13.7.07

Ecologia libidinal: campanha por um Verão sem depilação


«Não há revolução sem revolução sexual»
(What’s the point of a revolution without general copulation, copulation, copulation?)
Peter Weiss, in Marat-Sade


Porque é que não fazemos amor na rua (Why don’t we do it in the road?)
The beatles, 1968




A depilação dos homens: mais um negócio em perspectiva?


Enquanto houver pêlos…os negociantes da depilação podem estar descansados que as suas receitas não correm perigo!

Nos últimos tempos assiste-se à afirmação de duas tendências: a depilação dos homens ( e de uma forma geral, a criação de uma procura de cosméticos para o público masculino) e a moda da depilação integral do púbis ( tanto das mulheres como dos homens).

Para além do evidente interesse comercial (para as empresas do ramo) a depilação dos homens procura ser justificada com «argumentos» artificialmente construídos e para superar certas contradições inerentes à depilação feminina.
Há alguns anos atrás, quando só as mulheres se sujeitavam à depilação, os que prescreviam aquela prática – os publicitários, os redactores de revistas femininas, e as empresas do sector – defendiam fundamentalmente que os pêlos eram anti-femininos e que urgia a sua eliminação. Os pêlos eram então vistos como um apanágio viril, sendo que a depilação serviria para reforçar a separação dos sexos. As mulheres, e só às mulheres, deviam rapá-los. Como é fácil de imaginar um argumento sexista como este não podia manter por muito tempo.
Apareceu então uma representação social no sentido de considerar o pêlo como algo de «sujo» - note-se que a referência à higiene e à saúde é um óptimo expediente para dar como indiscutível uma qualquer «justificação» . Fala-se a esse propósito de um fenómeno de naturalização: depilar-se torna-se um necessidade biológica.
Ora sabe-se que a naturalização ) a transformação de um arbitrário social numa necessidade natural) é um processo muito importante de reprodução ideológica.
Todavia esta construção higienista enfrentava uma contradição : os pêlos só eram sujos para as mulheres!!! ( os homens tinham certamente o direito de ser sujos)

As coisas mudaram e as mulheres passaram a pressionar os homens a que eles próprios passassem a depilar-se – facto a que certamente não é estranho o marketing dirigido àquelas. Incitar os homens a depilarem-se passou a ser visto como um passo mais na igualdade dos sexos!!! E não é difícil ver aí uma perversão do feminismo induzido pelos publicitários


A depilação integral: a neutralização da sexualidade!

Os Pêlos estão fisiologicamente ligados à sexualidade. Por isso mesmo, é que eles foram frequentemente alvo de censura tanto na pintura como no cinema.. Os pêlos são os sinais mais evidentes da maturidade sexual. Correspondentemente os estudos sociológicos têm demonstrado que o corte e a ocultação dos pêlos estão ligados à operação ideológica que pretende domesticar a sexualidade, maxime a sexualidade feminina. E não é por acaso que a actual tendência para a depilação genital integral vai a par com a generalização da difusão dos videos pornográficos. Na realidade os actores e as actrizes do género exibem púbis pelados para melhor «ver», isto é, para efeitos de eficácia cinematográfica. Mas o certo é que tais imagens são uma referência para os adolescentes e os mais sugestionáveis no que toca não só quanto à maneira como abordam a sexualidade mas também quanto à sua aparência corporal. Ora sabe-se como a pornografia é uma negação da sexualidade viva, uma vez que reduz o corpo a um objecto manipulável.

E é assim que se está a criar uma nova geração de jovens, sem pêlos nem aspirações eróticas: é a geração porno.

É para contrariar esta tendência que foi lançado um apelo por um Verão sem depilação

Consultar( em francês):





O que significa a ecologia libidal?

O conceito de ecologia libidinal tem por finalidade estabelecer um vínculo entre, por um lado, a psicanálise política, nomeadamente a que foi desenvolvida por via das teorias de Wilheilm Reich e Herbert Marcuse ( o chamado Freud-marxismo), e por outro, as reflexões ecologistas, sociológicas e económicas ( que constroem uma crítica ao crescimento económico), surgidas no fim dos anos de 1970 e que são hoje retomadas por uma plêiade de movimentos, desde os movimentos antiglobalização ao pensamento libertário.
Trata-se pois de uma ecologia no sentido em que pretende enfatizar a continuidade e a interdependência entre o ser humano e os outros sistemas vivos e não-vivos. E assume-se também como libidinal na medida em que a energia vital universal corresponde no homem à energia sexual ( libido)

Mas não se pense que se trata de mais uma ideologia. Por definição, uma ideologia é um sistema fundado num axioma de base que é inquestionável. Por exemplo: «Deus existe» (todas as religiões são ideologias), ou «a laei do mercado leva-nos à prosperidade» ( ideologia liberal). Ora é nossa vontade escapar a este esquema mental. Sem apriorismos predefinidos procuramos observar quais são os motivos de sofrimento humano e o estado do planeta para justificar a necessidade de transformações sociais e económicas para tornar possível o desenvolvimento das potencialidades de cada ser.

Por sua vez a psicanálise política é a aplicação da psicanálise para a análise dos fenómenos de sociedade. Com efeito, as relações sociais e o modelo de sociedade são uma resultante do psiquismo dos indivíduos que compõem uma sociedade, sendo aqueles condicionados e formados também pelo modelo social dominante.
E se a terapia individual pode tratar alguns pacientes, a verdade é que só um abordagem psicanalítica global da sociedade permitirá corrigir os males que sofrem a quase totalidade dos seus membros.
( ver a este propósito o livro La Psychanalyse politique, de Roger Dadoun, P.U.F., 1995 – tradução portuguesa, A psicanálise política de Roger Dadoun )