Depois da conhecida obra «A Formação da Mentalidade Submissa», Vicente Romano tem novo livro traduzido para português, «A Intoxicação Linguística», com edição da Deriva
O livro já está disponível nas livrarias, nomeadamente na
Livraria Utopia
(na Rua da Regeneração,22, no Porto)
Alguns excertos do livro:
Introdução — Jornalismo e Língua
Pela sua própria natureza, a informação é selectiva. Devido às limitações espácio-temporais, aos condicionamentos profissionais, ideológicos, culturais, etc., os jornalistas vêem-se sempre obrigados a seleccionar. Quase nunca dispõem do tempo, do espaço e da autodeterminação suficientes para dizer o que gostariam. Daí que possa afirmar-se que um domínio superior da língua, o seu uso consciente e competente seja uma das qualidades fundamentais do jornalista. Entre os jornalistas, embora sejam raros, podem existir casos de ingenuidade profissional, mas em informação nada há que seja inócuo.
O uso correcto da língua contribui para a eficácia da comunicação, para o aumento do conhecimento, quer dizer, para que a ignorância se reduza e para a ampliação da liberdade humana. Por isso há que cuidar e dominar a língua, os recursos expressivos para a transmissão de informações.
Em tempos de guerra, de incerteza e de angústia social como os actuais, é fácil recorrer ao sensacionalismo, à manipulação orientada da emocionalidade. Sim, os profissionais da informação não podem renunciar à sua sensibilidade ante a dor e a exploração dos seres humanos. As suas reportagens e as suas palavras reflectem a sua posição perante os factos, mesmo quando tentam ocultá-los. Mas não se pode esquecer que estes profissionais são observadores, não actores. E, ainda que a verdade possua muitas caras e seja difícil obtê-la por inteiro, podem, sim, aproximar-se dela.
II
Porém, como dizia o senador norte-americano Hiram Johnson, em 1917, a verdade é a primeira vítima da guerra. Em termos semelhantes se manifestara no seu, Da Guerra, o general prussiano Carl von Clausewitz, cem anos antes: “Uma grande parte das notícias que recebem na guerra é contraditória, outra parte ainda maior é falsa e a maior parte é bastante duvidosa…”. Em suma, concluí Clausewitz, «a maioria das notícias é falsa e o temor dos seres humanos reforça a mentira, não a verdade».
Como demonstraram a II Guerra Mundial, o desmembramento militar da Jugoslávia, a Guerra do Golfo ou as agressões contra o Afeganistão, o Iraque e o Líbano, as palavras do senador norte-americano no princípio do século XX, como as do general prussiano no início do século XIX não perderam validade. Pelo contrário, reforçaram-se mais e mais.
O controlo da informação e difusão de notícias e imagens foi sempre utilizado como uma arma essencial para submeter vontades e conquistar consciências. Por isso, o Pentágono não deixou ver qualquer imagem da Guerra do Golfo, anunciada como a primeira guerra televisionada na História, nem a administração norte-americana mostrou os corpos das vítimas do 11 de Setembro, como não permite, hoje, a difusão de qualquer notícia ou imagem do Afeganistão ou do Iraque que não esteja controlada, isto é, manipulada pela CIA e pelo Pentágono. E, para maior sarcasmo, isto é feito por um governo que proclama aos quatro ventos a liberdade de expressão como um dos pilares da sua organização social.
O objectivo consiste, naturalmente, em que apenas se conheça uma versão dos factos, ou seja, a comunicação unidireccional e unilateral, irreversível. Mas, por definição, a comunicação engloba o elemento da reciprocidade, da dicção e da contradição, da partilha do conhecimento. Por isso é contraditória com a vontade autoritária, a qual recorre à força e à violência física. Reciprocidade significa franqueza, abertura aos outros. Na comunicação aberta são o conhecimento e o raciocínio que se concretizam. A violência, seja esta física seja psicológica, deforma o pensamento, uma vez que não indaga acerca do verdadeiro e do falso. Os meios que se fecham impedem a comunicação. Não são recursos de violência física, não são bombas, mas transformam os seres humanos em coisas e a política que se transmite por seu intermédio não pode senão estar submetida à coacção que os meios exercem sobre os fins (Pross, 1971).
