18.4.09

African Screens - ciclo sobre os novos cinemas de África prossegue este fim-de-semana no São Jorge

As sessões realizam-se no cinema S.Jorge ( na Av. da Liberdade, Lisboa). A ENTRADA É LIVRE

Os cinemas africanos contemporâneos assumem hoje o papel que a literatura africana tinha nos anos 1960. Tal como os escritos de Chinua Achebe, Ngugi Wa Thiongo e Wole Soyinka relatavam os movimentos da descolonização e a utopia da independência, os actuais cineastas africanos preocupam-se com os desejos pós-coloniais inseridos em regimes políticos, culturais e económicos impostos pela globalização.

O que é fascinante neste novo cinema de África é a capacidade dos seus cineastas em dar voz aos africanos, de forma a poderem comunicar para além das suas fronteiras nacionais e com públicos de outras esferas. Os filmes revelam-nos diferentes pontos de vista sobre temas globais como o fim da utopia nacionalista em África, o impacto dos ajustamentos estruturais, migrações, guerras, políticas de identidade e assuntos relacionados com a saúde e o ambiente.

A primeira intenção deste programa de filmes africanos é chamar a atenção para os novos caminhos e visões criativas do cinema africano. O nosso argumento é de que hoje estão a emergir de África novos posicionamentos críticos e novas linguagens cinematográficas, muitas vezes em competição ou mesmo em conflito umas com as outras, cuja visibilidade tem sido posta em causa pela visão monolítica e politicamente correcta da definição de cinema africano veiculada pelas casas de cultura e pelos festivais do Ocidente.

Com a nossa abordagem curatorial esperamos revelar a diversidade de linguagens do cinema africano e as diferentes visões políticas e criativas que estão por detrás dos seus filmes.
Acreditamos que a melhor forma de revelar essa diversidade – de Djibril Diop Mambety e John Akomfrah a Abderrhamane Sissako, de Balufu Bakupa Kayinda a Jean-Pierre Bekolo, ou mesmo com os vídeos de Nollywood – é através de uma visão que enfatize não apenas a diferença entre o cinema africano e o cinema ocidental, mas também a multiplicidade de linguagens e de empenhamentos políticos em África.

O programa foi dividido em quarto partes/quatro fins-de-semana:
1°: 27, 28, e 29 de Março:Cinema Africano, Pós-colonialismo e políticas estéticas (Parte I)

2°: 17, 18, 19 de Abril:África ao Microscópio

3°: 8,9 e 10 de Maio:Nollywood, o Nascimento de um Cinema IndígenaCinema Africano, Pós-Colonialismo e Estratégias Estéticas de Representação (Parte II)

4°: 15, 16, e 17 de Maio:NEGRITUDE

A primeira secção, intitulada “Cinema Africano: Pós-Colonialismo e Políticas Estéticas de Representação”, debruça-se sobre os modos de representação que usam estéticas pós-coloniais como veículo de expressão. Nota-se aqui uma descolagem em relação à estética nacionalista e anti-imperialista que estávamos habituados a ver no cinema de Sembene Ousmane. Como os próprios filmes revelam – “Il va Pleuvoir sur Conakry”, “Les Saignantes”, “Drum”, etc. – a utopia nacionalista dá lugar ao afro-pessimismo, com os cineastas a procurarem uma nova utopia unificadora na era da globalização.

Na segunda secção, “África ao Microscópio”, continuamos a perseguir essa nova utopia através da exibição de filmes de realizadores africanos e estrangeiros. E quando pretendemos dar ênfase ao contributo europeu para o desenvolvimento dos novos cinemas africanos, também programamos filmes, antigos e recentes, que advogam uma posição liberal e que atribuem a culpa dos problemas africanos às mudanças impostas pelo Ocidente.

Na terceira secção dá-se realce ao novo fenómeno da indústria do vídeo na Nigéria conhecido como Nollywood e aos documentários africanos, enquanto o quarto e último módulo lida com a estética do movimento da Negritude no cinema senegalês e noutros contextos africanos.

Ao programa de exibição de filmes associamos quatro painéis de discussão com realizadores, investigadores, produtores e profissionais da indústria do cinema: o primeiro sobre cinema africano e pós-colonialismo, o segundo sobre o cinema da diáspora, um terceiro sobre o apoio europeu e a influência da televisão e o quarto sobre a Negritude.

A nossa intenção é tentar produzir uma teoria coerente dos objectivos dos novos cinemas africanos, podendo mesmo mencionar o surgimento de um novo paradigma no cinema africano, tornado possível com a emergência nos últimos 20 anos de novas estruturas de produção de filmes e vídeos, em particular na Nigéria. A verdade é que a diversidade de cinemas africanos que existe hoje não se compara com a realidade de há 25 anos atrás, quando grande parte da produção só era possível através do apoio francês. As mudanças de política do financiamento europeu que entretanto se foram concretizando também nos permitem especular para além da
oferta monolítica de filmes africanos normalmente providenciada pelos festivais e centros culturais europeus. No fundo, nenhum investigador sério pode permitir-se continuar a ignorar o sucesso cinematográfico e industrial dos vídeos de Nollywood.

