luxúria - s. f. 1. Viço dos vegetais. 2. Lascívia, sensualidade.
A luxúria é o desejo passional e egoísta por todo o prazer sensual e material.
Segundo a Doutrina Católica, é um dos sete pecados capitais e consiste no apego aos prazeres carnais, corrupção de costumes; sexualidade extrema, lascívia e sensualidade.
As religiões antigas não penalizavam as práticas de luxúria. Pelo contrário, certas religiões promoviam mesmo rituais e práticas luxuriosas como foi o caso dos Bacanais, cujos excessos levaram o Senado romano a interditá-los no ano de 186 antes da nossa era. Encontram-se ainda celebrações dionisíacas que realizavam colectivamente este tipo de práticas sob efeito de drogas e do álcool ( recorde-se o Templo de Dionísio em Baalbeck , assim como as chamadas prostituições sagradas). Na mitologia há também uma série de deuses/as da luxúria :
Anuket (deusa do Nilo, no Egipto antigo)
Vénus (Roma)
Afrodite (deusa do amor na Grécia)
Eros (deus primordial da mitologia grega, responsável pela atracção sexual, o amor, o acto sexual, e venerado também como deus da fertilidade)
Lilith (Babilónia ; considerada também a primeira mulher de Adão, antes de Eva, na tradição judaico-cristã)
Tlazolteotl ( antigas civilizações mexicanas)
Freya ( nórdicos)
Huitaca (deusa de origem lunar, extremamente formosa, motivo pelo qual predicava a desobediência, as bebedeiras e os prazeres carnais)
Kâma ( no Hinduísmo)
Pan (semideus dos pastores; deus da fertilidade e da desenfreada sexualidade masculina)
Valentine de Saint-Point, pseudónimo de Anna Jeanne Valentine Desglans de Cassiat-Vercell , nasceu em Lyon a 16 de Fevereiro de 1875 e faleceu no Cairo em 28 de Março de 1953. O seu Manifesto da Mulher Futurista foi publicado em França e Itália em 1912 – em resposta vigorosa às declarações de Marinetti. Foi a primeira mulher a escrever um manifesto, marcando posição numa época em que o universo artístico era dominado por homens. Publicou a seguir o Manifesto Futurista da Luxúria cujo alvo era a moral cristã.
«Acabe-se de vez de injuriar o Desejo, essa atração ao mesmo tempo subtil e brutal de duas carnes quaisquer que sejam os seus sexos, de duas carnes que se querem tendendo para a unidade. Basta de mascarar o Desejo com essas máscaras de imundíce e da miséria das velhas e estéreis sentimentalidades. Não é a luxúria que desagrega e dissolve e reduz nada, são as hipnóticas complicações da sentimentalidade, os ciúmes artificiais, as palavras que seduzem, e enganam, o patético das separações e das fidelidades eternas, as nostalgias literárias: tout le cabotinage de l’amour».
Valentine de Saint-Point
«A luxúria é uma força porque, finalmente, jamais conduz à sensaboria do definitivo e à segurança que dá o apaziguador sentimentalismo»
Valentine de Saint-Point
"A Humanidade é mediocre. A maioria das mulheres não é nem superior nem inferior à maioria dos homens. Ambos são iguais. Ambos merecem o mesmo desprezo.O conjunto da Humanidade nunca foi senão o terreno de cultura, do qual brotaram os génios e os heróis dos dois sexos. Mas, na humanidade, tal como na natureza, existem momentos mais propícios ao florescimento. Nos Verões da humanidade, quando a terra é abrasada pelo sol, abundam os génios e os heróis".
