11.7.05

A loucura é a terra onde floresce a lucidez do homem (a propósito de Flaubert)


Excertos do livro «Diário de um louco» de Flaubert

...fui agredido em todos os meus gostos: na aula, pelas minhas ideias; nos recreios, pelo meu pendor para a selvajaria solitária. Desde então, sou um louco!
Vivi lá portanto sozinho e aborrecido, atormentado pelos meus mestres e escarnecido pelos meus colegas......

(…)

....vejo-me ainda, sentado nos bancos da minha sala de aula, absorto nos meus sonhos de futuro, pensando no que a imaginação de uma criança pode sonhar de sublime, enquanto o pedagogo troçava dos meus versos latinos, os meus colegas me olhavam zombeteiros. Que imbecis! Eles, rirem-se de mim! Eles tão fracos, tão vulgares, com um cérebro tão exíguo; eu cujo espírito se afundava nos limites da criatividade, que andava perdido em todos os mundos da poesia, que me sentia maior do que eles, que recebia alegrias infinitas e que tinha êxtases celestes perante todas as revelações íntimas da minha alma!

(…)

Nunca apreciei uma vida regrada, horas certas, uma existência de relógio em que é preciso que o pensamento pare com o sino, em que tudo já foi percorrido de antemão por séculos e gerações. Esta regularidade sem dúvida pode convir á maioria, mas para a pobre criança que se alimenta de poesia, de sonhos e de quimeras, que pensa no amor e em todas as tolices, é o despertar incessante deste sonho sublime, é não lhe deixar um momento de repouso, é asfixiá-la transportando-a para a nossa esfera do materialismo e do bom senso a que ela tem horror e nojo!

(…)

... tinha deturpado o gosto e o coração, como diziam os meus professores e, entre tantos seres de tendências tão ignóbeis, a minha independência de espírito levava a que fosse tomado pelo mais depravado de todos; era rechaçado para o nível mais baixo da própria superioridade, Mesmo reconhecendo-me imaginação, o que é, segundo eles, uma exaltação do cérebro vizinha da loucura!

(…)

.....abandonemos o manto real, o ceptro, os diamantes, o palácio em derrocada, a cidade em queda , para irmos ter com a égua e a loba!....

(…)

.....a natureza será livre sem o homem ...

(…)

Há mulheres em quem detectei o pretensiosismo a um quarto de légua de distância, só pela maneira como elas olhavam as ondas.....