Ver a propósito o livro «Cent ans de mouvements étudiants», Jean-Philippe Legois, Alain Monchablon, Robi Morder., ed Syllepse
Recordem-se também os textos ainda recentemente aqui surgidos a propósito do centenário da famosa e histórica greve académica de Coimbra de 1907: aqui, aqui
Uma palavra mais sobre os poderosos movimentos estudantis que abalaram não há muito tempo três países: a França e a luta dos estudantes contra o contrato do primeiro emprego; a luta dos estudantes do ensino secundário ( os célebres pinguins) no Chile; e a ainda vigorosa contestação dos estudantes gregos contra a reforma do ensino superior e a introdução na Grécia das reforma do processo de Bolonha.
Aproveitamos a ocasião para deixar aqui alguns sites de colectivos e associações que hoje em dia dão corpo ao actual movimento estudantil quer em Portugal quer em muitos outros países, aproveitando para abrir uma secção específica sobre o movimento estudantil na coluna do lado.
O movimento estudantil por cá
Parar Bolonha
Letras em Manifesto
http://letrasemmanifesto.blogspot.com/ (FLUL)
G.A.E. - Grupo de Acção Estudantil (ISCTE)
http://gae-iscte.blogspot.com/
MISTA - Movimento por um IST Alternativo (Instituto Superior Técnico)
http://mista-blog.blogspot.com/
MOVE- Movimento Aberto por Outra Vida na Escola (Instituto Superior de Agronomia)
http://move-aberto.blogspot.com/
O MOVE quer ser um movimento aberto. Porque acredita que é possível outra vida na Escola. Porque vê na Escola um espaço onde nascem e se discutem novas ideias. Porque espera da Escola mais do que uma rotina onde se aprende e ensina. Porque sabe que é possível juntar pessoas para fazer de outras formas. Porque recusa a "inevitabilidade" de uma Escola onde a tecnocracia vence a vida. move.aberto@gmail.com
MUDA é um movimento criado por estudantes, professores e investigadores da FCUL
http://www.muda.co.nr/
Des1biga
http://des1biga.blogspot.com/ (FMUL)
Agir (Un. Minho)
http://agir-uminho.blogspot.com/
Frente de acção estudantil (Un. De Coimbra
http://accaoestudantil.blogspot.com/
Reage ( I. Politécnico da Guarda)
http://reage-aag.blogspot.com/
Estudantes contra as praxes
M.A.T.A. - Movimento Anti “Tradição Académica
http://mata.xm.com/
M.A.T.A. - 15 anos a não resistir só e a não só resistir
Uma breve história do M.A.T.A. , desde o seu inicio à festa realizada em Dezembro na Faculdade de Letras de Lisboa
Antípodas-movimento anti-praxe
http://www.antipodas.web.pt/
O movimento Antípodas, sediado no Porto, visa o fim da praxe académica, e a sua substituição por uma recepção não hierárquica, baseada em relações de camaradagem de igual para igual e que encoraje a criatividade e o espírito crítico. Não pretendendo apresentar uma "receita feita" para esta recepção, tal como acontece com a praxe, defendemos antes que sejam @s própri@s alun@s a construí-la de acordo com as especificidades da sua faculdade. Como jovens, queremos ser agentes de mudança. Rejeitamos o conservadorismo de quem se submete cegamente à tradição e queremos construir uma faculdade integradora, democrática e aberta ao mundo.
Websites estrangeiros contra as praxes:
http://www.sos-bizutage.com/
http://contrelebizutage.free.fr/
http://www.stophazing.org/
Rádios Universitárias
Rádio Universitária do Minho
http://www.rum.pt/
Rádio Universitária de Coimbra
http://www.ruc.pt/
Rádio Universitária doAlgarve
http://www.rua.pt/temp/
Rádio Universitária da Beira Interior
http://www.rubi.ubi.pt/index.php
Rádio Universidade (Vila Real)
http://www.universidade.fm/
Jornais universitários
A Cabra ( jornal universitário de Coimbra)
http://acabra.net/
Jornal Universitário do Porto
http://espacosjup.blogspot.com/
O movimento estudantil lá fora
Coordenadora de Assembleias da Univ. de Santiago de Compostela
http://coordenadora.blogspot.com/
Sindicato dos estudantes dos países catalães
http://sepc.cat/
Assembleia contra a mercantilização do ensino
http://www.nodo50.org/acme/
Colectivo universitário autónomo ( Bolonha, Itália)
http://www5.autistici.org/cua/
Portal de lutas estudantis (fr)
http://www.luttes-etudiantes.com/
Sud-estudiant ( sindicato estudantil francês9
http://www.sud-etudiant.org/
Students for a democratic society
http://www.studentsforademocraticsociety.org/
associação de solidariedade sindical estudantil (Quebéc)
http://www.asse-solidarite.qc.ca/
Free Education
www.free-education.org.uk
Australian Student Environment Network (ASEN)
http://www.asen.org.au/
Students from the Antiauthoritarian Movement
http://www.resistance2003.gr/en/
Luta contra a privatização da educação na Grécia
http://www.ntua.gr/posdep/MME/media/2007-vol3_no2_Takis_education_Greece.htm
Frente de estudiantes libertários (Chile)
http://www.felchile.org/
Federação de estudantes chilenos
http://www.malaclase.cl/
Estudantes progressistas
http://parisar.wordpress.com/
Federação belga de estudantes francófonos
http://www.fef.be/index.html
Students for global democracy
http://www.sfgd.org/
Students resistance
http://studentresistance.wordpress.com/
Students environmental action alliance
http://www.seac.org/
Students farmworker alliance
http://sfalliance.org/
Students against sweatshops
http://www.studentsagainstsweatshops.org/
Campus anti-war (usa)
http://www.campusantiwar.net/
Campus activism (usa)
http://www.campusactivism.org/
Estudos e história dos movimentos estudantis
História dos Movimentos dos estudantes(fr)
http://fr.wikipedia.org/wiki/Mouvements_étudiants
Activismo estudantil (en)
http://en.wikipedia.org/wiki/Student_activism
GERME ( Groupe d'Etudes et de Recherche sur les Mouvements Etudiants)
http://www.germe.info/
Conservatoire des mémoires étudiantes et universitaires (CME)
http://www.cme-u.fr/
Livros sobre as lutas e os movimentos de estudantes nas últimas décadas
-Anos Inquietos - Vozes do Movimento Estudantil em Coimbra (1961-1974), organizado por Rui Bebiano e Maria Manuela Cruzeiro, edição da Afrontamento
(entrevistas a activistas estudantis dos anos 60)
RETRATOS DE UMA GERAÇÃO DE LUTA ESTUDANTIL
por João Mesquita
Público, domingo, 10 de Setembro 2006
Numa altura em que está definitivamente relançado o debate sobre os anos 60 do século XX, um livro que amanhã será colocado à venda vem atirar mais achas para a fogueira. Intitula-se Anos Inquietos - Vozes do Movimento Estudantil em Coimbra (1961-1974) e as sete entrevistas que constituem o seu prato-forte são um contributo para um retrato de uma geração. Tanto mais que os entrevistados não se limitam a falar das lutas que protagonizaram durante mais de uma década, antes se pronunciam sobre toda uma vida, a de hoje incluída. Mesmo se algumas vozes ficaram de fora
O movimento era contraditório e talvez daí a sua grandeza". A frase é do pediatra Luís Januário, um dos sete antigos activistas associativos entrevistados para o livro Anos Inquietos - Vozes do Movimento Estudantil em Coimbra (1961-1974), que amanhã é posto à venda. Mas talvez ela constitua o tronco comum ao pensamento dos sete - que está muito longe de ser único - sobre as lutas que protagonizaram nos anos 60 do século XX e, nomeadamente, sobre aquela a que se reporta directamente a tese de Januário: a chamada crise académica de 1969.
