«Essa imensa tutela de milhares de homens por seis ou sete homens é forçosamente absurda.» Alexandre Herculano
O carneirismo de pseudocidadãos está para esta democracia como a fidelidade dos vassalos esteve para o absolutismo régio.
Algumas citações sobre o carneirismo: uma de Camões (a propósito do gesto vergonhoso de Egas Moniz) , outra de Bocage ( a propósito dos que dão a vida pelo rei injusto e iníquo) , e finalmente uma terceira de Alexandre Herculano ( a propósito do Estado centralizado e a favor do self-government):
«Oh grão fidelidade portuguesa
De vassalo!...»
(Camões a propósito do gesto de Egas Moniz )
«Ah! Segue-o submissa grei
Lusas mãos pendões desferem
E até na injustiça querem
Dar a vida pelo rei»
(Bocage )
Escrevia Alexandre Herculano em 1858, na «Carta aos eleitores de Cintra»:
Quereis encontrar o governo central? Do berço à cova encontrai-lo por todas as fases da vossa vida, raramente para vos proteger, de contínuo para vos incomodar. Nada, a bem dizer, se move na vida colectiva do povo, que não venha de cima o impulso…Essa imensa tutela de milhares de homens por seis ou sete homens é forçosamente absurda…É preciso que o país da realidade , o país dos casais, das aldeias, das vilas, das cidades, das províncias, acabe com o país nominal, inventado nas secretarias, nos quartéis, nos clubes, nos jornais, e constituído pelas diversas camadas do funcionalismo que é, e do funcionalismo que quer e há-de ser…Os partidos, sejam quais forem as suas opiniões e os seus interesses, ganham sempre com a centralização…A administração do país pelo país é a realização material, palpável, efectiva, da liberdade na sua plenitude, sem anarquia, sem revoluções, de que não vem quase nunca senão mal…A centralização, na cópia portuguesa, como hoje existe e como a sofremos, é o fideicomisso legado pelo absolutismo aos governos representativos, mas enriquecido, exagerado; é, perdoai-me a frase, o absolutismo liberal. A diferença está nisto: dantes os frutos que dá o predomínio da centralização supunha-se colhê-los um homem chamado rei; hoje colhem-nos seis ou sete homens chamados ministros. Dantes os cortesãos repartiam entre si os frutos, e diziam ao rei que tudo era dele e para ele; hoje os ministros reservam-nos para si ou distribuem-nos pelos que lhes servem de voz, de braços, de mãos; pelo partido que os defende, e dizem depois que tudo é do país, pelo país e para o país. E não mentem. O país de que falam é o seu país nominal; é a sua clientela, o seu funcionalismo; é o próprio governo; é a tradução moderna da frase de Luís XIV – l’état c’est moi, menos a sinceridade.
( Alexandre Herculano)
O carneirismo de pseudocidadãos está para esta democracia como a fidelidade dos vassalos esteve para o absolutismo régio.
Algumas citações sobre o carneirismo: uma de Camões (a propósito do gesto vergonhoso de Egas Moniz) , outra de Bocage ( a propósito dos que dão a vida pelo rei injusto e iníquo) , e finalmente uma terceira de Alexandre Herculano ( a propósito do Estado centralizado e a favor do self-government):
«Oh grão fidelidade portuguesa
De vassalo!...»
(Camões a propósito do gesto de Egas Moniz )
«Ah! Segue-o submissa grei
Lusas mãos pendões desferem
E até na injustiça querem
Dar a vida pelo rei»
(Bocage )
Escrevia Alexandre Herculano em 1858, na «Carta aos eleitores de Cintra»:
Quereis encontrar o governo central? Do berço à cova encontrai-lo por todas as fases da vossa vida, raramente para vos proteger, de contínuo para vos incomodar. Nada, a bem dizer, se move na vida colectiva do povo, que não venha de cima o impulso…Essa imensa tutela de milhares de homens por seis ou sete homens é forçosamente absurda…É preciso que o país da realidade , o país dos casais, das aldeias, das vilas, das cidades, das províncias, acabe com o país nominal, inventado nas secretarias, nos quartéis, nos clubes, nos jornais, e constituído pelas diversas camadas do funcionalismo que é, e do funcionalismo que quer e há-de ser…Os partidos, sejam quais forem as suas opiniões e os seus interesses, ganham sempre com a centralização…A administração do país pelo país é a realização material, palpável, efectiva, da liberdade na sua plenitude, sem anarquia, sem revoluções, de que não vem quase nunca senão mal…A centralização, na cópia portuguesa, como hoje existe e como a sofremos, é o fideicomisso legado pelo absolutismo aos governos representativos, mas enriquecido, exagerado; é, perdoai-me a frase, o absolutismo liberal. A diferença está nisto: dantes os frutos que dá o predomínio da centralização supunha-se colhê-los um homem chamado rei; hoje colhem-nos seis ou sete homens chamados ministros. Dantes os cortesãos repartiam entre si os frutos, e diziam ao rei que tudo era dele e para ele; hoje os ministros reservam-nos para si ou distribuem-nos pelos que lhes servem de voz, de braços, de mãos; pelo partido que os defende, e dizem depois que tudo é do país, pelo país e para o país. E não mentem. O país de que falam é o seu país nominal; é a sua clientela, o seu funcionalismo; é o próprio governo; é a tradução moderna da frase de Luís XIV – l’état c’est moi, menos a sinceridade.
( Alexandre Herculano)