5.4.05

Pedido de socorro



O dia anunciava-se esplêndido. Era um 3 de Agosto, às 6,15 h. NO Aeroporto de Bruxelas-Zaventen, um Sol vermelho subia no céu. O Boeing 747 da Sabena aterrou à hora. Enquanto os passageiros, com os olhos ainda cheios de sono, desciam as escadas para entrar no autocarro, um controlador de fato-macaco branco deu a volta ao aparelho.Da caixa esquerda do trem de aterragem saíam três dedos de uma mão, agarrados à divisória. O controlador aproximou-se mais. No trem de aterragem, descobriu dois corpos de adolescentes, negros e frágeis, encolhidos, as feições paralisadas pelo medo. Eram os corpos de Fodé Touré Keita e de Alacine Keita, dois guineenses de 15 e 14 anos, vestidos com uns simples calções, umas sandálias e uma camisa de manga curta.
A caixa principal do trem de aterragem de um Boeing 747 contém dezasseis rodas grandes. O compartimento é vasto, com dois metros de altura. A caixa só é aberta a partir da cabina de pilotagem. Mas quando o avião está na pista, qualquer pessoas – desde que consiga esgueirar-se por entre o pessoal da manutenção – pode trepar para dentro da caixa.
À velocidade de cruzeiro, um Boeing 747 voa a cerca de 11.000 metros e, a essa altitude, a temperatura exterior é de -50º.
Os dois adolescentes terão provavelmente subido para a caixa do trem de aterragem na escala de Conacri.
No bolso da camisa de Fodé, o controlador encontrou uma folha cuidadosamente dobrada, com uma caligrafia incipiente:
«Portanto se virem que nos sacrificamos e arriscamos a vida, é porque sofremos de mais em África e precisamos de vocês para lutar contra a pobreza e para pôr fim à guerra em África. Porém, nós queremos estudar e pedimos que nos ajudem a estudar para sermos como vocês, em África…
Finalmente, pedimos imensa desculpa por termos ousado descrever esta carta a pessoas como os senhores, pessoas tão importantes por quem temos muito respeito. E não se esqueçam de que é a vocês que devemos queixamo-nos da fraqueza da nossa força em África.»

(retirado de «Os Novos senhores do mundo e os seus opositores» de Jean Ziegler, ed. Terramar,2003, com tradução de Magda Bigotte de Figueiredo a partir das Éditions Fayard de 2002)