"Os anos sessenta não foram maravilhosos nem terríveis, foram um tempo de permanente construção" - sustenta, logo no primeiro prefácio da obra editada pela Afrontamento e a que o PÚBLICO já teve acesso, um dos autores, o historiador Rui Bebiano. As entrevistas "de vida" que se seguem, da responsabilidade da investigadora Manuela Cruzeiro e realizadas no âmbito de um projecto multidisciplinar sobre "culturas juvenis e participação cívica", levado a cabo pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, dão força à ideia.
De facto, se há algo que os entrevistados afirmam recusar, é qualquer visão nostálgica dos movimentos em que participaram. A geógrafa Fátima Saraiva, que integrou a estrutura a quem é atribuída a articulação da luta de 69 - o "Conge" -, é talvez a mais expressiva: "Sinceramente, entusiasma-me muito mais planear o futuro do que recordar o passado". Mas a nota é dada logo pelo primeiro antigo activista a ser ouvido, Eliana Gersão. Garante a jurista, que em 60-61 já intervém associativamente: "Não sou uma nostálgica dos anos 60, nem acho que esses anos tenham sido "os melhores das nossas vidas".
Há, mesmo, quem ache que "hoje está muito mitificada a crise de 69". É o caso de Luís Januário, membro da primeira direcção eleita após o encerramento da Associação Académica pelo governo de Marcello Caetano. "Quando a repressão fechava a Associação, acabava a luta estudantil", sustenta o pediatra. E há, até, quem defina o movimento como "uma bolha", criticando-lhe algum "folclorismo" e apontando o dedo a quem defenderia "que a luta de classes estava ultrapassada e que a nova luta era a do "estudantariado". É o que acontece com outro médico, activista logo na crise de 62, Fernando Martinho.
Acontece que, paralelamente, nenhum dos entrevistados põe em causa os fundamentos do movimento. O próprio Fernando Martinho, actual deputado municipal pela CDU em Coimbra, garante que não só não "desvaloriza a crise e o seu aspecto romântico", como reconhece que ela "foi bonita e muito importante historicamente". Luís Januário, que hoje se situa na chamada esquerda não-alinhada, vai mais longe: "O movimento era incrivelmente festivo, no bom sentido", exclama, antes de admitir que algumas críticas por si formuladas, no passado, à condução das lutas, ignorassem afinal a necessidade de preservar o "carácter de massas" destas e a "unidade global" dos estudantes.
O papel do PCP
Os autores do livro assumem ter deixado de fora a opinião da ultra-minoritária direita estudantil da época, bem como dos "católicos progressistas" e da "esquerda radical", cuja influência maior no movimento situam já na década de 70. Prometem-na para um "segundo volume", a editar dentro "de um ano, ano e meio". O que fica permite, no entanto, perceber como eram heterogéneas as próprias correntes dominantes. Heterogeneidade que não é alheia às diferentes avaliações ainda hoje feitas e que passam muito pela relação com o PCP.
Eliana Gersão confessa: "Nós não sabíamos quem eram os comunistas. Eu até namorei com o António Barreto e não sabia que ele era comunista". Mas havia quem soubesse. Fátima Saraiva, que entrou para a Universidade quatro anos depois de Eliana, conta como, para parte considerável da sua geração, o PCP era, pura e simplesmente, "o partido". E tanto ela como a generalidade dos entrevistados - entre os quais se conta Carlos Baptista, membro do Conselho Fiscal da Associação em 69 e militante comunista desde 65 - sublinham a grande influência do PCP até à maior revolta estudantil ocorrida em Portugal.
Em Coimbra, é precisamente a partir de 1969 que essa influência começa a decrescer. "A invasão da Checoslováquia criou muitos problemas de consciência", assume Baptista. E, tanto ele como Fernando Martinho, que já vivera os movimentos de 62 e de 65, reconhecem o surgimento de "muito mais gente com outras concepções políticas". Entra ela, os chamados "contestas", onde pontificam trotsquistas como Francisco Sardo. Os mesmos que então atraem Luís Januário: "(Era) a questão da revolta incluir uma componente pessoal, que envolvesse a nossa forma de viver o dia-a-dia, o relacionamento com as mulheres, as aulas...".
Pio de Abreu, igualmente médico, destaca outros sectores: "Existia já muita gente a falar da revolução chinesa e, sobretudo, a criticar o marxismo-leninismo - e, mais ainda, o estalinismo -, sem voltar propriamente às ideias de Trotsky". Certo é que também ele, como Fátima Saraiva e Carlos Baptista, "alinhado" com a direcção presidida por Alberto Martins, fala do surgimento de "novas ideias" - "mais do que a ligação de um líder às massas, era precisa a ligação às pessoas". E não poupa na crítica à posição oficial do PCP, de que Barros Moura era, então, o principal rosto: "O PC achava que só os operários podiam fazer a revolução. Os estudantes tinham o papel de chamar a atenção, de fazer pressão".
Acontece que o próprio partido se apresenta dividido, quando eclode a crise de 69. Não por acaso, militantes como Carlos Baptista, Osvaldo Castro e Fernanda Bernarda integram a lista que ganha as eleições, proposta pelo Conselho de Repúblicas. Baptista adianta uma explicação: "Embora o Barros Moura sempre defendesse o trabalho unitário e se insurgisse contra comportamentos facciosos, o grupo identificado com ele não funcionava assim".
"Nem reféns, nem coveiros da memória"
Nem isto, nem a revelação de outras contradições em matérias como a sexualidade ou o medo, obsta, porém, a que da obra ressaltem sempre mais os inúmeros pontos comuns aos entrevistados: a aversão à ditadura derrubada em 74 e a facetas como o colonialismo e o sexismo; a apetência pelas práticas culturais e pelas tertúlias; a recusa do "praxismo"; a valorização do trabalho colectivo; a desconfiança face ao poder. Talvez porque, apesar das diferenças, todos se afirmem "de esquerda". Ou simplesmente porque, como escreve Manuela Cruzeiro no seu prefácio: "Nem reféns da memória, nem seus coveiros. Todos os entrevistados são pessoas que gostam do seu passado".
Em nenhum deles se nota, de facto, o mínimo sinal de arrependimento. Pelo contrário. É ver o gozo com que José Cavalheiro, que só esteve em Coimbra em 68-69, conta como escreveu na cela da primeira cadeia onde foi encarcerado: "Senhores da alta finança, o pôr-do-sol será sangrento!". Ou o modo como Luís Januário se analisa: "No meio da cegueira da ideologia, creio que tive sempre um rabo de olho para a coragem, a inteligência, a beleza. Mesmo que viessem dos meus opositores ou inimigos".
