11.1.13

Ovelhas negras: quanto mais lêem, mais negras se tornam


“I find television very educating. Every time somebody turns on the set, I go into the other room and read a book.”
Groucho Marx
 
 
“My alma mater was books, a good library.... I could spend the rest of my life reading, just satisfying my curiosity.”
Malcolm X

Ser professor é ter orgulho de ser o profissional que fará a diferença para o futuro do país


 
Não é um estudo técnico, é um programa político e uma agenda contra a economia e os portugueses
 
 
Propostas do estudo do FMI pago pelos portugueses e que, apesar dos erros, das informações erradas, desactualizadas, e das conclusões manipuladas, é considerado pelo governo PSD/CDS um «estudo muito bem feito»:
 
- mais de 100 mil desempregados
-cortes nas pensões e reformas
- cortes nos salários
- cortes na educação
- cortes na saúde
- cortes na segurança
 

Compreender a Dívida Pública ou como os bancos privados encontraram uma maneira de obter lucros garantidos



Porque é que o Banco central deixou de emprestar dinheiro ao Estado, deixando essa função nas mãos dos bancos privados?

Não será porque a dívida pública aos bancos privados está condenada a alimentar-se a ela própria, e a não parar de crescer, para garantir lucros fabulosos aos bancos por meio dos impostos pagos pelos cidadãos contribuintes?

Os bancos arranjam assim um meio garantido de se auto-financiar:

 o Estado é obrigado a financiar-se juntos dos Bancos, estes cobram-lhe os juros que lhes mais convém, podendo ser até juros agiotas, e o Estado, por sua vez, para obter receitas, cobra impostos cada vez mais elevados aos contribuintes.

No final, quem fica com a receita fiscal do Estado são os bancos.

A alienação da infância ou como as crianças são castradas da sua alegria e da sua natureza humana

 
 
Já não bastava a alienação dos trabalhadores, nem a dos consumidores, relativamente aos problemas sociais, nomeadamente a exploração e a manipulação a que são sujeitos sob a dominação do sistema capitalista.
 
Assistimos hoje à domesticação em larga escala de toda a população, a começar pelas crianças e jovens que abandonam a realidade social, e a sua própria felicidade pessoal, e rendem-se aos gadgets e à intoxicação mediática dos mass media.

O povo é quem mais ordena - convocação de uma grande mobilização popular para 2 de Março


Várias pessoas que estiveram na origem da manifestação cultural do dia 13 de outubro apelam a todos e todas para que, juntos, tomemos as ruas a 2 de março.
 
Somos todos precisos. Todos e todas: funcionários públicos e do privado, efectivas, contratados, precárias, reformados, pensionistas, estudantes e desempregadas. O Orçamento do Estado para 2013 vai ser posto em prática contra nós. Cortes, penhoras, despejos, despedimentos, dispensas são uma realidade diária, imposta à força, no país em que vivemos. Custe o que custar, dizem. Doa a quem doer, dizem. Mas sabemos que custa sempre aos mesmos, que dói sempre aos mesmos. E que os mesmos somos sempre nós.
 
2013 ainda não começou e já sabemos bem demais o que aí vem, porque a fome já se faz sentir em muitas casas, em muitas ruas, em muitas escolas. A doença e a miséria já matam, aqui e nos outros países reféns da Troika, esse governo não-eleito que continua a decidir o nosso futuro, que continua a condenar-nos os sonhos à morte, o futuro ao medo, a vida à sobrevivência. Gente que ninguém elegeu e que fala já de medidas de contingência para este mesmo Orçamento, que passarão, dizem, por novas baixas nos salários. Pela miséria nossa que lhes traz lucro a eles.
 
Depois de durante quase dois meses sentirmos na pele os efeitos deste Orçamento criminoso e imoral, a Troika regressará ao nosso país a 25 de fevereiro, para a 7ª avaliação do assalto financeiro a que este governo, ajoelhado e sem legitimidade, insiste em chamar “de resgate". Sabemos já de cor o teor das mentiras que dirão: que estamos a cumprir, que vamos no bom caminho, que tudo está como deveria estar. Mas esse caminho, o "bom" caminho no qual estamos e (se deixarmos) estaremos, será, como é hoje, o caminho para o cadafalso, o caminho da fome, da miséria, da destruição total da Constituição da República que este Governo e esta Presidência juraram defender, mas que violam constantemente, sem qualquer dúvida ou arrependimento. Já não fazem nada sequer próximo daquilo para que foram eleitos.
 
Mas nós somos cada vez mais. Somos já muita gente que se recusa a continuar calada. Já mostrámos a força da nossa voz e do nosso protesto. Em Portugal e noutros países, saímos à rua pacificamente, para dizer Basta. E o mundo inteiro ouviu e viu a nossa força. Sabíamos que essas enormes demonstrações de vontade, apesar da sua dimensão, não seriam suficientes, que a luta seria dura e longa e que teria de continuar. A força dos que nos oprimem é cega e obedece a uma rede internacional, para a qual somos apenas um nó insignificante. Mas esse nó é constituído por milhões de pessoas. Pessoas que sentem, pessoas que sofrem, mas que não deixam por isso de pensar, não deixam por isso de saber que têm de agir. Não vamos deixar que se repita a história e que acabemos entregues a regimes totalitários, reféns do ódio, da miséria, da guerra.
 
Por isso, a 2 de Março, unidos como nunca antes, com a força da revolta na voz e a solidariedade nos braços que entrelaçamos, sairemos de novo à rua, todos e todas, para dizer NÃO.
 
Apelamos a todos os cidadãos e a todas as cidadãs, com e sem partido, com e sem emprego, com e sem esperança, para que se juntem a nós. Como apelamos às organizações, aos movimentos cívicos, aos sindicatos, aos partidos políticos, às colectividades, aos grupos informais, de norte a sul, nas ilhas, no estrangeiro, para que saiam à rua e digam BASTA. Faremos de cada cidade, de cada aldeia, de cada povoação, um mar de força e gente, exigindo o fim definitivo da austeridade desumana, a queda do governo e o lançamento das bases para um novo pacto social. Sem troikas, sem políticas recessivas, sem inevitabilidades, sem despedimentos, sem sacrifícios irracionais que já todos percebemos aonde levam: à miséria total, ao fim de toda e qualquer esperança de uma vida digna, ao fim do Estado Social.
 
Usemos o tempo que nos separa desta data para construirmos um caminho, para alertarmos este, para esclarecermos aquela, sem perdermos de vista os nossos objectivos: o derrube total e inequívoco deste governo, o derrube da austeridade enquanto política que, ao contrário do que nos dizem, não funciona. Porque apenas funciona contra nós, contra o povo, contra os povos, quem quer que seja o seu intérprete - troika ou troikistas.
 
