9.3.09

Rizoma, pensamento rizomático e livros-rizoma



Retirado de : http://pt.wikipedia.org/wiki/Rizoma_(filosofia)

Rizoma é um modelo descritivo ou epistemológico proposto por Gilles Deleuze e Félix Guattari.
Neste modelo epistemológico, a organização dos elementos não segue linhas de subordinação hierárquica - com uma base ou raiz dando origem a múltiplos ramos -, mas, pelo contrário, qualquer elemento pode afectar ou incidir em qualquer outro.

Num modelo arbóreo de organização do conhecimento - como as taxionomias e classificações das ciências - o que é afirmado dos elementos de maior nível é necessariamente verdadeiro também para os elementos subordinados, mas o contrário não é válido; já num modelo rizomático, qualquer afirmação que incida sobre algum elemento poderá também incidir sobre outros elementos da estrutura, sem importar a sua posição recíproca.
O rizoma carece, portanto, de centro, característica que o torna particularmente interessante na filosofia da ciência e política, e também para a semiótica e as teorias da comunicação contemporâneas

A noção de rizoma foi adoptada da estrutura de algumas plantas que se ramificam em qualquer ponto, assim como se engrossam e se transformam num bolbo ou tubérculo; o rizoma da botânica, que tanto pode funcionar como raiz, talo ou ramo, independente de sua localização na figura da planta, serve para exemplificar um sistema epistemológico onde não há raízes - ou seja, proposições ou afirmações mais fundamentais do que outras - que ramifiquem-se segundo dicotomias estritas.

Deleuze e Guattari sustentam que, na tradição anglo-saxã da filosofia da ciência, que se costumou chamar de antifundacionalismo (ou antifundamentalismo, ou, ainda, antifundacionismo), a estrutura do conhecimento não deriva, por meios lógicos, de um conjunto de princípios primeiros, mas sim elabora-se simultaneamente a partir de todos os pontos sob a influência de diferentes observações e conceitualizações.

Isto não implica que uma estrutura rizomática seja necessariamente flexível ou instável, porém exige que qualquer modelo de ordem possa ser modificado: existem, no rizoma, linhas de solidez e organização fixadas por grupos ou conjuntos de conceitos afins. Tais conjuntos definem territórios relativamente estáveis dentro do rizoma.

O modelo rizomático presta-se a mostrar que a estrutura convencional das disciplinas epistemológicas não reflecte simplesmente a estrutura da natureza, mas sim que é um resultado da distribuição de poder e autoridade no corpo social.
Não se trata da apresentação de um modelo que represente melhor a realidade, mas sim da noção, oriunda do antifundacionalismo, de que os modelos são ferramentas pragmáticas, e não ontológicas.
A organização rizomática do conhecimento é um método para resistir a um modelo hierárquico que reflecte, na epistemologia, uma estrutura social opressiva.


Livros-rizoma versus livros-raíz

Nos livros-raíz, tão valorizados pela utopia moderna da unidade, todos os argumentos são organizados em torno um eixo central e têm como função sustentar uma idéia, partindo de um ponto prefixado e usando um método bem definido. O paradigma do livro-raiz é a monografia acadêmica, em que tudo precisa convergir para um único ponto: sustentar a validade da hipótese inventada pelo autor. Tudo o que extrapola esse limite é sentido como supérfluo, como um excedente a ser cortado, tanto por fugir aos objetivos específicos da obra quanto para evitar os ataques de uma banca eventualmente hostil.
O livro-raiz não compreende a multiplicidade porque ele precisa reduzir o mundo todo ao seu sistema, o sistema-raiz da lógica moderna que não pode pensar o mundo senão como uma grande unidade oculta sob a aparente diversidade das coisas.
O livro-raiz é um livro de guerra, um livro moldado com hierarquias de pensamento, que reivindica para si a verdade (ao menos alguma verdade) e é destinado a travar batalhas heróicas pelas bandeiras que sustenta. Um livro que exclui a diferença porque inadmissível e, a pretexto de representar a natureza em um sistema, termina por inventar um simulacro de mundo, feito de abstrações coerentes que excluem de si as tensões e o pulsar da vida humana.
O livro-raiz é o correspondente literário da perspectiva linear no desenho, que compra a ilusão da unidade plástica da obra pagando o preço de reduzir o homem a um cíclope de pedra, que vê o mundo a partir de um olho único e parado.

Opondo-se a tal padrão radicular, esta obra se organiza na forma de rizoma, como os tubérculos e a grama, que se desenvolve sem um centro fixo, em que cada unidade afirma sua diferença e não se submete à hierarquia das raízes.

Célebre desenho da artista australiana Angela Brennan que é conhecida pela sua pintura de um formalismo abstracto inspirado na filosofia e na vida quotidiana



DESTERRITORIALIZAÇÃO

Desterritorialização é, nas palavras de Gilles Deleuze, uma "palavra bárbara" proposta por Felix Guattari para o entendimento de processos inicialmente psicanalíticos mas posteriormente ampliados para toda a filosofia desenvolvida pelos dois autores.