Retratos de uma geração
Numa altura em que está definitivamente relançado o debate sobre os anos 60 do século XX, um livro que amanhã será colocado à venda vem atirar mais achas para a fogueira. Intitula-se "Anos Inquietos - Vozes do Movimento Estudantil em Coimbra (1961-1974) e as sete entrevistas que constituem o seu "prato-forte" são um contributo para um retrato de uma geração. Tanto mais que os entrevistados não se limitam a falar das lutas que protagonizaram durante mais de uma década, antes se pronunciam sobre toda uma vida, a de hoje incluída. Mesmo se algumas "vozes" ficaram de fora.
A grandeza de um movimento contraditório
"O movimento era contraditório e talvez daí a sua grandeza". A frase é do pediatra Luís Januário, um dos sete antigos activistas associativos entrevistados para o livro "Anos Inquietos" - Vozes do Movimento Estudantil em Coimbra (1961-1974), que amanhã é posto à venda. Mas talvez ela constitua o tronco comum ao pensamento dos sete - que está muito longe de ser único - sobre as lutas que protagonizaram nos anos 60 do século XX e, nomeadamente, sobre aquela a que se reporta directamente a tese de Januário: a chamada crise académica de 1969.
"Os anos sessenta não foram maravilhosos nem terríveis, foram um tempo de permanente construção" - sustenta, logo no primeiro prefácio da obra editada pela "Afrontamento" e a que o PÚBLICO já teve acesso, um dos autores, o historiador Rui Bebiano. As entrevistas "de vida" que se seguem, da responsabilidade da investigadora Manuela Cruzeiro e realizadas no âmbito de um projecto multidisciplinar sobre "culturas juvenis e participação cívica", levado a cabo pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, dão força à ideia.
De facto, se há algo que os entrevistados afirmam recusar, é qualquer visão nostálgica dos movimentos em que participaram. A geógrafa Fátima Saraiva, que integrou a estrutura a quem é atribuída a articulação da luta de 69 - o "Conge" -, é talvez a mais expressiva: "Sinceramente, entusiasma-me muito mais planear o futuro do que recordar o passado". Mas a nota é dada logo pelo primeiro antigo activista a ser ouvido, Eliana Gersão. Garante a jurista, que em 60-61 já intervém associativamente: "Não sou uma nostálgica dos anos 60, nem acho que esses anos tenham sido "os melhores das nossas vidas".
Há, mesmo, quem ache que "hoje está muito mitificada a crise de 69". É o caso de Luís Januário, membro da primeira direcção eleita após o encerramento da Associação Académica pelo governo de Marcelo Caetano. "Quando a repressão fechava a Associação, acabava a luta estudantil", sustenta o pediatra. E há, até, quem defina o movimento como "uma bolha", criticando-lhe algum "folclorismo" e apontando o dedo a quem defenderia "que a luta de classes estava ultrapassada e que a nova luta era a do "estudantariado". É o que acontece com outro médico, activista logo na crise de 62, Fernando Martinho.
Acontece que, paralelamente, nenhum dos entrevistados põe em causa os fundamentos do movimento. O próprio Fernando Martinho, actual deputado municipal pela CDU em Coimbra, garante que não só não "desvaloriza a crise e o seu aspecto romântico", como reconhece que ela "foi bonita e muito importante historicamente". Luís Januário, que hoje se situa na chamada esquerda não-alinhada, vai mais longe: "O movimento era incrivelmente festivo, no bom sentido", exclama, antes de admitir que algumas críticas por si formuladas, no passado, à condução das lutas, ignorassem afinal a necessidade de preservar o "carácter de massas" destas e a "unidade global" dos estudantes.
O papel do PCP
Os autores do livro assumem ter deixado de fora a opinião da ultra-minoritária direita estudantil da época, bem como dos "católicos progressistas" e da "esquerda radical", cuja influência maior no movimento situam já na década de 70. Prometem-na para um "segundo volume", a editar dentro "de um ano, ano e meio". O que fica permite, no entanto, perceber como eram heterogéneas as próprias correntes dominantes. Heterogeneidade que não é alheia às diferentes avaliações ainda hoje feitas e que passam muito pela relação com o PCP.
Eliana Gersão confessa:" Nós não sabíamos quem eram os comunistas. Eu até namorei com o António Barreto e não sabia que ele era comunista". Mas havia quem soubesse. Fátima Saraiva, que entrou para a Universidade quatro anos depois de Eliana, conta como, para parte considerável da sua geração, o PCP era, pura e simplesmente, "o partido". E tanto ela como a generalidade dos entrevistados - entre os quais se conta Carlos Baptista, membro do Conselho Fiscal da Associação em 69 e militante comunista desde 65 - sublinham a grande influência do partido até à maior revolta estudantil ocorrida em Portugal.
Em Coimbra, é precisamente a partir de 1969 que essa influência começa a decrescer. "A invasão da Checoslováquia criou muitos problemas de consciência", assume Baptista. E, tanto ele como Fernando Martinho, que já vivera os movimentos de 62 e de 65, reconhecem o surgimento de "muito mais gente com outras concepções políticas". Entra ela, os chamados "contestas", onde pontificam trotsquistas como Francisco Sardo. Os mesmos que então atraem Luís Januário: "(Era) a questão da revolta incluir uma componente pessoal, que envolvesse a nossa forma de viver o dia-a-dia, o relacionamento com as mulheres, as aulas...".
Pio de Abreu, igualmente médico, destaca outros sectores: "Existia já muita gente a falar da revolução chinesa e, sobretudo, a criticar o marxismo-leninismo - e, mais ainda, o estalinismo -, sem voltar propriamente às ideias de Trotsky". Certo é que também ele, como Fátima Saraiva e Carlos Baptista, "alinhado" com a direcção presidida por Alberto Martins, fala do surgimento de "novas ideias" - "mais do que a ligação de um líder às massas, era precisa a ligação às pessoas". E não poupa na crítica à posição oficial do PCP, de que Barros Moura era, então, o principal rosto: "O PC achava que só os operários podiam fazer a revolução. Os estudantes tinham o papel de chamar a atenção, de fazer pressão".
Acontece que o próprio partido se apresenta dividido, quando eclode a crise de 69. Não por acaso, militantes como Carlos Baptista, Osvaldo Castro e Fernanda Bernarda integram a lista que ganha as eleições, proposta pelo Conselho de Repúblicas. Baptista adianta uma explicação: "Embora o Barros Moura sempre defendesse o trabalho unitário e se insurgisse contra comportamentos facciosos, o grupo identificado com ele não funcionava assim".
