25.5.06

Luandino Vieira recusa prémio Camões


Luandino Vieira, escritor e poeta angolano, de 71 anos, recusou o Prémio Camões que lhe foi atribuído pelos Ministérios da Cultura de Portugal e do Brasil. Note-se que o prémio Camões é a mais alta recompensa financeira da área das letras da lusofonia

José Luandino Vieira vive numa casa isolada em Vila Nova de Cerveira, e afastado do mundo literário e político desde 1990. As razões para a recusa do prémio são de carácter pessoal, mas tudo parece que apontam para o facto do escritor não estar disposto ao ruído e barulho mediático que não deixaria de ficar exposto com a entrega do referido prémio.

O seu editor explica: «Luandino é um homem tímido. Vive retirado,isolado e suponho que quer continuar a viver assim, e que isso é mais valioso do que receber todo esse dinheiro do prémio Camões».
O destino dos 100.000 euros do prémio será agora objecto de nova decisão ministerial dos governos português e brasileiro.

Entretanto, no próximo dia 11 de Novembro será lançado em Luanda um novo livro, intitulado O Livro dos Rios que constitui o 1.º Volume da trilogia De Rios Velhos e Guerrilheiros.
Biografia

José Luandino Vieira, nascido na Lagoa do Furadouro (Portugal) em 4 de Maio de 1935 é cidadão angolano pela sua participação no movimento de libertação nacional e contribuição no nascimento da República Popular de Angola. Passou toda a infância e juventude em Luanda onde frequentou e terminou o ensino secundário. Trabalhou em diversas profissões até ser preso em 1959 (Processo dos 50), é depois libertado e posteriormente (1961) de novo preso e condenado a 14 anos de prisão e medidas de segurança. Transferido, em 1954, para o Campo de Concentração do Tarrafal, onde passou 8 anos, foi libertado em 1972, em regime de residência vigiada em Lisboa. Iniciou então a publicação da sua obra na grande maioria escrita nas diversas prisões por onde passou.Depois da Independência foi nomeado para a Televisão Popular de Angola, que organizou e dirigiu de 1975 a 1978; para o D. O. R. (Departamento de Orientação Revolucionária do MPLA) que dirigiu até 1979; para o I. A. C. (Instituto Angolano de Cinema) que organizou e dirigiu de 1979 a 1984.Membro fundador da União dos Escritores Angolanos exerceu a função de Secretário-Geral desde a sua fundação – 10-12-1975 – até 31-12-1980.Foi Secretário-Geral Adjunto da Associação dos Escritores Afroasiáticos, de 1979 a 1984; e de novo Secretário-Geral da União dos Escritores Angolanos, de 1985 a 1992.Após o colapso das 1.ªs eleições em 1992 e do recrudescimento da guerra civil, abandonou a vida pública, dedicando-se unicamente à literatura.


Obras publicadas na editorial Caminho
Nosso Musseque (1ª edição, 2003) «Outras Margens», n.º 13
A Vida Verdadeira de Domingos Xavier (1.ª edição, 2003) «Outras Margens», n.º 18
Nós, os do Makulusu (1.ª edição, 2004) «Outras Margens», n.º 26
João Vêncio: os Seus Amores (1.ª edição, 2004) «Outras Margens», n.º 29
Luuanda (1.ª edição, 2004) «Outras Margens», n.º 36
No Antigamente, na Vida (1.ª edição, 2005) «Outras Margens», n.º 39
Macandumba (1.ª edição, 2005) «Outras Margens», n.º 43
Velhas Estórias (1.ª edição, 2006) «Outras Margens», n.º 51

Outras Obras
A Cidade e a Infância (contos)
Vidas Novas (contos)
Velhas Estórias (estórias)
Lourentinho, Dona Antónia de Sousa Neto & Eu (estórias)




Estrada

Luanda Dondo vão,
cento e tal quilômetros
mangas e cajus
marcos brancos
meninos nus

Branco algodão
crescendo
corpos negros
na cacimba

O Lucala corre
confiante
indiferente à ponte que ignora

Verdes matas
Sangram vermelhas acácias
imbondeiros festejam
o minuto da flor anual

Na estrada
o rebanho alinha
pelo verde
verde capim

Adivinhados
caqui lacraus
de capacete giz
trazem a morte

Meninos
se embalam
em mães velhas
de varizes:

Rios azuis
da longa estrada

E é fevereiro
sardões as sol
Cassoalala

Eia Mucoso
tão cheio agora
Adivinhados
permanecem
lacraus caqui
capacetes giz

Não param as colheitas

Que razão seriam
fevereiro
acácias sangrando vermelho
verdes sisais
cantando o parto
da única flor?

Não param as colheitas!

(No reino de Caliban II - antologia
panorâmica de poesia africana de ex-
pressão portuguesa