curtos de sobrevivência, da existência de uma reserva de desapossados disponíveis para o trabalho, os quais os detentores dos meios de produção se propunham usar como forma de pressão sobre os que tinham trabalho.

5. Ainda assim foi essa própria concentração operária, com a comunicação permanente que permitia entre os assalariados, a contaminação com os ideais de liberdade que aqui e ali surgiam contra os restos do regime feudal e o pensamento utópico de homens livres, que ajudaram a despertar a consciência de si próprios como classe explorada – o proletariado.

6. As organizações operárias - os sindicatos, em particular - através das suas lutas, foram conseguindo então amenizar as duras condições de existência, tais como a duração da jornada de trabalho, os períodos de descanso, a assistência à doença e à velhice, conquistas estas obtidas com sofrimento e mesmo martírio, contra a resistência adversa e a violência.

7. Como horizonte da luta dos trabalhadores apontava-se a revolução social, isto é, havia uma consciência de que só fora do quadro da sociedade hierárquica de classes seria possível um mundo de liberdade e equidade. Tudo o mais eram apenas formas de mitigar a situação de miséria e opressão para uns, opulência e poder para outros.


Uma nova forma de capitalismo

8. Mas a própria organização dos proletários trouxe também com ela a pretensa necessidade de especialistas que, pouco a pouco, se foram retirando dos locais de trabalho para se concentrarem nas suas funções de discussão com os patrões e da organização de cada vez mais pretensos protestos.

9. À medida que a força proletária ia crescendo, a importância destes dirigentes para o desfecho das lutas, na óptica dos patrões, ia também crescendo, tornando-se pouco a pouco parceiros respeitados de negociação, cada vez mais alheios às necessidades reais da classe de onde tinham emergido.

10. Para muitos tornou-se necessária esta elite de dirigentes, por sua vez cada vez mais empenhados em justificar a sua função. As utopias da liberdade absoluta e da igualdade cederam lugar a uma via política mediatizada por estes dirigentes como caminho para alcançar a justiça social (o dito socialismo e a chamada ditadura do proletariado).

11. Para uns tratou-se de justificar a permanência da sociedade de classes tradicional, defendendo que a melhoria das condições de vida do proletariado deveria resultar da negociação e compromisso com os patrões. A via das reformas deveria conduzir, a pouco e pouco, diziam, a uma sociedade cada vez mais equitativa.

12. Para outros, tratou-se de defender a continuação da sociedade de classes de uma maneira menos evidente. Ao invés da via do diálogo, a sua escolha seria antes a do confronto e defesa de uma nova forma de organização da sociedade, cuja direcção era agora assegurada em nome das massas trabalhadoras, embora excluindo estas da tomada de decisões.

13. A chegada ao poder desta ideologia numa relativamente grande economia do mundo, que os próprios apelidavam de “comunismo”, proporcionou uma cultura de expansão e triunfo na defesa destas formas de organização estratificada, elas mesmo reproduzindo a organização para-militar que pontificava nas fábricas.

14. Os meios então à disposição destas elites dirigentes do proletariado em outros pontos do mundo foram-lhes permitindo sobreviver e reforçar-se, na ilusão de grande parte dos trabalhadores de que eram eles sobretudo quem representava a resistência ao capital quando, na verdade, não eram senão a tropa de choque de uma nova forma de organização daquele.

15. Na verdade, nos países onde esta ideologia tinha tomado o poder, por entre esforços inenarráveis impostos aos trabalhadores e diante de uma militarização cada vez mais acentuada, a única coisa que evoluiu não foi a situação subalterna e de miséria daqueles, mas apenas o desenvolvimento de grandes forças produtivas assentes na sobre-exploração.

16. Contrapondo-se ao capitalismo tradicional, inclusive através de meios bélicos, crescia aqui uma economia cada vez mais voltada apenas para as necessidades do Estado e alheia às das massas, segundo propósitos que eram previamente definidos por um plano rígido e arbitrário.


Evolução da dominação do capital

17. Este novo mundo era agora o de uma economia não apenas transnacional mas verdadeiramente global, assente na fluidez das comunicações e na recomposição do trabalho e da própria produção, que lhe foram trazidos por revoluções sucessivas, primeiro mecânica e depois cibernética, cada vez mais influentes.

18. A própria organização social do capitalismo tradicional, de mercado, tinha-se alterado em grande parte. Agora, ao passo que a produção industrial absorvia cada vez menos massas de operários, cresciam as concentrações de trabalhadores nos serviços. A agro-indústria foi-se, a pouco e pouco, impondo à agricultura de subsistência.

19. Com base numa superior capacidade produtiva, a necessidade de assegurar a fluidez das mercadorias fez crescer cada vez mais a concentração de serviços de comércio, banca e seguros. Essa mesma necessidade de protecção fez também crescer a tropa de choque policial, privada ou do Estado, até se tornar numerosa e influente quanto o próprio exército.

20. A introdução de processos de produção mecânicos cada vez mais automatizados foi libertando cada vez mais trabalhadores dos processos produtivos nas economias do centro do mundo capitalista, ao mesmo tempo que, nas suas periferias, a concentração de trabalhadores ia aumentando, ocupada em tarefas esgotantes ou perigosas.

