17.10.05

Conferência de Imprensa ( texto de Harold Pinter)


Excertos da peça/sketch de Harold Pinter, Prémio Nobel da literatura de 2005 com o título original «Press Conference» e que, com a tradução de Pedro Marques, faz parte do volume «Conferências de Imprensa e Outras Aldrabices, editado em conjunto pelos Artistas Unidos e Livros Cotovia, na colecção «Livrinhos de Teatro», por altura da representação do espectáculo homónimo, estreado em Junho de 2005, e encenado por Jorge Silva Melo


CONFERÊNCIA DE IMPRENSA (excertos)

Imprensa – Senhor ministro, antes de ser Ministro da Cultura creio que o senhor foi chefe da Polícia Secreta.

Ministro – Correcto.

Imprensa – Vê alguma contradição entre estes dois papéis?

Ministro – Absolutamente nenhuma. Como chefe da Polícia Secreta tinha a responsabilidade, especificamente, de proteger e garantir a nossa herança cultural de forças cuja intenção é subvertê-la. Defendíamo-nos do verme. E ainda nos defendemos.

Imprensa – O verme?

Ministro – O verme

….

Imprensa - Qual era a natureza da cultura por si proposta?

Ministro – Uma cultura baseada no respeito e nas regras da lei.

Imprensa – Como é que vê o seu actual papel de Ministro da Cultura?

Ministro – o Ministro da Cultura apoia-se nos mesmos princípios que os guardiães da Segurança Nacional. Acreditamos numa compreensão saudável, musculada e terna da nossa herança cultural e das nossas obrigações culturais. Estas obrigações incluem naturalmente a lealdade ao mercado livre.

…..

Imprensa – E a divergência crítica?

Ministro – A divergência crítica é aceitável – se for deixada em casa. O meu conselho é o seguinte – deixem-na em casa. Guardem-na debaixo da cama. Ao lado do penico do mijo.
(Ele ri-se)
É lá que é o lugar dela.

….

Imprensa – Então vê o seu papel como Ministro da Cultura como vital e frutuoso?

Ministro – Imensamente frutuoso. Acreditamos na bondade inata do vosso Manel vulgar e da vossa Maria. É isto que procuramos proteger. Procuramos proteger a bondade essencial do vosso Manel vulgar e da vossa Maria vulgar. Vemos isso como uma obrigação moral. Estamos determinados a protegê-los da corrupção e da subversão com todos os meios que temos à nossa disposição.

(…)