7.2.09

Lamento ou elegia do progresso ( La complainte du progrès), uma canção satírica do grande Boris Vian


Noutros tempos ao fazer a corte
falava-se de amor
e como prova do nosso ardor
oferecia-se o coração.

Hoje já não é como dantes
está tudo mudado
Pra seduzir o ente adorado
murmura-se-lhe ao ouvido
Ah... Gudule... Vem-me dar um beijo...

E eu dou-te...
eu dou-te um frigorífico
uma boa lambreta
um atomizador
um fogão de cozinha
com um forno de vidro
montes de cobertores
e facas para bolos
um torniquete
pra fazer vinagrete
um bom ventilador
para tirar os odores
lençóis aquecidos
uma pistola de biscoito
um avião para dois

e vamos ser felizes
e vamos ser felizes

Noutros tempos se acontecesse
a gente desentender-se
partíamos com ar lúgubre
deixando ficar a baixela

mas hoje o que é que querem
a vida está tão cara
dizemos volta prà tua mãe
e ficamos com tudo
Ah... Gudule... Pede desculpa... ou ...

ou fico com tudo
o meu frigorífico
o meu aparador
o meu lava-loiça de ferro
o meu fogão a petróleo
o meu encera-chanatos
o meu passa-lesmas
o meu banco de espelho
o meu caça-malandros
o torniquete
pra fazer vinagrete
o encolhedor de lixo
e o corta-batatas-fritas

e se a bela
inda se mostrar rebelde

pômo-la na rua
pômo-la na rua

e confiamos o nosso destino
ao frigorífico
ao apaga-poeira
ao fogão de cozinha
à cama sempre feita
ao aquece-sapatas
ao canhão de batatas
ao esventra-tomates
ao esfola-galinhas

mas muito muito em breve
receberemos a visita
de uma terna miúda
de uma terna miúda
que nos oferece o coração
sim que nos oferece o coração

então logo cedemos
temos de ser uns prós outros
e vivemos assim
e vivemos assim
até á próxima vez
até à próxima vez

Boris Vian, Canções e Poemas,
Lisboa, Assírio & Alvim, 1997

( retiramos a tradução portuguesa
daqui)








La complainte du progrès
by Boris Vian


Autrefois pour faire sa cour
On parlait d'amour
Pour mieux prouver son ardeur
On offrait son coeur
Aujourd'hui, c'est plus pareil
Ça change, ça change
Pour séduire le cher ange
On lui glisse à l'oreille
(Ah? Gudule!)

{Refrain 1:}
Viens m'embrasser
Et je te donnerai
Un frigidaire
Un joli scooter
Un atomixer
Et du Dunlopillo
Une cuisinière
Avec un four en verre
Des tas de couverts
Et des pell' à gâteaux

Une tourniquette
Pour fair' la vinaigrette
Un bel aérateur
Pour bouffer les odeurs

Des draps qui chauffent
Un pistolet à gaufres
Un avion pour deux
Et nous serons heureux

Autrefois s'il arrivait
Que l'on se querelle
L'air lugubre on s'en allait
En laissant la vaisselle
Aujourd'hui, que voulez-vous
La vie est si chère
On dit: rentre chez ta mère
Et l'on se garde tout
(Ah! Gudule)

{Refrain 2:}
Excuse-toi
Ou je reprends tout ça.
Mon frigidaire
Mon armoire à cuillères
Mon évier en fer
Et mon poêl' à mazout
Mon cire-godasses
Mon repasse-limaces
Mon tabouret à glace
Et mon chasse-filous

La tourniquette
A faire la vinaigrette
Le ratatine-ordures
Et le coupe-friture

Et si la belle
Se montre encore rebelles
On la fiche dehors
Pour confier son sort

{Coda:}
Au frigidaire
À l'efface-poussière
À la cuisinière
Au lit qu'est toujours fait
Au chauffe-savates
Au canon à patates
À l'éventre-tomates
À l'écorche-poulet

Mais très très vite
On reçoit la visite
D'une tendre petite
Qui vous offre son coeur

Alors on cède
Car il faut bien qu'on s'entraide
Et l'on vit comme ça
Jusqu'à la prochaine fois


La complainte du progrès
(Bernard Lavilliers interpreta a canção de Boris Vian)