3.5.08

A educação libertária segundo o notável cientista e professor açoriano Aurélio Quintanilha


Informação obtida por intermédio do blogue
http://vidanovazores.blogspot.com/


No passado ano de 2005 foi apresentada uma tese de mestrado na Universidade do Minho, de autoria de Amélia Filomena de Castro Gomes sob a orientação de Norberto Cunha, sob o titulo «A educação libertária segundo Aurélio Quintanilha».

É dessa tese que ora se apresenta uma breve resenha, seguida do link para a Universidade do Minho onde a referida tese pode ser livremente consultada via Internet.



Apresentação e resenha da tese de mestrado:

"Esta tese incide sobre Aurélio Quintanilha, um dos muitos cientistas e investigadores portugueses, cujas ideias educativas e pedagógicas são, praticamente, desconhecidas, na comunidade académica do nosso país.

Foi, também, um dos muitos funcionários públicos aposentado, compulsivamente, pelo Governo de Salazar, ao ser considerado opositor aos princípios fundamentais da Constituição Política.

Era, na altura, professor catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra. Pretende esta tese relevar o quão marcante foi o seu trajecto como pedagogo libertário, destacando aquele que foi sempre o seu lema: ser professor.

Para isso recorreu-se a pedagogos tidos como autoridades nesta matéria para ajudar a perceber a emergência do ideal libertário durante a segunda metade do século XIX e, por outro lado, reforçar e consolidar a influência anarquista em Aurélio Quintanilha, assim como o seu perfil libertário patente na sua principal obra Educação de Hoje, Educação de Amanhã (1921), analisaram-se alguns modelos educativos que influenciaram, directamente, a sua metodologia, a relação professor – aluno e, principalmente a estrutura e dinâmica de um processo de ensino que apostava numa escola que despoletava as capacidades cognitivas do aluno, reiterando a necessidade, por razões pedagógicas e sociais, duma educação profissional proporcionadora de uma profissão útil.

Salienta-se, também, que à educação libertária proposta por Aurélio Quintanilha, não lhe interessava um ensino livresco, de conhecimentos abstractos, mas sim a consecução de um desenvolvimento harmónico de todas as faculdades da criança assim como da sua saúde, e a aquisição de uma liberdade interior que se convertesse para o cidadão numa realidade permanente.

Todo este processo de aprendizagem devia ter em conta a actividade pessoal da criança e os seus interesses espontâneos, assim como a formação da consciência moral e da razão prática do estudante, desenvolvendo-se num ambiente onde imperassem os direitos e os deveres cívicos. Isto é, na proposta de uma pedagogia libertária, todos os actos individuais deviam contribuir para o bem estar colectivo, ou seja, deviam harmonizar o ideal de perfeição de cada um com o ideal de perfeição e de bem estar social.

Esta tese pretende assim, recorrendo ao pensamento de vários anarquistas, fundamentar o ideário libertário de Aurélio Quintanilha na sua proposta de reforma pedagógica, ensino este que promovia a actividade espontânea da criança, procurando formar cidadãos responsáveis dos seus direitos e deveres."