Concentremos energias e forças numa mobilização sem precedentes, sabendo que só juntos venceremos.
É preciso união.
Somos precisos - todos e todas nós.
Vamos manifestar-nos na tarde de 2 de Março!
A troika e o governo vão ouvir-nos gritar: O POVO É QUEM MAIS ORDENA!
 

10.1.13

Pelo Trabalho Doméstico Digno e Decente

 
Petição pública a favor do trabalho doméstico digno. Assina


Texto da Petição

Associação Comunidária, organização sem fins lucrativos, com número de Identificação Fiscal n.º 508438330 e signatários/as vêm, perante à vossa presença, apelar que Portugal, ratifique a Convenção 189 da OIT em prol do trabalho doméstico digno e proceda às alterações do da lei do serviço doméstico em Portugal que não sofre qualquer alteração desde 1992, ou seja, há 20 anos.

Atualmente o contrato de trabalho doméstico é legislado pelo regime especial, Decreto Lei 235/92, que até o presente momento encontra-se em vigor, pelo que pede-se pela revogação e alteração deste regime adaptando-o as regras da Convenção 189 da OIT bem como tornando eficaz a sua implementação.

  O trabalho doméstico em Portugal é prestado em grande número por mulheres migrantes e muitas delas não documentadas. Isto porque a lei não é eficaz e falta para estas empregadas, uma fiscalização ativa dos Órgãos governamentais quando se trata de trabalho doméstico.

É fácil compreender a suma importância e necessidade emergente de uma mudança legislativa quanto ao trabalho doméstico de forma a enquadrar as regras mínimas transpostas pela Convenção 189 da OIT na legislação local.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, o setor dos trabalhadores e trabalhadoras domésticas ainda é insuficientemente regulamentado e, em grande parte, informal. Dados da OIT mostram que há cerca de 53 milhões de pessoas atuando na área. Devido à informalidade e à falta de regulamentação, estima-se que esse número possa chegar a 100 milhões de pessoas, sendo que grande parte destes (as) trabalhadores (as) encontram-se na Europa. Na Convenção 189 são estabelecidos direitos fundamentais que devem ser comuns aos trabalhadores (as) domésticos (as) , como horas de trabalho razoáveis; pagamento de salário mínimo, onde houver; descanso semanal de no mínimo 24 horas consecutivas; esclarecimento prévio sobre termos e condições do emprego, respeito à liberdade sindical e direito à negociação coletiva.

O documento é organizado em 27 artigos, que tratam de definições do termo, direitos humanos e fundamentais do trabalho, proteção contra abusos, condições equitativas, contratos de trabalho, proteção a trabalhadoras e trabalhadores migrantes, moradia, jornada de trabalho, remuneração mínima, proteção social, medidas de saúde e segurança, agenciamento de emprego doméstico, acesso a instâncias de solução de conflitos e inspeção do trabalho. Quanto aos empregadores/as, vale mencionar que a formalização do contrato de trabalho doméstico é sempre benéfico, seja pela garantia e segurança de manter-se o registo do trabalhador/a, o/a qual lhe presta o serviço, bem como à título de IRS para dedução de ajuste anual.

Ao ratificar a Convenção 189 da OIT, Portugal será o país pioneiro na Europa a participar desta nobre e fundamental causa, será exemplo para os demais países a dignificar essas pessoas que necessitam com a máxima urgência de uma proteção social, jurídica e acima de tudo humanitária, a fim de melhorar suas condições de trabalho e de vida como trabalhadores/as domésticos/as.

Nesse sentido buscamos a vossa sensibilização e mobilização para a utente promoção e proteção emergente dos direitos humanos para todos (as) as trabalhadoras e trabalhadores domésticos em Portugal, para através do vosso apoio levar a discussão e votação em Assembleia, o projeto lei que proponha a ratificação e aplicação das disposições da Convenção 189 da OIT, bem como a criação de um Órgão Inspector direccionado a implementação do respectivo regime no sentido de influenciar uma positiva mudança legislativa para os/as trabalhadores/as domésticos/as.




História de uma trabalhadora doméstica em Portugal



Invisível, desvalorizado, mal pago, não remunerado, isolado, ocupado na maior parte por mulheres imigrantes e/ou domésticas, desigual, escravatura moderna...versus realização, dignidade, crescimento, desenvolvimento e igualdade .... O convite e desafio que lançamos é para acompanhar as ações que decorrem em Portugal e no mundo no âmbito do trabalho doméstico e assim promover as mudanças não só setoriais, mas pelos direitos humanos e principalmente por milhões de mulheres e meninas que são a grande maioria de ocupação neste sector.
 

Europa periférica no combate à crise - debate internacional ( dia 11/1) para assinalar o 10º aniversário da ATTAC Portugal



No âmbito da comemoração do seu 10º aniversário, a ATTAC Portugal organiza um debate internacional 'Europa periférica no combate à crise', na sexta-feira, dia 11 de Janeiro, às 18h30, no cinema S. Jorge, Lisboa, que contará com a participação de:

  Gunnar Armannsson - ATTAC Islândia
Cristina Asensi - ATTAC Espanha
  Benedikte Hansen - ATTAC Noruega
  Luís Bernardo - ATTAC Portugal

O debate será em inglês. Na plateia estarão ainda activistas convidados de muitos outros países, como França, Alemanha, Suíça, Bélgica, Grécia, Finlândia, Reino Unido, entre outros.

  Numa altura crítica do combate à crise, a ATTAC Portugal organiza um debate com vozes de diferentes pontos da Europa, para partilharem as suas experiências e pontos de vista connosco.

http://attacportugal.webnode.com/

9.1.13

Leitura das Histórias em três linhas, de Félix Fénéon, na livraria-bar Gato Vadio no dia 12/1/2013 por Rui Manuel Amaral e Pedro Amaral

Leitura das "Histórias em três linhas", de Félix Fénéon,
 
por Pedro Amaral e Rui Manuel Amaral,
 
no Gato Vadio, dia 12 de Janeiro de 2013, pelas 17h00.
 
Gato Vadio: Rua do Rosário, 281, Porto.
 
No próximo sábado, 12 de Janeiro, pelas 17h00, há mais uma sessão das Leituras do Gato Vadio. Desta vez dedicada às "Notícias em três linhas", de Félix Fénéon, traduzidas por Manuel Resende. O convidado é o Pedro Amaral.
 


