Tribunal considera Direcção de Universidade responsável pelos acontecimentos em torno da morte de Diogo Macedo
Ontem o Tribunal Cível de Famalicão reconheceu a responsabilidade da Universidade Lusíada de Famalicão nos acontecimentos em torno da morte de Diogo Macedo.
Em Outubro de 2001 Diogo Macedo, estudante do 4º ano de Arquitectura e membro da tuna, morreu devido a lesões cérebro-medulares, após acontecimentos ainda por esclarecer na noite em que aparentemente tinha decidido abandonar a tuna por não suportar mais as praxes a que era submetido. Inicialmente a morte tinha sido considerada acidental, mas as suspeitas de um médico do Hospital de S. João fizeram com que mais averiguações fossem efectuadas, tendo a autópsia demonstrado múltiplas escoriações corporais, além da fractura de uma vértebra cervical contraída por agressão e que teria sido a causa da morte.
Na sequência destes factos, dois elementos da tuna foram constituídos arguidos. Contudo, o processo foi arquivado em 2004 por falta de provas, uma vez que seria “impossível imputar à acção de qualquer pessoa concreta a produção das lesões”. Inexplicavelmente, apesar de estarem perto de 20 pessoas nas mesmas instalações que Diogo, nenhuma destas se recordava dos acontecimentos. Após a morte reuniram-se de urgência para alegadamente gizar versões, oportunamente criando uma amnésia colectiva que se apoderou dos “amigos” e “colegas” de Diogo, impedindo-os de fornecerem qualquer pormenor. Numa sessão de tribunal em que as testemunhas estavam a ser ouvidas, o próprio juiz reconheceu o "muro de silêncio" que tinha sido criado. Uma única versão conjunta de nada.
Depois do processo-crime, segue-se o processo cível. A mãe de Diogo Macedo pede uma indemnização de 210 mil euros à Fundação Minerva, que detém a Universidade Lusíada. O tribunal deu como provada a morte, em consequência de lesões provocadas. Este e outros dados levaram o Tribunal Cível de Famalicão a dar como provada a morte do estudante, em consequência de uma pancada, alegadamente, desferida durante a praxe. Estamos agora em Junho de 2009, oito anos após a morte de Diogo Macedo.
Ontem assistimos a uma decisão semelhante à de outros Tribunais relativamente a casos de praxe, numa tendência crescente de responsabilização das faculdades sobre as praxes que nelas se passam. O Tribunal de Vila Nova de Famalicão considerou que a Universidade Lusíada de Famalicão (ULF), não controlou nem evitou as praxes académicas, sendo obrigada a pagar uma indemnização de 90 mil euros à família de Diogo. O Tribunal considerou provado que “Nunca a ré (universidade) teve algum controlo efectivo sobre esse tipo de praxes violentas e humilhantes. Não temos notícia que alguma vez tenha proibido a violência mencionada, aliás os factos apurados mostram a ausência de intervenção”, tendo ainda acrescentado que "Existe uma clara interdependência” com a ULF “que lhe cede espaço, subsidio e publicidade, em troca de evidente publicidade e charme académico que esse tipo de grupos traz à sua academia”.
Este caso merece várias considerações:
- Estranhamente, apenas 3 anos depois da morte de Diogo Macedo os acontecimentos foram tornados públicos, em grande parte devido a uma Grande Reportagem da autoria de Felicia Cabrita. Esta jornalista, numa semana de investigação no local, descobriu mais do que as polícias em três anos – isto, apesar da direcção da Lusíada ter ameaçado de expulsão qualquer aluno que lhe prestasse declarações! Por outro lado, os relatos da mãe deixam claro que a escola sempre soube o que aconteceu; inclusivamente, tentou sempre silenciar as suas tentativas para descobrir as causas da morte do seu filho. Ao que parece, o poder da Universidade Lusíada conseguiu silenciar as vozes que poderiam esclarecer as circunstâncias em que este aluno morreu.
- Nesta tuna (e em todas as outras tunas universitárias), a democracia é inexistente, assim como as regras básicas de respeito pela expressão individual. O relacionamento é totalmente condicionado por uma hierarquia absolutamente rígida. Quem as integra obedece a uma autêntica estrutura de castas com claro prejuízo para quem está "mais abaixo" na cadeia. Este era o caso do Diogo, que apesar de já a integrar há 4 anos continuava a ser "caloiro" e alvo de animosidade, a qual esteve na origem da sua decisão de abandonar o grupo.
- À semelhança do que se passa noutras instituições do Ensino Superior, é evidente a conivência entre Direcções e grupos de estudantes que têm como base a hierarquização, submissão e proliferação de comportamentos repressores e inerentemente violentos. Isto exige uma reflexão por parte da Sociedade e das Instituições sobre aquilo que são e sobre o que pretendem oferecer aos seus alunos. Não podemos perpetuar estas "tradições" imaginárias que se apoderaram do vazio cultural e intelectual que tem caracterizado as escolas nestes últimos anos.
- Este caso extravasa os contornos praxísticos, a gravidade é a de um homicídio. Homicídio que ocorreu no contexto da praxe, numa tuna, entre estudantes, nas instalações de uma Faculdade do Ensino Superior. Estes factos obrigam-nos a pensar na arbitrariedade da "tradição". A "tradição" não pode cobrir de impunidade actos como este, os muros têm de ser derrubados e permitir que a verdade venha ao de cima.