This thesis is about Aurélio Quintanilha, a professor from the Faculty of Science of the University of Coimbra, one of the many Portuguese pedagogues and researchers, practically unknown to the academic panorama of our country. He was also, one among many civil servants compulsory pensioned off by Salazar’s government, being considered an opponent to the fundamental principals of the Political Constitution of that time. This thesis intends to reveal how remarkable his course as libertarian pedagogue was, highlighting his life long motto: To be a teacher. In order to achieve this, we had recourse to pedagogues, who are considered to be experts in this matter so that, on one hand, help us understand the emergence of the libertarian ideal during the second half of the nineteenth century and, on the other hand, to reinforce and consolidate the anarchist influence on the pedagogue Aurélio Quintanilha, as to show the evident libertarian profile of his major writing Educação de Hoje, Educação de Amanhã. Some educational models were analysed, which directly influenced the methodology, the relationship teacher – pupil and, mainly, the structure and dynamics of a teaching process that pledged on a school that awakened the pupil’s cognitive capacities, reiterating the necessity, for pedagogical and social reasons, of a professional education favouring a useful occupation. It is also pointed out that the libertarian education proposed by Aurélio Quintanilha was not interested in a bookish teaching, of abstract knowledge, but in the attainment of a harmonious development of all the child’s capacities, as of its health, and in the acquisition of an inner liberty that would turn into a permanent reality for the citizen. All this learning process should take into account the personal activity of the child and its spontaneous interests, as the formation of a moral conscience and of the practical reasoning of the student, developing itself in an ambiance in which civic rights and duties prevailed. That is, in the proposal of a libertarian pedagogy, all individual actions should contribute to the collective well-being, in other words, each one’s ideal of perfection should be harmonious with the social ideal of perfection and of well-being. Thus, this thesis intends, having recourse to the thinking of several anarchists, to establish the libertarian concepts of Aurélio Quintanilha’s proposal of a pedagogical reform, which advised a teaching promoting the spontaneous activity of the child, trying to form responsible citizens, aware of their rights and duties.