 
 

Interrogatório a Fénéon pelo juíz no processo judicial contra os 30 acusados de actividades anarquistas


— Êtes vous un anarchiste, M. Fénéon ?
— Je suis un Bourguignon né à Turin.
— Vous étiez aussi l'ami intime d'un autre anarchiste étranger, Kampfmeyer?.
— Oh, intime, ces mots sont trop forts. Du reste, Kampfmeyer ne parlant qu'allemand, et moi le français, nos conversations ne pouvaient pas être bien dangereuses. (Rires.)
— À l'instruction, vous avez refusé de donner des renseignements sur Matha et sur Ortiz.
— Je me souciais de ne rien dire qui pût les compromettre. J'agirais de même à votre égard, monsieur le Président, si le cas se présentait.
— Il est établi que vous vous entouriez de Cohen et d'Ortiz.
— Pour entourer quelqu'un, il faut au moins trois personnes. (Explosion de rires.)
— On vous a vu causer avec des anarchistes derrière un réverbère.
— Pouvez-vous me dire, monsieur le Président, où ça se trouve derrière un réverbère ? (Rires forts et prolongés. Le président fait un rappel à l'ordre.)
— On a trouvé dans votre bureau, au ministère de la Guerre, onze détonateurs et un flacon de mercure. D'où venaient-ils ?
— Mon père était mort depuis peu de temps. C'est dans un seau à charbon qu'au moment du déménagement j'ai trouvé ces tubes que je ne savais pas être des détonateurs.
— Interrogée pendant l'instruction, votre mère a déclaré que votre père les avait trouvés dans la rue.
— Cela se peut bien.
— Cela ne se peut pas. On ne trouve pas de détonateurs dans la rue.
— Le juge d'instruction m'a demandé comment il se faisait qu'au lieu de les emporter au ministère, je n'eusse pas jeté ces tubes par la fenêtre. Cela démontre bien qu'on pouvait les trouver sur la voie publique. (Rires.)
— Votre père n'aurait pas gardé ces objets. Il était employé à la Banque de France et l'on ne voit pas ce qu'il pouvait en faire.
— Je ne pense pas en effet qu'il dût s'en servir, pas plus que son fils, qui était employé au ministère de la Guerre.
— Voici un flacon de mercure que l'on a trouvé également dans votre bureau. Le reconnaissez-vous ?
— C'est un flacon semblable, en effet. Je n'y attache pas l'ombre d'une importance.
— Vous savez que le mercure sert à confectionner un dangereux explosif, le fulminate de mercure].
— Il sert également à confectionner des thermomètres, baromètres, et autres instruments. (Rires)

Art et anarchie dans le Paris fin de siècle

Joan Halperin, Félix Fénéon, éd. Gallimard, 1991, p. 321-326
 
 

Félix Fénéon (1861 - 1944) foi um anarquista e crítico de arte francês em Paris durante finais do século XIX. Ele criou o termo do "Neoimpressionismo" em 1886 para identificar a um grupo de artistas encabeçados por Georges Seurat, ao que tanto apoiou.
 
 
 
"Apesar do seu aspecto voluntariamente frio, da sua política um pouco rígida, do dandismo especial das suas maneiras, reservadas e altivas, tinha um coração caloroso e leal. Mas não o abria a toda a gente, visto que pessoa menos banal não havia. Quem conquistasse a sua confiança, podia abrigar-se nele como sob um tecto acolhedor. Sabia que lá havia de ser acarinhado e defendido, sempre que necessário."Octave Mirbeau, a propósito de Félix Fénéon.
 
 
 
Quando se conhece a fundo a vida de Félix Fénéon, tem-se a consciência clara de que lhe importavam pouco os seus antecessores e nada, ou quase nada, os que viessem depois: viveu sempre aferrado à grave matéria do presente. E é por isso que, como cidadão, teve uma existência marcante, e se dedicou de forma inesgotável ao tempo que lhe tocou viver, a ponto de se relacionar com terroristas e de ter chegado a participar, de forma mais ou menos directa, em algumas acções de terrorismo anarquista. (…) No entanto, o mais curioso de tudo isto é que alguém com esta impetuosidade seria hoje, de forma quase automática, pasto para a atenção do público, em boa medida porque ele próprio se postularia como objecto de notícia e comentário. Mas ele preferiu sempre o anonimato. Nesse sentido, parece também um oblíquo precursor dos personagens de Walser, do protagonista do único romance de Ville de la Mirmont, dos protagonistas dos textos kafkianos que têm por nome apenas uma letra. O desejo de anonimato de Fénéon parece quase inverosímil se tivermos em conta a sua participação em tantas actividades. E, contudo, podemos aceitar como totalmente sincera a sua afirmação de que aspirava ao silêncio, ao esquecimento, a passar completa e absolutamente incógnito.Antonio Jiménez Morato.


O fotógrafo Joachim Berthoud não conseguia
consolar-se da morte da mulher. Matou-se em
Fontenay-sous-Bois.


O abade Andrieux, de Roannes, a Aurillac,
trespassado na quarta-feira a tiros de espingarda
por impiedoso marido, morreu ontem à noite (Havas).


Por desaguisado político, os Srs. Bégouen,
publicista, e Bepmale, deputado, tinham-se
tratado de «ladrão» e «cobarde». Reconciliaram-se (Despacho particular).

Juiz: O que é que tem a dizer aos testemunhos de ter sido visto detrás de um candeeiro público a falar com um conhecido anarquista?



Fénéon: Terei todo o prazer em responder a essa questão se o meritíssimo juiz tiver a gentileza de me indicar qual é a parte detrás de um candeeiro público.

Félix Fénéon durante o julgamento em que foi acusado de envolvimento no atentado anarquista do restaurante Foyot, em 1894.

Fonte:



 

O sofrimento deve dar lugar à rebelião e à solidariedade - texto de António Pinho Vargas

 
O sofrimento deve dar lugar à rebelião e à solidariedade

Texto do compositor e sociólogo António Pinho Vargas publicado no jornal Público de 5 de Janeiro de 2013


"Estás a sofrer?"

Como considerar a questão da solidariedade? Como é possível conduzir uma vida com base nesse conceito? Que formas práticas pode ela assumir? Julgo que há duas formas de pensar este problema. Podemos considerar, em primeiro lugar, que a pergunta fulcral para desencadear solidariedade é a formulada por Richard Rorty: "Estás a sofrer?"

