15.5.05

Os Provos e a contra-cultura



A revolta Provo foi o primeiro episódio em que os jovens, como grupo social independente, tentaram influenciar o território da política. Fizeram-no de modo absolutamente original, sem propor ideologias, mas um novo e generoso estilo de vida anti-autoritário e ecológico. Ao contrário da atitude beat de afastamento para fora da sociedade, os Provos holandeses ( o movimento nasce e desenvolve-se em Amesterdão) empenharam-se descaradamente em permanecerem dentro da sociedade, para provocarem nela um curto-circuito.

Para os mais distraídos, aqueles para os quais a palavra Provo nada significa, é bom lembrar que a contra-cultura teve o seu local de eleição, não na Califórnia, mas na Amesterdão do início dos anos sessenta, por intermédio dos Provos, que tiveram apenas na imaginação a sua única arma.
Com efeito, e diferentemente do slogan de Maio de 68 que queria levar a imaginação ao poder, os Provos utilizaram a imaginação contra o poder.

Jogo, magia e anarquia foram centrais nas acções dos provos (abreviação de provocador): um grupo de divertidos agitadores que se reuniam para celebrar ritos colectivos contra o fetiche da sociedade consumista. Foi ali que surgiram as primeiras campanhas antipublicidade e antiautomóvel. Ali surgiu aquilo que passamos a chamar de contracultura e se desenvolveu a ideia que a subversão resultava melhor se estivesse misturada com o humor e a irrisão.
Os Provos fizeram de Amesterdão a Meca dos jovens dos anos 60 e 70. O exemplo dos Provos inspirou os diversos movimentos de contestação jovem dos anos 60, inclusive os hippies norte-americanos e os estudantes do Maio de francês de 68.

A «provolução» talvez tenha sido o primeiro exemplo de uma rebelião sem nenhuma causa aparente. A Holanda no início dos anos de 1960 podia considerar-se uma ilha de bem-estar e tranquilidade. Isto é, «não existia nenhum motivo comcreto para protestar contra a ordem constituída», segundo as palavras de um historiador do movimento Provo. Decerto que não existia nenhum motivo, a não ser, naturalmente, a …própria existência da ordem constituída.

Reproduz-se o manifesto programático do jornal dos Provos, lançado em 1965:

PROVO é uma folha mensal para anarquistas, provos, beatnicks, noctâmbulos, amoladores, malandros, simples simoníacos estilistas, magos, pacifistas, comedores de batatinhas fritas, charlatães, filósofos, portadores de germes, moços de estribarias reais, exibicionistas, vegetarianos, assistentes do assistente, gente que se coça e sifilíticos, polícia secreta e toda a ralé deste tipo.
PROVO é alguma coisa contra o capitalismo, o comunismo, o fascismo, a burocracia, o militarismo, o profissionalismo, o dogmatismo e o autoritarismo.
PROVO deve escolher entre uma resistência desesperada e uma extinção submissa.
PROVO incita à resistência onde quer que seja possível
PROVO tem consciência de que no final perderá, mas não pode deixar escapar a ocasião de cumprir ao menos pela quinquagésima e sincera tentativa de provocar a sociedade.
PROVO considera a anarquia como uma fonte de inspiração para a resistência
PROVO quer devolver vida à anarquia e dá-la a conhecer aos jovens
PROVO É UMA IMAGEM


E, mais tarde, quando se dissolveram, na sua declaração podia ler-se:

«Não podemos convencer as massas, e nem é isso que nos interessa. O que poderemos, realmente, esperar desse bando de apáticos…? É mais fácil o sol surgir no Oeste do que eclodir uma revolução nos Países Baixos.
Somos Provo…, mas, então, porquê? Não é certamente para nos entediarmos. Nem fazemos provocações por falta de paz. Porquê, então? Porque este mundo está cheio e atolado de exércitos, Estados, polícias, espiões, cavalos de batalha, muros de vergonha, bases de mísseis, rampas de lançamento, quartéis, mortos de fome, histeria religiosa, burocracia e campos de extermínio…Nós não somos tão ingénuos a ponto de acreditar que possamos transformar este mundo, num piscar de olhos, num lugar ideal(…) Posto isto sempre diremos: nunca transfiram para outros o vosso poder.»


( excertos de «Provos, Amsterdãoe o nascimento da Contra-Cultura» de Matteo Guarnaccia, segundo a tradução brasileira do colectivo Baderna, editado pela editora Conrad)