"Mais grave ainda que a fome aguda e total, devido às suas repercussões sociais e económicas, é o fenómeno da fome crónica ou parcial, que corrói silenciosamente inúmeras populações do mundo".
"O subdesenvolvimento não é, como muitos pensam equivocadamente, insuficiência ou ausência de desenvolvimento. O subdesenvolvimento é um produto ou um subproduto do desenvolvimento, uma derivação inevitável da exploração económica colonial ou neocolonial, que continua se exercendo sobre diversas regiões do planeta
Citações de Josué de Castro
Sobre Josué de Castro:
«Ele sabia que não adiantava aumentar a riqueza, sem reduzir a pobreza»
«Propunha o incentivo da agricultura familiar e a criação de restaurantes populares»
No próximo dia 5 de Setembro de 2008 completam-se 100 anos do nascimento do destacado geógrafo brasileiro ( pernambucano de nascimento), autor de livros como Geografia da Fome (1935), traduzido e editado em 25 línguas, e Geopolítica da Fome, textos que se tornaram em autênticas referências incontornáveis da literatura sobre a matéria, e onde são denunciadas as verdadeiras causas da fome que atinge milhões de seres humanos, causas de carácter social e económico, que exigem, antes de tudo o mais, uma solução política. Josué de Castro fez da luta contra a fome a sua bandeira de vida, até porque, desde miúdo, conhecera de perto o fenómeno da fome: morando perto dos mangues, Josué fez uma comparação cruel: "As pessoas que vivem naquelas áreas e sobrevivem da pesca do caranguejo, acabam se tornando 'irmãos de leite' desse anfíbio". Por causa das suas ideias progressistas, foi obrigado pelo regime militar brasileiro da época a deixar o país. Morreu no exílio, em Paris, na França, no dia 24 de Setembro de 1973, aos 65 anos de idade.
Josué de Castro teve inúmeras profissões: médico, geógrafo, professor, escritor, sociólogo e político. Presidiu a FAO, organismo da Organização das Nações Unidas (ONU) para Agricultura e Alimentação e seus conceitos sobre desenvolvimento sustentável e as causas da miséria fizeram com que fosse indicado duas vezes ao Prêmio Nobel, da Medicina, em 1954, e da Paz, em 1963.
A socióloga, filha e “herdeira cultural” do médico, Anna Maria de Castro, disse que o pai tinha propostas concretas para acabar com a fome, como reforma agrária, melhoria de sementes e aumento da produtividade. As suas ideias, no entanto, foram vistas como “comunistas”, pois , Josué acreditava na capacidade de superar a fome aliando a Ciência, a técnica e a participação das pessoas.
No início do livro «Geografia da Fome» pode-se ler:
"Neste nosso ensaio de natureza ecológica tentaremos, pois, analisar os hábitos alimentares dos diferentes grupos humanos, ligados a determinadas áreas geográficas, procurando, de um lado, descobrir as causas naturais e as causas sociais que condicionaram o seu tipo de alimentação, com suas falhas e defeitos característicos, e, de outro lado, procurando verificar até onde esses defeitos influenciam a estrutura económico-social dos diferentes grupos estudados. Assim fazendo, acreditamos poder trazer alguma luz explicativa a inúmeros fenómenos de natureza social até hoje mal compreendidos por não terem sido levados na devida conta os seus fundamentos biológicos
Um pouco mais à frente, aparece a denúncia do neocolonialismo:
"É mesmo esta a característica essencial do desenvolvimento económico do tipo colonialista, bem diferente do desenvolvimento económico autêntico de tipo nacionalista. O colonialismo promoveu pelo mundo um certa forma de progresso, mas sempre a serviço dos seus lucros exclusivos, ou quando muito associado a um pequeno número de nacionais privilegiados que se desinteressavam pelo futuro da nacionalidade, pelas aspirações políticas, sociais e culturais da maioria. Daí o desenvolvimento anómalo, sectorial, limitado a certos sectores mais rendosos, de maior atractivo para o capital especulativo, deixando no abandono outros sectores básicos, indispensáveis ao verdadeiro progresso social".
