Costuma-se associar o termo de contra-cultura – que foi popularizado pelo livro «The making of a Counter Culture» de Theodore Roszak em 1969 – aos anos sessenta. Mas se ensaiarmos uma definição logo veremos que a contracultura não é privativa do ambiente cultural vivido nessa década e que, pelo contrário, podemos encontar manifestações contra-culturais em muitas outras épocas e latitudes.
«…o essencial de uma contra-cultura, enquanto fenómeno histórico perene, é marcado pela afirmação do poder do indivíduo a criar a sua própria vida, e não tanto em aceitar os diktats das convenções sociais ou das autoridades da época, quaisquer que sejam as configurações com que o pensamento dominante e as subculturas se apresentam»
Trata-se, é certo, de uma definição algo vaga, que carece de precisões acerca dos princípios e valores, sobre o que distingue o pensamento dominante e as subculturas dominadas, quer de grupos étnicos e religiosos minoritários quer de grupos dissidentes contra-culturais.
As características fundamentais da contra-cultura são de 3 ordens:
- a contra-cultura confere primazia ao indivíduo relativamente às convenções sociais e às condicionantes governamentais
- a contra-cultura questiona o autoritarismo em todas as suas formas, desde as mais subtis às formas mais brutais
-a contra-cultura pressupõe a relação estreita entre a transformação individual e as mudanças sociais.
O indivíduo está, pois, no centro da contra-cultura. Concepções segundo as quais a mudança social se funda em valores altruístas e em que o individualismo é sempre entendido como um egoísmo são logicamente estranhas à contra-cultura.
Com efeito, o individualismo deve ser compreendido conforme o preceito socrático « Conhece-te a ti mesmo», além de que o individualismo contra-cultural é um individualismo profundamente compartilhado.
No prefácio de um dos seus livros, Timothy Leary sublinha a diferenciação entre movimentos contra-culturais e movimentos políticos:
«O meio de acção privilegiado de uma contra-cultura é o poder das ideias, das imagens e da expressão artística, e não a obtenção de poderes pessoais ou políticos. Consequentemente grupos minoritários, alternativos ou partidos políticos radicais não são contra-culturais. Se é certo que os movimentos contra-culturais tem implicações políticas, a verdade é que a tomada do poder e o facto da sua conservação exigir a adesão a estruturas muito rígidas fazem que tal se torne incompatível com a inovação e a criação que estão na base e é a razão de ser da contra-cultura. Ou seja, organização e instituição são incompatíveis com a contra-cultura.»
Outras características da contra-cultura:
- rupturas e inovações radicais em matéria de arte, ciências, espiritualidade, filosofia e modos devida.
- A diversidade.
- Uma comunicação aberta e autêntica, um contacto inter-pessoal profundo, assim como uma generosidade e uma partilha de meios.»
E não menos preciosa é a distinção entre a contra-cultura e as subculturas:
«...as contra-culturas são movimentod transgressivos de vanguarda. As contraculturas revelam uma excepcional diversidade. Pelo contrário, as subculturas definem-se geralmente por uma espécie de conformismo minoritário ou alternativo.»
Qualquer fenómeno contra-cultural envolve uma reacção repressiva da parte do pensamento dominante do sistema instituído. E, no limite, até a sua recuperação:
« O sistema integra a fraseologia contra-cultural na sua própria propaganda, ao mesmo tempo que os poderes económicos reduzem a arte e a estética contra-cultural a produtos de consumo.»
Em contrapartida, os artistas contra-culturais optam pelo exílio ou pela retirada para comunidades mais ou menos isoladas.
De qualquer forma a separação e o distanciamento relativamente ao pensamento dominante não é propriamente de carácter geográfico e pode até exigir formas muito subtis para que se faça a sua diferenciação:
«Os beats distanciaram-se do hiperconformismo característico da sociedade norte-americana dos anos cinquenta recorrendo a uma maneira de se vestirem e a uma recusa em participarem nessa corrida de ratos, ainda que à custa de uma certa pobreza».