A tese completa pode ser lida aqui







Biografia de Aurélio Quintanilha






Professor Doutor Aurélio Pereira da Silva Quintanilha era um cientista português de renome internacional.
Nasceu na freguesia de Santa Luzia de Angra, Ilha Terceira, Açores, a 24 de Abril de 1892 e morreu em Lisboa em casa de sua filha Carlota em 1987, com 95 anos.
Era membro de uma família ilustre da Ilha – a família Coelho Borges, pelo lado paterno e da mui digna família Silva Pereira pelo lado materno.
O nome Quintanilha aparece por iniciativa de um parente que restabeleceu a ligação onomástica com um avô – José da Silva Quintanilha que foi Corregedor de Angra.
Iniciou os seus estudos liceais em Angra, continuou-os na Horta e veio a conclui-los em Ponta Delgada.
Órfão de pai ao sair da escola primária, foi educado por uma irmã 13 anos mais velha do que ele, pessoa culta e inteligente que o acompanhou com a mãe até Coimbra.
Aqui matriculou-se na Faculdade de Ciências que frequentou durante 3 anos, sem fazer exames.
O seu irmão Guilherme, 16 anos mais velho do que ele, coronel de artilharia, convenceu-o a increver-se na vida militar, como artilheiro voluntário e a tirar os preparatórios para a Escola do Exército, o que conseguiu.
Durante a sua estadia em Lisboa, iniciada em 1912 e concluída em 1919 matriculou-se em Medecina, o que lhe permitiu assistir às aulas do Professor Celestino da Costa e de Pedro Roberto Chaves e assim adquirir uma grande prática laboratorial nos domínios da Citologia e da Histologia.
Entretanto, na convivência com amigos alfacinhas, envolveu-se na política da época, fazendo-se anarco-sindicalista avançado, defensor da causa do proletariado e da República.
As suas ideias sociais e políticas, revelam a forte influência também do seu antigo professor liceal, José Augusto dos Santos, Director do Jornal O Tempo, de Angra.
Em 1915 adoeceu gravemente e foi hospitalizado. É nessa altura que recebeu a orientação amiga do Professor Teles Palhinha, para se licenciar em Ciências Naturais.
Em 1917 faz exame das cadeira de Botânica e é convidado pelos seus Professores Pereira Coutinho e Teles Palhinha para ser segundo assistente. Começou então a dar excelentes aulas práticas de Citologia Animal.
Em 1919 é licenciado em Ciências Naturais com vinte valores e logo de seguida o Professor Carrisso convida-o para 1º assistente em Coimbra.
Por volta de 1920 deram-lhe a regência da cadeira de Botânica Médica.
Em 1926 fez concurso para Professor Catedrático e iniciou uma longa viagem pela Europa, vindo a conhecer pessoalmente o famoso cientista alemão Hans Kniep, em Berlim.
Desse contacto resultou que em 1928 partia para a Alemanha como Leitor de Português na Universidade de Berlim onde esteve até 1931. Aproveitou o tempo para aprender com o referido cientista germânico novas técnicas da Genética de Basidiomicetos.
De regresso a Portugal retomou o seu trabalho de docente de Botânica Médica e através desse curso consegue entusiasmar alguns alunos brilhantes a prosseguirem os seus estudos de Biologia.
Aurélio Quintanilha diz, nas suas próprias palavras “se eu não tivesse feitos outra coisa, na minha carreira de docente do que descobrir, guiar os primeiros passos e entusiasmar pelos estudos da biologia experimental” cientistas ilustres como Abílio Fernandes, José Antunes Serra e Flávio Resendes “creio que já me poderia considerar bem pago pelo esforço dispendido”.
Quando foi trabalhar para a Alemanha já levou consigo sua mulher, Maria Susana, igualmente licenciada em Biologia, e suas duas filhas Cecília e Carlota.
Entretanto divorciou-se e casou com a Lucya, uma senhora alemã, preparadora de laboratório que veio a ser mãe de Alexandre Quintanilha e grande amigas das enteadas.
Em Coimbra começou a ser conhecido pelo seu estilo pedagógico de Professor justo, exigente e de grande competência, que acamaradava com os alunos, jogando mesmo à bola com eles, e revelando grande entusiasmo pelas aulas práticas e pela investigação científica.
A ele se atribui a classificação de professores salsicheiros e professores jardineiros. Os primeiros enchiam a cabeça dos alunos com conhecimentos teóricos e os segundos cuidavam deles como os jardineiros cuidam das flores dos seus jardins.
Em 1935, Salazar manda publicar um decreto que autoriza o Governo a demitir os funcionários civis e militares que tenham revelado espírito de oposição aos princípios fundamentais da Constituição Política ou não dêem garantias de cooperar na realização dos fins superiores do Estado. E foi com base nesta legislação que Aurélio Quintanilha, sem qualquer actividade política desde 1919, foi aposentado compulsivamente, com a reforma de 1.100$00 mensais. Expulso da função pública aos 43 anos e envolvido “até ao pescoço” em projectos de investigação científica, só encontrou uma saída para o seu futuro: Terminar o seu trabalho sobre a genética da sexualidade dos Basidiomicetos e apresentá-lo no Congresso Internacional de Botânica em Amsterdão. Conseguiu o que pretendia. A sua comunicação valheu-lhe o prémio Hansen da Academia das Ciências da Dinamarca, cuja medalha em ouro está presentemente na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, e uma bolsa de estudo britânica para trabalhar no Laboratório de Criptogamia em Paris.
Aqui e até 1939 desenvolveu uma intensa actividade científica. É nesta época que vai ao Congresso Internacional de Genética em Edimburgo onde apresentou uma comunicação sobre o fenómeno de Buller e onde encontra o Professor António Câmara que o convida a trabalhar na Estação Agronómica Nacional, uma vez que o ambiente político em Portugal parecia haver melhorado. Entretanto alista-se no Exército francês e é soldado de 2ª classe durante um ano. Consegue depois voltar a Portugal em 1941 para sair do ambiente de guerra da capital francesa e procura trabalhar na Estação Agronómica Nacional.
Porém, Salazar voltou a barrar-lhe o caminho mas deixou que fosse trabalhar na distante Junta do Algodão em Angola e Moçambique. Parte pois para esta Província Ultramarina, como Director do Centro da Investigação Científica Algodoeira (CICA), em Lourenço Marques, onde vive até depois da independência.
Em 19 anos de trabalho conseguiu aumentar imenso a produção do algodão e publicou numerosos trabalhos.
Em 1950 realiza-se em Estocolmo o Congresso Internacional de Genética onde Aurélio Quintanilha decide contrariar o investigador russo Lysenko, defensor da doutrina Genética chamada Mitchurinismo – luta que lhe trouxe grande prestígio internacional.
Em 1958 assiste ao Congresso Internacional de Genética em Montreal onde volta a atacar o delegado russo, todo mitchurinista e que fica desprestigiado.
Em 1962 é extinta a Junta do Algodão e em sua substituição é criado o Instituto do Algodão de Angola e Moçambique. Quintanilha é então despedido por já ter ultrapassado o setenta anos de idade.
Mas, mais tarde, Veiga Simão convida-o a trabalhar no Laboratório de Botânica da Universidade de Lourenço Marques, a título gratuito. Entretanto é criado o Instituto de Investigação Científica de Moçambique onde Aurélio Quintanilha resolve trabalhar.
Representou Portugal em diversos congressos internacionais, sempre com grande brilho, até porque era um poliglota de mérito.
Publicou numerosos trabalhos científicos de valor reconhecido internacionalmente.



