A Simplicidade Voluntária
Vivemos numa sociedade de consumo em que as pessoas acreditam que comprando, acumulando bens e objectos, possuindo cada vez mais…se tornam mais felizes. Quem  realmente se aproveita deste excesso consumista  ( as grandes empresas multi e transnacionanais) manipulam-nos através de  artifícios como a moda, a publicidade  e os meios de comunicação; criam  constantemente novas necessidades e distribuem ilusões a torto e a direito.  Este modo de proceder é apoiado pelos governos  que sempre  defendem um crescimento a  qualquer preço. E a verdade é que têm tido sucesso,uma vez que o consumo e   a presença da técnica  nas nossas vidas  não cessam  de aumentar.
Um consumo deste tipo tem, todavia, inúmeras consequências.  Primeiro sobre o meio ambiente: os recursos escassos diminuem a olhos vistos. Mais graves são, porém, o lixo e os resíduos que são assim gerados  e  cujos efeitos provocam as alterações climáticas e a contaminação do ar e da água. Actualmente consumimos para além das capacidades do planeta, o que significa simplesmente que estamos a pôr em causa o futuro das gerações  vindouras. E a responsabilidade por este estado de coisas é nossa, os residentes dos países industrializados. É que não se podem imputar as culpas a 80% da população da Terra  que, as mais das vezes, não têm sequer o necessário para sobreviver. Se todos os habitantes do planeta consumissem tanto como nós, seriam precisos  5 planetas Terra para satisfazer esse caudal de consumo. Não tenhamos a ilusão: todo o mundo aspira a viver como nós, depois de  nós mesmos termos generalizado a ilusão  que essa é a melhor maneira para se viver.
Libertar-se  do consumo
O consumo  excessivo  tem efeitos sobre as nossas próprias vidas. Para consumir tal como fazemos precisamos de dinheiro; logo, em consequência, a maioria das pessoas trabalham desalmadamente. No Canadá, por exemplo, cerca de 20% da população activa trabalha mais de 50 horas por semana. Esgotamo-nos a trabalhar, dando o melhor do nosso tempo e das nossas vidas para o trabalho; enquanto isso, outras vertentes da nossa existência ( a família, a vida amorosa, a participação cívica e a vida comunitária, a saúde,…) sofrem com essa  quase exclusividade que o trabalho exige. Acaba-se de chegar a um paradoxo: quanto mais satisfeito  formos na vida material, menos felizes sentimos. E há cada vez mais pessoas que acham que isso não tem sentido, e que há que fazer algo para mudar esta situação. Mas o quê? Os governos e os partidos não dão respostas alternativas, empenham-se antes em seguir a mesma direcção tal como têm feito até agora. Ora há que ultrapassar este bloqueio  E é isso justamente o que propõe  a Simplicidade Voluntária: empreender as mudanças necessárias nas nossas vidas.
Não confundir a Simplicidade Voluntária com a pobreza; esta é imposta  por força de circunstâncias penosas. Mas quando se opta voluntariamente por viver sobriamente,tudo funciona de modo diferente. É que não nos sentimos frustrados porque nos privamos de um bem, mas antes  sentimos que vale a pena  substitui-lo por algo  que tenha mais sentido.  Este desprendimento  alarga o espaço para  a nossa consciência  operar de outra forma: trata-se  de  um  estado de  espírito que  nos convida a apreciar, a saborear  e procurar o elemento qualitativo da vida. No fundo, renunciamos aos objectos que estorvam, travam  e impedem  irmos até ao fim das nossas possibilidades.” Não é a riqueza, mas o apego à riqueza que é um obstáculo à emancipação; e não é o prazer  da busca por coisas agradáveis que está em causa, mas sim o desejo ardente de as adquirir”, escreve Schumcher (1911-1997), autor do livro Small is Beautiful.
A Simplicidade Voluntária  leva-nos ao não-uso e à não-posse de algo, implica uma escolha: não comprar certo objecto ou não seguir determinado procedimento implica uma escolha  por um outro motivo de satisfação, nem que seja ser fiel aos nossos princípios ou  aos nossos compromissos sociais.
Escolher não utilizar certo bem ou serviço, não seguir a moda, consumir de outra maneira, tudo isso releva de actos de consciência e de lucidez, e não de fatalidade. Na verdade, quem faça voluntariamente este tipo de opções sabe que  podia não o fazer, e acaba por ser o próprio a dominar a situação em vez de se um ser dominado por esta. Claro está que não se trata de  decisões irrevogáveis que arrastam  consigo um radicalismo sem concessões, nem sequer de  uma regra de aço que dificilmente poderíamos  desvincularmo-nos. A Simplicidade Voluntária é uma opção que é tomada  mediante pequenos passos, uma via que se segue por decisão própria e porque nos sentimos satisfeitos por seguir.
A sobriedade
Simplicidade Voluntária não se confunde com ascetismo; é, até mesmo, a sua antíteses. O asceta priva-se voluntariamente dos prazeres da vida  materiais em busca de um ávida espiritual mais intensa; ora o adepto da Simplicidade Voluntária  não foge do prazer nem das satisfações. Muito pelo contrário. Ele procura-os, mas entende que os não alcançar com os meios que lhe dá  a sociedade de consumo.
O medo constitui o obstáculo mais sério para uma  opção destas, a favor da Simplicidade Voluntária. Receio do que os outros vão pensar, quando  nos afastarmos do seu estilo de vida; receio de sermos marginalizados, e de sentirmos inseguros face ao futuro, pois nos tempos que correm de um individualismo feroz, estamos habituados a pensar por si mesmos, a contar só connosco perante as contrariedades da vida. Quem quererá ajudar-me se não tenho dinheiro, quem me ajudará quando for velho? Protegemo-nos então com seguros, planos de reforma, depósitos bancários, etc.E quando tivermos o futuro assegurado podemo-nos dar ao luxo de viver mais livres, não sendo necessário trabalhar tanto. Acontece, porém, que cada ano que passo damo-nos conta que o dinheiro acumulado não é suficiente…
Evidentemente que, se um destes dias, alguém deixar o emprego, vender o seu carro, e começar a consumir só o que produz, a catástrofe não tardará a chegar. Mas a verdade é que a Simplicidade Voluntária é um processo gradual; e  não é um fim mas antes um meio para chegar uma melhor bem estar. Com o passar do tempo  cada qual poderá  aprofundar mais o seu compromisso graças aos momentos de liberdade  que vai conquistando e  aos laços de solidariedade  que vais desenvolvendo para a indispensável segurança afectiva.
Não é fácil abandonarmos o universo do consumismo. Hoje em dia, tudo nos empurra a encontrar em alguma forma de consumo a solução dos nossos problemas, e a satisfação dos nossos desejos. Não é por acaso que as lotarias passam mensagens do tipo  “ganhando o primeiro prémio  tem os seus problemas resolvidos”. Mas tal não passa de uma ilusão: aquilo a que tão ardentemente aspirávamos, acaba rapidamente de perder interesse logo que o obtivermos, não constituindo os bens materiais formas seguras de satisfazer as nossas mais profundas necessidades. 
A Simplicidade Voluntária  constitui actualmente o movimento social que ganha cada vez mais força. Não cessam de aparecer livros, contactos e interessados. Existe já vários sites directa ou indirectamente relacionados.  Há que fazer o possível para  dar a conhecer a Simplicidade Voluntária como meio de controlarmos as nossas vidas
Serge Mongeau  ( autor do livro La Simplicité Voluntaire)
(este texto apareceu na revista The Ecologist)
www.simplicitévoluntaire.org
www.simpleliving.net
 