Dia 29/8, sexta:
9h30 – Abertura
10h15 – Leitura dramatizada de trechos da peça Morte e Vida Severina, de João Cabral de Mello Neto e Chico Buarque de Holanda – professor Fernando Limoeiro (TU/UFMG)
11h – Coffee-break
11h30 – Palestra “Presença de Josué de Castro”
Anna Maria de Castro – filha de Josué de Castro e professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Ajax Pinto Ferreira – coordenador do Centro de Memória da Medicina
Local: Salão Nobre da Faculdade de Medicina da UFMG (avenida Alfredo Balena, 190, bairro Santa Efigênia)
Dia 4/9, quinta-feira:
12h – Encenação da peça teatral Zerando a Fome, do professor Romeu Sabará
Degustação de comidas típicas derivadas do milho
Local: Praça de Serviços da UFMG (avenida Antônio Carlos, 6627, campus Pampulha)
Dia 5/9, sexta-feira:
14h às 17 horas – Debate sobre a “Problemática da Fome”
Participantes: José Divino Lopes – professor da Escola de Enfermagem da UFMG, membro-titular do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável de Minas Gerais e suplente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar
Leila Regina da Silva – Vicariato da Ação Social e Política da Arquidiocese de Belo Horizonte, representante do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de Belo Horizonte
Local: Auditório da Escola de Belas-Artes (avenida Antônio Carlos, 6627, Campus Pampulha)
Actividades complementares
Entre os dias 1 e 4 de setembro, será realizada na Fafich, Faculdade de Educação, Escola de Enfermagem e Escola de Belas-Artes a exibição do filme/documentário Josué de Castro – Cidadão do Mundo, de Silvio Tendler, seguida de debate.
Dia 2/9, terça-feira:
18h – Escola de Enfermagem (avenida Alfredo Balena, 190)
1 – Seminário “Josué de Castro e a alimentação como direito”
Debate, precedido da exibição do documentário "Josué de Castro, Cidadão do Mundo", de Silvio Tendler
Organização da disciplina Nutrição e Cidadania e do Projeto Segurança Alimentar e Cidadania na Vila Acaba Mundo (Curso de Nutrição da Escola de Enfermagem e Programa Pólos de Cidadania da Faculdade de Direito da UFMG).
JOSUÉ DE CASTRO E A LUTA CONTRA A FOME
Conferência
Excerto do belissimo filme de Silvio Tendle
Chico Science falando de Josué de Castro
A Geografia da Fome (excertos de textos e escritos de Josué de Castro)
A fome é, conforme tantas vezes tenho afirmado, a expressão biológica de males sociológicos. Está intimamente ligada com as distorções económicas, a que dei, antes de ninguém, a designação de subdesenvolvimento.
A fome é um fenómeno geograficamente universal, a cuja acção nefasta nenhum continente escapa. Toda a terra dos homens foi, até hoje, a terra da fome. As investigações científicas, realizadas em todas as partes do mundo, constataram o facto inconcebível de que dois terços da humanidade sofre, de maneira epidémica ou endémica, os efeitos destruidores da fome.
A fome não é um produto da superpopulação: a fome já existia em massa antes do fenómeno da explosão demográfica do após-guerra. Apenas esta fome que dizimava as populações do Terceiro Mundo era escamoteada, era abafada era escondida. Não se falava do assunto que era vergonhoso: a fome era tabu.
O assunto deste livro é bastante delicado e perigoso. A tal ponto delicado e perigoso que se constituiu num dos tabus de nossa civilização. É realmente estranho, chocante o facto de que, num mundo como o nosso, caracterizado por tão excessiva capacidade de escrever-se e publicar-se, haja até hoje tão pouca coisa escrita acerca do fenómeno da fome, em suas diferentes manifestações.
Quais são os factores ocultos desta verdadeira conspiração de silêncio em torno da fome? Trata-se de um silêncio premeditado pela própria alma da cultura: foram os interesses e os preconceitos de ordem moral e de ordem política e económica de nossa chamada civilização ocidental que tomaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável de ser abordado publicamente.
Ao lado dos preconceitos morais, os interesses económicos das minorias dominantes também trabalhavam para escamotear o fenómeno da fome do panorama espiritual moderno. É que ao imperialismo económico e ao comércio internacional a serviço do mesmo interessava que a produção, a distribuição e o consumo dos produtos alimentares continuassem a se processar indefinidamente como fenómenos exclusivamente económicos - dirigidos e estimulados dentro de seus interesses económicos - e não como factos intimamente ligados aos interesses da saúde pública.
Um dos grandes obstáculos ao planeamento de soluções adequadas ao problema da alimentação dos povos reside exactamente no pouco conhecimento que se tem do problema em conjunto, como um complexo de manifestações simultaneamente biológicas, económicas e sociais.