Valentine de Saint-Point
«O Feminismo é um erro político. O Feminismo é um erro cerebral da mulher, erro que o seu instinto reconhecerá»
Valentine de Saint-Point
Manifesto futurista da Luxúria / Manifesto da Mulher Futurista , de Valentine de Saint-Point, editado pela & ETC
Texto de Henrique Fialho sobre o livro e que fomos buscar aqui
Henrique Fialho é também responsável do blogue
http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.com/
Valentine de Saint-Point (n. 1875 – m. 1953), pseudónimo de Anna Jeanne Valentine Marianne Desglans de Cessiat-Vercell, foi literalmente uma mulher dos sete instrumentos. Poeta – a primeira colectânea, intitulada Poémes de la Mer et du Soleil, surgiu em 1905 –, romancista, ensaísta, dramaturga, pintora, coreógrafa, entre outras actividades que seria exaustivo enumerar, foi também uma voz inconformada do movimento futurista francês. Em 1912 lançou o Manifesto da mulher futurista, seguindo-se-lhe, um ano depois, o Manifesto futurista da Luxúria. Se o primeiro surge como resposta declarada à misoginia de Filippo Tommaso Marinetti (n. 1876 – m. 1944), militante fascista italiano que ficará para a história como papa do Futurismo, o segundo tem por alvo mais abrangente a moral cristã, à qual devemos, entre outras pesadas heranças, a ideia da mulher como representação bestial da luxúria, um dos sete pecados capitais, que urge domesticar. Com alvos destes, é fácil adivinhar o fim reservado à fundadora dos «dramas ideiistas».
Após três relações falhadas e uma dedicação total à escrita, refugia-se em Espanha, partindo posteriormente para os Estados Unidos. Já em Marrocos, converte-se ao Islamismo. Instala-se no Cairo, onde virá a falecer só e miseravelmente. Em 1947, um jornalista anónimo anunciava prematuramente a morte de Valentine. Fê-lo nestes termos: «Percorrendo o simples trajecto da sua vida sentimental, é muito pouco dizer-se que Valentine de Saint-Point foi uma mulher independente. (…) Numa altura em que as mulheres podiam quando muito aspirar à categoria de poetisas (de Louise Labé a Anna de Noailles, digamos, para resumir alguns séculos de história), Valentine não hesita em praticar todos os géneros literários (poesia, romance, crítica) e até em invadir o domínio artístico: teatro, pintura e gravura (expõe nomeadamente no Salão dos Independentes), e sobretudo a dança (…). Os seus maiores inimigos, embora nem sempre directamente nomeados – mas haveria necessidade? –, são a moral (ou a hipocrisia) burguesa e a moral cristã» (pp. 19-22).
Desenterrado pela musculatura sempre atenta da &etc, o Manifesto da Mulher Futurista (Abril de 2009) volta a aparecer, agora acompanhado de uma introdução de Fernando Cabral Martins e vários outros textos de interesse inquestionável, dos quais se destacam o Manifesto Futurista da Luxúria e alguns breves ensaios sobre as intenções da autora no domínio das artes performativas. Interroga-se o introdutor sobre como ler, hoje, estes textos. Mais dados ao amorfismo do que à virilidade, talvez os possíveis leitores deste pequeno grande livro venham a manifestar aquela ambivalência que caracteriza os actuais amantes de uma literatura erigida à margem das convenções. Refiro-me a um certo deslumbramento que experimenta todo aquele que tem a felicidade de encontrar no texto a força que não procura, ou da qual de desvia, em vida. No fundo, a hipocrisia que outrora se pretendia atingida não dista muito da mesma hipocrisia que hoje acaba ferida nos seus recalcamentos mais dolorosos. Educados para a servidão, muito poucos serão aqueles que estão dispostos a hipotecar o seu bem-estar (material e moral) em nome de uma liberdade, de uma autonomia, de uma independência das quais podemos esperar pouco mais do que o desconforto da solidão.
