27.5.06

SOS Mata Atlântica: é preciso defender a Mata Atlântica (Brasil)

No mapa vê-se os vários biomas existentes no Brasil


O golpe de misericórdia nos remanescentes da Mata Atlântica (Brasil)

No próximo sábado, 27 de Maio, é o Dia da Mata Atlântica, um dos lugares mais ricos em biodiversidade do Brasil, e também um dos mais ameaçados do planeta, apenas 7% de sua área original ainda restam. Há mais de 500 anos os "homens brancos" endinheirados vêm usurpando esse ecossistema. Isso é triste, mas, para piorar, está previsto para ser votado pela Câmara dos Deputados no final deste mês, o golpe de misericórdia nos remanescentes da Mata Atlântica. Trata-se do Projecto de Lei 107/03 (PL da Mata Atlântica). Onde o governo federal, organizações não-governamentais “ambientalistas”, dentre as quais a famosa e rica SOS Mata Atlântica e parte da bancada ruralista, estão unidos para aprovar essa lei que libera os desmatamentos das últimas áreas de Mata Atlântica, permitindo a volta das madeireiras.

Extensas áreas de Mata Atlântica preservadas poderão ser devastadas em questão de meses, tão logo o projecto seja aprovado pela Câmara dos Deputados, onde está tramitando com velocidade super-sónica, já que é de interesse do Ministério do Meio Ambiente.

E vêm sendo divulgado para a imprensa através de ONG’s oportunistas uma propaganda enganosa, altamente nociva para a sociedade, de que a nova lei da Mata Atlântica é boa, escondendo a parte podre desse projecto de lei. Alegam que o novo projecto vai proteger a Mata Atlântica, que é uma lei para o uso sustentável, para a recuperação desta floresta, quando na verdade é bem ao contrário. Este novo projecto ameaça aniquilar de vez com o que restou da Mata Atlântica, já quase toda destruída pela “exploração sustentável”, dos ciclos económicos e especulação imobiliária.

A Mata Atlântica precisa de protecção e não de propostas irresponsáveis de pessoas ambiciosas que defendem interesses pessoais acima de qualquer coisa. Lembrando que os viveiros de mudas, empreendimentos de dirigentes de ONG's ambientalistas, são muito bem contemplados no novo projecto.

Questionamentos do PL da devastação da Mata Atlântica

A campanha da ONG SOS Mata Atlântica, cujo presidente do conselho director é o empresário Roberto Klabin, sócio das Industrias Klabin de Papel e Celulose S.A., que foi uma das maiores devastadoras da Mata Atlântica até hoje, e precisa destruir mais áreas de Mata Atlântica para aumentar seus lucros com a expansão dos reflorestamentos de pinus e eucalitpo, que defende o Projecto de Lei da devastação da Mata Atlântica, e esconde as consequências graves: os artigos 14 e 23 liberam os desmatamentos [possibilitando a expansão dos reflorestamentos com pinus e eucalipto e, portanto, atende os interesses das empresas do sector de papel e celulose] e o artigo 27 permite o ataque de madeireiras nos últimos fragmentos.

A essência do PL da devastação considera que o homem é bonzinho com a natureza, que vai tirar só o necessário, ignora que o homem é ganancioso, quer lucro, quer consumir, quer dinheiro, quer poder... Por isso precisamos PROTEGER a Mata Atlântica do poder económico e não ATACÁ-LA.

Quando a gente diz "PROTEGER" a Mata Atlântica, PROTEGER de quem? Dos ET´s? Não! Proteger do Homem! É o homem que quer aniquilar o planeta, não dar chance para as gerações futuras, para a perpetuação da vida no planeta.

A lei catual (decreto 750), pode não ser perfeita, mas protege muito bem a Mata Atlântica e está incomodando os devastadores, que querem puxar o tapete e liberar tudo. Isso é muito estranho!

Mais questionamentos

Qual a lógica do PL da Mata Atlântica com um artigo "bem cristalino" que libera os desmatamentos num momento em que é intensa a pressão para devastar o que resta para o plantio de pinus e eucalipto? Várias empresas de reflorestamento estão prospectando novas áreas para plantio de pinus/eucalipto em parceria com pequenos proprietários ou compra da área com pinus/eucalipto plantado. A lei é bem vinda para estas empresas, porque quase tudo o que resta da Mata Atlântica é de floresta secundária, que poderá ser derrubada com a nova lei.

O PL da Mata Atlântica tem uma lógica económica fundamentada apenas em argumentos folclóricos, contradizendo a ciência e o que aprendemos com a história da devastação.

Como o Ministério do Meio Ambiente pode garantir o cumprimento da nova lei da Mata Atlântica (que é complicadíssima, com vários artigos ambíguos, subjectivos) em áreas privadas se não consegue cuidar nem dos parques nacionais?

Por que querem derrubar a lei atual (decreto 750) que PROTEGE a Mata Atlântica para aprovar uma lei que ATACA a Mata Atlântica?

