18.8.05

Terrorismo liberal = assassine primeiro, pergunte depois


O Reino Unido é o berço de liberalismo e, realmente, um dos lugares nos quais a civilização ocidental tem raízes mais profundas. Os ingleses orgulham-se frequentemente do facto de que a sua tradição de protecção de direitos individuais e das liberdades faz com que não tenham necessidade de uma Constituição no Reino Unido - tal é a força de cultura liberal e os valores liberais na Grã-Bretanha. Além disso, e muito diferentemente da situação existente nos Estados Unidos, a sociedade britânica tem a reputação de ser bastante tolerante e multicultural.
Contudo a Scotland Yard acaba de executar um cidadão brasileiro imigrante que erradamente pensou tratar-se de um terrorista - segundo um novo princípio policial: primeiro assassine, e depois pergunte. A lógica deste princípio é: caso um fundamentalista muçulmano estiver pronto a explodir-se como uma bomba humana, matando todas as pessoas que estiverem por perto, o problema resolver-se-á se ele for alvejado antes de poder activar a bomba que transporta. Mas, claro que, como não há tempo a perder, prendendo o suspeito para conferir se ele realmente é um terrorista - e não um simples trabalhador brasileiro no seu caminho para o trabalho - nós devemos estar prontos para aceitar alguns danos colaterais. (...) Os agentes da Scotland Yard não souberam se ele era ou não um fundamentalista irracional, mas o facto do brasileiro não ser suficientemente branco ou rico fez logo pensar aos polícias que bem podiam negligenciar os direitos dele em nome da segurança nacional. Jean-Charles deMenezes teve de carregar com esta suspeição porque não lhe deram nenhum tempo para provar que, apesar de ser moreno, estrangeiro e pobre, ele não era afinal um "terrorista irracional" que os polícias andavam à procura. O problema que temos agora não é somente de um texano reaccionário ou de um traidor trabalhista è frente dos governos. O capitalismo (e a sua ideologia, o liberalismo) está agora a apropriar-se dos nossos direitos, inclusive o direito a não ser morto pelo Estado por qualquer razão. Na actual época de guerra global permanente, o terrorismo liberal de Estado está, pelos vistos, para ficar. Uma coisa vos posso garantir: há que temer o terrorismo estatal mais do que qualquer outra coisa que um grupo de bombistas fundamentalistas possa fazer aqui e acolá.

Título original:
Welcome to Liberal Terrorism
Autor do texto: Ezequiel Adamovsky, in ZNet