Um activista anti-TV inventou um dispositivo de controle remoto (TV-B-Gone) que permite de forma anónima, e sem pedir licença a ninguém, desligar os aparelhos de televisão que se encontram nos espaços públicos e centros comerciais.
As acções dos activistas anti-TV têm mais a ver com objectivos de saúde mental do que com fins simplesmente de carácter político ao defenderem o desaparecimento ou a secundarização da TV como razão de vida de muitos dos cidadãos telespectadores espalhados pelos quatro cantos do mundo. Um dos métodos de acção directa preferidos pelos activistas anti-TV – e dos mais eficazes – é desligarem os aparelhos de televisão que se encontrarem nos espaços públicos graças a um dispositivo técnico inventado.
Mitch Altman, um engenheiro electrónico de Sillicon Valley, na Califórnia, e defensor do uso social da tecnologia, inventou há cerca de dois anos o TV-B-Gone ( em português, «a TV foi-se») que consiste num dispositivo de controle remoto universal ( que dá para todos os aparelhos e marcas) mediante o qual é possível apagar qualquer tipo de aparelho de TV situado num raio de 17 metros com um simples botão de carregar. Com esta «bomba», os activistas anti-TV cometem os seus «atentados» em espaços públicos como cafés, restaurantes, bares, aeroportos, etc. «Hoje os aparelhos de TV estão por todo o lado, acesos, independentemente de haver pessoas a vê-los ou não. Basta um minuto para pensar nos efeitos que este poderoso media tem hoje em dia na nossa vida diária.», diz Altman que se vê a si próprio como alguém que ajudou com a sua invenção a levar a paz a alguns lares. Confessa que já não TV desde 1980 e que tal lhe permitiu já usufruir algumas boas horas de bem-estar de que estaria privado se tivesse continuado a possuir televisão em casa. Altman, que tem o seu próprio website (http://www.tvbgone.com/) onde é feita a divulgação da sua invenção, que é distribuída comercialmente quer nos Estados Unidos quer na Europa, não esconde a sua satisfação: «O TV-G-Gone» dá-te a possibilidade de teres algum poder sobre aqueles milhares de aparelhos que enxameiam o nosso espaço público visual».
Todos ao anos realiza-se a nível internacional um iniciativa com a designação genérica de «TV turn-off week» («A semana sem televisão») que defende a ideia de que a nossa qualidade de vida seria muito melhor sem a presença ( e intromissão) do pequenos ecrãs nas nossas casas, assim como nos espaços públicos por onde passamos no dia-a-dia. A iniciativa foi desencadeada com base em estudos realizados que indicam que a televisão aumenta a depressão, a ansiedade e diminui a auto-estima. Está também provado que aumenta a demência e a obesidade; já para não falar do facto das crianças que estiverem mais expostas à TV serem habitualmente mais propensas à violência ( segundo estimativas feitas, só nos Estados Unidos e Reino Unidos haverá cerca de 18 mil «tele-assassinos» em idade escolar). E, ainda que não custe a reconhecer que nem toda a TV é má, o certo é cada telespectador que passe 4 ou 5 horas por dia a ver televisão, como nos mostram os recentes inquéritos sobre os hábitos televisivos, perderá 10 anos da sua vida sentado no sofá a fitar o aparelho de televisão!!!
Os contestatários da televisão afirmam que não actuam contra a televisão em si mesma. Trata-se de uma tecnologia útil que não desaparecerá tão cedo. Pretendem apenas sensibilizar um cada vez maior número de pessoas para mudarem os seus hábitos, além de preconizarem a criação de espaços públicos sem televisão.
