Numa época como a nossa em que muitos dos padrões culturais das sociedades modernas se encontram em acelerada fase de revisão e mudança, os direitos humanos permanecem um importante referencial para saber equacionar os problemas sociais contemporâneos.
Com efeito, mais que uma construção social, historicamente datada, os direitos humanos, e toda a sua evolução ao longo do tempo, têm simbolizado a caminhada civilizacional para uma vida humana com dignidade e justiça. Obviamente que os direitos humanos não estão imunes a debates e polémicas de carácter histórico-filosófico, político, e até jurídico, mas mantém-se como uma ferramenta indispensável para intervir socialmente nas mais variadas áreas sociais.
Para esta sua relevância terá contribuído indubitavelmente a luta secular que homens e mulheres travaram para o seu respeito e implantação no campo das ideias e do pensamento mais esclarecido, mas sobretudo na sua consagração em textos escritos, mormente sob a forma de leis gerais, aplicáveis universalmente.
Basta recordar o que representou historicamente a assinatura em 1215 pelo rei inglês João I (também conhecido por João Sem Terra) da Magna Carta onde um monarca soberano admite, pela primeira vez na história, limitar o seu poder absoluto, renunciar às sua prerrogativas, e sujeitar as suas decisões aos procedimentos impostos pelos textos legais escritos. Este facto histórico representou o declínio do absolutismo régio e um antecedente remoto das modernas declarações dos direitos humanos, uma vez que estes são vistos como direitos intocáveis, logo não sujeitos ao poder institucionalizado do Estado.
Outro facto histórico, representativo da luta pelo respeito dos direitos humanos que assiste a qualquer ser humano, é a famosa controvérsia que estalou em Valladolid em 1550-51, envolvendo teólogos, juristas e políticos sobre a verdadeira natureza dos indígenas americanos, onde se digladiavam duas teses e concepções diametralmente opostas: por um lado, os partidários da dominação colonial espanhola, que encaravam os indígenas como seres inferiores; e por outro, aqueles que, como Bartolomé de las Casas, considerado o pioneiro dos direitos humanos, defendiam a natureza humana dos índios, e a necessidade de os respeitar como pessoas.
Mas foi a Declaração Americana da Independência de 1776 que consagrou explicitamente a ideia que todo o ser humano é portador de um conjunto de direitos humanos que o poder político deve respeitar.
Nas últimas décadas os direitos humanos ganharam uma visibilidade reforçada graças à acção das organizações não-governamentais e muitos activistas sociais espalhados por todo o mundo que não desistem de difundir e recordar a necessidade de se salvaguardar e garantir os direitos humanos em todas as circunstâncias.
É justamente como resultado deste activismo que surgiu, depois da 1ª geração de direitos humanos da época do racionalismo iluminista do século XVIII, quando se consagraram os principais direitos civis e políticos, uma 2ª geração de direitos humanos, voltada agora para o reconhecimento universal de um importante conjunto de direitos sociais e económicos de toda e qualquer pessoa. Finalmente, nos últimos anos irrompe uma 3ª geração de direitos humanos, onde os direitos sociais colectivos como o direito à paz, ao desenvolvimento e ao ambiente, passam a ser também considerados como direitos humanos, com a mesma dignidade que os restantes.
Nunca é demais salientar o relevo e a importância de que se revestem os direitos humanos. Pena é que sejam, ainda hoje, tantas vezes desprezados e esquecidos. Talvez seja altura, por isso, de os incluir transversalmente no currículo das nossas escolas, e promover uma verdadeira educação para a cidadania global.
AAS