"Nem reféns, nem coveiros da memória"
Nem isto, nem a revelação de outras contradições em matérias como a sexualidade ou o medo, obsta, porém, a que da obra ressaltem sempre mais os inúmeros pontos comuns aos entrevistados: a aversão à ditadura derrubada em 74 e a facetas como o colonialismo e o sexismo; a apetência pelas práticas culturais e pelas tertúlias; a recusa do "praxismo"; a valorização do trabalho colectivo; a desconfiança face ao poder. Talvez porque, apesar das diferenças, todos se afirmem "de esquerda". Ou simplesmente porque, como escreve Manuela Cruzeiro no seu prefácio: "Nem reféns da memória, nem seus coveiros. Todos os entrevistados são pessoas que gostam do seu passado".
Em nenhum deles se nota, de facto, o mínimo sinal de arrependimento. Pelo contrário. É ver o gozo com que José Cavalheiro, que só esteve em Coimbra em 68-69, conta como escreveu na cela da primeira cadeia onde foi encarcerado: "Senhores da alta finança, o pôr-do-sol será sangrento!". Ou o modo como Luís Januário se analisa: "No meio da cegueira da ideologia, creio que tive sempre um rabo de olho para a coragem, a inteligência, a beleza. Mesmo que viessem dos meus opositores ou inimigos".
http://cjuvenis.ces.uc.pt/recortes.aspx
-Movimento estudantil e crise do Estado Novo. Coimbra 1962, por Álvaro Garrido, ed. Minerva Editora, Coimbra, 1996
resumo por Alexandra Silva
“A crise de 62 assumiu características de transição na tipologia das crises académicas
inaugurando um novo ciclo na história das lutas estudantis, de conteúdo explicitamente político e até revolucionário”.
Tendo como capa o símbolo do Dia do Estudante, esta obra, já com alguns anos mas com uma extensão e um rigor que continuam raros, aborda aquela que ficou conhecida como “crise de 62” que nasceu da problemática em torno dos festejos do Dia do Estudante.
O autor começa por discutir o conceito de “juventude” e de “movimento estudantil”, optando por utilizar, para o contexto de 62, a expressão “movimento associativo” por ser aquela que melhor espelha as preocupações dos estudantes e já que o movimento estudantil surgirá apenas em finais de 60, em função da politização acentuada do movimento e do seu interesse por temas extra-estudantis. De seguida avalia as tensões internas e externas do regime que se vinham acentuando desde os anos 50 motivadas por diversas razões: o aparecimento de alguns movimentos de oposição juvenil como o MUD, a contestação ao decreto-lei 40900, a candidatura de Humberto Delgado e o papel do PCP, algumas insubordinações militares falhadas, intervenções de católicos progressistas na vida política do país, o início da guerra colonial. Este era, nas palavras de Manuel Braga da Cruz, “um tempo de diversificação do regime”.
Para uma melhor compreensão dos acontecimentos faz-se uma abordagem do problema universitário nos anos 30 e 40. Entre 1933 e 1945 verificaram-se as primeiras tentativas de “arregimentação” da juventude universitária mas a ditadura militar procurou converter a Universidade numa “corporação orgânica” do regime. As novas condições políticas e mentais da Segunda Guerra Mundial provocaram transformações na Academia de Coimbra - a eleição de Zenha e sua demissão marcou a ruptura da AAC com a universidade e com o regime.
Nota-se a partir de então um esforço legislativo e regulamentador do Estado Novo no que concerne ao associativismo estudantil, com um carácter fortemente tutelar. Foi mesmo a promulgação de legislação cerceadora do funcionamento das AE's que desencadeou os primeiros movimentos académicos de massas em 1956 e 1962.
No capítulo III é analisada com algum pormenor a problemática em torno do decreto-lei 40900, que marcou “o despertar de uma consciência académica” numa academia que até então se pautara por uma “insenção ideológica” mas sempre sensível quando via ameaçada a autonomia dos seus organismos representativos, entendendo-se daí, na visão do autor, “o sentido corporativo, consensual e massificante do protesto estudantil”.
No ano lectivo 1960/61 verificou-se a expansão e abertura do movimento associativo na AAC. É feita uma abordagem do perfil dos novos dirigentes associativos: a “nova geração politizada e de esquerda” ou “nova vanguarda” (encarnada na figura de Silva Marques). Tudo está em mudança. Cresce a intervenção dos membros das Repúblicas que assumem grande importância com a candidatura à DG pelo Conselho de Repúblicas cuja principal linha programática assentava no desenvolvimento de uma acção intencionalmente direccionada para a abertura das estruturas associativas à participação estudantil, bem como a preocupação com as actividades circum-escolares. Regista-se uma alteração no discurso associativo, pautado pela abordagem crescente das temáticas da “formação humana” do estudante e da sua “responsabilidade social” (muitas das questões vêm discutidas em artigos de Via Latina que o autor refere). Verifica-se uma bipolarização ideológica na Academia, na qual surgem polémicas internas indiciadoras de transformações importantes ao nível dos comportamentos e da moral”. Refere-se ao I Encontro Universitário de Convívio em fevereiro de 1961 e à publicação de “Carta a uma jovem portuguesa” de Abril seguinte - situações que as censuras por parte da oposição de “direita” não deixaram escapar, por incrementarem o convívio académico e interacadémico e pela tentativa de impulsionar a participação da mulher universitária nas estruturas associativas. As polémicas inicialmente com uma dimensão moral, rapidamente assumiram uma dimensão política. A conotação ideológica dos novos dirigentes na estratégia de abertura e expansão da vida associativa acabou por operar um fenómeno no sentido contrário: bipolarizou a Academia e afastou os sectores mais tradicionalistas. Um parêntesis para salvaguardar que o “problema ultramarino” era ainda “senão residual, pelo menos secundário” o que chegou a ser criticado pela linha “situacionista” do semanário lisboeta Agora (1961), embora existisse junto dos sectores mais politizados manifestações inequívocas.
No capítulo V são analisadas as proibições ministeriais do I Encontro Nacional de Estudantes e das comemorações do Dia do Estudante, bem como a desconsideração daquelas por parte dos organismos estudantis responsáveis pela sua promoção e organização. Esta reacção marcou a abertura de um movimento académico de contestação dos poderes governamental e universitário nas três cidades universitárias portuguesas. Álvaro Garrido descreve sucintamente ambos os acontecimentos, com princípios marcadamente “sindicalistas”, e as acções/proibições por parte dos organismos repressivos do Estado: a nota oficiosa do SNI, o “luto académico”, o pedido de demissão de Marcello Caetano do cargo de reitor da Universidade de Lisboa. De certa forma isto convergiu numa proximidade com o reitor que assumiu uma atitude pró-estudantil, ao contrário do que se verificou em Coimbra onde a conflitualidade com o reitor Guilherme Braga da Cruz se manifestou. O alvo preferencial da contestação estudantil coimbrã transferiu-se para as próprias autoridades universitárias, tendo a agitação estudantil e consequente repressão do Estado, atingido níveis radicais.
Tomando consciência do movimento sindicalista no seio dos estudantes e face aos acontecimentos de Coimbra o MEN fez suspender em Maio de 1962 os corpos gerentes da AAC (DG e Assembleia Magna) e revogar alguns enunciados dos respectivos estatutos. Os destinos da AAC passaram a ser geridos por uma Comissão Administrativa, mudança esta que remetia o movimento associativo coimbrão para um plano clandestino, que passou a estruturar-se informalmente em assembleias plenários nas Repúblicas ou locais de convívio estudantil da cidade. Tudo toma a dimensão de uma forte radicalização que vai desde a ocupação da sede da AAC por parte dos estudantes (como se vê numa fotografia incluída pelo autor na obra) até aos consequentes castigos como a suspensão e exclusão do ensino e mesmo a prisão de estudantes por ordem do ME.