21. O recurso inexorável a novos meios de produção fará, contudo que, por sua vez, também esta massa de trabalhadores possa ser dispensada e se converta num enorme exército industrial de reserva, ao mesmo tempo que a produção de mercadorias em função do mercado se tornará cada vez mais supérflua e incongruente.

22. Esta produção realizada não em função da necessidade das pessoas mas do lucro, acarretando crises sucessivas de superprodução, não pode senão originar, cada vez mais, e ao mesmo tempo, ao lado da abundância o desperdício e a fome, e a continuação demente do esgotamento das fontes de energia que foram antes consideradas praticamente eternas.

23. Não admira que face à ideia de «desenvolvimento», considerado um fim em si mesmo, levando ao perigo de não-sobrevivência o próprio planeta, se suceda já hoje uma tentativa capitalista que procura reduzir os efeitos nefastos da política de sobre-exploração dos recursos para assegurar a possibilidade de continuar a sua dominação.


O capitalismo além da produção de objectos

24. Mas a organização da própria sociedade industrial do capitalismo evoluiu de uma forma tal que, muitas vezes, permanece praticamente invisível àqueles que apenas lhe reconhecem o carácter de actividade de rapina na esfera produtiva ou especulativa/financeira. Muito para além disso, ele diversificou a sua actividade a outros domínios.

25. Os empreendimentos económicos há muito saltaram fora dos trilhos de uma mera produção de objectos. Para além das indústrias tradicionais, quer sejam as de consumo para o Estado - em armamento, por exemplo -, quer sejam as de consumo para as pessoas - roupas, mobília, etc. -, surgem agora as novas indústrias de modelação da própria vida.

26. Surgem indústrias cada vez mais ambiciosas na educação e na saúde, por exemplo. A necessidade de assegurar, por via da escassez cada vez maior da mais-valia retirada dos trabalhadores, obriga a multiplicar e diversificar uma produção massiva que procura constantemente novos mercados e novos consumidores.

27. A massa de consumidores é ampliada a cada vez mais categorias: crianças e adolescentes, mercados longínquos, etc.. Tal como no mundo da produção planificada do capitalismo de Estado se sucediam as campanhas de produção, no capitalismo de mercado sucedem-se as campanhas de consumo: Natal, Dia da Mãe, do Pai, disto e daquilo…

28. A abundância derivada da exploração dos trabalhadores e do esgotamento da natureza permitiu uma acumulação tal que, a partir de certa altura, e no sentido de manter a sua forma essencial – a desigualdade e hierarquia – passou a ser possível dispensar das tarefas produtivas uma cada vez maior massa de gente.


O lugar do trabalho no modo de produção capitalista

29. A extensão da escola a uma cada vez maior massa de crianças e de jovens não tem que ver com uma apregoada cada vez maior qualificação do trabalho, pelo contrário cada vez menos exigente em competências e saberes e antes reduzido a formas estereotipadas e repetitivas de execução, mas a essa necessidade de libertação de mão-de-obra e controlo.

30. Mas se o capitalismo procura, por um lado, assegurar o preço mínimo da força de trabalho, por outro lado ele sabe que só uma sociedade assente no trabalho assalariado lhe permite perpetuar todo um sistema de produção baseado na desigualdade em que, por princípio, ele mesmo assenta.

31. Ter ou não ter trabalho é apresentado como uma distinção social que premeia os “diligentes” em desfavor dos “menos capazes”. A narrativa fantasiosa sobre o próprio modelo de opressão ajuda, por sua vez, a justificar as narrativas não menos fantasiosas sobre a própria acumulação primitiva do capital.

32. Alicerçada com base no saque dos próprios povos ou de povos mais longínquos, a acumulação que permitiu o impulsionar das formas modernas da exploração capitalista em desfavor do sistema feudal é, ela já, em si mesma, sub-produto de uma sociedade classista, globalmente desigual – a vários títulos – e hierarquizada.

33. Nenhuma sociedade humana pode viver sem a interdependência dos seus membros, assegurando a funcionalidade daquela através da repartição de tarefas, quer estas sejam trabalho manual ou intelectual. Um e outro concorrem para a organização social que torna viável a vida em comunidade.

34. A desigualdade do valor do trabalho, justificada por que uns acumulam nas suas tarefas uma elevada quantidade adicional de trabalho morto, enquanto noutros esse trabalho acumulado é residual, é em si mesma uma fundamentação que, de modo idêntico, justifica a acumulação primitiva do capital.

35. Não há valor intrínseco superior de uma qualquer forma de trabalho relativamente a outra. Todas as prestações à comunidade têm exactamente o mesmo valor de dádiva e partilha, como bem se pode ver em núcleos humanos colaborativos (ao invés de competitivos), como por exemplo em qualquer grupo de afinidade.

36. A importância do trabalho para o capital significa a importância do próprio sistema do salariato. Assalariar é já subjugar. E lutar por assegurar uma sobrevivência fora do sistema de salariato é já atingi-lo no que ele tem de mais essencial. A divisa de Auschwitz «o trabalho liberta» ilustra esta importância.