Em segundo lugar, há uma acepção mais propriamente política, na qual se encara o sofrimento humano como "a contradição que existe entre a experiência da vida quotidiana, em muitas partes do mundo, e a ideia, o horizonte, de uma vida decente" (Santos, 2004). Em que mundo vivemos, sob que hegemonia? Para Boaventura de Sousa Santos, "o neoliberalismo é uma das utopias conservadoras para as quais o único critério de eficácia é o mercado ou as leis do mercado". "Qualquer outro critério ético é desvalorizado como ineficaz. Nega-se radicalmente a existência de alternativas à realidade do presente e procura-se desacreditar quaisquer alternativas precisamente por serem utópicas, idealistas, irrealistas" (Santos, 2011). Esta "ética" da eficácia capitalista é avaliada de forma peculiar pelos detentores do poder - continua a ser vista pelos conservadores como a única eficaz, mesmo quando falha totalmente - e é justamente no meio de um processo violento desta natureza que estamos na passagem para 2013, em Portugal. Na Europa, que se move numa lentidão institucional exasperante e que, no essencial, se rege pelos mesmos critérios e pelos mesmos valores conservadores neoliberais, radica a origem do imenso sofrimento humano que decorre do desemprego galopante, dos salários cada vez mais baixos para as camadas mais pobres, do aumento das desigualdades, do desmantelamento do Estado social, visto como insustentável, de acordo com esse critério de análise - o mercado como única medida de eficácia - e, desse modo, aumenta-se o sofrimento humano de milhões de pessoas de forma brutal e persistente.

É forçoso sobrepor os dois planos: ter em conta a pergunta de Rorty "Estás a sofrer?" e pôr fortemente em questão a pretensão de única via possível atribuída aos "mercados". É óbvio que há alternativas, como houve com Lula da Silva no Brasil ? muitos milhões de pessoas retirados da pobreza -, como há, mesmo nos EUA, com Obama, como se viu no Obama Care, apesar do tremendo combate que teve de travar com a direita no quadro do complexo sistema político americano. Mas, na Europa, segue-se o caminho inverso: empobrecer as populações e retirar-lhes muitos dos sistemas sociais de apoios estabelecidos. Entre as consequências da acção deste Governo e das acções comandadas pela troika europeia e o FMI - pretexto ou não - verifica-se um regresso da pobreza de forma nunca vista desde o regime de Salazar. Mas as alternativas políticas que existem, ao contrário do que o discurso hegemónico quer fazer crer, não respondem, por si só e neste momento particular, à pergunta de Rorty. Vejamos a questão considerando os diferentes tempos simultâneos em jogo.

Do ponto de vista das necessidades reais do ser humano em sofrimento, o seu tempo existencial de vida contínua não se pode medir apenas no tempo médio das alternâncias políticas, nem no tempo longo das crises estruturais.

O tempo da crise é o tempo das crises económicas - que podem durar entre 25 e 50 anos - sem que, no entanto, a sua presença na actualidade mediática deixe de nos transmitir a sensação de que tudo está por um fio: um tempo médio ou longo, narrado como tempo frenético. Daí a estranha sensação de uma imobilidade de fundo e de uma superfície agitada e frenética. A luta política entre os vários responsáveis pela política global prossegue com o anúncio de medidas para combater a crise que se revelam ineficazes para combater a crise e são mesmo criadores de crise. Aquilo que faz a actualidade das notícias manifesta-se de acordo com os critérios do tempo frenético dos media. Também os famosos "mercados" financeiros - lugar por excelência da luta dos especuladores - é igualmente regulado pelo tempo frenético. Na especulação financeira, num só dia, biliões de dólares ou euros podem mudar de lugar, de proprietário, de banco, de multimilionário. O tempo da economia, no sentido da acção humana produtora de bens e mercadorias e das suas trocas, é muito mais lento do que o movimento acelerado da troca de capitais. A tecnologia e a Internet permitiram essa aceleração brutal.

Mas para um desempregado - aí colocado pela voragem destrutiva das medidas de austeridade, até aqui o único remédio erroneamente proclamado para a crise - o tempo que domina a sua vida é existencial e vive-se de acordo com o ritmo da pulsação cardíaca, ou seja, não pára, não tem tempo para parar; é regulado pela necessidade de encontrar todos os dias, no pior dos casos, uma forma de sobreviver, uma forma de comer, uma forma de manter a vontade de viver. É, desse modo, o tempo da existência quotidiana dos humanos; em cada minuto, em cada dia, pode passar do espanto para a revolta, da fúria para um sossego de fadiga, da luta convicta para a submissão e a desistência. É um tempo determinado pela crise, mas que obriga muitas pessoas a acções diárias de sobrevivência: como vou arranjar dinheiro para a casa, para dar à mãe, para dar aos filhos, para pagar a escola, onde vou viver depois de ir entregar a casa ao banco, etc.

Os políticos, os cientistas sociais, os economistas, os intelectuais, vivem numa espécie de tempo intermédio: analisar, escrever, decretar, interpretar diariamente aquilo que envia sinais provenientes da profundeza do tempo longo da economia, da rapidez dos movimentos rápidos das bolsas financeiras e, nos casos mais lúcidos, interpretar igualmente os sinais inquietantes enviados para o ambiente, pelos movimentos lentíssimos do planeta, na sua rejeição imparável da agressão violenta dos humanos das sociedades capitalistas industriais do mundo. A acção deste vasto grupo, em particular dos políticos, sendo diária, só manifesta mudanças de vulto nos períodos eleitorais-atualmente-carnavalescos ou nos períodos de crise política aparente ou eventual. Daí, desse tempo intermédio da democracia-actualmente-existente, saem, por vezes, sinais de alguma esperança para os que sofrem a crise e sinais de preocupação para os que lucram com ela. Os sinais são os mesmos; a sua interpretação é que varia conforme são vistos por pobres, motivados pela pulsão da sobrevivência, ou por ricos, motivados pela pulsão destrutiva da acumulação de capital. Esta divisão não é retórica, é real.

Esta multiplicidade de tempos simultâneos parece mostrar que a tese de Walter Benjamin de que, nas revoluções, "o tempo sai dos eixos" ? de Hamlet, "the time is out of joint" - se tornou o nosso tempo diário "normal", tal como na sua outra brilhante intuição de que nas sociedades capitalistas "o estado de excepção é a regra". Na crise todos estes tempos se misturam e interligam.

Entronca neste ponto a divergência entre duas tradições de solidariedade: a católica progressista? existente desde o antigo regime? sob múltiplas formas e a solidariedade no sentido político mais lato, vista como horizonte político futuro de uma sociedade mais justa. Esta visão política, sobretudo a da tradição marxista-leninista, tinha em tempos uma tal confiança no determinismo histórico, que punha em causa toda e qualquer acção passível de ser criticada como "reformista", ou mesmo "solidária". Corria, em 1970-71, entre os movimentos associativos estudantis de Lisboa, uma anedota, provavelmente inventada - mas lúcida na sua invenção - sobre um dirigente associativo do qual se dizia que dava pontapés no engraxador para agudizar as contradições de classe e, desse modo, favorecer a vinda do socialismo, o desenrolar mais rápido do processo histórico já conhecido. Hoje sabemos que não existe determinismo histórico algum que conduza necessariamente a um destino já previamente conhecido. Apenas a acção das pessoas do mundo permitirá sair desta crise pelo lado da emancipação e da solidariedade.