Considerando que o grande problema do Estado era o sindicalismo estudantil, é feita uma análise do pretendido corporativismo universitário e explicadas as teses do associativismo estudantil, baseado no movimento associativo francês e na UNEF. Conclui-se a incompatibilidade com o corporativismo universitário defendido pela doutrina do Estado autoritário, no domínio social, ideológico, político ou filosófico. Para caracterizar a falta de unidade no que a este assunto respeita, o autor indica-nos os vários sectores da opinião académica: os “católicos” - constituídos por elementos organicamente ligados ao CADC e que assumem uma posição corporativista; as “direitas” - constituídas por elementos mais ou menos afectos ao regime e onde também se incluem alguns dos primeiros destacando-se os “ultra-direitistas” agrupados no Movimento Jovem Portugal e que assumem uma posição antiassociativista; as “esquerdas” - elementos afectos à DG de 19600/61 e 1961/62, mesmo os desvinculados do PCP mas também os ligados a esta estrutura clandestina, assumindo todos uma posição reivindicativa ou de pendor sindicalista.
“Entre 1962/65 por força da repressão governamental o movimento estudantil e associativo nacional foi remetido a uma situação defensiva”. Diluíra-se a unidade estudantil. O Estado reconhecer pelo decreto-lei 44632/62 a autonomia das organizações circum-escolares cerceando o crescimento qualitativo e quantitativo das AE's e assumindo um carácter marcadamente preventivo. Em Coimbra, travado o movimento associativo, reforçava o seu poder o Conselho das Repúblicas.
Na conclusão Álvaro Garrido salvaguarda o “carácter redutor e convencional” da designação de “crise de 62”. A obra possui ricos anexos: I - Cronologia da crise académica de Coimbra-62; II - Sanções disciplinares aplicadas aos alunos matriculados na UC devido à participação nos acontecimentos académico; III - Fotografais da crise académica de Coimbra-62.
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-Encyclopedia of Student and Youth Movements, David F. Burg, New York, Facts on File Inc., 1998, 254 pp
resumo por Alexandra Silva
Alertando para a importância do estudo dos movimentos sociais, Burg, escritor e editor com formação em história e sociologia, pretende demonstrar o quão diferentes e geograficamente espalhados os movimentos juvenis e estudantis são, apesar de se ficar desde logo com a noção da impossibilidade de os abranger todos. Assim, a sua preocupação foi centrar-se na análise dos movimentos, organizações e pessoas que tiveram maior impacto quando surgiram, ou uma maior influência nos momentos que se lhe seguiram.
Discute-se aqui a separação entre student movements e youth movements , “virtualmente todos os movimentos estudantis são movimentos juvenis, mas nem todos os movimentos estudantis são movimentos juvenis”. Ambos envolvem a juventude, desenvolvem-se a partir de uma mesma origem histórica, partilham frequentemente ideias e pressupostos similares, e por vezes têm um importante significado político e social, embora normalmente se inscrevam na curta duração. Os movimentos estudantis foram em regra iniciados por estudantes universitários como actos de rebelião contra formas de opressão académica, social, política ou económica e foram, também, por norma, espontâneos e efémeros. Muitas vezes surgiram como resposta a uma circunstância imediata, como por exemplo a revolução de 1848 ou a guerra do Vietname.
Característica comum entre os movimentos estudantis e os juvenis, é o facto de se apresentarem como uma espécie de contra-poder dentro de um sistema político autoritário e opressivo. Porém, certas vezes alguns deles são, ao contrário, criados com o propósito de transmitir os valores autoritários vigentes, isto é, a própria força institucional: muitos movimentos foram criados pelos estudantes e outros pelos adultos para os estudantes. Em suma, os movimentos estudantis e os movimentos juvenis partilham importantes semelhanças e são interactivos e também complementares, partilhando práticas e integrando, por vezes, os mesmos actores. Mas cada movimento tem a sua própria identidade no que respeita à faixa etária dos seus intervenientes, ao espaço a que se confinam, à duração, às formas de actuação e finalidades.
Percorrendo as letras do abecedário, este estudo é bastante abrangente em termos de amplitude temporal, uma vez que vai desde a Antiguidade até à actualidade revelando diferentes formas de actuação, o móbil, os intervenientes, as influências, as consequências. Contém referências a movimentos de várias cidades do mundo desde organizações feministas, a anti-raciais, passando por associações de estudantes, conceitos realcionados com as culturas juvenis, organizações religiosas ou políticas ou nomes de líderes.
Com a suficiente profundidade que um estudo deste género implica, não deixa de ter no final de algumas entradas referências bibliográficas para que os interessados possam aprofundar o seu estudo. Contém uma vasta lista de bibliografia seleccionada e um índice alfabético que facilita a pesquisa de assuntos. Talvez ajudasse, dada a extensão temporal, um índice por datas ou períodos históricos. Muitas entradas são ainda apoiadas por imagens alusivas.
Retirado de:
http://cjuvenis.ces.uc.pt/detalhesNotasLeitura.aspx?id=23&Page=0
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-The Sixties. Cultural Revolution in Britain, France, Italy, and the United States, c.1958-c.1974, Arthur Marwick, Oxford, Oxford University Press, 1999
resumo por Alexandra Silva
Esta obra constitui um monumental estudo da mudança social e política na Europa e Estados Unidos durante o período da revolução cultural, a aclamada obra de Arthur Marwick, professor e historiador que fundou o Sixties Research Group na Open University.
Com uma lista de bibliografia extensa e um vasto índice de temas, ajuda-nos a encontrar leituras sobre os mais variados acontecimentos, personalidades, correntes de pensamento, culturas, etc., que marcaram os anos 60. Contém ainda um rico conjunto de fotografias que ilustram os assuntos tratados, desde a música às estrelas de cinema, passando pela moda e a arte, até às manifestações sociais e políticas.
O autor começa por se questionar se houve uma revolução cultural entre 1958 e 1974, aquele que considera ser o abrangente período dos sixties, discutindo algumas das características de uma época que considera ter sido única e demonstrando as fontes e métodos a que recorreu para o seu estudo. De seguida, e considerando que esta ocorreu a questão que coloca é “porquê?”, discutindo os problemas dessa explanação, ressalvando as peculiaridades das 4 nações que se propôs abordar e avaliando a convergência e as forças de mudança ocorrida.
Parte então para a avaliação dos primeiros sinais da revolução cultural, no período entre 1958 e 1963. É o tempo da afirmação de uma nova cultura juvenil que se desdobra em subculturas com novos interesses e novas preocupações que vão do jazz ao rock n´roll, passando pela arte, as questões morais ou raciais, o cinema ou a literatura.
