ÍNDIO NÃO CONSOME E QUEM NÃO CONSOME NÃO É GENTE
( a propósito do conceito de desenvolvimento)Índio não compra jornal. Índio não compra anúncio na televisão. Índio não compra propaganda na rádio. Índio não vota. Índio não patrocina campanha eleitoral. Índio não consome. Não consumir dá nisso: você não vale nada numa sociedade de consumo como as nossas sociedades capitalistas contemporâneas
Reproduz-se a seguir um pequeno excerto de uma entrevista com a advogada Joênia Wapixana, que representa os indígenas no Supremo Tribunal Federal do Brasil a propósito da delimitação das reservas dos índios, questão que tem sido muito falada nos últimos meses a propósito da Reserva indígena Raposa Serra do Sol:
Pergunta - Há quem diga que nas regiões onde os indígenas vivem o desenvolvimento acabará por se impor da mesma forma que nas outras regiões do Brasil, e não há maneira de mudar esta evolução. O que diz a isto?
Joênia Wapixana - Olha, essa palavra desenvolvimento para nós tem outro significado que o meramente capitalista, meramente económico e individual. O desenvolvimento que trabalhamos é numa perspectiva de respeito. Primeiro, ao próprio costume e à própria cultura indígena. Para mim, desenvolvimento é você ter água com qualidade e você manter um ambiente saudável, ter saúde, educação. O desenvolvimento que se prega é muito diferente dos valores indígenas. É lógico que nós usamos tecnologia para benefício próprio. Mas o desenvolvimento dos arrozeiros é puramente individual e nele só tem importância a cobiça, a ganância e a exploração dos recursos naturais. Os rios Surumu, Tacutu e Cotingo são os principais rios que abastecem as comunidades [da reserva]. É onde se toma banho, de onde se consome para afazeres domésticos, onde tem os peixes. É a principal fonte de sobrevivência da biodiversidade. Qual é o tratamento que se dá a esses rios? Eles tiram água para a irrigação, desviam o curso do rio através de valas e não há qualquer controle sobre a utilização. Há quantos anos eles fazem isso? O que se faz ali na plantação de arroz é a pulverização, que contamina as águas! Com o que? Com agrotóxicos. O desenvolvimento que ele [arrozeiro] trouxe para Roraima é o que destrói, o que degrada, que ocupa ilegalmente terra de comunidades que têm direitos colectivos. Então queremos um desenvolvimento onde as comunidades indígenas tenham suas criações conforme os manejos tradicionais, onde tudo é discutido colectivamente, onde há respeito ao meio ambiente, onde ninguém sai jogando agrotóxico. A gente utiliza tecnologia nos cursos de preparação para lidar com reflorestamento -- por exemplo, de buritizais, de madeira -- mas para as próprias comunidades indígenas. Essa é a nossa forma de desenvolvimento, que contribui com o meio ambiente, não que acabe com ele. Desenvolvimento, sim, mas com respeito, não de qualquer jeito.
Fonte:
http://historiaemprojetos.blogspot.com/
Manifesto em defesa da Reserva indígena Raposa Serra do Sol:
http://www.lpp-uerj.net/manifesto/index.htm