Nesse sentido, regressa aqui uma forma de tempo frenético que talvez afecte também os partidos das esquerdas: a luta parlamentar diária, a luta pelo poder entre si e a luta contra o Governo de direita que absorve, de forma diária, a sua concentração e a sua acção, imersa na vida política aparentemente rápida. Essa actividade, certamente importante, poderá, talvez, fazer esquecer o tempo presente em favor do tempo médio ou longo, no qual se trava a luta fundamental que comanda a evolução das sociedades. Ora, para muitas pessoas em sofrimento, não há tempo para esperar pela História.

Sendo certo que, durante o regime de Salazar, "a caridade cristã" pôde ser vista como uma forma de eternizar o estado de coisas e que essa memória ainda nos afecta, o facto é que, no seu tempo existencial de vida quotidiana, os excluídos, os pobres, os desempregados, os que recorrem ao Banco Alimentar e às Misericórdias, às Sopas dos Pobres, etc., não têm tempo para esperar pelo desenlace da luta política, pela queda do Governo, pelo fim da crise, ou outras projecções que se podem desejar ou especular.

A atitude a tomar será considerar que, enquanto não chega o momento da rebelião - como passo para "o momento da solidariedade na construção de uma tópica para a emancipação" ? e se está no momento do sofrimento humano, é necessário considerar a pergunta de Rorty e responder-lhe com acções imediatas, independentemente dos eventuais pressupostos ideológicos que presidem àqueles que as desencadeiam. É necessário sobrepor os dois momentos: o momento político das lutas de médio e longo prazo e o momento de solidariedade activa face ao sofrimento humano, evitando colocá-los como alternativas opostas e contraditórias entre as quais é forçoso escolher. Agir agora: "Estás a sofrer?"



Nota biográfica:
António Pinho Vargas(Vila Nova de Gaia, 15 de agosto de 1951) é um músico e compositor português.
Licenciou-se em História, pela Faculdade de Letras do Porto, e terminou o Curso Superior de Piano do Conservatório da mesma cidade. Posteriormente obteve o mestrado em Composição, pelo Conservatório de Música de Roterdão, onde foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. Em 2010 doutorou-se em Sociologia da Cultura, na Universidade de Coimbra, com uma tese intitulada Música e Poder: para uma sociologia da ausência da música portuguesa no contexto europeu.
Destacou-se como compositor clássico, sendo autor de três óperas e várias peças, incluindo obras gravadas pela Arditti String Quartet, o Galliard Ensemble, o escocês Royal Academy Brass, a Northern Sinfonia, entre outros. No mundo do jazz tem sete álbuns editados, sendo o primeiro, Outros Lugares, de 1983

António Damásio diz que os cortes preconizados na educação preconizados pelo FMI são incompatíveis com aquilo que Portugal precisa

O neurologista António Damásio lembrou que a educação de excelência que o país precisa é incompatível com os cortes exigidos pelo FMI.
Para este médico, que foi distinguido em todo o mundo, um défice de educação conduz invariavelmente a um défice económico e social, por isso mais cortes na educação são um risco perigoso.
«Espero que nada disso se vá passar e seja possível manter qualidade e aumentar a qualidade nas escolas», acrescentou o cientista português.
Ao visitar uma escola nos Olivais que vai ter o seu nome, António Damásio frisou que «não é possível ter uma sociedade justa e com progresso se não houver excelente educação».
Com este tipo de educação, será possível «ter indivíduos mais bem preparados para viverem e participarem numa economia forte em que as pessoas possam chegar à boa saúde, felicidade e ao que chamo o florescer do indivíduo humano».
Para este professor que está radicado há muitos anos nos EUA, «não há nada que nos diga que não se deve emigrar», contudo, «o que não é de todo solução é resolver problemas económicos com emigração».

Vamos todos apoiar amanhã (10/1/2013) a Myriam Zaluar

 
Amanhã, dia 10 de janeiro, pelas 11h, Myriam Zaluar será julgada no Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa por, no passado dia 6 de março, ter distribuído panfletos e tentado efectuar uma inscrição colectiva no Centro de Emprego do Conde de Redondo em Lisboa. Foi constituída arguida e acusada de organizar uma manifestação não autorizada. Eram quatro pessoas.
 
Perante nova demonstração de repressão e violação dos direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa, vimos por este meio convocar todos e todas para que se juntem a nós no apoio a esta companheira. ‎
 
10 de janeiro | 11h |
Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa.
  Alameda dos Oceanos, No 1.08.01 .F - 1990-209 Lisboa.
 
 
Artigo 45.º da Constituição da República Portuguesa
 Direito de reunião e de manifestação
1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.

Manifestação de Professores em Lisboa (26 de Janeiro). Todos os professores a Lisboa contra o desmantelamento da Escola Pública!

 

Perante tudo isto, não podes ficar em casa!
 
Mais desemprego

Professores dos quadros em risco de despedimento / mobilidade

Corte total do salário nos 3 primeiros dias de doença

 Mais Mega-agrupamentos

Municipalização da Educação

Aumento do horário de trabalho

Maior componente lectiva
 
O ano de 2013 surge sem novidades. O que se anuncia é ainda pior. O Orçamento do Estado promulgado por Cavaco entre o Natal e o Ano Novo, anuncia mais miséria e a troika, achando pouco, quer acrescentar-lhe mais desgraça. A direita no poder aproveita a crise para, com essa justificação, levar por diante o mais forte ataque jamais desferido contra o Portugal Democrático, aproveitando para, por fim, ajustar contas com Abril.
 
A par do desmantelamento das funções sociais do Estado, que a todos obrigará a custos mais elevados na saúde, educação ou proteção social, sobre os portugueses irá abater-se uma brutal carga fiscal destinada a extorquir-lhes dinheiro que será enviado para estrangeiros. Ali Babá, ou seja, o FMI usa os seus homens de mão na nossa terra para delapidar Portugal e os portugueses e, assim, se anuncia ainda mais desemprego, novos cortes salariais, o aumento do horário de trabalho ou a transferência total do ensino para os municípios, primeiro passo para a concessão a privados… em suma, sugadas gorduras e secada a carne, querem agora arrancar-nos a pele!
 