Centrando-se nos “high sixties”, isto é, o período decorrido entre 1964 e 1969, no qual é assassinado de John F. Kennedy, se dá um espantoso desenvolvimento da tecnologia, Nixon assume o poder, se cria o Estado-Providência em vários países e se verifica uma maior preocupação com os sistemas de educação. Desenvolvem-se cada vez mais um largo número de subculturas mas bastante ligadas entre si, que fazem circular as suas ideias através da televisão, revistas, teatro experimental. Divulgam-se as teorias estruturalista e conceptualista e filósofos como Marcuse, Lévi-Strauss, Foucault ou Derrida ou Sartre marcaram a mudança ideológica. Paralelamente, também na arte, na poesia, na música, na arquitectura, no teatro experimental se operavam mudanças profundas.
A emigração, a pobreza nos EUA, as estruturas familiares envoltas numa maior permissividade são aspectos também estudados por Marwick, que não deixa ainda de discutir o conceito de Beleza como ele surgiu nos anos 60. Problematiza ainda toda a discussão em torno do consumo de álcool, que tanta polémica suscitou nos EUA ou a construção dos bairros periféricos de Paris e todas as preocupações ambientais e sociais que isso gerou. No meio de tudo isto, assiste-se a uma irresistível americanização mas que acaba por atingir uma dimensão internacional, mas por exemplo a Inglaterra não deixa de invadir os EUA por exemplo com a sua música: é o tempo dos Beatles e dos Rolling Stones conquistarem uma parte significativa do público americano. O autor dá a este título o nome de Les Années Anglaises demonstrando a interacção cultural que acabou por se dar entre os vários países, que acolheram novas formas de cultura. Hippies, yippies, progressives e do-gooders são alguns dos grupos juvenis que o autor analisa nas suas práticas sociais, formas de cultura, impacto na sociedade e que marcaram esta época. Lutam pelas liberdades pessoais e direitos civis, reagem contra a guerra do Vietname, procuram melhores condições de ensino. Neste sentido, Marwick analisa o ano de 1968 (“a date to remember?”) e os delicados acontecimentos na Itália, Paris, Inglaterra e América. O movimento estudantil atingiu uma dimensão internacional com os estudantes a lutarem por ideais semelhantes, com preocupações comuns e formas de protesto que nem sempre foram as mais pacíficas.
Os anos entre 69 e 74 foram os anos da libertação da mulher e do feminismo com as batalhas sobre a liberdade sexual, a contracepção e o aborto, o divórcio e a igualdade de direitos. Mas foi também o período da libertação gay, do fim da censura no cinema e da arte surrealista. Vive-se o termos das intensas lutas universitárias, mas surge um certo mal-estar nas escolas secundárias, despoletando-se ainda o fenómeno terrorista em vários países. No início dos anos 70 houve tensão e violência, marcadas por uma extrema intolerância e pobreza. São apresentados os resultados de algumas questões colocadas às pessoas nos vários países da Europa e nos EUA, onde se procura analisar as consequências da mudança operada nos últimos anos e onde se conclui que a sociedade está carente e onde se verifica uma certa nostalgia dos anos 60. Mas pelos resultados apresentados, verifica-se existir uma notória melhoria das condições de vida.
Marwick fala da consumação cultural que envolveu inúmeras pessoas por todo o mundo e, em jeito conclusivo, afirma que os anos 60 não foram só o tempo do prazer e do excesso, e que nenhum outro período histórico dispôs ou disporá de uma semelhante caracterização.
Retirado de:
http://cjuvenis.ces.uc.pt/detalhesNotasLeitura.aspx?id=27&Page=0
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-Student resistance – a history of the unruly subject, Mark Boren, New York, Routledge, 2001
resumo por Alexandra Silva
Boren pretende compor uma história cronológica global do movimento estudantil, tendo em conta a sua importância, uma vez que, em momentos de crise, os estudantes “foram a força sociológica, política e física mais poderosa”. Justifica o título da obra considerando que o movimento estudantil sempre foi um movimento de resistência contra a agressão e opressão, considerando, em jeito de trocadilho, a Resistência como o 4º R, numa referência aos 3 érres da Educação: Reading, ´Riting and ‘Rithmatic.
O livro começa com uma incursão pelo nascimento da universidade e a formação da resistência estudantil, seguindo-se uma abordagem pela Universidade e a Reforma e as lutas estudantis. Segue-se um capítulo sobre a “modernização do poder estudantil e o nascimento do líder estudantil”, centrado numa tentativa de explicação das revoltas estudantis de 1848 e das suas derivações para outros países, bem como no nascimento de organizações estudantis. Entrando no período que vai do início do novo século ao fim da I Grande Guerra, analisa a proliferação global do poder estudantil: os estudantes continuaram a organizar-se e a onda de protestos face à Guerra e, de seguida, a “Reforma e terrorismo nos anos 20 e 30” (análise dos acontecimentos em vários países onde se deram ataques ao imperialismo). “Militância estudantil e estado de guerra, 1940-1959” é o ponto onde Boren aborda a radical reforma do activismo europeu durante e depois da 2ª Guerra Mundial, a mudança de natureza das organizações que se tornaram mais politizadas, o papel da Union Nationale des Etudiants de France (UNEF), a luta dos estudantes ingleses contra o desarmamento nuclear. Considera o momento do pós-guerra de “attack and counterattack”: acção dos estudantes húngaros, acontecimentos e posições na Ásia, nascimento da resistência estudantil na Índia, poder estudantil na África, activismo estudantil americano – a contestação e posições em relação à Guerra Fria; as organizações anti-comunistas como a The United States Students Assembly ou, por outro lado, pró-comunismo como a Socialist Youth League ou a American Youth League, que foram atacadas por organizações patrióticas americanas. É ainda abordado o activismo estudantil durante a Grande Guerra e a formação de grupos ligados à SANE (National Comittee for a Sane Nuclear Policy) organizada em 1958 ou a SLATE da Califórnia, que tinha o intuito de reduzir o papel da ala direita estudantil, através de boicotes e protestos. Outras organizações: a Student Peace Union, de carácter liberal nascida em Chicago, a CORE – organização estudantil anti-racismo.
Além dos protestos contra a Guerra, as lutas pelos direitos civis, a participação política, os estudantes insurgiam-se também contra as intervenções no campo pedagógico que, desde 1945, vinham a forçar as escolas a integrar mais cursos e mais pessoas, o que em nada contribuía para a qualidade de ensino. Acentua-se também a luta anti-colonialista com os estudantes a tomarem as instalações da universidade como aconteceu em Porto Rico, o que culminou na suspensão de muitos deles. Na América Latina, por sinal, a resistência estudantil começou como uma vingança: mais violenta (em Cuba, principalmente, a partir da morte de um estudante), mas também no Brasil, Guatemala, Colômbia ou Argentina (sendo aqui a acção muito mais controlada devido a uma maior repressão).
Os estudantes estavam organizados em cada um dos seus países e tiveram um papel importante ao manifestarem-se contra a guerra. A troca de informação, ideologias e tácticas entre si definir-se-ia então, tornando-se importantíssima durante os anos 60.