Por outras palavras, procuraremos realizar uma sondagem de natureza ecológica, dentro deste conceito tão fecundo de Ecologia, ou seja, do estudo das acções e reacções dos seres vivos diante das influências do meio.
Neste ensaio de natureza ecológica tentaremos, pois, analisar os hábitos alimentares dos diferentes grupos humanos ligados a determinadas áreas geográficas, procurando de um lado, descobrir as causas naturais e as causas sociais que condicionaram o seu tipo de alimentação, com suas falhas e defeitos característicos, e de outro lado, procurando verificar até onde esses defeitos influenciam a estrutura económico-social dos diferentes grupos estudados.
O objectivo é analisar o fenómeno da fome colectiva - da fome atingindo endémica ou epidemicamente as grandes massas humanas. Não só a fome total, a verdadeira inanição que os povos de língua inglesa chamam de starvation, fenómeno, em geral, limitado a áreas de extrema miséria e a contingências excepcionais, como o fenómeno muito mais frequente e mais grave, em suas consequências numéricas, da fome parcial, da chamada fome oculta, na qual pela falta permanente de determinados elementos nutritivos, em seus regimes habituais, grupos inteiros de populações se deixam morrer lentamente de fome, apesar de comerem todos os dias. É principalmente o estudo dessas colectivas fomes parciais, dessas fomes específicas, em sua infinita variedade, que constitui o objectivo nuclear do nosso trabalho.
É que existem duas maneiras de morrer de fome: não comer nada e definhar de maneira vertiginosa até o fim, ou comer de maneira inadequada e entrar em um regime de carências ou deficiências específicas, capaz de provocar um estado que pode também conduzir à morte. Mais grave ainda que a fome aguda e total, devido às suas repercussões sociais e económicas, é o fenómeno da fome crónica ou parcial, que corrói silenciosamente inúmeras populações do mundo.
A noção que se tem, correntemente, do que seja a fome é, assim, uma noção bem incompleta. E este desconhecimento, por parte das elites europeias, da realidade social da fome no mundo e dos perigos que este fenómeno representa para a sua estabilidade social, constitui uma grave lacuna tanto para a análise dos acontecimentos políticos da actualidade, que se produzem em diversas regiões da terra, como no que se refere à atitude que os países da abundância deveriam ter face aos países subdesenvolvidos, permanentemente perseguidos pela penúria e pela miséria alimentar.
Nenhum fator é mais negativo para a situação de abastecimento alimentar do país do que a sua estrutura agrária feudal, com um regime inadequado de propriedade, com relações de trabalho socialmente superadas e com a não utilização da riqueza potencial dos solos.
Apresenta-se deste modo a Reforma Agrária como uma necessidade histórica nesta hora de transformação social que atravessamos como um imperativo nacional.
É que cerca de 60% das propriedades agrícolas no Brasil são constituídas por glebas de áreas superiores a 50 hectares de terra, das quais 20% possuem mais de 10.000 hectares. No recenseamento de 1950 ficou evidenciada a existência no Brasil de algumas dezenas de propriedades que são verdadeiras capitanias feudais:proriedades com mais de 100.000 hectares de extensão.
Do latifúndio decorre também a existência das grandes massas dos sem-terra, dos que trabalham na terra alheia, como assalariados ou como servos explorados por esta engrenagem económica de tipo feudal. Por sua vez, o minifúndio significa a exploração antieconómica da terra, a miséria crónica das culturas de subsistência que não dão para matar a fome da família.
O tipo de reforma que julgamos imperativo da hora presente não é um simples expediente de desapropriação e redistribuição da terra para atender às aspirações dos sem-terra. Processo simplista que não traz solução real aos problemas da economia agrária. Concebemos a reforma agrária como um processo de revisão das relações jurídicas e económicas, entre os que detêm a propriedade agrícola e os que trabalham nas actividades rurais.
Precisamos enfrentar o tabu da reforma agrária - assunto proibido, escabroso, perigoso - com a mesma coragem com que enfrentamos o tabu da fome. Falaremos abertamente do assunto, esvaziando desta forma o seu conteúdo tabu, mostrando através de uma larga campanha esclarecedora que a reforma agrária não é nenhum bicho-papão ou dragão maléfico que vá engolir toda a riqueza dos proprietários de terra, como pensam os mal-avisados, mas que, ao contrário, será extremamente benéfica para todos os que participam socialmente da exploração agrícola...