Para 2013 não ser tão mau como todos prevemos e é anunciado, só resta, a cada um de nós, assumir a responsabilidade de tudo fazer para contrariar este rumo negativo dos acontecimentos.
 
É preciso que o país saiba dizer “Não!”, como disseram os argentinos quando decidiram pagar apenas parte da dívida, dada a ilegitimidade da mesma. É preciso que o país tenha governantes que não aceitem discriminações e não aceitem ser gozados, assistindo ao aliviar de pressões sobre países com défice mais elevado, mas , aqui, comendo com tudo adotando o que chamam de “bom comportamento”. É preciso responsabilizar quem é, efetivamente, responsável pela situação criada e, nesse sentido, não basta constatar o chamado “milagre irlandês”, é necessário olhar para a coragem de responsabilizar sem olhar a consequências.
 
É por isso que 2013 será tanto melhor ou pior, quanto soubermos e formos capazes de ultrapassar silêncios e conformismos com exigências, propostas, ação e luta. A espiral que aperta cada vez mais, e apertará até sufocar, não irá parar se não fizermos por isso. Se ficarmos apenas a assistir as coisas tornar-se-ão insuportáveis, pois Pedro, Passos Coelho e outros que tais continuarão a rir-se das nossas vidas, acenando-nos de longe, escrevendo hipocrisias com gozo e deixando para os portugueses apenas as pedras que não reluzirem.
 
DAR OUTRO RUMO AO PAÍS E ÀS NOSSAS VIDAS
 
2013 será o ano de nos livrarmos destes males: estas políticas malvadas, os seus executores e a troika que traz ainda outros presos pela goela. É preciso enxotar a troika daqui para fora, rasgar o seu memorando e trilhar outro caminho, que há. Não faltam políticas alternativas, há que saber construir a alternativa política. É preciso dar esperança aos portugueses; é preciso dar rumo ao futuro; é preciso lutar muito por tudo isso!
 
Para os professores, a luta desponta já no alvorecer do ano, em 26 de janeiro.
 
Todos na rua, mais uma vez.
 



Há Fado nas Tasquinhas e Restaurantes da Mouraria



Vai voltar a ouvir-se o fado nas tascas e restaurantes da Mouraria.
Até ao final de Janeiro, as tardes de sábado serão animadas por vários músicos e fadistas que estarão nestes locais, à espera de serem descobertos por dois guias locais, numa espécie de caça ao tesouro em que se contará um pouco da história do fado e da Mouraria.
 
De tasca em tasca, vai poder ouvir-se o fado, petiscar iguarias de diferentes locais do mundo e tomar uns copos para aquecer as frias tardes deste inverno. Este projecto é uma iniciativa da Associação Renovar a Mouraria, e pretende dinamizar a recém criada Rota das Tasquinhas e Restaurantes da Mouraria, com o objectivo de dinamizar o comércio local da restauração.
 
 Aqui, poderão ser ouvidas as vozes finalistas do Concurso Há Fado na Mouraria, acompanhadas por viola de fado e guitarra portuguesa.
 
O ponto de encontro é na Igreja da Senhora da Saúde, no Martim Moniz, às 16 horas.
Janeiro: dias 12, 19 e 26 Das 16h às 19h
 
 Gratuito (não é necessária inscrição prévia)
Informações: 218 885 203 ou 922 191 892
 
Dois guias, quatro músicos e vários fadistas vão animar as tasquinhas e restaurantes da Mouraria, trazendo de volta o fado ao bairro. onde nasceu. Entre petiscos e um copo de vinho, conheça a Mouraria e um pouco da sua história.

 
 
 
ROSA MARIA é uma publicação de distribuição gratuita, pretende ser a voz dos homens e mulheres da Mouraria e o principal veículo de informação sobre o bairro. O desafio é divulgar a riqueza cultural, patrimonial, humana e social, contribuindo para a sua consolidação como bairro histórico e cosmopolita da cidade. Vai contar as histórias dos seus habitantes e denunciar as carência e problemas de quem vive e trabalha na Mouraria

8.1.13

A Marcha do Silencio dos Zapatistas ( descendentes dos maias)


 
A Marcha do Silencio dos Zapatistas ( descendentes dos maias)
 
No dia 21/12/2012, enquanto o mundo brincava ao fim do mundo, os verdadeiros descendentes dos maias, vivos e reais, mandaram-nos das montanhas de Chiapas uma importante mensagem, que surpreendeu o México. Em diferentes municípios da região Sudeste, milhares de indígenas integrantes do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) iniciaram o dia em grandes marchas por diferentes estradas e cidades. A manifestação, organizada até à véspera em sigilo, foi pacífica e surpreendentemente silenciosa. Em todas as marchas, o silêncio foi absoluto. Nenhuma palavra de ordem, nenhum cântico, nenhum grito de protesto. Ao final do dia finalmente foi divulgado um comunicado oficial do Subcomandante Marcos, dizendo apenas: "Escutaram? É o som do mundo de vocês desmoronando. E do nosso ressurgindo". Como sabemos, os maias nunca falaram em "fim do mundo" (tão-pouco jamais conceberam essa ideia). Ao contrário, num gigantesco silêncio, disseram-nos que um mundo novo, uma nova era, está começando. E que os ideais zapatistas estão de volta.
 
 
COMUNICADO DEL COMITÉ CLANDESTINO REVOLUCIONARIO INDÍGENA- COMANDANCIA GENERAL DEL EJÉRCITO ZAPATISTA DE LIBERACIÓN NACIONAL.
 
MÉXICO. 21 DE DICIEMBRE DEL 2012
 
A QUIÉN CORRESPONDA:
¿ESCUCHARON?
Es el sonido de su mundo derrumbándose. Es el del nuestro resurgiendo.
El día que fue el día, era noche. Y noche será el día que será el día.
¡DEMOCRACIA! ¡LIBERTAD! ¡JUSTICIA!
 
Desde las montañas del Sureste Mexicano.
Por el Comité Clandestino Revolucionario Indígena-Comandancia General del EZLN Subcomandante Insurgente Marcos.
México, Diciembre del 2012.