O PL da Mata Atlântica permite coleta de sementes e frutas que são vitais para a sobrevivência da fauna, que garante a manutenção da floresta (já que são os animais que plantam e fazem a polinização). O artigo ainda tem o disparate de mencionar: desde que não afete a fauna (Quem vai fiscalizar isso? Como?). É óbvio que afeta a fauna! Não tem nada sobrando num ecossistema. Este artigo é o mesmo que dizer: "É permitido cortar a cabeça do indivíduo desde que não lhe provoque a morte.”

Liberar a destruição da Mata Atlântica para salvá-la? É a mesma coisa que liberar os assaltos à residências para diminuir este tipo de crime.

Os serviços ecológicos da Mata Atlântica são importância estratégica para o fornecimento de água para as grandes metrópoles, para uma população superior a 120 milhões de brasileiros. Isso não é suficiente? Por que então apoiar a lei para a devastação dos remanescentes?

A Mata Atlântica não é uma simples plantação de árvores. É um ecossistema altamente complexo com milhares de organismos interagindo entre si. Por que a lei se preocupa apenas com o plantio de algumas árvores? Onde está a fundamentação científica dessa bobagem?

O PL da Mata Atlântica se fundamenta apenas em argumentos folclóricos. A ciência prova que não é possível a exploração da Mata Atlântica, como propõe o PL, sem que isso provoque perda de biodiversidade, com conseqüências imprevisíveis para o futuro.

O PL da Mata Atlântica prevê a destinação de recursos públicos para empreendimentos particulares, inclusive, de dirigentes de ONGs. Por que não destinar estes recursos para fortalecer a fiscalização do IBAMA ou para as unidades de conservação federais, que estão à mingua?

O PL da devastação da Mata Atlântica prevê a volta das madeireiras para garimpar o que restam nos últimos fragmentos de Mata Atlântica. Temos áreas onde as madeireiras atuaram há quase um século que até hoje não se regeneraram, foram engolidas por impenetráveis taquarais.

Mata Atlântica: desmatada, acabou-se!

Abaixo trecho do livro “A Ferro e Fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica” do historiador norte-americano Warren Dean, página 249 (Ed. Companhia da Letras, 2004), o botânico sueco Alberto Leofgren, que no início do século passado ajudou a criar o “Serviço Florestal e Botânico” em São Paulo (que mais tarde daria origem ao Instituto Florestal) e teve forte influência na criação de unidades de conservação e instituição do dia da árvore no Brasil*.

(...) O que era apenas vagamente compreendido, ou relutantemente admitido, por conservacionistas como Loefgren, é que a restauração da Mata Atlântica era mais ou menos impossível. Como Leofgren bem sabia muitos fazendeiros permitiam que parte de suas fazendas permanecesse como mata, não apenas para exploração futura mas também como reserva de madeira. Delas retiravam madeira na medida em que precisavam ou encontravam mercado, mas não conseguiram manejá-las (explorá-la de forma sustentável) como ouviam dizer que se fazia na Europa ou na América do Norte, porque, ao contrário dos bosques daqueles climas frios, essa floresta não era composta de maneira uniforme por umas poucas espécies resistentes, de crescimento rápido, sem complicações quanto à polinização, dispersão e frutificação, sem grandes requisitos nutricionais (simbioses complexas com fungos) e, em sua maioria, mais competitivas que cooperativas com o resto dos habitantes da floresta. Recriar uma floresta de pinheiros no norte (coníferas) ou de árvores latifoliadas exigia pouco manejo; recriar a Mata Atlântica teria exigido quase onisciência (todo o conhecimento) e uma existência que durasse séculos. Os terrenos de madeira, mesmo os dos mais prudente dos fazendeiros, gradualmente se deterioravam, portanto – as madeiras mais nobres eram retiradas uma a uma, e o dossel se tornava mais aberto já que outras árvores jovens eram esmagadas com a derrubada das mais velhas. Por fim, quando brotavam árvores e cipós inúteis, esvanecia-se a finalidade do terreno, a faixa era queimada e plantava-se café, milho ou capim de pasto. (...)

*Observação: o dia da árvore (copiado dos EUA) foi comemorado aqui pela primeira vez em 1902, em Araras (SP) e tinha o propósito de valorizar a Mata Atlântica, isto é, chamar atenção sobre os desmatamentos. Depois esta idéia original foi deturpada, como sabemos.


Texto enviado por Moésio Rebouças


Nota:
O bioma Mata Atlântica está reduzido atualmente a 7,84% de sua cobertura original que já se estendeu por 1,3 milhão quilômetros quadrados do território brasileiro. Apesar da devastação, ainda abrange 17 estados brasileiros e ainda abriga uma das mais altas taxas de biodiversidade do planeta, somando cerca de 20 mil espécies de plantas e 1.650 de animais, desse número, 8 mil sãos espécies endêmicas, ou seja, só ocorrem na Mata Atlântica. O bioma é considerado patrimônio nacional pela Constituição Federal e pelo decreto 750/93.