(...)
In, A Intoxicação Linguística, Vicente Romano. Em breve distribuido nas livrarias
Introdução — Jornalismo e Língua
Pela sua própria natureza, a informação é selectiva. Devido às limitações espácio-temporais, aos condicionamentos profissionais, ideológicos, culturais, etc., os jornalistas vêem-se sempre obrigados a seleccionar. Quase nunca dispõem do tempo, do espaço e da autodeterminação suficientes para dizer o que gostariam. Daí que possa afirmar-se que um domínio superior da língua, o seu uso consciente e competente seja uma das qualidades fundamentais do jornalista. Entre os jornalistas, embora sejam raros, podem existir casos de ingenuidade profissional, mas em informação nada há que seja inócuo.
O uso correcto da língua contribui para a eficácia da comunicação, para o aumento do conhecimento, quer dizer, para que a ignorância se reduza e para a ampliação da liberdade humana. Por isso há que cuidar e dominar a língua, os recursos expressivos para a transmissão de informações.
Em tempos de guerra, de incerteza e de angústia social como os actuais, é fácil recorrer ao sensacionalismo, à manipulação orientada da emocionalidade. Sim, os profissionais da informação não podem renunciar à sua sensibilidade ante a dor e a exploração dos seres humanos. As suas reportagens e as suas palavras reflectem a sua posição perante os factos, mesmo quando tentam ocultá-los. Mas não se pode esquecer que estes profissionais são observadores, não actores. E, ainda que a verdade possua muitas caras e seja difícil obtê-la por inteiro, podem, sim, aproximar-se dela.
II
Porém, como dizia o senador norte-americano Hiram Johnson, em 1917, a verdade é a primeira vítima da guerra. Em termos semelhantes se manifestara no seu, Da Guerra, o general prussiano Carl von Clausewitz, cem anos antes: “Uma grande parte das notícias que recebem na guerra é contraditória, outra parte ainda maior é falsa e a maior parte é bastante duvidosa…”. Em suma, concluí Clausewitz, «a maioria das notícias é falsa e o temor dos seres humanos reforça a mentira, não a verdade».
Como demonstraram a II Guerra Mundial, o desmembramento militar da Jugoslávia, a Guerra do Golfo ou as agressões contra o Afeganistão, o Iraque e o Líbano, as palavras do senador norte-americano no princípio do século XX, como as do general prussiano no início do século XIX não perderam validade. Pelo contrário, reforçaram-se mais e mais.
O controlo da informação e difusão de notícias e imagens foi sempre utilizado como uma arma essencial para submeter vontades e conquistar consciências. Por isso, o Pentágono não deixou ver qualquer imagem da Guerra do Golfo, anunciada como a primeira guerra televisionada na História, nem a administração norte-americana mostrou os corpos das vítimas do 11 de Setembro, como não permite, hoje, a difusão de qualquer notícia ou imagem do Afeganistão ou do Iraque que não esteja controlada, isto é, manipulada pela CIA e pelo Pentágono. E, para maior sarcasmo, isto é feito por um governo que proclama aos quatro ventos a liberdade de expressão como um dos pilares da sua organização social.
O objectivo consiste, naturalmente, em que apenas se conheça uma versão dos factos, ou seja, a comunicação unidireccional e unilateral, irreversível. Mas, por definição, a comunicação engloba o elemento da reciprocidade, da dicção e da contradição, da partilha do conhecimento. Por isso é contraditória com a vontade autoritária, a qual recorre à força e à violência física. Reciprocidade significa franqueza, abertura aos outros. Na comunicação aberta são o conhecimento e o raciocínio que se concretizam. A violência, seja esta física seja psicológica, deforma o pensamento, uma vez que não indaga acerca do verdadeiro e do falso. Os meios que se fecham impedem a comunicação. Não são recursos de violência física, não são bombas, mas transformam os seres humanos em coisas e a política que se transmite por seu intermédio não pode senão estar submetida à coacção que os meios exercem sobre os fins (Pross, 1971).
(...)
In, A Intoxicação Linguística, Vicente Romano. Em breve distribuido nas livrarias
Consultar:
Para saber mais de Vicente Romano e ler alguns dos seus textos: