Começa-se a entender melhor, nestes princípios do século XXI a força e a originalidade e, sobretudo, a coerência do projecto libertário que não se deve limitar aos contornos que o anarquismo adquiriu a partir do século XIX mas cujo lastro histórico é muito mais extenso. A esta renovação do pensamento libertário não é certamente estranha as novas condições sócio-cultrais das actuais sociedades pós-industriais que certos autores associam ao chamado pós-modernismo. É neste enquadramento que se insere o livro de Daniel Colson, «Os três ensaios da filosofia anarquista».
O anarquismo afirma-se hoje como uma alternativa às insuficiências do pensamento dominante: desde o pensador marroquino Abdallah Laroui até Hanna Arendt, e passando por toda a tradição revolucionária europeia, Colson mostra-nos a originalidade e as potencialidades da concepção libertária nos três ensaios que reuniu no seu último livro.
Daniel Colson vai buscar à história arabo-muçulmana, à concepção de Arendt sobre as «falhas da história» e aos acontecimentos revolucionários de 1848 e da Comuna de Paris referenciais para expor a sua leitura anarquista.
O primeiro ensaio é uma reflexão sobre o pensamento marroquino contemporâneo Abdallah Laroui que, nos comentários que faz da obra de Ibn Khaldûn (1332-1406), evoca a dificuldade do pensamento árabe a abrir-se sobre a racionalidade histórica ao mesmo tempo exterior e anterior. A finalidade de se encontrar no outro e de encontrar o outro em si mesmo gera uma dupla tensão que se traduz num cimento associativo essencialmente positivo e que se opõe frontalmente a qualquer integrismo. A liberdade do outro, longe de ser um limite ou a negação da minha liberdade, é, pelo contrário, a sua condição necessária. Colson mostra assim uma relação de fundo entre o pensamento anarquista e a teologia do Islão na medida em que não se pode falar do passado a não ser a partir do presente.
O segundo ensaio é consagrado a Hanna Arendt e à relação que esta estabelece entre história e ficção nas «falhas da história» e nas «brechas do pensamento».É justamente neste interstício que nasce o «era uma vez» da narrativa.
No terceiro ensaio o autor mostra como os acontecimentos revolucionários de 1848 e da Comuna de Paris puderam esgotar a sua força histórica e que toda a tentativa de repetição não pode levar senão ao enfraquecimento das suas potencialidades e do seu significado.
No pensamento libertário moderno, anarquia e realidade são sinónimos segundo Colson.
Para o debate desta problemática realizou-se uma conferência-debate no passado dia 2 de Abril no CIRA emMarselha cujo conferencista foi o próprio autor daquele livro, Daniel Colson, professor de sociologia na Universidade de Saint-Etienne, e autor de «Trois essais de philosophie: islam, histoire, monadologie.” Lignes-Manifestes, 2004. 384p. 23 euros.
C.I.R.A. (centro internacional de investigações sobre anarquismo), Rue Saint-Dominique, 3 13001 Marsella (esquina com Place des Capucines) Tel-fax: 04 91 56 24 17
Correio cira.marsella@free.fr
Website: http://cira.marseille.free.fr/
Consultar:
http://raforum.apinc.org/article.php3?id_article=2040
http://www.ainfos.ca/fr/ainfos05137.html