Querem-nos impingir um Parque Verde na zona oriental da cidade do Porto, mais concretamente no Vale de Campanhã, «contaminado» com o todo-poderoso automóvel, através da construção de uma rodovia com características de auto-estrada ( ou via rápida), como se já não bastassem as vias já existentes que despejam diariamente milhares de viaturas motorizadas na cidade.
Porque de facto o que há a mais no Porto são automóveis, e não espaços verdes de proximidade onde a população urbana possa reencontrar o equilíbrio psicológico, perdido com o estilo de vida citadino. É por coisas como estas que passa a tão espezinhada qualidade de vida dos portuenses.
O pré-anúncio pelos gestores autárquicos da construção da malfadada via rápida que atravessaria essa Zona Verde representa, sem dúvida, a derrota ( mais uma) para uma população carente de espaços que possam contrabalançar a invasão do trafego urbano e a densidade de construção que estão a transformar a cidade num formigueiro humano à imagem das irrespiráveis e desumanas metrópoles, apressadamente super-desenvolvidas, onde os residentes se atropelam uns aos outros.
São conhecidas as consequências nefastas da ocupação lineal de terrenos através da construção de infraestruturas lineais de transporte ( prejuízo para os habitats, emissão de produtos tóxicos, o efeito-barreira, a fragmentação e destruição das sociabilidades locais e regionais), o que no caso pendente é agravado com as característicos próprias da Zona Oriental e dos Bairros que lhe são adjacentes cuja degradação e periferia exigiria uma outra abordagem que não a construção de uma rodovia que acaba justamente por reforçar ainda mais aquelas tendências de «guettização».
Claro está que o que está em jogo aqui é o modelo de cidade que queremos. Ou bem optamos por um espaço urbano à escala humana, respeitador de uma lógica de proximidade ( justiça, comércio e economia de proximidade) ou então enveredamos pelo modelo das megapolis sobrepovoadas, encasteladas com construções em altura, e ramificações labirínticas, onde qualquer pessoa se sentirá forçosamente prisioneiro e refém de um urbanismo que nada tem de humano.
As forças cegas do mercado tendem logicamente para este modelo depredador, e os gestores políticos soçobram facilmente aos seus cantos de sereia, tal é a força que representam os investimentos de capitais e a sensação de «obra feita». Acontece que nem a população nem os ecossistemas locais e regionais são os principais beneficiários deste progresso feito de betão armado e alcatrão. Aliás existem outras formas de progredir que não passam necessariamente por esta intrusão ou enxerto de elementos estranhos aos sistemas vivos.
Com efeito, o desenvolvimento humano – se é isso que é a mola das decisões políticas – é muito mais de carácter imaterial que a enxurrada de obras & construções urbanas e semi-periféricas que poderão encher a vista ( e degradar a paisagem) mas não contribuem para a tão propalada quanto desprezada qualidade de vida das populações. E os decisores políticos, devidamente assessorados pelos urbanistas (ou por quem faz o seu papel, apesar de não estarem a tal habilitados), devem sopesar maduramente senão mesmo casuisticamente nas escolhas a fazer para evitar transformar as nossas cidades em poucos mais que espaços irrespiráveis, quais castelos (des)urbanizados onde a vontade ansiosa dos residentes é «rasparem-se» dali para fora!!!...
O realismo manda que se façam estudos para encontrar alternativas sustentáveis e de longo prazo. Impôr um atravessamento rodoviário na zona projectada para a construção do Parque Oriental da Cidade é hipotecar um projecto de futuro que poderia em muito atenuar a densidade de construção e a sua consequente agressividade para o habitat social. E não se diga que não faltam alternativas. Com um pouco de bom senso e algum conhecimento de causa, não se deixaria de encontrar soluções que salvaguardem os valores fundamentais de um correcto ordenamento urbano. A pressa e precipitação de ver obra feita é que deitam tudo a perder. Obrigam a soluções de recurso que têm efeitos catastróficos para os tempos próximos. Ponto é que os decisores não se precipitem e para satisfazerem as suas agendas políticas ,assim como darem largas aos interesses espúrios dos bastidores, e respectivos jogos de poder, não venham a lesar gravemente o interesse da cidade e da população.
Resta-nos esperar que as tomadas de posição das associações ambientalistas da cidade do Porto sejam devidamente ponderadas numa decisão definitiva que venha a ser adoptada e que tenha em conta os superiores interesses da qualidade de vida dos residentes da cidade.