Datas mais importantes:



1926 – Doutoramento em Coimbra.
1937 – Prémio Hanse, da Academia das Ciências da Dina-marca.
1941 – Prémio Artur Malheiro da Academia das Ciências.
1947 – Doutor Honoris Causa pela Universidade Wit Wa-tersrand da África do Sul.
1958 – Sócio Correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.
1972 – Grande Oficial da Ordem de Santiago de Espada.
1974 – Homenagem prestada na última lição de Coimbra com afixação de placa comemorativa.
1974 – Homenagem da Fundação Gulbenkian.
1981 – Doutor Honoris Causa pela Universidade de Lisboa.
1983 – Ordem da Liberdade.
1992 – Homenagem da Câmara Municipal de Lisboa.


Publicações de Aurélio Quintanilha:
1940 – Etude Genetique des Phenomenes de Nanisme Chez les Hymeno-mycetes. Separata do B. S. Broteriana - Volume XIV - II Série.
1943 – O Problema da delimitação e origem das espécies do ponto de vista da biologia experimental - Separata do Boletim da Sociedade Broteriana - Volume XVII - II Série.
1945 – Os fundamentos científicos da sexualidade - Biblioteca Cosmos nº 25 - Lisboa.
1951 – D. António Pereira Coutinho, o Mestre, o Botânico e o Homem - Tipografia Minerva Central - Lourenço Marques.
1960 – Michurinismo e Mendelismo, Separata da Agros nº 5 - Ano 43 - Lisboa - Quintanilha, A. Salazar d’Eça e Cabral A.
1962 – Desenvolvimento do Botão Floral do Algodoeiro em Função do Tempo - B. S. Broteriana, Dezembro, Vol XXXVI (2ª Série).
1965 – Gregório Mendel. Cem anos depois. Instituto do Algodão de Moçambique.
1966 – Homologias cromossómicas do Género Gossypium - B. S. Broteriana - Vol XL (2ª Série).
1966 – O problema algodoeiro português e a actividade do Centro de Investigação Cientifica Algodoeira - Separata do Boletim da Academia de Ciências de Lisboa - Vol XXXVIII. (??)
1969 – Prof. Eng. Joaquim Vieira Natividade - O Investigador, o Agró-nomo-Silvicultor e o Homem - Separata do B. S. Broteriana - Volume XLIII - II Série.
1970 – Progressos Recentes da Genética de Bactérias e Vírus - Separata da Revista de Ciências Biológicas - Vol 1, Série B - Universidade de Lourenço Marques.
1973 – Progressos da Genética dos Fundos e a Contribuição dos Portu-gueses - Separata da Revista de Ciências Biológicas - Vol 2, Série B - Universidade de Lourenço Marques.
1980 – Evocando o Passado - Separata do B. S. Brotariana - Vol LIII (2ª Série).