Em Mérida há 28 anos que uma escola utiliza os valores e as metodologias anarquistas na educação de crianças e jovens: educar de forma assemblária, substituir a competição dos exames pelo conhecimento partilhado e fomentar o desejo de aprender. É a Escola Livre Paideia onde actualmente trabalham 5 pessoas a tempo inteiro, sendo frequentada por 31 pessoas na Primária e no Secundário e 15 pessoas na educação infantil.
Evidentemente que não se trata de um colégio como os demais. Na Escola Livre Paideia não existem nem se reproduzem hierarquias nem se utilizam os castigos e punições como nas outras escolas. Nem muito menos existem exames, nem tão pouco a obrigação de repetir mecanicamente a matéria e o programa de cada nível educativo. Todas estas regras e rotinas, típicas do sistema educativo oficial, foram aqui postas de lado desde o dia 9 de Janeiro de 1977. Escolheram-se outras formas de ensinar e aprender. Na verdade, a Escola livre Paideia tem sido, desde a sua criação, o único centro educativo que mais empenho e persistência tem mostrado em seguir e aplicar as ideias anarquistas sobre igualdade, cooperação e não-autoridade.
A sua prática educativa baseia-se fundamentalmente na iniciativa pessoas e nas inquietações pessoais de cada estudante. Considera-se mesmo que as escolas tradicionais impedem e obstaculizam as capacidades que as pessoas revelam ao longo da sua infância. Daí que na Paideia não se seguem programas predefenidos mas, antes pelo contrário, são os próprios alunos que decidem o que querem aprender.
Liberdade responsável
Para isso os professores dedicam-se às tarefas de orientação. Enquanto docentes a sua função consiste em estimular o desejo de conhecimento e saber e em transmitir valores e assegurar a convivência entre todos. A importância e o valor que se dá à liberdade é, nesse sentido, a principal motivação. «Quem critica a escola confunde liberdade com não estudar ou com perda de tempo. Mas não é assim», explica uma das responsáveis pela escola, Josefa Martín Luengo. E acrescenta: «O valor que ensinamos é o da liberdade responsável, ensinamos-lhes que há que conquistar a liberdade.»
Na prática isso traduz-se em compromissos de trabalho. Na Escola Paideia aproveita-se a curiosidade inata dos estudantes para que sejam estes, no início de cada semana, que indiquem e proponham atingir certos e determinados objectivos. O compromisso pode ir desde um trabalho sobre certa matéria, fazer exercícios e preencher o caderno de Matemático ou de uma Língua até realizar uma investigação sobre um tema de história ou uma composição sobre valores e convivência.
A sua não realização não implica a aplicação de qualquer sanção ou castigo. «O alunos – explica Luengo – demonstram, ao ser-lhes aplicado uma sanção, que são responsáveis, habituando-se a receber ordens e em segui-las. Ora não é isso que eles gostam. Por isso é que procuram cumprir com os seus compromissos a fim de poder continuar a ser pessoas livres.» Desde os primeiros momentos a aprendizagem é identificada com liberdade.«É fácil demonstrar que o poder, os poderes e os sistemas autoritários sempre se basearam na ignorância, no fanatismo e nas religiões para se perpetuarem», argumentam os elementos da Escola Paideia que sempre defendeu que um dos seus principais desafios é dotar os seus estudantes de amplos conhecimentos, devidamente acompanhados com um apurado sentido crítico.
Cultura assemblária
Apesar de tudo, o mais frequente é que os compromissos assumidos sejam levados a cabo sem excessivas dificuldades. Tratam-se de actividades livremente escolhidas por cada estudante que, por sua opção, se decide e assume a realizá-las. A que acresce a satisfação em explicar aos demais o que se aprendeu no decurso das reuniões assemblárias. Com efeito, uma vez por mês, cada um expõe a todos os outros elementos da escola o que aprendeu ao longo do período mensal anterior, respondendo igualmente às perguntas e questões que lhe são apresentadas pelos seus companheiros, o que lhes permite dar conta do que lhes falta, ou não, ainda aprender.
A cultura assemblária é a cultura característica da Escola Paideia. Cada assembleia aglutina todos os elementos da escola, estando presentes desde a professora mais veterana até às crianças de 5 e 6 anos. É durante essas assembleias que se organiza a autogestão da escola, se decidem os objectivos de cada curso e de cada nível educativo, assim como se resolvem os conflitos que tenham, porventura, aparecido. Não por acaso a ausência de violência é um dos traços mais marcantes do funcionamento interno da escola. Grupos de estudantes actuam, quando necessário, como pacificadores. E quando se desencadeiam conflitos reúnem-se as duas partes até que ambas cheguem a um acordo. Se a divergência se mantiver então cabe à Assembleia decidir.
Através do diálogo razoável a escola livre Paideia resolve os problemas que hoje em dia assolam o sistema oficial de ensino, como é o caso da violência, o cansaço e as frustrações dos professores, ou então a falta de interesse dos alunos.
Autor do texto: Miguel Ángel de Lucas
Texto publicado no último número do jornal Diagonal (16/2/2006)
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