Explicar na sala de aula que os mercados funcionam está a tornar-se uma tarefa difícil, senão mesmo uma missão impossível, para os professores de economia: a actual crise financeira do capitalismo global mostra justamente como as teorias económicas dominantes não são validadas pela realidade.
Transcrevemos a seguir alguns excertos de um artigo publicado no suplemento de economia do jornalPúblico de 21 de Novembro sob o título «A crise não vai mudar o que se ensina nas salas de aulas. Não?”
«Empresas centenárias fecham portas, economias entram em recessão, e nas salas de aula das faculdades de economia parece continuar tudo na mesma. José Reis, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, identifica duas tendências. De um lado, o ensino que repete a teoria dominante ("a larga maioria"), do outro o que tenta estimular o pensamento crítico. Feitas as contas, "não é ousado supor que nas salas de aula continua tudo como dantes, alheio à crise e fechado de forma defensiva, face aos desafios do pensamento crítico", denuncia.
Nos intervalos, os alunos discutem cenários futuros, repletos de dúvidas quanto ao seu próprio papel. "Há uma enorme curiosidade para perceber o que aconteceu", revela António Gomes Mota, presidente da ISCTE Business School. "Creio que as notícias lhes estão a causar alguma ansiedade e perplexidade, pois não sabem o que vem aí. Não compreendem como acções desregradas de uma elite de especuladores financeiros podem ter causado um desastre global", conta por seu lado Sandro Mendonça, professor do departamento de economia do ISCTE.
No Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), perguntam-se se o que estão a aprender é correcto e útil. "São questões que nos preocupam também enquanto professores", admite o economista e docente António Mendonça.
Com a queda de bancos de investimento históricos e o desmoronar de economias, antes exemplares, reacendeu-se a discussão sobre as virtudes e defeitos do capitalismo e das correntes neo-liberais. Explicar aos alunos a ideia clássica de que "os agentes optimizam, os mercados harmonizam" fica mais difícil. "A evidência empírica diz o contrário, ou melhor, grita-o", alerta Sandro Mendonça. (…) "[No ISEG] questões como a eficiência dos mercados ou a mão invisível sempre foram abordadas como devem ser: como modelos teóricos de referência, importantes para a compreensão do funcionamento das economias, e não realidades objectivas e imutáveis ou ideais a atingir", explica »