O autor parte em seguida para uma análise da resistência estudantil nesse período, focando diversas experiências: “Coreia do Sul: os fogos da revolta”, “Estudantes japoneses continuam a organizar-se”, “A revolução cultural e a dissolução da dissidência na China”, “A revolução estudantil na Indonésia”, “Revolução e reformas na Índia”, “O estado da resistência estudantil na França”, “Os estudantes alemães tornam-se radicais nos anos 60”, “Uma face diferente do radicalismo: as acções dos estudantes na Holanda”, “Estudantes checos e a Primavera de Praga”, “Estudantes turcos”, “Resistência estudantil em África”, “A luta estudantil pela liberdade nos Estados Unidos”, “Os estudantes latino-americanos e o regresso do extremismo nos anos 60”. Com uma explicação cuidada dos motivos, realidades, acções e condicionantes dos movimentos estudantis nestes locais, em jeito conclusivo se verifica que um pouco por todo lado a participação política, a luta pelos direitos humanos e a formação de uma nova cultura juvenil foram ponto comum nas mais variadas universidades, bem como a repressão policial e as lutas com as autoridades.
Numa abordagem mais concreta aos anos de 68 e 69, 1968 é aqui considerado “o ano do estudante”, o momento histórico da resistência estudantil em várias cidades do mundo. Naturalmente, é feita uma abordagem pormenorizada dos acontecimentos de França, mas também da Irlanda, Inglaterra, Alemanha, Itália, Europa de Leste, África, Paquistão ou Japão, México e Estados Unidos. Em todos se denota a participação política ou crescente politização, bem como a radicalização do movimento e o esforço repressivo do poder institucional.
No início dos anos 70 as lutas começaram gradualmente a amainar do ponto de vista do seu radicalismo. Deveu-se sobretudo à obtenção de algumas respostas às lutas dos estudantes, o que os levou a acalmar, ou por outro lado, ao aumento da repressão policial, que calou vozes. São avaliados os acontecimentos da Alemanha, Estados Unidos, México, Japão, Tailândia e Indonésia, China, Coreia do Sul e sudoeste asiático, Rodésia e Irão.
“A revolução no mundo pós-moderno, 1980-1989” é o capítulo onde aborda as realidades de alguns países durante os anos 80. Salienta-se: Pinochet e os protestos dos chilenos, as lutas dos mexicanos contra as reformas, o Apartheid, as lutas no Paquistão, a resistência estudantil na Palestina, revolução na Checoslováquia, na Roménia, Burma, Coreia do Sul, China.
“Estudantes irrequietos no nascer do novo milénio” é o último capítulo, no qual é abordada a realidade dos anos 90. Os estudantes voltaram a agitar-se por todo o mundo. No Brasil, por exemplo, o interesse pelo activismo político reavivou-se e aos protestos estudantis juntaram-se os das classes laborais. As suas demonstrações foram, em certa medida, bem sucedidas, mas o mesmo não aconteceu noutros países da América latina. Também nos Estados Unidos se verificou um renascimento do activismo estudantil, cujos protestos incidiram fortemente sobre a Guerra do Golfo, mas ainda sobre a questão do limite de consumo de álcool ou sobre o estabelecimento de programas de estudos étnicos nas universidades ou a atribuição de benefícios de saúde para estudantes graduados. Nas universidades europeias verificaram-se profundas reformas que provocaram novas reacções nos estudantes um pouco por todo o lado.
No epílogo o autor salienta o papel da resistência estudantil na dinâmica das sociedades e termina com a seguinte questão: “Whiter student resistance?”.
A obra integra ainda uma completa lista de bibliografia que possibilita o aprofundamento dos temas tratados, bem como um bom índice de assuntos que permitem ao leitor orientar-se bem nela. É um bom registo para a história da resistência estudantil em vários pontos do mundo ao longo do tempo, pelo que nos permite conhecer as realidades, no que a esse assunto diz respeito, que em alguns países são menos conhecidas. No entanto, a Península Ibérica parece ter sido aqui praticamente esquecida
Retirado de:
http://cjuvenis.ces.uc.pt/detalhesNotasLeitura.aspx?id=28&Page=1
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- Student protest. The sixties and after, J. Gerard DeGroot, Longman, London e New York, 2003
resumo por Alexandra Silva
DeGroot, investigador em História, da Universidade de St. Andrews, organiza um volume dedicado à cultura de protesto, recolhendo textos de diversos autores que abordam o movimento estudantil na sua complexidade de tempos, espaços e intervenientes. Este estudo bastante variado e com contributos das mais diversas áreas das ciências sociais, oferece-nos um conjunto de textos sobre acontecimentos específicos em várias cidades e períodos históricos, nem sempre fáceis de encontrar.
J. Angus Johnston reflecte sobre o activismo estudantil nos EUA antes de 1960, incidindo sobre os momentos em que os estudantes resistiram à autoridade institucional e em que a resistência deflagrou em protesto, como a escravatura em 1830, a I Guerra Mundial, a onda de activismo nos anos 30 ou a guerra civil americana. Alerta ainda para a importância do estudo da diversidade do activismo estudantil antes dos anos 60, a ter em conta para o estudo dos movimentos surgidos depois. A National Student League (NSL), a Young Communist League (YCL) e a International Union of Students (IUS) são algumas das organizações mais importantes ao longo desses acontecimentos.
A localização do protesto estudantil é um estudo feito por Nella van Dyke, que procura revelar as patentes de activismo nas universidades americanas nos anos 60. Analisa os factores que poderão influenciar na localização dos protestos estudantis concluindo que escolas mais selectivas e com maior tradição política e cultural experienciarão um maior activismo, bem como aquelas que têm uma maior população estudantil. Conclui que o activismo nesses campus influenciará os protestos.
Bertram Gordon aborda o “Maio de 68”, lançando algumas bases teóricas e expondo algumas consequências. Mostra que ao longo dos anos 60 se assiste ao aumento do descontentamento estudantil revelado pelo aparecimento de movimentos como a UNEF, ou o papel da CGT e do PCF. O autor faz uma recolha de testemunhas dos participantes tirando algumas conclusões gerais: os acontecimentos de Maio inserem-se num fenómeno global; o movimento foi extremamente radical, bastante à esquerda, “more red than Mao”; sobressai o socialismo, a igualdade social, a melhoria das condições de vida - revolução social que lançaria as bases para a revolução cultural; marcou uma abertura para emancipação da mulher e a construção de uma nova sociedade. Por fim, os acontecimentos foram vistos como uma falha. Todos viveram represálias e efeitos a longo prazo devido à participação, mas todos reconhecem no Maio de 68 um grande acontecimento para a história do século XX em França.
Os protestos estudantis britânicos durante a guerra do Vietname é também um dos assuntos abordados neste volume. Os assuntos universitários despertaram o activismo (preços das refeições, papel dos estudantes nos assuntos internos da Universidade, a falta de liberdade de expressão) e o Apartheid também mobilizou os alunos. Mas Sylvia Elis indica a oposição à guerra como a principal força dominante, embora estes movimentos tenham sido menos radicais e violentos que os americanos. A autora salienta, nesse contexto, os acontecimentos na London School of Economics, como o palco dos acontecimentos mais radicais, as demonstrações na Grosvenos Square em 1967 e 68 e o papel da National Union of Students (NUS).