27 de Setembro de 2009
M.A.T.A. - Movimento Anti-"Tradição Académica"
mata.info@gmail.com
http://www.sitiodomata.org/
http://www.blogdomata.blogspot.com/
Ontem o Tribunal Cível de Famalicão reconheceu a responsabilidade da Universidade Lusíada de Famalicão nos acontecimentos em torno da morte de Diogo Macedo.
Em Outubro de 2001 Diogo Macedo, estudante do 4º ano de Arquitectura e membro da tuna, morreu devido a lesões cérebro-medulares, após acontecimentos ainda por esclarecer na noite em que aparentemente tinha decidido abandonar a tuna por não suportar mais as praxes a que era submetido. Inicialmente a morte tinha sido considerada acidental, mas as suspeitas de um médico do Hospital de S. João fizeram com que mais averiguações fossem efectuadas, tendo a autópsia demonstrado múltiplas escoriações corporais, além da fractura de uma vértebra cervical contraída por agressão e que teria sido a causa da morte.
Na sequência destes factos, dois elementos da tuna foram constituídos arguidos. Contudo, o processo foi arquivado em 2004 por falta de provas, uma vez que seria “impossível imputar à acção de qualquer pessoa concreta a produção das lesões”. Inexplicavelmente, apesar de estarem perto de 20 pessoas nas mesmas instalações que Diogo, nenhuma destas se recordava dos acontecimentos. Após a morte reuniram-se de urgência para alegadamente gizar versões, oportunamente criando uma amnésia colectiva que se apoderou dos “amigos” e “colegas” de Diogo, impedindo-os de fornecerem qualquer pormenor. Numa sessão de tribunal em que as testemunhas estavam a ser ouvidas, o próprio juiz reconheceu o "muro de silêncio" que tinha sido criado. Uma única versão conjunta de nada.
Depois do processo-crime, segue-se o processo cível. A mãe de Diogo Macedo pede uma indemnização de 210 mil euros à Fundação Minerva, que detém a Universidade Lusíada. O tribunal deu como provada a morte, em consequência de lesões provocadas. Este e outros dados levaram o Tribunal Cível de Famalicão a dar como provada a morte do estudante, em consequência de uma pancada, alegadamente, desferida durante a praxe. Estamos agora em Junho de 2009, oito anos após a morte de Diogo Macedo.
Ontem assistimos a uma decisão semelhante à de outros Tribunais relativamente a casos de praxe, numa tendência crescente de responsabilização das faculdades sobre as praxes que nelas se passam. O Tribunal de Vila Nova de Famalicão considerou que a Universidade Lusíada de Famalicão (ULF), não controlou nem evitou as praxes académicas, sendo obrigada a pagar uma indemnização de 90 mil euros à família de Diogo. O Tribunal considerou provado que “Nunca a ré (universidade) teve algum controlo efectivo sobre esse tipo de praxes violentas e humilhantes. Não temos notícia que alguma vez tenha proibido a violência mencionada, aliás os factos apurados mostram a ausência de intervenção”, tendo ainda acrescentado que "Existe uma clara interdependência” com a ULF “que lhe cede espaço, subsidio e publicidade, em troca de evidente publicidade e charme académico que esse tipo de grupos traz à sua academia”.
Este caso merece várias considerações:
- Estranhamente, apenas 3 anos depois da morte de Diogo Macedo os acontecimentos foram tornados públicos, em grande parte devido a uma Grande Reportagem da autoria de Felicia Cabrita. Esta jornalista, numa semana de investigação no local, descobriu mais do que as polícias em três anos – isto, apesar da direcção da Lusíada ter ameaçado de expulsão qualquer aluno que lhe prestasse declarações! Por outro lado, os relatos da mãe deixam claro que a escola sempre soube o que aconteceu; inclusivamente, tentou sempre silenciar as suas tentativas para descobrir as causas da morte do seu filho. Ao que parece, o poder da Universidade Lusíada conseguiu silenciar as vozes que poderiam esclarecer as circunstâncias em que este aluno morreu.
- Nesta tuna (e em todas as outras tunas universitárias), a democracia é inexistente, assim como as regras básicas de respeito pela expressão individual. O relacionamento é totalmente condicionado por uma hierarquia absolutamente rígida. Quem as integra obedece a uma autêntica estrutura de castas com claro prejuízo para quem está "mais abaixo" na cadeia. Este era o caso do Diogo, que apesar de já a integrar há 4 anos continuava a ser "caloiro" e alvo de animosidade, a qual esteve na origem da sua decisão de abandonar o grupo.
- À semelhança do que se passa noutras instituições do Ensino Superior, é evidente a conivência entre Direcções e grupos de estudantes que têm como base a hierarquização, submissão e proliferação de comportamentos repressores e inerentemente violentos. Isto exige uma reflexão por parte da Sociedade e das Instituições sobre aquilo que são e sobre o que pretendem oferecer aos seus alunos. Não podemos perpetuar estas "tradições" imaginárias que se apoderaram do vazio cultural e intelectual que tem caracterizado as escolas nestes últimos anos.
- Este caso extravasa os contornos praxísticos, a gravidade é a de um homicídio. Homicídio que ocorreu no contexto da praxe, numa tuna, entre estudantes, nas instalações de uma Faculdade do Ensino Superior. Estes factos obrigam-nos a pensar na arbitrariedade da "tradição". A "tradição" não pode cobrir de impunidade actos como este, os muros têm de ser derrubados e permitir que a verdade venha ao de cima.
27 de Setembro de 2009
M.A.T.A. - Movimento Anti-"Tradição Académica"
mata.info@gmail.com
http://www.sitiodomata.org/
http://www.blogdomata.blogspot.com/