Para além da concepção filosófica deleuzeana, em que aparece associada a processos como devir e "linhas de fuga", a expressão insere-se hoje num amplo debate no âmbito das Ciências Sociais, da Antropologia à Ciência Política e à Geografia.
Assim, muitos autores defendem a tese de que a desterritorialização é a marca da chamada sociedade pós-moderna, dominada pela mobilidade, pelos fluxos, pelo desenraizamento e pelo hibridismo cultural.
Devemos tomar cuidado para não sobrevalorizar esta "sociedade em rede" (nos termos de Manuel Castells), fluída e desterritorializada, na medida em que ela aparece sempre conjugada com a reconstrução de territórios, ainda que territórios mais móveis e descontínuos.
Haesbaert (em "O Mito da Desterritorialização") defende que desterritorialização seja um termo utilizado não para o simples aumento da mobilidade ou para fenómenos como a hibridização cultural, mas para a precarização territorial dos grupos subalternos, aqueles que vivenciam efectivamente (ao contrário dos grupos hegemónicos) uma perda de controle físico e de referências simbólicas sobre/a partir de seus territórios. Já que todo o indivíduo não pode viver sem território, por mais precário e temporário que ele seja, desterritorialização pode se confundir, neste caso, com precarização territorial.
Assim, haveria um sentido genérico, de desterritorialização como destruição ou transformação de territórios (enquanto espaços ao mesmo tempo de dominação político-econômica e de apropriação simbólico-cultural), e um sentido mais estrito, vinculado à precarização territorial daqueles que perdem substancialmente os seus "controles" e/ou identidades territoriais.
O que muitos denominam desterritorialização, especialmente quando relativo às classes mais privilegiadas, trata-se na verdade de uma reterritorialização em novas bases, a que Haesbaert propõe denominar "multiterritorialidade".


Para aprofundar o tema:

Abertura da biblioteca Norte/Sul do Centro de estudos sociais

A biblioteca Norte/Sul pretende criar um acervo bibliográfico - prioritariamente mas não exclusivamente constituído por revistas e publicações periódicas - resultante da produção científica realizada nos países do hemisfério Sul (o chamado "terceiro mundo") na área das ciências sociais e humanas, a qual, em geral, é pouco conhecida nos países do Norte.

Comporta uma ampla variedade temática: povos indígenas; lutas contra-hegemónicas; identidades e etnicidades; direitos humanos e outros princípios de dignidade humana; questões económicas, organizacionais e empresariais; desenvolvimento democrático sustentável; conhecimentos alternativos e biodiversidade; alternativas à globalização neo-liberal; justiça social e inclusão social; estudos feministas e questões de diferença sexual. Inclui ainda produção científica dos países do Norte sobre os países do Sul.

O projecto teve início em 1998, e encontra-se em fase de expansão. A próxima fase contempla a disponibilização dos materiais existentes na Norte/Sul, aos investigadores de outras instituições que os solicitarem.

Professora Bibliotecária: Clara Keating

Bibliotecária Responsável: Maria José Carvalho

Bibliotecário: Acácio Machado

Horário de Funcionamento: Segunda-feira a Sexta-feira, 9:30horas às 20horas*
Encerrada: Sábados, domingos e feriados.


Contacto:
biblioteca@ces.uc.pt

Para mais informação e acervo da Biblioteca:
http://www.ces.uc.pt/biblioteca/monografias.php
Sobre o CES ( centro de estudos sociais):

Filo-café sob o tema «O Medo à Liberdade» no centro social Aturuxo, em Boiro, na Galiza (11 de Abril). Inscrições abertas para todos os interessados


Um Filo-Café é, no essencial, um espaço público de trocas. Real. Com pessoas vivas, para lá do virtual. A partir de um tema, há uma pequena comunicação (não superior a 10 minutos) que serve para estimular a emissão do pensamento aberta a todos os presentes. No meio das trocas de pensamento surgem emissões artísticas: pequenas performances, música, poesia, etc. Isto é: a conversa é espontânea, a emissão artística é "preparada" antecipadamente. No espaço onde se realiza o filo-café há também lugar para a exposição de fotografia, pintura, escultura, instalação. É efémero. Começa às 21h30 e costuma acabar às 24h


A participação na conversa é absolutamente livre. As inscrições, livres, destinam-se às pessoas que querem apresentar algum trabalho artístico.


Inscrições Abertas:Para a sua inscrição indique nome, lugar de proveniência e área de emissão, através de
incomunidade@gmail.com ou: (00351)965817337. As inscrições estarão abertas até ao dia 05 de Abril (podendo ser fechadas antes, caso o nº de inscritos o justifique)


Áreas de Emissão: Pensamento, Fotografia, Música, Performance, Poesia, Pequenas-Comunicações, Teatro, Artesanato, Filosofia, Semiótica, Pintura, Escultura.



