25.5.07

O legado de Lineu e os novos paradigmas da botânica

Fonte da notícia: jornal Público

Comemorou-se anteontem ( 23 de Maio) o tricentenário do nascimento do sueco Carl Linnaeus. Mas quem foi Lineu e que importância tem para o comum cidadão ?
A sua criatividade, curiosidade e divulgação científica permitiram ordenar, organizar e inventariar grande parte da biodiversidade presente em diferentes partes do globo.
Em 1707, para se designar um ser vivo, planta ou animal, era preciso construir uma frase inteira, que chegava a ocupar mais do que um parágrafo !

Foi Lineu quem pôs fim a esta confusão, ao criar a chamada nomenclatura binominal para todos os seres vivos. A partir de então, o nome científico de cada espécie passou a ser composto por dois termos: o nome do género e o respectivo restritivo específico.
A ele se deve ainda o estabelecimento da moderna taxonomia (dar nome a um táxon ou indivíduo) ao integrar todos os organismos num sistema de classificação hierárquica, baseado nas suas características observáveis. A consistente e sistemática aplicação desta classificação em que os seres vivos eram identificados e nomeados, permitiu tornar a biologia uma ciência reprodutível. À época, esta criação de Lineu correspondeu a um portal de informação com todos os benefícios potenciais para a identificação e descrição das espécies presentes nos habitats e a comunicação e divulgação de nomes reconhecidos de forma global e universal. O seu saber e amor pelas plantas motivou-o a estabelecer redes de colectores, entre padres, jesuítas, soldados, que instruía e treinava, com quem se correspondia e trocava saberes, tendo com isto contribuído para o conhecimento e inventário de novas espécies.

Hoje em dia, o princípio desta classificação ainda é válido, mas a taxonomia já não é apenas uma ciência descritiva pois serve-se de novas ferramentas, como a biologia molecular e a sequenciação do DNA, para ajudar a esclarecer dúvidas de classificação. É mesmo impensável estudarem--se as relações de parentesco, a evolução das espécies ou das populações sem utilizar marcadores moleculares ou a sequenciação de DNA.

Mas no mundo de mudança que actualmente vivemos, onde a perda de biodiversidade é uma realidade e onde muitos dos recursos vegetais estão ainda por identificar e caracterizar, é difícil não usar ou menosprezar o conhecimento tradicional dos naturalistas, dos botânicos, que conjugam em si saberes integradores sobre as espécies, a sua biologia e ecologia.
Antes que os botânicos se tornem dinossáurios e dêem lugar apenas a biólogos vegetais, antes que a análise molecular e a sequenciação dos genes induzam a alienação do estudo das espécies na natureza, será interessante perspectivar os novos desafios que se colocam à taxonomia moderna.

Estabelecer equipas interdisciplinares com biólogos moleculares e botânicos; organizar chaves simples e didácticas para facilitar a identificação das plantas no campo; saber estabelecer prioridades de identificação, caracterização e conservação; divulgar ao público em geral a diversidade que se pode encontrar na natureza;estabelecer redes de "naturalistas", à semelhança de Lineu, com propósitos de inventariação, caracterização e conservação; tornar acessível, em formato digital, a informação presente nos herbários e nos inventários de campo.

No séc. XXI estes são alguns dos paradigmas que se colocam aos actuais académicos de botânica e em particular aos jardins botânicos.
Reconhecer as limitações e aceitar estes desafios é comemorar Lineu e dar a conhecer ao público o seu legado.