Mais de 1.300 cientistas originários de 95 países elaboraram a pedido da ONU um relatório sobre a situação actual dos ecossistemas planetários. Das suas conclusões retira-se um sinal de alarme para o bem estar e o desenvolvimento. O homem tem conseguido alimentar-se melhor graças à agricultura, à piscicultura. Mas as consequências do crescimento económico vão traduzir-se no desaparecimento das espécies, na redução dos insectos polinizadores ou na água doce. E os países pobres serão os principais afectados. Pior ainda: se estes países seguirem o modelo dos países mais ricos, a biosfera será largamente afectada. O custo económico deste atentado à natureza é imprevisível.
Pela 1ª vez, 1.300 investigadores científicos fizeram um ponto da situação dos ecossistemas do nosso planeta. O aumento da produção agrícola reduziu a fome, mas, em contrapartida, a intensidade da acção humana tem degradado significativamente o ambiente. O que significa, simplesmente, que a prazo o bem estar do homem vai deteriorar-se.
«Políticos despertai»! Este é, em termos muito diplomáticos, a mensagem enviada por mais de 1.300 cientistas reunidos a convite da ONU para estudarem e analisarem o actual estado dos ecossistemas da Terra.. No relatório sobre «Avaliação dos ecossistemas para o Milénio», publicado na passada 4ª feira em Tóquio, New Delhi, Cairo, Nairobi, Paris, Washington e Brasília, os seus autores traçaram um panorama muito pessimista do impacte das actividades humanas sobre o ambiente natural. O grupo de cientistas, reunido sob a égide da Universidade das Nações Unidas ( com base em Tóquio) e o Banco Mundial alertam que, caso esta degradação prosseguir, fica em causa o bem estar do homem e os objectivos do Milénio - que tinham sido fixados em 2000, visando reduzir a fome, a pobreza e a doença até 2015 - não poderão ser atingidos. A publicação deste relatório coincide com a fixação dos temas e prioridades do G8, que se reunirá na Grã-Bretanha em Julho próximo, por Tony Blair: a mudança climática e o subdesenvolvimento de África.
Trata-se do estudo mais completo realizado até hoje acerca do estado do nosso planeta. No seu cerne está a constatação de que a acção humana exerce um grande pressão sobre as funções naturais do planeta , pelo que a capacidade dos ecossistemas para responder às necessidades das futuras gerações não pode estar garantida.
Normalmente fala-se do esgotamento dos recursos energéticos mas esquece-se a destruição dos ecossistemas.
Chama-se ecossistema a um conjunto de organismos (plantas, animais, micro-organismos) que agem por interacção, sendo os homens partes integrantes dos ecossistemas. A floresta tropical, os oceanos, a savana são exemplos de ecossistemas, o conjunto dos quais formam a biosfera que é a parte viva do planeta.
A originalidade do estudo é que não se debruça propriamente sobre o ambiente enquanto tal, mas sim em torno dos serviços prestados pelos ecossistemas., tais como a alimentação, a água, o tratamento de doenças, a regulação e equilíbrio dos climas. Ora segundo o relatório cerca de 60 % dos ecossistemas que permitem a vida na Terra estão degradados, degradação essa que se acentuou mais nos últimos 50 anos do que em toda a história da Humanidade, e que se agravará ainda mais nas próximas décadas.
Tal se deve às transformações ambientais que se têm verificado: por exemplo, de 1945 para cá converteram-se mais terras à agricultura que durante os séculos XVIII e XIX.; outro dado ilustrativo é o relativo ao carbono, pois 60% do crescimento da concentração do gás carbónico na atmosfera desde 1750 dá-se só a partir de 1959.
A avaliação feita não é totalmente negativa, uma vez que se registou melhorias significativas no bem estar do homem e no desenvolvimento económico, o que permitiu um aumento da produção agrícola superior ao da população mundial, e uma multiplicação por seis da economia mundial.
Também a proporção de pessoas que sofrem de mal nutrição foi reduzida, assim como melhorou a saúde humana.
O maior problema reside no facto da degradação dos ecossistemas, a continuar, poder impedir a realização dos objectivos do Milénio. Alerta-se ainda para o facto dos países e as populações mais pobres serem as mais atingidas com essa degradação. Além disso, esta tendência contribui para o aumento das desigualdades na medida em que são as populações pobres que estão mais dependentes dos serviços prestados pelos ecossistemas.
Um aspecto preocupante, assinalado pelos investigadores, é a probabilidade acrescida de «mudanças não lineares», o que significa que a partir de certo limiar de degradação, um mudança brusca se pode dar no ecossistema que o enfraquece ou até pode torná-lo incapaz de funcionar normalmente. Um exemplo disto poderá ser a pesca, cujos stocks deixarão de ser aproveitáveis, pura e simplesmente.
Toda esta evolução é agravada com o aquecimento da Terra ( que poderá levar, por exemplo, a transformar a região do Amazonas em savana) e que tornará difícil senão mesmo impossível o restabelecimento dos equilíbrios perdidos.
A conclusão é que a crise dos ecossistemas não é menos grave que a do clima.
(tradução de uma parte do texto sob o título «L’épuisement de la nature menace le progrès» publicado no Le Monde 1 de Abril de 2005)