O primeiro parágrafo do Manifesto da Mulher Futurista é bastante claro: «A Humanidade é medíocre. A maioria das mulheres não é nem superior nem inferior à maioria dos homens. Ambos são iguais. Ambos merecem o mesmo desprezo» (p. 27). Alimentemos a esperança de, no final, escaparmos à mediocridade da maioria podendo as nossas acções certificar-nos a superioridade moral dessa minoria que ainda julgamos existir por, aqui e acolá, irmos encontrando focos de resistência que nos levam a tal. Nenhum manifesto escapa, obviamente, a contradições inerentes a toda e qualquer tomada de posição. Tomar posição, optar, é antes de mais assumir uma certa convergência na contradição, a qual não deve ser levada à letra de incoerência. Incoerente é o hipócrita, contraditório é o humano, demasiado humano. Super-homens são tão raros em morte quanto impossíveis em vida.
Os manifestos de Valentine, pretendendo libertar um género específico de amarras historicamente determinadas por modelos civilizacionais sempre erigidos sob a égide de uma suposta palavra divina, não se livram das suas próprias imposições. Impõem uma renovação que transcenda estereótipos políticos – «O Feminismo é um erro político. O Feminismo é um erro cerebral da mulher, erro que o seu instinto reconhecerá» (p. 31) –, impõem uma voz cruel, violenta, viril contra o Sentimentalismo, impõem a energia do Desejo contra os «sinistros trapos românticos»: «A luxúria é uma força porque, finalmente, jamais conduz à sensaboria do definitivo e à segurança que dá o apaziguador sentimentalismo» (p. 40). No fundo, desenterrar estes textos é mais um gesto de luta contra a hipocrisia que ainda hoje refreia quem por confessa ingenuidade tenderíamos a julgar mais livres e menos superficiais. Faz-se a história da humanidade também de excepções, ostracizadas e deixadas na penumbra até que alguém volte a torná-las apaixonadamente vivas, «pois haverá sempre espíritos insubmissos que preferirão às belas estradas os caminhos pitorescos e incertos» (pp. 56-57).
Henrique Fialho, 2009
«O Feminismo é um erro político. O Feminismo é um erro cerebral da mulher, erro que o seu instinto reconhecerá»
Valentine de Saint-Point
Manifesto futurista da Luxúria / Manifesto da Mulher Futurista , de Valentine de Saint-Point, editado pela & ETC
Texto de Henrique Fialho sobre o livro e que fomos buscar aqui
Henrique Fialho é também responsável do blogue
http://universosdesfeitos-insonia.blogspot.com/
Valentine de Saint-Point (n. 1875 – m. 1953), pseudónimo de Anna Jeanne Valentine Marianne Desglans de Cessiat-Vercell, foi literalmente uma mulher dos sete instrumentos. Poeta – a primeira colectânea, intitulada Poémes de la Mer et du Soleil, surgiu em 1905 –, romancista, ensaísta, dramaturga, pintora, coreógrafa, entre outras actividades que seria exaustivo enumerar, foi também uma voz inconformada do movimento futurista francês. Em 1912 lançou o Manifesto da mulher futurista, seguindo-se-lhe, um ano depois, o Manifesto futurista da Luxúria. Se o primeiro surge como resposta declarada à misoginia de Filippo Tommaso Marinetti (n. 1876 – m. 1944), militante fascista italiano que ficará para a história como papa do Futurismo, o segundo tem por alvo mais abrangente a moral cristã, à qual devemos, entre outras pesadas heranças, a ideia da mulher como representação bestial da luxúria, um dos sete pecados capitais, que urge domesticar. Com alvos destes, é fácil adivinhar o fim reservado à fundadora dos «dramas ideiistas».
