A luta dos moradores dos bairros Marianas, Azinhaga dos Besouros, Estrada Militar, Quinta da Vitória, Fim do Mundo e Quinta da Serra ( todos da cidade de Lisboa), com o apoio do grupo Direito à Habitação da associação Solidariedade Imigrante, contra a demolição dos seus bairros sem a salvaguarda do seu direito a terem uma habitação digna.
Os bairros de barracas foram construídos há já dezenas de anos pelos trabalhadores que chegavam à cidade, portugueses e imigrantes. A cidade precisava deles mas não tinha habitação para eles. Então tiveram de construir as suas casas, ocupando terrenos devolutos ou comprando terrenos a proprietários de quintas etc...
Os bairros de barracas foram construídos há já dezenas de anos pelos trabalhadores que chegavam à cidade, portugueses e imigrantes. A cidade precisava deles mas não tinha habitação para eles. Então tiveram de construir as suas casas, ocupando terrenos devolutos ou comprando terrenos a proprietários de quintas etc...
Os bairros, que respondiam à falta de habitação, ficaram até que as autoridades e os novos proprietários dos terrenos ( grupos imobiliários, bancos...) decidirem, por interesses económicos, mandar toda a gente embora.
Há quinze anos, os despejos violentos fizeram crescer os protestos dos moradores. Sob a pressão dessa luta o Estado criou o PER, Programa Especial de Realojamento. Foram construídos prédios sociais e uma parte dos moradores foi realojada. Num prazo de 5 anos era previsto acabar com os bairros e realojar todos os moradores. Mas a verdade é que os bairros ainda existem e lá permanecem, e ainda não foram realojadas todas as famílias que foram recenseadas em 1993.
O problema principal é que o programa está agora completamente desactualizado.
Desde 1993, passaram 14 anos. A situação mudou, chegaram pessoas, nasceram pessoas. Todos as pessoas ( muitos são trabalhadores da construção civil ) que chegaram depois de 1993 não tem direito a nada. Outros já cá estavam em 1993 mas não foram recenseados porque, por exemplo, estavam a trabalhar numa obra no Algarve ou não estavam em casa no dia do recenseamento.
Os salários baixos que as pessoas recebem não lhes permite alugar uma casa no mercado privado.
São expulsos violentamente. A polícia atira-os para a rua
MANIFESTO DOS MORADORES DOS BAIRROS AFECTADOS PELAS DEMOLIÇÕES
Este manifesto foi escrito por um grupo de moradores dos bairros Marianas, Azinhaga dos Besouros, Estrada Militar, Quinta da Vitória, Fim do Mundo e Quinta da Serra, com o apoio do grupo Direito à Habitação da associação Solidariedade Imigrante.
Nós, moradores dos bairros demolidos ou na iminência de o serem, expomos o seguinte:
Vários bairros da área metropolitana de Lisboa, construídos há décadas por trabalhadores portugueses migrantes do interior do país e por trabalhadores imigrantes e os seus filhos, estão a ser demolidos.
Muitas pessoas são expulsas das suas casas e não têm direito ao realojamento.
O Programa Especial de Realojamento (PER) baseia-se num recenseamento realizado em 1993.
Muitos moradores, chegados aos bairros antes de 1993, não foram incluídos no PER. Nós, por exemplo, que somos trabalhadores da construção civil, fomos excluídos. O nosso trabalho exige frequentes deslocações durante dias seguidos aos locais das obras. Essa é a razão da nossa ausência do bairro e da nossa falta de informação durante o recenseamento.
Também existem, nos nossos bairros, milhares de pessoas que chegaram depois de 1993 e que pela sua situação económica precária, pela discriminação à qual estão sujeitas no acesso à habitação no mercado privado e pela inexistência de uma política real de habitação que possa responder às suas necessidades habitacionais, não tiveram outra alternativa que os bairros de barracas.
Agora, as câmaras expulsam-nos sem nos deixar nenhuma alternativa habitacional, tirando-nos o único tecto que temos.
Trabalhamos para construir Portugal. Pagamos os nossos impostos e contribuímos para a economia do país. Como qualquer cidadão, descontamos para o Estado mas este não nos reconhece o direito constitucional a uma habitação.
Considerando a história da colonização e considerando a da emigração portuguesa, não achamos justo o tratamento recebido pelos imigrantes em solo português.
Não estamos a pedir casas de graça, mas o acesso a uma habitação com uma renda de acordo com os nossos rendimentos.
Estamos dispostos a colaborar com o Estado para encontrar uma solução que respeite os direitos de todas as pessoas.
DENUNCIAMOS:
O Programa Especial de Realojamento (PER) revelou-se um programa limitado e injusto que tem excluído muitas pessoas.
As autarquias estão a tratar-nos como se não fossemos seres humanos.
As demolições contribuem para a degradação dos bairros, provocando inúmeros danos psicológicos, morais e materiais. As condições de habitabilidade têm vindo a piorar substancialmente desde o início das demolições: entulho, canalizações partidas, estruturas danificadas que criam infiltrações quando chove...
Estes processos de demolição, além de não terem tido nenhum acompanhamento social, têm-se caracterizado por uma presença violenta e abusiva das forças policiais, que se limitam a expulsar brutalmente as pessoas das suas casas sem qualquer diálogo. Isto é abuso de poder.
Existem inúmeras casas fechadas nos bairros de realojamento, destinadas à venda e que permanecem vazias até hoje.
O estatuto ilegal das nossas casas não é assim tão evidente. O Estado permitiu a construção destes bairros e, em certos casos, até a apoiou; pois, estes remediavam a carência de habitação para os trabalhadores que chegavam à cidade. Posteriormente o Estado deixou desenvolver este mercado paralelo de habitação. Em muitos casos as casas foram compradas pelas pessoas. Outras pessoas sempre pagaram aluguer, facturas de electricidade, água, esgotos e contribuições autárquicas. Existem mesmo casos de "habitação ilegal" registada nas finanças.
Achamos absolutamente inadmissível a desresponsabilização do Estado e a sua completa despreocupação para com os seus cidadãos. Sentimo-nos tratados como se não fossemos pessoas. As Câmaras e o Governo passam as responsabilidades um para o outro como num jogo de ping-pong.
Quando confrontadas por nós, as Câmaras dão esperanças, mas logo a seguir dão o dito pelo não dito. O Governo fez promessas e apresentou soluções que nunca cumpriu. As falsas alternativas são injustas, provisórias e discriminatórias: apoio incerto de três meses de renda, dias em centros de acolhimento ou pensões, propostas de regresso ao país de origem.
EXIGIMOS QUE SEJAM RESPEITADOS OS NOSSOS DIREITOS!
EXIGIMOS que seja respeitado o direito à habitação para todos, consagrado pelo artigo 65 da Constituição Portuguesa.
EXIGIMOS que sejam suspensas as demolições das casas onde moram pessoas que não têm alternativa habitacional.
EXIGIMOS o realojamento de todos os moradores dos bairros que não estão incluídos no PER.
EXIGIMOS que o Estado crie e aplique uma verdadeira política da habitação para todos os cidadãos.
EXIGIMOS o acesso a uma habitação condigna em que nos responsabilizamos pelo pagamento de uma renda de acordo com os nossos rendimentos, de forma a criar uma oportunidade para podermos mostrar e defender a possibilidade de uma vida melhor.
HABITAÇÃO PARA TODOS!