O ritmo de esgotamento das matérias-primas é insustentável. E tal não diz unicamente respeito aos recursos não renováveis, os que têm origem mineral, como os hidrocarbonetos, os minerais e os metais. Também para os recursos renováveis, o ritmo de esgotamento é excessivo: é o caso da água, das pescas e das madeiras tropicais. O modo de produção é, além disso, gerador de poluição, redução da biodiversidade, e destruição do capital natural: o empobrecimento dos solos sob o efeito da agricultura intensiva, o aquecimento climático, o desaparecimento de espécies vivas ou a destruição de ecossistemas…
Não é, contudo, uma lei geral, e muitos exemplos existem que mostram os ecossistemas complexos podem ser muito produtivos sem estarem sob pressão excessiva sobre o seu ambiente.
Mas, sem dúvida, que o formidável crescimento da produção material e dos transportes, desde há dois séculos, veio a traduzir-se numa acentuação muito significativa da «pegada ecológica». Um recente relatório das Nações Unidas («Avaliação dos ecossistemas para o Milénio») constata que, « no decurso dos últimos cinquenta anos, a humanidade transformou mais intensa e rapidamente os ecossistemas do que em qualquer período da história humana». E acrescenta que o crescimento do bem estar que daí resultou para uma parte da humanidade foi feito «em detrimento das vantagens para as futuras gerações, daquilo que estas poderiam obter dos tais ecossistemas». Ou seja, estamos prestes a comer o que nos resta.
Ora o ritmo desta degradação não pára de aumentar. Os derivados de nitratos duplicaram desde 1960, e os dos fosfatos triplicaram. 60% do crescimento do efeito de estufa foram registados desde 1960. O desaparecimento de espécies animais são mil vezes mais ao longo do último século do que ao longo de milénios precedentes: 10% a 30% das espécies encontram-se ameaçadas. Uma parte não negligenciável destes problemas está ligada ao modelo de desenvolvimento industrial, que se mostra muito consumidor de recursos não renováveis. Ainda que terciarizadas, o consumo de matérias primas não pára de crescer: em seis anos (1998-2003) o consumo mundial do nickel aumentou em 16%, o do alumínio em 24%, o do cobre em 14% e o de chumbo em 13 %. Ritmos manifestamente excessivos para o futuro do nosso planeta.
Danos colaterais.
O problema não é tanto, como vulgarmente se crê, o risco de penúria. Tal risco só existe, a médio prazo, para o petróleo ( talvez, o urânio), o que explica, de resto, que a alta dos custos verificada actualmente não é conjuntural: o consumo de petróleo passou de 3 mil milhões a 4,5 mil milhões de toneladas anuais em vinte anos, um aumento de ultrapassa os novos recursos redescobertos durante o mesmo período .Quanto às outras matérias-primas, elas não correm o risco de se esgotarem.
Em contrapartida, o ritmo de extracção gera efeitos colaterais dramáticos para a populações atingidas: forte aumento da radioactividade foi registada no Níger, intoxicações por mercúrio para os produtores de moluscos, redução de superfícies agrícolas cultiváveis, descida dos lençóis de água, e desaparecimento de espécies utilizadas em certas actividades.
Verifica-se, sobretudo, um crescimento significativo da poluição difusa, a que ninguém se sente responsável porque todo o mundo é responsável: nitrificação dos lençóis freáticos causado pelo uso de produtos químicos na agricultura, salinização das terras, dispersão de metais pesados, poluições urbanas, etc. E, com certeza, há que acrescentar o aquecimento climático produzido pela acumulação dos gazes com efeito de estufa, devido principalmente à combustão de carvão e de hidrocarbonetos. O relatório da ONU sublinha que, no domínio das pescas e da água, as intervenções efectuadas ultrapassam já a capacidade regenerativa dos ecossistemas. Num total de 24 ecossistemas estudados pelos investigadores, 15 encontram-se degradados de forma profundamente inquietante.
A regulação dos preços não basta
O mecanismo dos preços – principal, senão mesmo a única via de regulação numa economia liberal – não permite travar de maneira significativa ( e, muito menos, inverter) toda esta degradação dos ecossistemas. Desde logo, porque a maior parte deles são ecossistemas não mercantis: as dificuldades dos pescadores tradicionais na Mauritânia e no Senegal, confrontados com a falta de peixe, não se repercutem em qualquer cotação bolsista, mas traduzem-se na prática na contínua degradação das condições de vida para aqueles que vivem desses ecossistemas.
Mesmo um alta de preços ( do petróleo, por exemplo) não reduz o consumo nem constitui grande estimulo para a produção de recursos alternativos renováveis. A alta o ouro negro nos últimos dois anos não impediu que a procura mundial continuasse a crescer 4% ao ano, principalmente devido ao aumento do parque de veículos e a lentidão de transformação dos sistemas de transportes no seio de um ambiente urbanizado que implicariam investimentos extremamente onerosos . A inércia não é absoluta, mas seriam necessários movimentos consideráveis no sistema de preços para as coisas se modificarem. No fundo, o ajustamento é pago pelas populações mais frágeis que pagam a maior factura para algo de que não são, de todo, responsáveis.
É, pois, pela via de políticas públicas cada vez mais restritivas que se poderá assegurar um desenvolvimento durável. E tal passará pela obrigação da reciclagem, o prolongamento do ciclo de vida dos produtos industriais, a sua redução no consumo, a fixação de taxas com efeitos no ambiente, etc. Já que o problema é mundial, as políticas públicas também o deverão ser. E como os meios dos países ricos não são os dos países pobres, tais políticas terão que ser também solidárias. Infelizmente, ainda não se começou a trilhar por esse caminho. A tomada de consciência planetária ainda não se deu, e a regra ainda continua a ser a de «cada um por si», e que os outros de desenrasquem.
( tradução do texto «Les écosystèmes n’ont pas de prix» publicado em Alternatives Economiques de Avril 2005)