António Pedro Ribeiro: individualismo revolucionário, xamanismo e utopia - texto de Alexandre Teixeira Mendes na apresentação do livro Fora da Lei



"FORA DA LEI" , novo livro de A.Pedro Ribeiro
 
Texto de ALEXANDRE TEIXEIRA MENDES na apresentação do último  livro de A.Pedro Ribeiro «Fora-da-Lei»
 
António Pedro Ribeiro: individualismo revolucionário, xamanismo e utopia
 
 
De entre os últimos livros de António Pedro Ribeiro, merece ser especialmente citado “Fora da Lei” (e-ditora, Braga, Dezembro de 2012), um poemário miscelânea- iconoclasta que inclui um CD com gravações (recitações) do autor e diseur (ao longo do ano corrente). Todos estaremos de acordo em que estas páginas se inscrevem no quadro de uma escrita testemunho assente em esquemas e fórmulas composicionais pré-estabelecidas - jogos enunciativos - temáticas de teor auto-biográfico (no seu contexto preciso: o domínio dos “fantasmas” pessoais). “Combato os demónios/como Horderlin, Kleist, Nietzsche/vou até ao infinito” (p.30). Desta escrita, segundo o quadro poético-base dos fluxos mentais e da errância - habitual e constante - de ser e ser algo – singular e próprio - das combinações múltiplas – fica-nos a vizinhança imediata com o “caminho excêntrico” de que nos fala Hörderlin. Tem assim o condão de nos remeter à u-topia e ao niilismo (democrático).
 
  hors la loi
 
Esta poética surge-nos, antes de mais nada, associada à recusa do poder e do controlo tecnopolita (para usar a expressão de Harvey Cox). Mostra-se-nos guiado pela crítica das estruturas centralizadas de dominação e, no entanto, do capitalismo manipulativo (onde será necessário acrescentar: a lógica do (ter sobre o ser) mercantil). Diremos que estes textos-poemas coincidem também com um tom semi-insurrecional - no re-assumir da praxis política - da dialéctica do fora-da-lei, hors la loi - do “discurso livre”. E em que se reclama o compromisso militante (minoritário) e o próprio ideário da liberdade: a "liberdade livre" de Rimbaud. A escrita de António Pedro Ribeiro - já o dissemos antes - sempre se mostrou possuída por uma paixão central da “urbs” - a prática viva e“mítica” da cidade-panorama - transumante ou metafórica - da “polis” - dos “voyeurs” ou caminhantes metropolitanos- “on the road” - bem à maneira da beat generation - do “dire-vrai” sobre eros - as questões atinentes a todo o poder-dominação que se volve demoníaco (a “Kultur” consumista ou o “American Way of Life”).
 
  iluminações
 
Na acentuação crítica do mundo quotidiano (everyday-world) e do mundo da vida (life-word) - sob um fundo filosófico partilhado que nos remete à Internationale situationiste francesa e seus sonhos de revolução e libertação no domínio da vida quotidiana - as teses criticistas de Henri Lefebvre - esta poemática encerra em si, necessariamente, uma vocação dialógica e comunal. O point de départ da poesia de António Pedro Ribeiro é, em sentido rigoroso e original, a discussão sobre “representação” e “autoridade”: a sociedade do espectáculo. A originalidade desta escrita-vórtice está no contínuo movimento de imersão/ re-emersão da palavra - dando prevalência à vox (vocis) - às “iluminações”. Poderemos pôr em evidência um tipo de poesia engagé - pós-radical - de inscrição ideológica “para-marxista”. Na crítica dos módulos e fórmulas da sociedade de mercado e de dominação - num contexto de “acelerada” “liquefacção” das estruturas e instituições sociais em que hoje naufragamos- esta poética prima, antes de mais, pela singularidade e intransigência do seu radicalismo (a lição báquica): “mas há noites em que Dionísios/volta e aí dança, celebra e faz/tremer o instituído” (p.31)
 
niilismo
 
Os poemas de António Pedro Ribeiro exibem, em seu contexto de significação original, um questionar social e político: advogam um niilismo extremo, o l´enjeu do individualismo revolucionário (na acepção de Alain Joufroy). Sob a égide da crítica básica do sistema industrial-consumista - denunciam-se as patologias e as fraquezas da razão instrumental - os truques e mentiras (a linguagem corrente) dos contabilistas e dos economistas - do poder soberano e das suas instituições - a situação humana, the human predicament (na conceituação do teólogo Paul Tilitch). Mais ainda, os oligopólios - o mundo financeiro - o escravismo e a opressão mercantil - a estrutura e a lógica da “sociedade unidimensional” (v. Manifesto Antinormalidade, p. 26-27). Unindo-se ao niilismo de Max Stirner e Guy Debord - as razões de uma revolta anárquico-libertária - Rimbaud, Morrison, Ginsberg e Miller - o próprio riso de Zaratustra – a obra de António Pinto Ribeiro assenta, de per si, na assumpção cénica (assertiva) do desejo ( a "indizibilidade do único"). Não teremos dificuldade em entender, desde já, porque os gregos falavam de um logos spermatikos, a palavra geradora ou o pensamento seminal.
 
  trans(e)versal
 
A poesia de António Pedro Ribeiro assenta, por conseguinte, - já o vimos precedentemente - na crítica da alienação (manipulação autoritária) e da dominação (instrumental, organizacional e psíquica) - cujo protótipo simbólico é o “Zé-Ninguém” de W.Reich. Referimo-nos a uma escrita que veicula latu sensu a insânia, o pathos da loucura e a ebriedade. Não se deve perder de vista a plenitude e a beatitude de uma poética sugerindo um caminho (de discernimento) alternativo (primordial e iluminativo): "asceta longe da tribo xamã encoberto" (p.21).Trata-se - à primeira vista - de uma escritura “engajada” - de apego ao trans(e)versal - que se opõe à visão normal - convencional. Poderíamos falar longamente sobre a conscienciosa rebelião desta poesia (porquanto uma escrita da contestação, do dissentimento ou da recusa). Temos assim uma poética mundivivencial da dicção coloquial quotidiana (para além da mera tradição lírica-discursiva)
 
  activismo existencial
 
A poesia negativa e dialéctica-dialógica - catártica e des-construtora - assume a dissidência - o poder da contestação e do protesto que é essencial a todo o pensamento livre e criador. Esta escrita denunciadora do “vazio” do mundo - da ideologia e da linguagem tecnocrática do capitalismo planetário (que transforma a pessoa humana em um ser domesticado e unidimensional) esforça-se por ser - sob as estratificações das convenções fixas - uma poesia dos transes e transportes visionários. E é ainda bem preciso e essencial notar o seu pendor oracular e na coincidência com as correntes beat. Uma das dimensões destes textos é o forte pendor ideológico - enquanto propensão crítica do ethos do domínio capitalista e inclusive da res publica burguesa. Já que se admite que o poder político é basicamente sustentado pela coerção física, enquanto que o poder económico se sustenta através de recompensa e privação.
 