É evidente que não bastaria dispor de alimentos em quantidade suficiente e suficientemente diversificados para cobrir as necessidades alimentares da população mundial. O problema da fome não é apenas um problema de produção insuficiente de alimentos. É preciso que a massa desta população disponha de poder de compra para adquirir estes alimentos.
A fome age não apenas sobre os corpos das vítimas da seca, consumindo sua carne, corroendo seus órgãos e abrindo feridas em sua pele, mas também age sobre seu espírito, sobre sua estrutura mental, sobre sua conduta moral. Nenhuma calamidade pode desagregar a personalidade humana tão profundamente e num sentido tão nocivo quanto a fome, quando atinge os limites da verdadeira inanição. Excitados pela imperiosa necessidade de se alimentar, os instintos primários são despertados e o homem, como qualquer outro animal faminto, demonstra uma conduta mental que pode parecer das mais desconcertantes.
Querer justificar a fome do mundo como um fenómeno natural e inevitável não passa de uma técnica de mistificação para ocultar as suas verdadeiras causas que foram, no passado, o tipo de exploração colonial imposto à maioria dos povos do mundo, e , no presente, o neocolonialismo económico a que estão submetidos os países de economia primária, dependentes, subdesenvolvidos, que são também países de fome.
As massas humanas se deram conta de que a fome e a miséria não são indispensáveis ao equilíbrio do mundo, e que hoje, graças aos progressos da ciência e da técnica, surgiu pela primeira vez na história um tipo de sociedade na qual a miséria pode ser suprimida e com ela a fome.
Subdesenvolvimento
Os países do Terceiro Mundo são subdesenvolvidos, não por razões naturais - pela força das coisas - mas por razões históricas - pela força das circunstâncias. Circunstâncias históricas desfavoráveis, principalmente o colonialismo político e económico que manteve estas regiões à margem do processo da economia mundial em rápida evolução.7
Na verdade, o subdesenvolvimento não é a ausência de desenvolvimento, mas o produto de um tipo universal de desenvolvimento mal conduzido. É a concentração abusiva de riqueza - sobretudo neste período histórico dominado pelo neocolonialismo capitalista que foi o factor determinante do subdesenvolvimento de uma grande parte do mundo: as regiões dominadas sob a forma de colónias políticas directas ou de colónias económicas.
O subdesenvolvimento é o produto da má utilização dos recursos naturais e humanos realizada de forma a não conduzir à expansão económica e a impedir as mudanças sociais indispensáveis ao processo da integração dos grupos humanos subdesenvolvidos dentro de um sistema económico integrado. Só através de uma estratégia global do desenvolvimento, capaz de mobilizar todos os factores de produção no interesse da colectividade, poderão ser eliminados o subdesenvolvimento e a fome da superfície da terra.
O maior de todos esses erros foi considerar o processo do desenvolvimento em toda parte como semelhante ao desenvolvimento dos países ricos do Ocidente. Uma espécie de etnocentrismo conduziu os teóricos do desenvolvimento a assentar as suas ideias e estabelecer os seus sistemas de pensamento em concepções de economia clássica que ignoravam quase totalmente a realidade sócio-econômica das regiões de economia ocidental capitalista, uma economia socialista em elaboração acelerada e uma rede de abastecimento e de venda no resto do mundo. Não se ocupavam, pois, das estruturas económicas desse resto do mundo, abandonado quer aos sociólogos, quer, antes, aos folcloristas.
Esta tremenda desigualdade social entre os povos divide economicamente o mundo em dois mundos diferentes: o mundos dos ricos e o mundo dos pobres, o mundo dos países bem desenvolvidos e industrializados e o mundo dos países proletários e subdesenvolvidos. Este fosso económico divide hoje a humanidade em dois grupos que se entendem com dificuldade: o grupo dos que não comem, constituído por dois terços da humanidade, e que habitam as áreas subdesenvolvidas do mundo, e o grupo dos que não dormem, que é o terço restante dos países ricos, e que não dormem, com receio da revolta dos que não comem.
Um dos factores mais constantes e efectivos das terríveis tensões sociais reinantes é o desequilíbrio económico do mundo, com as resultantes desigualdades sociais. Constitui um dos maiores perigos para a paz o profundo desnível económico que existe entre os países economicamente bem desenvolvidos de um lado, e de outro lado os países insuficientemente desenvolvidos. Desnível que se vem acentuando cada vez mais, intensificando as dissensões sociais e gerando a inquietação, intranquilidade e os conflitos políticos e ideológicos.