37. Lutar contra o trabalho é assegurar o triunfo sobre a colonização da vida de cada pessoa, que a reduz a peça avulsa de um mundo que lhe é alheio. Fulano ou fulana tornaram-se não a pessoa que são, em si próprias, com a sua riqueza e multiplicidade de saberes, competências, reflexões e afectos, mas meras designações de profissão.

38. Quer a reinvenção de formas de sobrevivência que reciclam a dissipação e alienação do modo de vida dominante, quer a criação de formas horizontais e colaborantes do exercício de uma actividade de partilha e troca que assegure sobrevivência e empreste mais-valia à comunidade exemplificam que é possível viver a vida doutra maneira.


Um capitalismo que invade todas as esferas da vida

39. Assim também essa mesma necessidade de assegurar a permanência da dominação hierárquica e desigual “obriga” à dissipação dos recursos na publicidade, no turismo, na produção de inutilidades, na multiplicação dos eventos desportivos, e do mundo do espectáculo, e em toda uma panóplia de actividades deste e doutros géneros.

40. Uma das formas mais importantes desta dissipação é o próprio desenvolvimento produtivista, que faz do chamado progresso um objectivo em si mesmo, sem atender de forma racional a que necessidades ele corresponde e a que preço se faz impor, muitas vezes arrasando as próprias comunidades, e trazendo o desespero e a miséria.

41. Pelo volume de negócios realizado, pela introdução artificial de determinados modos de vida, uma das principais indústrias do mundo de hoje, absolutamente central e vital para o capitalismo, é a indústria do entretenimento, capaz de gerar necessidades e cumplicidades artificiais, simulacros de felicidade que entorpecem e se tornam o ópio dos nossos dias.

42. O papel tradicional da religião enquanto bloqueador da acção e da reflexão social está morto. Mas a sociedade de classes encontrou os substitutos à altura, quer se chamem futebol ou música rock (ou seja lá o que for), desde que formas de massificação alheias ao exercício da lógica e da consciência individual e colectiva.

43. Não se trata aqui da formação e diversidade do gosto estético, da emoção, e da partilha desse gosto ou emoção. Trata-se da pulsão consumista obsessiva, trata-se do castramento da própria pulsão criativa, trata-se da aceitação submissa das massas aos tiques e escolhas dos seus ídolos. E isto reflecte-se nos mais variados domínios, incluindo a política.

44. Mesmo para aqueles que não foram capazes de o ver antes, quando os anarquistas insistiam no seu carácter de totalidade, hoje salta à vista que a dominação central é sobretudo hierárquica e civilizacional e não apenas económica e focalizada numa mera exploração económica do proletariado, seja o que for que hoje o represente.

45. De facto, à medida que, cada vez mais, o tão afamado progresso ia lançando para fora do processo produtivo cada vez mais massas de gente em progressivo empobrecimento, o lugar central da resistência anti-capitalista foi-se deslocando cada vez mais também para fora da grande fábrica ou empresa de serviços, cuja luta se resume sobretudo a manter o emprego.


Os novos focos de resistência possível

46. Massas proletarizadas de gente sem emprego ou emprego precário ocupam hoje cada vez mais o lugar central da resistência social que antes coube ao proletariado fabril. Este processo arrasta mais do que só os trabalhadores que perderam o seu emprego ou que detêm um em condições penosas e que, pela sua própria situação, os amarram de pés e mãos.

47. Acantonada em locais que lhe permitem grande convivência comunicacional, transformada em exército laboral de reserva essencial ao funcionamento do sistema capitalista, a massa dos alunos em situação de pré-inserção na vida económica, representa agora uma força social crescente com grande capacidade potencial de resistência.

48. Por um lado sujeita ao embrutecimento e manipulação sistemáticos que espera de uma sua fracção o papel dirigente e a reprodução do modelo em que cresceu, reside nela também a disponibilidade de tempo e a revolta contra um mundo que sabe nada ter a dar-lhe a não ser perspectivas incertas de sobrevivência e uma mais que certa insatisfação.

49. É este também o lugar dos artistas e intelectuais que não se limitam a aproveitar as benesses dadas pela proximidade do poder, seja ele ditado pelas escolhas das altas instâncias do Estado, seja ele expresso nas pequenas oportunidades aqui e ali geradas pelo poder autárquico ou outros poderes em busca dos seus elementos decorativos e de elegância.

50. Por isso defendemos a luta social em todas as formas por que ela se manifesta, na relação laboral e fora dela, na divulgação do pensamento libertário, na luta por um modo de vida não predatório da própria natureza, contra as formas de coacção violenta e os aparelhos militares nacionais e planetários, nas lutas de emancipação sexual, contra o progresso tecnológico a todo o preço. Não somos anarco-sindicalistas, mas partilhamos um lugar na barricada dos que combatem a opressão hierárquica, económica, e de todos os tipos.

Porto, 13 de Outubro de 2010
Colectivo Hipátia