Curadoria: Manthia Diawara (New York University) Lydie Diakhaté (Ghana Real Life Documentary Festival)


http://www.africacont.org/



PROGRAMA PARA ESTE FIM DE SEMANA

18 Abril (Sábado)

Sala 2
15:00 THIS IS MY AFRICA
(Esta é a Minha África)
R: Zina Saro-Wiwa
(48’, Nigéria/Reino Unido, 2008)
«Feche os olhos e pense em África. O que vê?» Esta pergunta foi feita a 20 pessoas, entre as quais o artista Yinka Shonibare e o realizador John Akomfrah. Um curso intensivo em identidade/identidades africanas: «Queria fazer um filme que usasse memórias privadas para desafiar e contrabalançar aquilo que se diz publicamente de África, que quase sempre é negativo e redutor».

Sala 3
16:00 UNE AFFAIRE DE NÈGRES
(Negócio de Negros)
R: Osvalde Lewat-Hallade
(90’, Camarões/França, 2007)
Um filme comovente sobre os Camarões dos anos 1990, quando a polícia perdeu o controlo na sua luta contra o crime. Centenas de pessoas desapareceram. “Une Affaire de Nègres” combina entrevistas chocantes com observações sensatas de pessoas magoadas que se questionam como pode a justiça prevalecer numa sociedade brutalizada.


Sala 3
18.00 NELISITA: NARRATIVAS NYANEKA
R: Ruy Duarte de Carvalho
(90’, Angola, 1982)
A partir de narrativas do povo Nyaneka, o autor cria uma ficção onde o povo actua e encena as próprias lendas.

Sala 2
20.00 Introdução: Kamel Chérif / France Bonnet e Manthia Diawara / Lydie Diakhaté
LES CAPRICES DE MARIANNE V (Caprichos Franceses)
R: Kamel Chérif / France Bonnet
(57’, França, 2008)
O realizador questiona os caprichos de Marianne (a mulher símbolo da
república francesa). Por que se recusou um canal de televisão francês a passar o seu filme “Signe d'appartenance” (2004), que ganhou um prémio em Veneza e é sobre um rapaz que tratou de fazer a sua própria circuncisão? Uma investigação autobiográfica sobre o verdadeiro conteúdo dos princípios igualitários franceses.


Sala 3
22:00 EZRA
R: Newton Aduaka
(110’, Nigéria/França, 2006)
Em 2002, na Serra Leoa, Ezra foi uma criança-soldado. Agora ele enfrenta um tribunal da ONU sobre um massacre que houve na sua aldeia. O álcool e a droga fizeram com que perdesse a memória e a sua irmã faz-lhe uma terrível acusação… Este filme é interpretado por actores amadores e conta a história de Ezra, similar à história das cerca de 120.000 crianças-soldado existentes em África. Venceu o prémio de melhor filme no festival internacional de Durban, África do Sul (2007).


19 Abril (Domingo)

Sala 3
18.00 Introdução: Claire Andrade Watkins e Manthia
Diawara / Lydie Diakhaté
SOME KIND OF FUNNY PORTO RICAN?: A CAPE VERDEAN AMERICAN STORY (Será um porto-riquenho esquisito? História de um cabo-verdiano americano)
R: Claire Andrade Watkins
(83’, EUA, 2006)
Um retrato da história dos imigrantes radicados na zona de Fox Point, em Providence, no estado de Rhode Island, onde três gerações de cabo-verdianos foram removidos à força para permitir a realização de projectos de urbanização entre finais dos anos 60 e princípios de 1970.

Sala 2
20:00 EN ATTENDANT LES HOMMES (À Espera dos Homens)
R: Katy Lena Ndiaye
(56’, Senegal/França, 2007)
Nos limites do deserto do Sahara, as sociedades são dominadas pelas tradições e pela religião. No
entanto, três mulheres não se sentem de todo predestinadas a esperar pelo seu homem.

Sala 3
22:00 HEREMAKONO
(À Espera da Felicidade)
R: Abderrahmane Sissako
(95’, Mauritânia/França, 2002)
Nouadhibou é uma pequena aldeia na costa da Mauritânia. Entre os edifícios esbranquiçados
e cantigas melancólicas que atravessaram gerações, a vida acontece enquanto se espera uma
hipotética felicidade… Antes de emigrar para a Europa, o jovem Abdallah visita a sua mãe. Incapaz de falar a língua local, o melancólico jovem de 17 anos sente-se um estranho no seu próprio país. Ele evita as festas e os costumes da aldeia e os tecidos coloridos tradicionais interessam-lhe menos do que a última moda europeia. No entanto, Abdallah observa esse universo tocante que lhe é desconhecido: as tristezas da sensual Nana; o karaoke romântico dos emigrantes chineses; a frustração do velho habilidoso Maata com as falhas de electricidade; e o
olhar curioso do jovem órfão Khatra, capaz de evocar esperança e carinho.