O surrealismo está vivo e lança-se à acção.
Leia-se e multiplique-se
Considerando:
a) que cada dia que passa são cada vez mais as perversões esclavagistas dos Impérios e dos seus cúmplices
b) que a miséria cresce, o crime cresce, a injustiça cresce, as ameaças crescem
c) que está em marcha um ataque armado imperial para cancelar definitivamente a liberdade
d) que somos reféns das ditaduras financeiras, bancárias, clericais, massmediáticas, legalóides, politiqueiras e moralistas
e) que não temos descanso nem nos deixam respirar
f) que pretendem usurpar-nos a vida e a esperança
g) que semearam com mortos os nossos sonhos e vigílias
h) que o medo inunda as noites e dias com noticiários, embargos judiciais e moral policial
i) que o terror tem cotação nas bolsas
j) que estamos acorrentados aos fios da consciência
k) que a podridão e a pouca vergonha desfilam triunfalmente pelas avenidas da impunidade
l) que a democracia fica desfigurada com a mais despudorada campanha nacionalista, fascista e patrioteira
m) que converteram o trabalho numa carnificina
n) que arrastamos pelas ruas as nossas depressões e cansaços como alma escondidas nas sombras elípticas dos abutres
o) que a fome nos tira lascas 365 vezes por minuto
p) que a humilhação goza de perfeita saúde
q) que o desemprego é um grande negócio
r) que tudo é ainda passível de piorar
s) que isto já não é assunto de caciques
t) que somos o alvo
u) que eles fabricam cada dia mais e melhores armas
v) que se votarmos neles seremos então seus
w) que não há tempo a perder. Que a consciência do nosso atraso não é suficiente
x) que o nosso trabalho, tal como está, faz-nos cada vez mais escravos e mais miseráveis
y) que eles estão organizados e se preparam para nos dar o golpe final
z) que não basta unirmo-nos… é preciso organizarmo-nos revolucionarmente
PROMULGAMOS A…
Real Declaração Universal
Dos Direitos da Revolução Permanente
( e as suas permanente obrigações)
I. Todos os seres humanos podem, devem e precisam de ser revolucionários. A partir de hoje será obrigação e direito de todos executar pelo menos três acções revolucionárias diárias contra qualquer sinal de escravidão física e mental.
II. Será reconhecida como revolucionária toda aquela acção organizada que contribua directa ou indirectamente, objectiva ou subjectivamente, para dar por terminado o modo esclavagista e de exploração criado pelo capitalismo imperial.
III. Esta declaração propõe o amor e a poesia como formas supremas da revolução. Toda a indiferença face à revolução será considerado como delito de lesa-majestade
IV. A mansidão, docilidade e inactividade complacentes para com o capitalismo serão consideradas indecentes e imorais
V. Está proibida qualquer revolução na solidão. ( salvo casos excepcionais ou extremos). É dever e direito de toda a pessoa, que se respeite, construir a revolução acompanhado. É mais produtivo, mais seguro e mais saboroso.
VI. Será propósito de cada acto de amor honesto e quotidiano converter-se em revolução que liberte corpos e espíritos para uma vida digna, dentro do possível, ainda que não pareça.
VII. É prerrogativa e obrigação da humanidade contribuir para a construção de uma grande frente única revolucionária ( a Revolução Mundial) que será com a maior brevidade convertida num poema colectivo para a redistribuição equitativa da felicidade e justiça. Tudo isto está nas nossas mãos, isto é, de todos nós.
VIII. É certo que não basta ser rebelde, mas há que começar por alguma coisa. Quando começar a grande revolução mundial, o que só acontecerá quando toda a opressão, escravatura e exploração estejam desterradas, manter-nos-emos revolucionários para não nos transformarmos no seu contrário.
IX. É preciso que a revolução se expresse por todas as áreas da vida. Por isso, daqui para diante, será necessário sermos revolucionários nos sonhos e no descanso, nos jogos e nos trabalhos, pública e em privado. Será prerrogativa de todo o revolucionário produzir beijos revolucionários, abraços revolucionários, carícias revolucionárias. Ciência, artes, filosofias e ofícios revolucionários. Não há desculpas para não se amar em revolução crescente e postergar um minuto que seja os mandatos do desejo.
X. Esta declaração é uma declaração de guerra contra toda a hegemonia da razão sobre os instintos e vice-versa. É uma declaração contra a separação entre a consciência e o inconsciente. É uma declaração de guerra contra a separação entre o espírito e o corpo. É uma declaração de guerra contra a separação do trabalho intelectual e o trabalho manual. É uma declaração de guerra contra a separação entre a riqueza material e os povos que a produzam. Contra a propriedade privada.
XI. Esta declaração é uma declaração de guerra contra a apatia, a desorganização, a depressão, a mediocridade, a sujidade, a miséria, a corrupção, os saldos amargos, a austeridade para tantos, a abulia, as doenças, as deficiências, os atrasos, as desigualdades, os maus tratos, a intranquilidade, a insónia, a impotência, a frigidez, o bom comportamento, as atitudes burguesas, a desnutrição, o abandono, a solidão e a tristeza.
XII. A partir de agora é obrigatória a revolução que fecunde alegria para todos, o bem estar material e emocional, o sexo criativo, lúdico e amoroso, o trabalho não alienante, a paz entusiasta, a vontade de rir-se sem ser por motivos estúpidos, a amizade contundente, o amor louco e tudo quanto a nossa consciência exigir para satisfazer as necessidades, pessoais e colectivas, para aproximarmo-nos daquilo que todos sonhamos como um mundo melhor, que é um mundo sem exploração, feito por e para uma humanidade renovada. E isso não é impossível.
XIII. É inaceitável ser-se indiferente a esta declaração.
XIV.
«Não será o medo à loucura que nos obrigará a baixar as bandeiras da imaginação»
Autor: Fernando Buen Abad Domíngueztradução para português de um original de Fernando Buen Abad Domínguez, sob o título CARTAS DESDE EL SURREALISMO Nº 5 que se encontra em:
www.barriodelcarmen.net