Eric Zolon fala sobre o movimentos estudantil no México, cantrando-se na onda de protesto e contracultura em 1968, surgida com a preparação da XIX Olimpíada e que se desenvolveu a partir da contestação ao PRI (Partido Revolucionário Institucional). Estes acontecimentos tiveram grande alcance junto da juventude mexicana de todas as classes e contribuíram para a construção de uma democracia política no México.
“’Left, left, left!’ The Vietnam Day Committee, 1965-66” é o título do artigo escrito por Gerard J. DeGroot, organizador desta obra, e aborda as demonstrações de Maio de 1965 no campus de Berkley da Universidade da Califórnia organizadas pelo Vietnam Day Committee. Este “Carnaval de protestos contra a guerra” que contou com a participação de artistas de mímica, cantores folk e mais de 10 mil pessoas em protesto, teve uma duração de 36 horas e nele se prepararam os passos a dar de seguida. Em Outubro preparou-se uma nova manifestação que viria a coincidir com a International Days of Protest against the Vietnam War, mas a marcha acabou por sair gorada devido ao seu extremismo.
Na Alemanha, os estudantes saíram também à rua e manifestaram-se na Rudi Dutschke Long March, personificada na figura de Rudi Dutschke como o ideólogo da Association of Socialist Students, a organização estudantil socialista ideologicamente mais forte na Alemanha. Neste artigo, o autor Ingo Cornils fala ainda das influências desta luta anti-autoritária (personalizadas nas obras de Habermas, Marcuse ou Ernst Bloch) e da organização de um congresso anti-Vietnam em Berlim.
O estudo seguinte é assinado por Clare White tem como título: “Duas respostas ao protesto estudantil: Ronald Reagan e Robert Kennedy”. Refere as posições de ambos os presidentes na questão estudantil, mas com sentidos de resposta opostos: Kennedy tenta ganhar o apoio dos estudantes, sobretudo da Nova Esquerda (nada surpreendente considerando a sua experiência política e pessoal), por sua vez, Reagan tenta refrear os radicalistas e tentará uma aproximação a longo prazo.
“O governo mexicano e o conflito estudantil” é um ensaio de Donald Mabry sobre os acontecimentos da National Autonomous University of Mexico, com especial incidência sobre os anos de 1929 e 1968 e as tentativas de melhoria por parte de L. Echeverria nos anos 70.
D. Moses reflecte sobre as fontes ideológicas do Estado e a radicalização estudantil na Alemanha Oeste, entre 1967 e 1977, verificando-se uma semelhante legitimação ideológica, sendo que uma das mais importantes era nunca mais permitir que o Nazismo ou algo semelhante voltasse a assolar a Alemanha.
No artigo seguinte, Julie Reuben aborda as tentativas de reforma nas universidades dos EUA com a criação das free universities que propunham uma linha programática de acordo com aquilo que os estudantes consideravam ser mais importante para o seu currículo, nomeadamente trazer os assuntos políticos e sociais para os currículos e a criação de novos programas.
Sandra Hollin Flowers apresenta-nos um estudo particular sobre as organizações estudantis afro-americanas e suas manifestações. Destaque para a Association for the Advancement of Colored People (NAACP), a Congress of Racial Equality (CORE), a Southern Christian Ladership Conference (SCLC). Estes movimentos caracterizam-se pela crítica social e não pela reacção à administração da Universidade. Neles participam brancos e negros e as manifestações não são violentas. Nos anos 50 a opressão racial e a segregação deram origem ao desenvolvimento de uma consciência política. Nos anos 60 as lutas estão associadas à ideologia de esquerda e às lutas de independência africana, assistindo-se a uma radicalização do movimento que cria o slogan ‘black power’ e ao crescente nacionalismo e preocupação com a Nação.
A emergência do papel das mulheres na luta contra a guerra do Vietname é um estudo apresentado por Barbara L. Tischler, pois considera que a luta contra aquela guerra esteve nas origens do activismo feminino de finais de 1960, inícios de 1970, que se foram aproximando dos ideais de várias organizações da chamada Nova Esquerda ou de organizações anti-capitalistas como a Students for a Democratic Society (SDS). A autora salienta a forma árdua como as mulheres tiveram de lutar para se fazerem ouvir, criando novas organizações feministas e vários jornais de protesto que expandissem a sua causa.
Salvo as diferenças sociológicas e históricas, Gunter Minnerup demonstra a simetria entre duas épocas da história dos movimentos sociais na Alemanha: a revolução estudantil na Alemanha Ocidental em 1968 e o movimento civil dos cidadãos na Alemanha de Leste em 1989. À parte o hiato temporal, uma linha comum se mantém: o fechamento cultural e a opressão.
Artigo bastante interessante é aquele que apresenta Alan R. Kluver sobre os movimentos estudantis nas sociedades confucianas. Os movimentos estudantis são muitas vezes vistos como um produto das tradições filosóficas e políticas ocidentais. O autor apresenta então o caso da Coreia do Sul onde os estudantes universitários serão uma das maiores forças políticas não-governamentais, tentando demonstrar que aí os protestos estudantis refectem os valores e papéis da tradição política confuciana, conjugados com os conceitos modernos de democracia e direitos civis.
Behrooz Ghamari-Tabrizi faz um estudo sobre os estudantes de esquerda na revolução iraniana (1977-1981), apresentando-nos a revolução cultural islâmica, algumas organizações militantes (com particular destaque para a Militant Student Organization - MSE), acontecimentos durante a revolução (como os estudantes massacrados no Black Friday - 1978 - e outros esmagados pela República Islâmica - 1981. Salienta que o movimento estudantil foi sempre secundário pois a Esquerda reduziu-o à luta geral contra o imperialismo e a favor do socialismo.
Frank N. Pieke estuda o “Movimento Popular da China em Beijig em 1989”, descrevendo os acontecimentos económicos que estiveram na origem dos protestos populares e em particular dos estudantis e as consequências das demonstrações, como a aplicação da Lei Marcial.
A última participação nesta reunião de textos de DeGroot diz respeito a um acontecimento histórico mais recente. Trata-se da crise de 1992 na Universidade do Estado de San Diego, analisada por James L. Wood. Nas suas razões antecedentes e próximas que levaram os estudantes, na sua maioria não ligados a instituições políticas, a organizarem a chamada The Vigil (a Vigília). Esta, constituiu o ponto alto das demonstrações, movendo um extenso grupo de participantes.
A obra possui uma nota final sobre cada autor, o que pode ser muito útil para o leitor, e um bom índice de assuntos. Carece, talvez, de uma listagem de bibliografia que seria um contributo muito enriquecedor para os que estejam interessados em aprofundar determinados assuntos aí tratados.
Retirado de:
http://cjuvenis.ces.uc.pt/detalhesNotasLeitura.aspx?id=77&Page=1
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Ler ainda o artigo de opinião de Sam Graham-Felsen, jornalista da revista americana The Nation onde analisa os movimentos estudantis "de esquerda" nas Universidades dos Estados Unidos da América nos últimos anos:
http://www.thenation.com/doc/20060213/grahamfelsen