«Para mim as palavras são sempre importantes. Creio que a palavra é a arma mais perigosa que existe. Bem mais perigosa que a metralhadora. As palavras ficam.» ( Léo Ferré)
Por altura de um dos concertos dados em Portugal em 1982 o antigo jornal «Sete» entrevistou Léo Ferré, músico e cantor francês, conhecido pelas suas músicas e pelas suas opiniões anarquistas. Dessa entrevista, publicado pelo «Sete» de 31/3/1982 reproduzimos algumas passagens.
- Dizem que Léo Ferré é o sobrevivente de uma geração perdida…
Léo Ferré – Melhor que isso: que sou o porta-voz de um mundo perdido. É isso, de facto, prque tenho a impressão de que fui inspirado…Para me fazer compreender, eu falo de um mundo perdido, porque ele existe, certamente. Não o vemos, mas eu persisto…Prefiro pensar que aquilo a que se chama alma são os extraterrestres, as coisas que estão para lá do nosso entendimento, mas que existem. Quer sejam Deus, ou um tocador, ou a música, ou um violoncelo. Mas de certeza que não sou um fascista…
- O «mundo perdido» é a Utopia?
Léo Ferré – Não. Eu vou dar um exemplo: se olhares para um carreiro de formigas, tu dizes:«Que interessante que isto é!» E não tens necessidade de intervir, porque as formigas são demasiado pequenas. Ora, eu penso que há certamente outras pessoas no Universo que olham para nós, e nó somos as formigas. E é por isso que não há uma intervenção contra o terror deste mundo. Terror político, claro. Não há intervenção contra os que torturam e matam pessoas em El Salvador e na Guatemala, por exemplo. (…) Se eu lhes chamo o «mundo perdido» é porque é um mundo que nós inventamos, que não se vê. E é muito bom dizer que ele existe, porque constitui uma esperança. E sem ela não se podia viver…
- Qual é o teu papel entre as formigas?
Léo Ferré – Eu faço música, sou a formiga que canta…
(…)
-Isso quererá dizer que há esperança de futuro na juventude?
Léo Ferré – Sim. (…) Em França, por exemplo, os economistas fazem os orçamentos para a «defesa nacional», para a guerra, têm problemas porque os aviões, as máquinas, os carros de assalto estão fora de moda. Mas com metade daquilo que se gasta para preparar os meios de defesa, os generais, os soldados, podia-se dar u subsídio aos jovens…
- Isso é a subversão?
Léo Ferré – Claro, é porque eu sou um subversivo…
(…)
-Porque vives no campo?
Léo Ferré – Porque tenho possibilidade de o fazer. Tu não podes viver no campo, mesmo que queiras, porque trabalhas aqui, numa cidade. E nas cidades as pessoas não se conhecem nem se amam. (…) Para mim as palavras são sempre importantes. Creio que a palavra é a arma mais perigosa que existe. Bem mais perigosa que a metralhadora. As palavras ficam.
-Porque essas canções?
Léo Ferré - «Thank you Satan» é um agradecimento a Satanás por fazer de nós «maus». A outra é um agradecimento a Deus por todas as porcarias que nos envia lá de cima…