O medo à liberdade

Da liberdade apenas têm medo aqueles que consideram o outro como um inimigo em vez de o encararem como um cooperante.

Na verdade, ninguém é livre, pese embora no dia a dia o uso da liberdade seja quase absoluto. É assim com os tiranos, os corruptos, os indigentes, os astutos… mas também o é com os santos, os ascetas, os beneméritos e os profetas… Sartre tem razão! Nascemos condenados a ser livres.

Há liberdades individuais e colectivas e ambas têm um enquadramento específico. Nos dois campos tudo me é permitido, mas nem tudo me é aceite. Os limites para a minha acção encontram-se sempre e só na livre acção do outro.

Do ponto de vista colectivo, posso matar, roubar, extorquir, molestar… e serei castigado pelas minhas práticas na medida em que exercer sobre outrem uma acção que não me é consentida.

Do ponto de vista individual, ou seja, quando o produto da minha acção recai apenas sobre mim, nem deveria ser punido, nem agraciado pelo Estado ou pela sociedade. As leis gerais apenas se devem aplicar à regulação da vida em comum.

Não é a mesma coisa nem pode ser avaliado da mesma maneira, um atentado contra a vida de outrem ou contra a própria vida, molestar o corpo alheio, ou molestar o próprio corpo…


Paradoxalmente é em nome da liberdade que o Estado impede o exercício da escolha individual. Impõe-nos o que acha ser o melhor para a colectividade e daí extrai que também será o melhor para cada um em particular.


O uso que o poder faz da liberdade é aquele que Rousseau estabeleceu no Contrato Social ao responder à objecção de como pode o homem ser livre e ao mesmo tempo ter de se conformar com vontades que não são as suas? Eis a resposta: “O cidadão aprova todas as leis, aquelas que não obtiverem o seu acordo e até os que o punem se não as respeitar. A vontade constante de todos os membros do Estado é a vontade geral; é devido a ela que são cidadãos e livres. Quando se propõe uma lei, o que se pede a cada um não é que a aprove ou rejeite, mas se está ou não conforme a vontade geral que é também a sua: cada cidadão ao entregar o seu voto, dá assim a sua opinião e pela contagem dos votos, se exprime a vontade geral. Quando vence a opinião contrária à minha só isso prova que eu estava enganado e que o que eu considerava como sendo a vontade geral, não o era afinal”.

Fundamentalmente, este é o princípio geral da democracia que faz de cada um de nós um mero elo de um todo que é a sociedade. Mesmo que submeta a subjectividade de cada um aos princípios gerais de todos, a vida em sociedade obriga ao cumprimento simultâneo de direitos e deveres, precisamente porque a acção individual colide com o interesse geral e para garantir os princípios mínimos de funcionamento à sociedade é realmente necessário que se proceda a essa adequação. Do ponto de vista social, mesmo quando o incumprimento dos deveres seja devido à acção externa e não a uma decisão pessoal, a punição é sempre a consequência. Por exemplo: aquele que por acção alheia perde o seu posto de trabalho o qual lhe garantia os rendimentos para cumprir os contratos financeiros contraídos, deixa de o poder fazer e retiram-lhe os seus bens; aquele que rouba apenas e só para se alimentar a si e à sua família; aquele que, por motivos económicos, não possa recorrer aos serviços médicos para se tratar a si ou aos seus e de cuja falta de tratamento resulte a incapacidade ou a morte… Em nenhum destes casos a acção é livre, mas em nome do suposto interesse colectivo, as consequências que não resultam directamente da vontade individual do agente, continuam a ser avaliadas pela lei geral.
O resultado das nossas escolhas é referendado por essa voz comum que inunda a nossa vida e tolhe os nossos desejos. Para que a ordem social se mantenha, decretam que aquilo que é bom para a maioria também tem de ser bom para cada um, sem querer saber do sentido da opinião minoritária.

Ora é neste segundo ponto que o poder da maioria se exerce de forma discricionária e totalizante. O filósofo existencialista dinamarquês Kierkegaard, defensor do extraordinário poder da subjectividade individual, vincava que em cada um de nós, pese embora toda a coacção do Estado e da sociedade, residirá sempre um segredo a que ninguém mais terá acesso e que nos acompanhará até à morte. Ainda na sua análise, a nossa acção exterior é sempre subordinada a uma escolha: ou isto ou aquilo… e no momento em que escolhemos comprometemos de forma irremediável toda a nossa acção.


Desta forma, a liberdade apresenta-se-nos sempre como um absoluto e um relativo, pois se por um lado estamos condenados a ser livres, o exercício da nossa liberdade é limitado por diversas condicionantes externas e internas.

Ante a força destas constatações, somos levados a concluir que a liberdade exterior ou colectiva é algo de que se fala muito, mas que, verdadeiramente, na prática, não existe. Apenas e só a subjectividade é garante para o pleno exercício da liberdade. Só a Criação - artística, científica, literária… - se pode apresentar como o verdadeiro lugar da plena realização da Liberdade.


sarmento manso