Ora, o problema do subdesenvolvimento não é exclusivo destes países; é antes um problema universal, que só pode ter soluções igualmente em escala universal. Viver na opulência, num mundo em que 2/3 estão mergulhados na miséria, não é apenas perigoso, é um crime. A tensão social na qual se vive hoje é, na maior parte das vezes, o produto desta conhecida injustiça social, uma vez que os povos dominados tomaram consciência da realidade sócio-económica do mundo, nesta fase da história da humanidade que vivemos, fase de transformações explosivas, caracterizadas essencialmente por explosões diversas: a explosão psicológica dos povos explorados, não menos perigosa do que a explosão atómica com a qual se abriu uma nova era no nosso planeta: a era atómica.
É urgente restabelecer o equilíbrio económico do mundo aterrando o largo fosso que separa os países bem desenvolvidos dos países subdesenvolvidos, sem o que é bem difícil que se consiga a verdadeira paz e a tranquilidade entre os homens. Nenhuma tarefa internacional se apresenta mais árdua, mas ao mesmo tempo mais promissora para o futuro do mundo, do que a do desenvolvimento económico destas áreas mais atrasadas, onde os recursos naturais e os potenciais geográficos se conservam relativamente inexplorados.
A paz depende mais do que nunca do equilíbrio económica do mundo. A segurança social do homem é mais importante do que a segurança nacional baseada nas armas.
Igualmente falso é o conceito de desenvolvimento avaliado unicamente à base da expansão da riqueza material, do crescimento económico. O desenvolvimento implica mudanças sociais sucessivas e profundas, que acompanham inevitavelmente as transformações tecnológicas do contorno natural. O conceito de desenvolvimento não é meramente quantitativo, mas compreende os aspectos qualitativos dos grupos humanos a que concerne. Crescer é uma coisa; desenvolver é outra. Crescer é; em linhas gerais, fácil. Desenvolver equilibradamente, difícil.
Cada vez se pergunta com mais insistência se desenvolver-se significa desumanizar-se, nesta frenética busca de riqueza, de acordo com a fórmula preconizada pelo Ocidente de maximizar os lucros em vez de maximizar as energias mentais que enriquecem com mais rapidez a vida dos homens e podem dar-lhes muito mais felicidade.
O problema do desenvolvimento do Terceiro Mundo, e mesmo o do mundo inteiro que ainda se apresenta subdesenvolvido sob certos aspectos, é antes de tudo um problema de formação de homens. Se a revolução industrial dominou o século XIX, é a revolução cultural que deve dominar o século XX, isto é, a criação de uma cultura capaz de encontrar verdadeiras soluções para os grandes problemas da humanidade.
O subdesenvolvimento é uma forma de sub-educação. De sub-educação, não apenas do Terceiro Mundo, mas do mundo inteiro. Para acabar com ele, é preciso educar bem e formar o espírito dos homens, que foi deformado por toda parte. Só um novo tipo de homens capazes de ousar pensar, ousar reflectir e de ousar passar à acção poderá realizar uma verdadeira economia baseada no desenvolvimento humano e equilibrado.
As contradições do desenvolvimento são múltiplas. Desenvolvimento significa ao mesmo tempo mutação e disciplina. Mas a disciplina impede muitas vezes a mutação. É o conservantismo das sociedades que alcançaram um auto grau de desenvolvimento, que se tomam como modelo ideal de sociedade e passam a combater o desejo da transformação.
Encarar aspectos isolados do problema na luta contra o subdesenvolvimento parece-nos algo ultrapassado, pois sabemos que as fórmulas tradicionais, as medidas isoladas e as concessões limitadas não bastam. A gravidade do problema requer urgentemente a adopção de uma estratégia global do desenvolvimento, comportamento e medidas convergentes por parte dos países desenvolvidos, assim como dos países em vias de desenvolvimento.
Só há um tipo de verdadeiro desenvolvimento: o desenvolvimento do homem. O homem, factor de desenvolvimento, o homem beneficitário do desenvolvimento. É o cérebro do homem a fábrica de desenvolvimento. É a vida do homem que deve desabrochar pela utilização dos produtos postos à sua disposição pelo desenvolvimento.
Para saber mais, consultar:
http://www.josuedecastro.com.br/port/index.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Josu%C3%A9_de_Castro
http://diplo.uol.com.br/2008-06,a2455