hybris
 
Trata-se de uma poesia da iconoclastia e da irreverência (composta de palavras-chave no sentido estrito) que enaltece, vimo-lo nos capítulos precedentes, a auto-reflexão. Em que há também um exercício crítico em torno da sociedade autoritária “unidimensional”. Por fim, o questionamento dum mundo dominado por critérios de eficiência e sucesso e, por conseguinte, assente na “auto-escravização”do humano. Verificar-se-á que esta poesia - com os seus laivos de narcisismo umbiguista - está necessariamente ligada ao activismo existencial-visionário: de negação do ethos e do pathos do autoritarismo. Noutras palavras: uma escrita que patenteia, desde as primeiras obras, uma opção ético-política libertária. Falámos dos insigths de uma poética que nos surge mobilizada pelo “sagrado selvagem - o amor ao prolixo- a pro-jecção da hybris. “sou o canto das aves/e das sereias/sou aquele que renasce/e aquele que bebeu o Graal/que esteve com Jesus,/Merlin e Zaratustra//sou o super-homem/o poeta que reinará/sobre a Terra/sou Quixote/a lutar contra os moinhos/sou Artur de Camelot/sou todos os vencidos/que hão-de vencer/sou a água dos rios/sou o poema que não acaba/a canção que não se cala/o ouro todo do mundo” (pp.18-19)
 
  profecia
 
  Parece pois que as diligências da escrita de António Pedro Ribeiro, do poeta como do “performer”, são comandadas, cada vez mais, pela “projecções” do inconsciente. Isto traz-nos à mente os mecanismos de dissociação efectiva da identidade. A sua forca de gravitação está na apologia do “espírito livre”: libertação e liberdade colectiva. Tendo em conta essa outra virtude que é a poesia manifesto. Mais: a causa em que parece enfileirar é a causa da velha e da nova esquerda em estilo profético: democracia, auto-governo, organizações de base. É aqui que se faz importante a verificação da missão da denúncia e da profecia (já o indicamos anteriormente). Mas onde se enfatiza a liberdade e a “auto-determinação”: a de que somos “fazedores de mundo” (assinale-se a obra "Ways of Worldmaking" (1978) de Nelson Goodman) e a de que - note-se - estamos constantemente a fazer “novos mundos a partir dos velhos”. Como no-lo diz: “Capaz de gerar estrelas crio mundos novos” (p.43). Mas, pela sua própria natureza, uma poesia de "demanda" que - no seu teor cívico-ético - planfletarismo - simboliza a insurreição, a revolta, enfim, a crítica ao fascismo (democrático) em acto - que Agamben-Foucault denominou "bio-poder" - , quando se associa a visão paradigmática política do Ocidente ao campo de concentração.
 
(contra)poder
 
A poética da qual falamos é o exercício de um "contra-poder" (num aferrar-se à ideologia libertária e democratista). “Os instrumentos pelos quais o poder é exercido e as fontes do Direito para esse exercício - escreve Kenneth Galbraith – estão interrelacionadas de maneira complexa. Alguns usos do poder dependem de estar oculto, de não ser evidente a submissão dos que a ele capitulam” (Anatomia do Poder, Difel, Lisboa, p. 19). Observar-se-á, portanto, que o poder (no estrito exercício e manutenção) nunca pode, afinal, dissociar-se do seu appparatus. O que não podemos esquecer é que a história é normalmente escrita em torno do exercício do poder. Assim sendo poderia igualmente ser escrita em torno das fontes do poder e dos instrumentos que o impõem (Ib. p.105). Haveria apenas de perguntar se, basicamente, a finalidade do poder é hoje o exercício do próprio poder? E se tem ainda sentido admitir-se a poesia - passivamente como activamente - num mundo assente nas relações de poder - enquanto dom, hospitalidade, transe, desmesura?
 
leviathan
 
Na presente obra submetem-se a um exame crítico as categorias jurídicas tradicionais: re-equacionam-se os fundamentos do poder político e do direito (o novo leviathan). Não se trata evidentemente de propor a abolição dos códigos e das regras mas de considerar que o direito não é redutível a: 1) uma série de ordens ou imperativos, 2) um mero sistema de normas, 3) regularidade dos comportamentos, 4) função de uma realidade de tipo objectivo-natural. O que queremos sustentar é que a lei - as normas jurídicas - são fenómenos impessoais. Mas o que aqui é relevante é o dogma do liberalismo e do neo-liberalismo jurídicos - tácitamente uma ordem jurídica fechada e completa (primum verum). Parte-se aqui confessadamente de um desmascaramento da ideologia da “ordem”(da “normalização”) na acentuação de um confronto assumido que incide sobre a doutrinação uniformizante e a política moderna (como uma forma específica e difusa da guerra) super-dirigida. É razoável supor que a liberdade de realização dos fins individuais está pré-determinada pela história e pela sociedade. Na expressão de António Pedro Ribeiro: “Os negócio dos homens nada nos dizem/ entre faunos e sátiros/ erigimos a nossa morada/o homem vulgar não nos atinge” (p. 62)
 
(in)submissão
 
  Não é necessário dizer que a linguagem mordaz e a linguagem mágica permanecem. Vem depois a valorização da natureza-experiência primordial e, em particular, da infância (imóvel). Distingue-se pela concepção rousseana - franciscana-silvestre do homem - que se revela da mesma natureza das pedras, animais ou plantas. “Celebro o triunfo da Arte sobre a sobrevivência. Sou o homem que vem dos séculos, da floresta. Trago em mim o enigma da existência. Sou rei, mago, poeta. Sou delírio e loucura. Sou o primeiro homem. Não conheço limites, sigo a liberdade antiga” (p. 22). Digamos - para encerrar, e de passagem - que esta poesia configura, nas suas linhas gerais, o cosmopolitismo, num tempo de mundialização do urbano, - das cidades-mundo - em que de facto se adensa particularmente a aceleração da história e, por outro lado, a decadência da paisagem (a destruição da natureza). E que supõe também o emergir do monstruoso (criado pelo homem) e a crescente artificialidade em todas as dimensões essenciais da existência. As estruturas políticas (incluindo o Estado) não existem fora da totalidade social de que são um elemento integrante. Revertendo agora ao nosso ponto, temos que a escrita de António António Pedro Ribeiro é mais o ponto de vista afirmativo da mensagem libertária - uma poética que recupera o ideal - o arquétipo do poeta-xamã. Ora - e para falar a linguagem de Platão - a poesia supõe a inspiração, ou seja, uma possessão do poeta por uma força divina, seja qual for, Musa ou Apolo, ou um “fora de si”, mais ou menos definido. Mas onde o testemunho “numinoso” é ainda transe.
 
  Café-Bar Olimpo Porto 21 de Dezembro de 2012
  Alexandre Teixeira Mendes