Após três relações falhadas e uma dedicação total à escrita, refugia-se em Espanha, partindo posteriormente para os Estados Unidos. Já em Marrocos, converte-se ao Islamismo. Instala-se no Cairo, onde virá a falecer só e miseravelmente. Em 1947, um jornalista anónimo anunciava prematuramente a morte de Valentine. Fê-lo nestes termos: «Percorrendo o simples trajecto da sua vida sentimental, é muito pouco dizer-se que Valentine de Saint-Point foi uma mulher independente. (…) Numa altura em que as mulheres podiam quando muito aspirar à categoria de poetisas (de Louise Labé a Anna de Noailles, digamos, para resumir alguns séculos de história), Valentine não hesita em praticar todos os géneros literários (poesia, romance, crítica) e até em invadir o domínio artístico: teatro, pintura e gravura (expõe nomeadamente no Salão dos Independentes), e sobretudo a dança (…). Os seus maiores inimigos, embora nem sempre directamente nomeados – mas haveria necessidade? –, são a moral (ou a hipocrisia) burguesa e a moral cristã» (pp. 19-22).
Desenterrado pela musculatura sempre atenta da &etc, o Manifesto da Mulher Futurista (Abril de 2009) volta a aparecer, agora acompanhado de uma introdução de Fernando Cabral Martins e vários outros textos de interesse inquestionável, dos quais se destacam o Manifesto Futurista da Luxúria e alguns breves ensaios sobre as intenções da autora no domínio das artes performativas. Interroga-se o introdutor sobre como ler, hoje, estes textos. Mais dados ao amorfismo do que à virilidade, talvez os possíveis leitores deste pequeno grande livro venham a manifestar aquela ambivalência que caracteriza os actuais amantes de uma literatura erigida à margem das convenções. Refiro-me a um certo deslumbramento que experimenta todo aquele que tem a felicidade de encontrar no texto a força que não procura, ou da qual de desvia, em vida. No fundo, a hipocrisia que outrora se pretendia atingida não dista muito da mesma hipocrisia que hoje acaba ferida nos seus recalcamentos mais dolorosos. Educados para a servidão, muito poucos serão aqueles que estão dispostos a hipotecar o seu bem-estar (material e moral) em nome de uma liberdade, de uma autonomia, de uma independência das quais podemos esperar pouco mais do que o desconforto da solidão.
O primeiro parágrafo do Manifesto da Mulher Futurista é bastante claro: «A Humanidade é medíocre. A maioria das mulheres não é nem superior nem inferior à maioria dos homens. Ambos são iguais. Ambos merecem o mesmo desprezo» (p. 27). Alimentemos a esperança de, no final, escaparmos à mediocridade da maioria podendo as nossas acções certificar-nos a superioridade moral dessa minoria que ainda julgamos existir por, aqui e acolá, irmos encontrando focos de resistência que nos levam a tal. Nenhum manifesto escapa, obviamente, a contradições inerentes a toda e qualquer tomada de posição. Tomar posição, optar, é antes de mais assumir uma certa convergência na contradição, a qual não deve ser levada à letra de incoerência. Incoerente é o hipócrita, contraditório é o humano, demasiado humano. Super-homens são tão raros em morte quanto impossíveis em vida.
Os manifestos de Valentine, pretendendo libertar um género específico de amarras historicamente determinadas por modelos civilizacionais sempre erigidos sob a égide de uma suposta palavra divina, não se livram das suas próprias imposições. Impõem uma renovação que transcenda estereótipos políticos – «O Feminismo é um erro político. O Feminismo é um erro cerebral da mulher, erro que o seu instinto reconhecerá» (p. 31) –, impõem uma voz cruel, violenta, viril contra o Sentimentalismo, impõem a energia do Desejo contra os «sinistros trapos românticos»: «A luxúria é uma força porque, finalmente, jamais conduz à sensaboria do definitivo e à segurança que dá o apaziguador sentimentalismo» (p. 40). No fundo, desenterrar estes textos é mais um gesto de luta contra a hipocrisia que ainda hoje refreia quem por confessa ingenuidade tenderíamos a julgar mais livres e menos superficiais. Faz-se a história da humanidade também de excepções, ostracizadas e deixadas na penumbra até que alguém volte a torná-las apaixonadamente vivas, «pois haverá sempre espíritos insubmissos que preferirão às belas estradas os caminhos pitorescos e incertos» (pp. 56-57).
Henrique Fialho, 2009