7.5.05

Bertrand Russel

As influencias anarquistas do pensamento de Bertrand Russel

Bertrand Russel foi um dos maiores filósofos e matemáticos do século XX, desenvolvendo uma obra e um activismo ímpar ao longo do século em que viveu.

Bertrand Russel simpatizou ao longo de toda a sua vida com o anarquismo, muito embora tenha abraçado a ideia de um Estado Mundial para acabar com as guerras entre as nações. Com a idade de 23 anos, o jovem aristocrata é descrito na sua biografia como alguém com tendências anarquistas.

Russel conhecia o sentido e o significado do anarquismo quando escreve em 1918, pouco antes de ser preso por ter denunciado a legitimidade da I Grande Guerra Mundial, o livro "Roads to Freedom: socialism, anarchism, and syndicalism", onde inclui uma citação de Lao-Tzu:

Production without possession
Action without sel-assertion
Development withou domination


Num fundamentado texto da sua autoria, Russel define o anarquismo como a teoria que se opõe a toda a espécie de governo que resulte de uma imposição à força. A liberdade é o supremo bem do credo anarquista, devendo a liberdade ser entendida como a via mais directa para a abolição de todo o controle forçado sobre os indivíduos pela comunidade. Russel defende que o anarquismo deve ser o ideal último para o qual a sociedade deve continuamente aproximar-se. Aliás, o próprio Russel defende que o anarquismo esta particularmente ajustado em áreas tão diversas como a arte, a ciência, as relações humanas e alegria o gozo de viver.

No entanto, ele confessa que por enquanto, e nos tempos mais próximos, será muito difícil que este sonho se venha a realizar-se. Numa sua obra de juventude "Principles of Social Reconstruction" (1916), ele admite que o Estado e a propriedade são as duas mais poderosas instituições no mundo moderno. Porém, ao mesmo tempo que tenta demonstrar quanto dispensáveis são muitos dos poderes estatais, também aceita a utilidade de outros a fim de evitar a substituição da lei pela força nas relações humanas. "A anarquia primitiva, que antecedeu a lei, era muito pior que a lei", escreve Russel. O Estado teria também, segundo ele, um papel positivo a desempenhar na educação obrigatória, na saúde e na administração da justiça económica.

Apesar das fortes críticas de Bakukine e de Kropotkine contra o Estado, Russel admite que alguma coerção da comunidade deva subsistir sob a forma de lei, assim como o Estado é uma instituição necessária para a realização de certas e limitadas tarefas. Sem o Estado o forte poderia oprimir o fraco. Defendia, de todas as ideologias então referenciadas, o socialismo corporativista (guild socialism), se bem que sempre recordando que "o livre crescimento do indivíduo deva ser o fim supremo de todo o sistema político". Num dos números do jornal anarquista Freedom (fundado por Kropotkine) o livro "Roads to Freedom" de Bertrand Russel é vivamente recomendado, observando que os trabalhos do autor contêm propostas construtivas para o anarquismo.


Russel visitou a Russia no Verão de 1920 onde se encontrou com anarquistas como Emma Godman e Alexander Berkman que lhe apresentaram a cidade de Moscovo e vários leaders bolchevistas. O livro que reúne as suas impressões dessa viagem, "The Practice and Theory of Bolchevism" (1920), inclui já várias observações críticas à situação numa altura em que qualquer crítica à ditadura bolchevista era vista, pela esquerda, como uma traição . Dois anos depois, quando Emma Goldman procurou refúgio político na Grã- Bretanha, foi Russel que fez as necessárias diligências junto do Home Office, garantindo que aquela se comprometia a não desenvolver qualquer forma de anarquismo violento no país. No jantar de boas-vindas em Oxford, a única pessoa a aplaudir os violentos ataques feitos por Goldman ao governo soviético foi Russel. A reportagem do Freedom sobre o acontecimento terminava assim: "Mr. Russel, o filósofo mais acutilante da Inglaterra, proferiu então um discurso onde demonstrava as suas mais firmes convicções anarquistas."


Apesar de tudo, Russel manteve sempre alguma distância para com os anarquistas. Recusou, por exemplo, ajudar Emma Goldman a constituir um comité de ajuda aos prisioneiros políticos russos com o argumento que não via uma alternativa melhor ao governo soviético e que não resultasse ainda em maior crueldade. Escreve então a Goldman o seguinte: "Não vejo a abolição de todos os governos como algo que tenha possibilidade de se realizar nas nossas vidas ou mesmo durante o século XX". Mesmo assim, e depois de constatar a inutilidade da sua tomada de posição, acabou de censurar o tratamento dado pelo governo bolchevista aos seus prisioneiros políticos. E quando Sacco e Vanzetti foram executados, Bertrand Russel não teve dúvidas em afirmar que tinham sido injustamente condenados por motivo das suas opiniões políticas.


As atitudes e as suas afirmações libertárias, bem como toda a sua relutância em seguir à risca as posturas anarquistas resultam da sua singular concepção da humanidade e do universo, e do facto de estar consciente da "falácia naturalística" a que Kropotkine e outros anarquistas não escapavam ao defenderem argumentos baseados na supremacia das leis da natureza, que deviam ser seguidas, mas que na perspectiva de Russel mais não nos levaria que não sermos escravos da própria natureza. Tal não o impedia contudo em reconhecer que "se a Natureza deva ser o nosso modelo, então os anarquistas teriam o melhor dos argumentos. Com efeito, o universo físico está ordenado não porque tenha um governo central mas simplesmente porque todos os seres tudo fazem para assim ser"

Como ateísta e atomista, Russel tem uma sombria concepção da humanidade não obstante as suas esperanças de um mundo melhor. Ele considera que o homem é o resultado de uma "conjugação acidental de átomos" destinada a extinguir-se com a morte do sistema solar. Mas apesar da efémera e acidental posição do ser humano no universo tal não significa que o homem não possa lutar para a melhoria de todos. Só a crença do mais profundo desespero pode construir um mundo melhor.

Como humanista, Russel preocupa-se em lutar pela expansão da liberdade e felicidade humanas. Coisa que não é fácil.

Nos anos 50 e 60 Russel envolve-se mais uma vez com grupos de anarquistas no Comité dos Cem no âmbito da Campanha pelo Desarmamento Nuclear. O velho filósofo bate-se então pela acção directa não-violenta e pela desobediência civil em larga escala

Nos textos de Bertrand Russel perpassa uma forte brisa libertária como se pode ser no seguinte excerto:


"Thought is subversive and revolutionary, destructive and terrible. Thought is merciless to privilege, established institutions and comfortable habits. Thought is anarchic and lawless, indifferent to authority, careless of the well-tried wisdom of the ages".