Recorde-se, por exemplo, que nos Estados Unidos o canal de programas infantis Nickelodeon decidiu certo dia ( 2 de Outubro de 2004) cancelar a sua programação habitual durante 3 horas, e limitar-se a transmitir ao longo dessas horas um cartaz onde se convidava os seus telespectadores a aproveitar esse tempo livre para actividades recreativas. Esse caso serve de exemplo para o que se pretende com uma iniciativa internacional como é a «TV turn-off» ( televisão desligada) e que decorre todos os anos na última semana do mês de Abril ( em 2006, de 24 a 30 de Abril).
Mais do que acções que firam a susceptibilidade dos teledependentes o que se pretende é levar a cabo acções de carácter persuasivo. Convencer os donos dos restaurantes de que a presença da TV nos seus estabelecimentos, em vez de atrair clientes, tem justamente o efeito contrário, poderia ser um bom exemplo de uma acção que se enquadra nos objectivos desta «semana sem televisão». Mas, no fundo, o que se pretende é passar a mensagem de que viver sem a televisão constitui uma experiência de vida libertadora, divertida e até mesmo enriquecedora.
Não se trata, pois, de aferir se existem bons ou maus programas, ou se a programação televisiva tem estas ou aquelas características. Não, nada disso. O que se trata é de constatar que a televisão é uma verdadeira indústria e, como tal, cabe-lhe oferecer produtos fantasiosos e cativar a maior audiência possível, uma vez que o êxito dessa indústria se mede em quantos minutos da nossa vida ela consegue roubar. Actualmente, por exemplo, nos Estados Unidos e no Reino Unido o número de horas que em média cada pessoa passa a ver televisão cifra-se em cerca de 4 horas/dia, isto é, metade do tempo em que não se está a dormir e a trabalhar. Uma dose diária excessiva, sem dúvida, que gera efeitos devastadores para uns mas que representa para outros um grande negócio. Na verdade, quando o aparelho de televisão não te diz o que deves comprar, nem o que deves pensar, nem o que deves sentir, então é quando ele te está a convencer a não mudares de canal, e a não perderes mais este episódio.
Há alguns anos atrás um dos activistas anti-TV, David Burke, realizou uma perfomance pública em Londres - em nome da White Dot, organização inglesa que organiza no Reino Unido a semana sem TV - colocando uma grande televisão à frente da abadia de Westminster com uma legenda « White Dot says GET A LIFE» ( White Dot diz-te para que tenhas uma vida), enquanto lia uma carta ao príncipe Carlos a pedir para não permitir a transmissão por televisão do acto da sua futura coroação. Esta acção teve reprcussão na grande imprensa e permitiu que a semana sem televisão fosse notícia dos jornais principais.
O dispositivo TV-B-Gone permite, além do mais, o desencadeamento imediato de um debate/discussão no próprio local em que a acção decorrer, o que tem vantagens acrescidas. O TV-B-Gone corresponde a mil flyers ao suscitar uma reflexão e debate público, quase que espontaneamente.
Se valorizarmos a nossa liberdade, o mínimo que nos cabe fazer é questionarmos porque é que estamos a ver televisão.
Na realidade, uma poderosa indústria não cessa em gastar milhões de euros para produzir programas e transmitir publicidade que não visam senão seduzir e manipular os seus destinatários. E não são poucos os que passam horas inteiras a ver televisão, absorvendo cada minuto aquelas fascinantes imagens, num autêntico bombardeamento visual que tem precisamente como alvo o próprio telespectador passivo.
Convidar as pessoas a questionarem a presença excessiva, e até abusiva, da TV no seu dia-a-dia, e convidá-la a tirarem melhor proveito do seu tempo de vida é, no essencial, o objectivo primeiro de iniciativas como a da
«Semana sem Televisão».
Enjoy it
Tradução e adaptação de um texto de autoria de Leonardo Oliva, publicado no nº 24 da revista The Ecologist, versão em castelhano.
Mais info sobre o TV-B-Gone: aqui
Sobre a conexão entre a televisão e a obesidade ler: aqui
Mais info sobre a iniciativa «TV-turn off week»:
wwv-turnoff.org/